sábado, 30 de julho de 2016

"Coxinhas" cancelam protestos de 31 de Julho. Orientação de "espíritos superiores"?

KIM KATAGUIRI, DO MOVIMENTO BRASIL LIVRE: "CRIANÇA-ÍNDIGO"?

A julgar pela entusiasmada classificação, pelo "movimento espírita" brasileiro, de que as passeatas de 13 de Março foram sinais de "despertar político", "libertação" e "intuição dos espíritos de luz" contra "tudo que está aí", o significado de "crianças-índigo", "cristais" ou "estrelas" não pode ser outro: COXINHAS.

Pois como explicará o "espiritismo" diante do cancelamento das históricas passeatas de 31 de Julho, que iriam inaugurar, para os olhos dos "espíritas", sempre confiantes na sua "boa palavra", a transição do Brasil de país problemático para "Coração do Mundo e Pátria do Evangelho"?

O "espiritismo" havia tomado o gosto da Era Michel Temer, já que diversos blogues do gênero haviam publicado, em série, textos pedindo aos sofredores aguentar dificuldades. "Abram mão de seus desejos", "não reclamem diante das dificuldades" e "bem-aventurados os perseguidos" são algumas das mensagens encontradas.

Isso coincide com a perspectiva de que o presidente interino, assim que se tornar efetivo - quando a pressão do empresariado, da mídia associada e de setores solidários do Legislativo, do Judiciário e do Ministério Público, influírem na votação final do impeachment de Dilma Rousseff pelo Senado - , impor um pacote de retrocessos político-econômicos que devolverão o Brasil a um estágio anterior à Era Vargas.

Daí a mensagem subliminar do "espiritismo" brasileiro, que, através desses recados pela "aceitação" e pela "perseverança", dentro dos valores da Teologia do Sofrimento que a doutrina brasileira não mais pode esconder, manifesta seu apoio entusiasmado a esse governo retrógrado, pelo qual seus palestrantes pedem "orações em favor" do presidente e "preces para ele trabalhar em prol do próximo".

São meros apelos igrejistas, que definem o caráter de uma religião que se autoproclama "ciência e filosofia", se autodefine como "futurista" e "racional" mas não consegue mais esconder sua herança dos valores medievais do Catolicismo português, que sempre estiveram nos corações dos "espíritas" desde os primórdios roustanguistas da FEB.

E aí, como explicarão os "espíritas" diante do cancelamento das passeatas anti-PT - as que exibiam as cores da bandeira brasileira que tanto encantaram os "espíritas" e inspiraram Robson Pinheiro a escrever um romance, O Partido: Projeto Criminoso de Poder - , que seriam comandadas justamente pelos grupos Movimento Brasil Livre e Revoltados On Line (soa irônico os "espíritas" condenarem tanto a ideia de "revolta"), que desistiram do evento?

Sabe-se que o cancelamento, anunciado há alguns dias, teve como desculpas o fato de que a votação final do impeachment ocorrerá no final de agosto e que o período marca a volta dos jovens à escola, com o fim das férias previsto para o começo do referido mês.

E os "espíritas", o que dirão? Dirão que "espíritos traiçoeiros" iriam atrapalhar as passeatas, por isso os "espíritos benfeitores" iriam aconselhar a suspensão do evento. Explicar como os "amiguinhos pouco esclarecidos", eufemismo para os "espíritos obsessores", irão atrapalhar os eventos, é algo complicado, mas como o "espiritismo" veio para confundir e não para explicar, é compreensível.

Vamos ver como é que os "espíritas" sairão desta, eles que agora terão que assumir a herança católica medieval - em muitos momentos, seu catolicismo é ainda mais retrógrado do que o que a Igreja Católica desenvolve hoje - e, principalmente, a Teologia do Sofrimento, que se expressa claramente nos textos que são divulgados pelos próprios "espíritas".

quinta-feira, 28 de julho de 2016

"Espíritas" ficam de fora na Rio 2016. Não faz mal, se unam aos católicos


Mesmo com a recomendação do Ministério Público Federal para que se amplie a contemplação de religiões durante os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, o comitê organizador da Rio 2016 se omitiu em responder sobre o caso, fazendo com que religiões de matriz africana e outras seitas como o "espiritismo" não tenham representação nas cerimônias a serem realizadas durante o evento.

