terça-feira, 12 de maio de 2015

"Espiritismo" e a desculpa dos erros


"Quem nunca errou, que atire a primeira pedra", conta o registro da Bíblia de um suposto episódio (na verdade fictício, segundo pesquisas históricas, por ser uma inserção católica da Idade Média) envolvendo Jesus e uma adúltera.

Mais recentemente, outras frases mais simplificadas se relacionaram com os erros humanos, como o tal "Quem nunca...?", da qual criou até uma "tribo" chamada "quenunca", por conta do episódio envolvendo a embriaguez de uma conhecida atriz de teatro, cinema e TV.

Os "quenuncas" são aliás um subproduto dessa interpretação errada da consciência dos erros. Que todas as pessoas erram, isso é verdade, embora dizer isso tenha se tornado um chavão. Mas o problema não é esse risco de errar, que com certeza deve ser compreendido pela complexidade social em que vivemos, mas a apologia ao erro que o exagero dessa ideia pode causar.

Há uma grande diferença entre uma pessoa que erra sem querer e mantém a consciência tranquila, evitando se traumatizar com o erro que cometeu, e outra que comete algum erro pior e sai por aí orgulhosa dizendo "Quem nunca...?", fazendo publicidade de seus próprios delitos?

É aí que há o perigo da apologia do erro, tão perigosa quanto condenar severamente os erros mais inocentes. A permissividade do erro já ocorre muito na humanidade, principalmente no Brasil, e até práticas cruéis como o homicídio forjam justificativas de acordo com as conveniências.

Os machistas praticam homicídio contra mulheres, o feminicídio, alegando "legítima defesa da honra". O coronelismo latifundiário mata trabalhadores, desempregados e até missionários sob a desculpa da "defesa da propriedade". A ditadura militar assassinou milhares de cidadãos brasileiros por causa do "combate à subversão" e "repressão ao comunismo".

Se atos de extrema covardia são justificados assim dessa forma, então se estimula a bebedeira e o uso de drogas, e castigar os pulmões com cigarro até que, na meia-idade, uma quimioterapia seja feita em vão e o que resta do fumante convicto é a saudade que deixará para seus amigos, parentes e colegas.

OS ERROS "ESPÍRITAS"

A apologia ao erro é uma boa desculpa para medíocres e incompetentes passarem no teste. Isso vem desde a escola, quando pessoas que não querem nem conseguem aprender fazem o possível para passar de ano, com as chamadas "colas".

Essa apologia é boa para que facínoras, algozes, calhordas e canalhas de outrora cheguem à posteridade muitas vezes embarcando em causas que espontaneamente nunca se identificariam nem se interessariam em seguir. São marionetes das conveniências, capazes de transformar em obsessão uma causa da qual nem sonhando eles desejariam seguir outrora.

No "espiritismo", os erros fazem com que figuras como Francisco Cândido Xavier sejam mantidas em seu pedestal pelas paixões terrenas de seus seguidores. O anti-médium praticamente empastelou a doutrina de Allan Kardec, autor que Chico Xavier nunca teve o menor interesse em seguir, mas ao qual se tornou tendenciosamente vinculado.

Tudo se justifica para aceitar erros vergonhosos. As conveniências medem e manipulam a avaliação dos erros humanos. Dependendo de quem erra, os erros graves são aceitos por conta de certas condições de favorecimento social, distinções de caráter materialista ou simbólico feitas para alimentar e assegurar as vaidades pessoais.

Daí o fato de muitos homicidas terem deixado a cadeia porque gozam de um importante status social. Latifundiários que fazem a regra de suas terras não seriam punidos pelos seus crimes. Feminicidas ricos levam a melhor até na conquista de novas namoradas, passando a perna em muitos nerds ou poetas dotados do mais sincero e respeitoso cavalheirismo.

E, no caso "espírita", um Chico Xavier que às vezes se comportava de forma hesitante e, em outras, apoiava abertamente fraudes, e que deturpou a Doutrina Espírita e cometeu pastiches literários, é endeusado e promovido a "líder" por conta de valores e símbolos associados a um estereótipo que envolve velhice, pobreza, bondade e caridade.

Esse estereótipo, que alimenta vaidades pessoais dos seguidores de Chico Xavier com um jogo de contrastes ideológicos entre pobreza/riqueza, ignorância/sabedoria, fraqueza/força, silêncio/voz e pequeneza/grandeza, faz com que muitos elitistas se apoiem nessa figura para disfarçar seus ódios, desprezos e maus tratos contra idosos e humildes de carne e osso que vivem no seu cotidiano.

Permitindo a complacência com os erros de Chico Xavier, que foram muitos e gravíssimos, porque entregaram a Doutrina Espírita a um rol de atividades desonestas e enganadoras, permite-se que, promovendo-o a líder de tudo, a um quase Deus e a um "dono da verdade", se autorize qualquer mediocridade, qualquer corrupção, qualquer delito ou até mesmo crime.

Sim, porque no caso do crime, é através da ideologia de Chico Xavier que os atos criminosos, dos roubos aos genocídios, sejam justificados como atos de "reajustes espirituais", impondo a culpabilidade das vítimas e atenuando a culpa dos criminosos, que só "pagarão pelo que fizeram" daqui a uma ou duas encarnações.

Chico Xavier é um dos símbolos máximos da apologia ao erro, porque ele cometeu vários e preocupantes. Ele explorava as tragédias dos jovens mortos e expunha as famílias a situações vexatórias, se aproveitando das tristezas alheias, e renegando o sossego e a privacidade que essas famílias precisam para refletir sobre a perda de entes queridos.

No entanto, seu estereótipo de "bom velhinho" o faz com que seus seguidores, em suas diversas correntes, dos "chiquistas puros" (que só veem ele como filantropo, "médium" e conselheiro religioso) a outros que lhe atribuem qualidades surreais, o coloquem sempre como alguém superior, atribuindo qualidades que vão do "missionário" ao "cientista político".

Sim, Chico Xavier passou a ser um gancho para fantasias idealistas ou delírios surreais. E virou ele mesmo um símbolo máximo da apologia ao erro, sendo a única pessoa que pode cometer até erros graves, mas que é isento de responsabilidade total sobre os mesmos, ainda que os tivesse feito de propósito.

Tanto que ele tornou-se o único a ser aceito pela falsidade ideológica das mensagens por ele difundidas, e o único que foi oficialmente autorizado a se apropriar indevidamente de um autor morto, Humberto de Campos, produzindo obras que destoam totalmente do estilo do falecido autor maranhense.

Em nome das "palavras de amor" trazidas pelo mineiro que simbolizava o estereótipo do "caipira humilde", para depois ser visto como o "bom velhinho", Chico Xavier usou e abusou da credulidade alheia e, mesmo assim, ganhou foros de "autoridade máxima" do nosso país, promovido a "líder absoluto" de tudo, sem ter mérito natural para isso.

E agora o "espiritismo" tenta salvar sua doutrina e a figura de Chico Xavier, alegando que "tem consciência" dos erros cometidos. Mas tudo isso é desculpa para tudo permanecer na mesma, para que os erros continuem já que eles são confortavelmente aceitos. As pessoas que fazem apologia aos seus erros se acham certas, e acabam atirando pedras no bom senso e na coerência.

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