Religiões como cristianismo, budismo, hinduísmo, judaísmo e islamismo terão representantes em plantão durante a realização de cerimônias, a serem feitas em português, espanhol e inglês. Não houve informação se tendências evangélicas estão incluídas no critério de cristianismo, já que o termo costuma estar associado à Igreja Católica.

O que se observa é a exclusão do "espiritismo" nas cerimônias. A religião, segundo dados estatísticos, tem, oficialmente, 2% de adeptos em toda a população brasileira, mas ela não terá representante de plantão para realizar cultos ou rituais específicos no evento.

Apesar de não ter havido uma resposta ao Ministério Público, representantes dos organizadores da Rio 2016 afirmaram que o Centro Olímpico estará aberto a todas as religiões e que as cinco religiões escolhidas se baseiam nas crenças da maioria dos atletas olímpicos e paralímpicos participantes.

Diante disso, a sugestão que se dá aos "espíritas", que tanto falam em resignação e perseverança, para eles deixarem de tristeza nesta ocasião e, em vez de tentar explicar o cientificismo de Allan Kardec para os organizadores olímpicos, seria melhor os "espíritas" se unirem aos católicos.

Isso porque o "espiritismo" brasileiro nunca se lembrou de Allan Kardec nos momentos mais necessários, preferindo a influência jesuíta do Catolicismo do Brasil-colônia - de origem portuguesa e de conteúdo medieval - e tanto preferiu criar práticas análogas às da Igreja Católica.

Vide a "água fluidificada" (água benta), o "auxílio fraterno" (confessionário), os "centros espíritas" e suas "doutrinárias" (igreja e missa), a concepção de "colônia espiritual" e "umbral" (Paraíso e Inferno), de "resgates espirituais" (pecado original) e de "espíritos benfeitores" (santos). Para cada atividade ou conceito católico, um equivalente "espírita".

E como os "espíritas" não parecem ter problemas em conciliar com este ou aquele segmento da sociedade, nada melhor do que eles se relaxarem e se integrarem aos católicos, porque a história do "movimento espírita" sempre esteve ligada a práticas e procedimentos que minimizassem os conflitos iniciais com os católicos, atitude que tão cedo culminou numa verdadeira vaticanização do Espiritismo realizada no Brasil. Agora é assumir isso de vez na Rio 2016.

terça-feira, 26 de julho de 2016

O desespero do 'velho" em sobreviver ao "novo"

NO BRASIL, JOGA-SE FORA A FRUTA DA ESQUERDA, E LUTA-SE O TEMPO TODO PARA PRESERVAR E MANTER A DA DIREITA.

O grande problema do mundo, e, com maior intensidade no Brasil, é a revolta de setores ultraconservadores da sociedade com as transformações do tempo. Agora mandando às favas valores ligados à ética, bom senso, lógica, justiça social etc, diversos movimentos tentam agora puxar os ponteiros dos relógios para fazer a humanidade caminhar para trás.

Há, no plano internacional, a ação de grupos terroristas, mesmo através de ações individuais, revela esse saudosismo doentio e psicótico pelos "tempos áureos", trazidos por relatos fantásticos de épocas que podem variar de passagens bíblicas ou islâmicas e tempos medievais ou de privilégios capitalistas ao mesmo tempo abusivos e tolerados.

No Brasil, ele se manifesta de forma ainda mais constante e de maneira desesperada. Do machismo ao chamado "ultraliberalismo" (espécie de variação do neoliberalismo adotando princípios dos primórdios desumanos do capitalismo do século XVIII), há saudosismo doentio de todo lado: da Idade Média, da ascensão da burguesia, do jesuitismo do Brasil colônia, do "milagre brasileiro" da Era Médici.

Há um medo de que velhos "heróis" de um Brasil velho e obsoleto não caiam. Velhos totens, velhos dogmas, símbolos relacionados à tecnocracia, à supremacia religiosa, à grande mídia, ao mercado, ou até mesmo ao machismo. A sociedade brasileira está com muito medo e reage da forma mais esquizofrênica possível.

Uma catástrofe política está em andamento, através do governo de Michel Temer, que combina aspectos dos governos dos generais Emílio Médici e Castelo Branco com outros que lembram a República Velha e o Segundo Império, numa atitude desesperada de reverter os avanços sociais inúmeros dos últimos tempos.

Já não é mais uma simples campanha ultraconservadora de resgate aos valores "sagrados". Já não é mais um mero apelo para "respeitar as tradições da Família, do Livre Mercado, da Livre Propriedade e dos Valores Cristãos", mas um esforço, por vezes debiloide, por outras violento, de recuperar na marra estruturas e valores que já se comprovam obsoletos.

No Brasil, mais do que na França, EUA ou Alemanha, costuma-se jogar fora o novo em folha, e preservar, a todo custo, o que já está podre e inútil. Isso influi até no contexto de falecimento de brasileiros famosos e na reação da sociedade conservadora em relação a isso.

É um país cujos grandes intelectuais, artistas e ativistas, em boa parte, morreram cedo, sob a resignação da sociedade, mas também sob a ação violenta dos que protegem privilégios aqui e ali. Em contrapartida, é um país com medo de assumir a ideia de que assassinos também morrem, e, mesmo que vários deles contribuam para abreviar sua vida por descuidos à saúde, até a grande imprensa tem medo de pensar em um dia noticiar o obituário de algum homicida famoso.

Nesse cenário, a sociedade brasileira parece mais com medo de ver a presidenta Dilma Rousseff voltar ao poder do que o presidente interino Michel Temer causar, quando se tornar efetivo, uma administração desastrosa que deixará o Brasil vulnerável à hiperinflação.

As pessoas não se preocupam que o governo Temer foi instaurado através de um processo de corrupção parlamentar e jurídica, movida pela apreciação parcial e tendenciosa das leis, e cuja agenda política, econômica e social é das mais retrógradas e injustas para os brasileiros.

Todos ficam tranquilos e serenos, sem perceber a hipocrisia do presidente Temer, que, sob a desculpa de combater a inflação, corta gastos sociais, limita investimentos para Educação e Saúde, quer desvalorizar salários e eliminar os direitos trabalhistas, enquanto aumenta os gastos para servidores do Poder Judiciário, dá "generosas gorjetas" para a grande mídia e desviará o Minha Casa, Minha Vida para um projeto que assiste mais os ricos do que os pobres.

De repente, os pontos de vista elitistas, com seus preconceitos diversos, são defendidos até por setores da classe média ou mesmo da juventude, da qual se esperaria alguma modernidade. Mas, depois que houve, nos últimos 15 anos, surtos de trolagem e cyberbullying na Internet, em defesa de valores retrógrados ou fenômenos da mídia e do mercado retrógrados, imagina-se até surfistas e skatistas levantando bandeiras medievais das mais obscuras.

A sociedade enlouqueceu, os surtos atingem desde simples estruturas familiares até os escritórios das filiais brasileiras de multinacionais, passando pelos corpos discentes e docentes das universidades privadas e pelas redações dos chamados jornalões ou das redes de televisão.

Todos querendo uma volta impossível ao passado. O "velho" querendo sobreviver ao "novo", na marra, atropelando a lógica, o bom senso e a justiça. Pessoas se entregando a movimentos absurdos, sejam seitas delirantes ou grupos terroristas, para forçar o retrocesso dos relógios a qualquer preço, nem que a sociedade tenha que se tornar mais estúpida e egoísta para tanto.

Movimentos assim que representam a momentânea catarse que hipnotiza as pessoas e traz reações de apoio unânime nas mídias sociais revelam isso. Por ironia, as mídias sociais, como Orkut (já extinto), Facebook, YouTube e WhatsApp (o Twitter, na ironia de seus textos curtos, permite o debate e a contestação de caráter progressista), tornaram-se redutos do mais saudoso e paranoico obscurantismo ideológico.

Até mesmo o "espiritismo" brasileiro, que agora se revelou não passar de uma reciclagem do apodrecido Catolicismo medieval português, que vigorou no Brasil-colônia, também comprova esse curto neo-reacionário que atinge o Brasil e o mundo.

A herança do Catolicismo medieval não é invencionice de detratores. A história do "movimento espírita" confirma, com fatos, este legado, o que faz uma doutrina supostamente inspirada em Allan Kardec se aproximar muito mais do imperador romano Constantino do que do pedagogo de Lyon.

É só observar a evocação de espíritos de padres jesuítas, que "voaram" para o "espiritismo" brasileiro como pombos sobre o milho. E, em vez dos "espíritas" tentarem explicar esta postura dignamente, eles se contradizem numa postura dúbia que distorceu até mesmo os alertas de Erasto, que seria o último espírito a aceitar essa baboseira igrejista que se faz no Brasil.

Recentemente, os palestrantes "espíritas" não conseguem mais esconder que professam até mesmo a Teologia do Sofrimento, corrente do Catolicismo medieval que faz apologia às desgraças como caminho para a "purificação da alma".

Os artigos que mais se publicam em nome do "espiritismo" brasileiro, mesmo por derivados estrangeiros, como em Portugal e até na França, enfatizam o princípio moralista de que o sofredor deve aceitar as desgraças e os obstáculos extremamente difíceis, sem reclamar, em troca do prêmio místico das "graças" e "bênçãos" futuras.

Sob o pretexto de combater "paixões materialistas de toda espécie", os "espíritas" condenam até mesmo a individualidade e as vocações pessoais, aconselhando o sofredor a se conformar com seus infortúnios ou enfrentar dificuldades acima de qualquer capacidade para obter alguma vitória na vida.

Aqui os "espíritas" dão um tiro no pé, tratando, ainda que implicitamente, a individualidade humana como um atributo material, o que permite essa visão desumana que tanto expressa indiferença ao sofrimento alheio quanto permite a pretensa legitimação de fraudes psicográficas, que não refletem o estilo nem o caráter pessoal do morto alegado.

Com isso, o "espiritismo" brasileiro segue o "espírito do tempo" de um Brasil velho que insiste em prevalecer. Os "espíritas" nunca caíram em contradições como hoje, já que em outros tempos o roustanguismo era mais assumido. E depois os "espíritas" não gostam quando falamos que eles estão cada vez mais longe de Allan Kardec, considerado a personificação do bom senso.

domingo, 24 de julho de 2016

O lado cruel da Teologia do Sofrimento "espírita"


Não dá para esconder. O "espiritismo" brasileiro professa a Teologia do Sofrimento, corrente mais retrógrada da Igreja Católica e originária da Idade Média. A ideia de que aguentar desgraças sucessivas visando "purificar a alma" é claramente defendida por Francisco Cândido Xavier, em suas próprias palavras.

Portanto, não há como escapar. Chico Xavier disse para as pessoas sofrerem sem queixumes, sem mostrar sofrimento, sem reclamar. Não se podia sequer gemer de dor. Alguém pisou no seu calo? Agradeça. Alguém lhe passou a perna? Agradeça. Alguém lhe apunhalou pelas costas? Não só agradeça como fique feliz.

Segundo a Teologia do Sofrimento, se você é azarado, você vai para o céu. Você, como tolo, é induzido a acreditar que vale desperdiçar um prazo encarnatório de cerca de 80 anos aguentando desgraças, quando você poderia aproveitar esse limite de tempo para desenvolver suas qualidades e deixar uma contribuição de valor para a humanidade.

Sim, para a religião "espírita" - do jeito que ela é feita no Brasil e trabalhada por nomes como Chico Xavier e Divaldo Franco, ela é religião, sim, e das mais igrejeiras, às vezes até mais católica que a Igreja Católica - , tanto faz você deixar uma encarnação inútil, desperdiçada com tantas desgraças, com a certeza de que o incerto lhe trará as tais "bênçãos" que você nem tem ideia do que seja.

Inventaram até um paraíso surreal chamado "colônia espiritual", uma fantasia da qual a ciência nem sequer conta de indícios plausíveis - e não se está falando prováveis - , na qual o sofredor irrecuperável estará destinado no futuro, com cachorrinhos, gatinhos, pijamas brancos, relva perfumada e até suco de açaí e cineminha no além-túmulo.

Esse paraíso, que no fundo avacalha com os conhecimentos trazidos arduamente por Allan Kardec, se torna o tempero "espírita" da Teologia do Sofrimento, na qual as relações de passado e futuro se tornaram os aspectos diferentes da Igreja Católica e fazem o "espiritismo" ser muito mais cruel.

Pois de um lado está a "lei de causa e efeito" e seus "resgates espirituais" ou "reajustes morais" - analogia "espírita" ao pecado original - do qual o "espiritismo" difere do Catolicismo pelo juízo de valor pormenorizado do qual se supõe, mesmo sem estudos sérios sobre reencarnação (o "espiritismo" apenas finge apreciar tais estudos), que alguém sofre porque foi um algoz numa encarnação anterior.

De outro lado, está a "colônia espiritual", um complexo habitacional que mais parece vindo das campanhas publicitárias de empreiteiras sobre a construção de um novo condomínio, e que parece ser não só o destino presumido de pessoas felizes mas também o exílio de pessoas desgraçadas.

Daí temos os "reajustes morais" (passado) e as "colônias espirituais" (futuro) como verdadeiras presunções - tanto no sentido de presumir como do envaidecimento do "espiritismo" brasileiro - como sustentáculos da versão desta doutrina para a Teologia do Sofrimento que teve em Madre Teresa de Calcutá um dos seguidores mais recentes, nos últimos séculos.

E o que a Teologia do Sofrimento apronta para o desgraçado é essa sina de infortúnios pesados que não podem ser resolvidos. Há esforço, esperança, perseverança, dedicação, mas tudo isso é em vão e somente com um sacrifício descomunal se obtém apenas parte do benefício, uma compensação morna que os religiosos exageram e definem como "superação".

Na maior parte dos casos, as pessoas chegam a abrir mão de talentos, desejos, anseios, projetos de vida para fazer aquilo que não gostam, aguentando a prepotência de algozes, a mediocridade de parceiros incômodos, individualidades são sacrificadas e os benefícios chegam tarde, e racionalizados.

Em outros casos, o sofrimento e a desgraça se tornam tão grandes que as pessoas se amarguram e passam a considerar a opção do crime ou do suicídio. Começam a sentir ódio, depressão, irritação constante, estresse, passam a adotar um comportamento sombrio, casmurro, vingativo ou tão somente quieto, mas preocupante.

Este é o lado cruel da Teologia do Sofrimento, inclusive a "espírita". Esta doutrina, aliás, com toda a sua vocação dissimuladora - afinal, ela bajula Kardec mas pratica igrejismo - , acaba forçando os sofredores a sofrerem ainda mais, com recomendações moralistas que fingem benevolência da forma mais hipócrita possível.

Quem não teve conhecimento de conselhos "espíritas" do tipo "não reclame, ame", "na desgraça, ore e confie em Deus", "não mostre seu sofrimento para não aborrecer os outros" e outros conselhos que recomendam até mesmo as pessoas "desejarem menos" e "mudarem os pensamentos"?

São eufemismos para a condenação à individualidade e às vocações e o prazer humanos. Os "espíritas" não vão assumir esse discurso ao pé-da-letra, vão dizer que valorizam a individiualidade, respeitam os talentos humanos e apenas dizem que "só defendem que a pessoa reinvente seus projetos de vida".

Só que não é isso que acontece. Seria tudo bem se fossem apenas breves e superáveis dificuldades que permitam as pessoas aperfeiçoar desejos e projetos de vida, mudar os interesses quando os mais antigos se mostram prejudiciais ou inócuos e criar, a partir disso, novas habilidades e talentos inusitados.

Só que as desgraças relacionadas à Teologia do Sofrimento "espírita" impedem isso. Fazem a pessoa desiludir-se demais num dia, para em outro se tornar escravo de uma ilusão alheia. Fazem a pessoa abrir mão de seus talentos, porque o "espiritismo" criminaliza o prazer, vendo-o erroneamente como fonte de tentações e ações malignas, ignorando que o excesso de desgraça é que é, sim, fonte de muitos malefícios e degradação de caráter.

Imagine. Mulheres que não querem se envolver com homens poderosos mas sem caráter, mas que a "sorte" só lhes volta para esses tipos, diante das circunstâncias impostas pelo "destino". Ou homens que se cansaram de ver a mulher como um troféu ou brinquedo sexual, e quando não querem mais este tipo, acabam atraindo somente esta espécie para a vida amorosa.

Ou então, no mercado de trabalho, a pessoa só poder trabalhar em uma empresa corrupta, ou em lugar perigoso, mediante sempre uma remuneração baixa demais, em condições sub-humanas. Para o "espírita" envaidecido que espera que os desgraçados se superem, para aí fazer o marketing da superação, tanto faz haver escravos numa sociedade moderna. Os escravos é que façam sua abolição do nada e se virem!

Daí a crueldade da Teologia do Sofrimento que produz criminosos e suicidas. O desperdício de vidas humanas com as desgraças sucessivas, com a pregação de que elas terão que ser suportadas e nada pode ser feito para resolvê-las, senão mediante um sacrifício acima dos limites, é o princípio dessa ideologia retrógrada.

E a Teologia do Sofrimento, cria do Catolicismo medieval, é ainda mais cruel na sua adaptação pelo "espiritismo" brasileiro, por se apoiar em juízos de valor próprios desta doutrina, que supõem a sentença dos "resgates espirituais" (passado) a serem tolerados no presente em prol de um prêmio chamado "bênçãos futuras", de preferência nas "colônias espirituais" (futuro). Agindo assim, o "espiritismo" se apoia no incerto para defender a única certeza das desgraças humanas.

sexta-feira, 22 de julho de 2016

Por que o medo dos empregadores em relação a candidatos talentosos?


O desemprego existe por falta de dinheiro das empresas? Nem sempre. Em muitos casos, evita-se contratar empregados por causa do talento. Parece um absurdo, mas o que se nota é que o talento deixou de ser um critério para contratação nas empresas, o mercado de trabalho costuma desperdiçar o talento apenas por uma questão de preconceito.

Embora a mídia apresente casos de gente talentosa que venceu na vida, que obteve uma ocupação no mercado de trabalho, isso é mais uma exceção do que regra. E, prestando bem atenção nas coisas, as pessoas só obtém conquistas depois de muito esforço e, em vários casos, abrindo mão de suas vocações naturais para obter uma ocupação mais secundária.

Há mais gente talentosa entre os moradores de rua do que entre os empregados. Se hoje vemos, no Poder Judiciário, gente dotada de muita incompetência, mesmo com alguma longevidade cronológica de experiência, como o jurista Gilmar Mendes, na prática um fanfarrão jurídico que brinca com as leis em causa própria e de seus amigos, então é bom pensar nesse outro lado da realidade.

O Brasil vive uma crise de hierarquia e é hora de expor as irregularidades diversas de quem obteve status há um bom tempo. Clientelismos, compadrios e outras conveniências, apoiadas em preceitos moralistas, elitistas e burocráticos, foram responsáveis pela ascensão, no mercado de trabalho, de gente que nem merecia subir tanto na vida.

A meritocracia, por incrível que pareça, é a doutrina que privilegia quem não merece. O "mérito" a que se refere o nome é aquele obtido pelo compadrio, fora outros critérios injustos que surgem, mesmo o critério "honesto" dos concursos públicos de exigir Matemática até para funções que nem de longe trabalham esta disciplina.

Muitas pessoas talentosas reclamam da dificuldade quase insuperável de obter um emprego. Os cursos de especialização profissional costumam ser muito caros, ou requerem provas de seleção muito difíceis. O mercado de trabalho faz de tudo para evitar contratar justamente os mais diferenciados e talentosos, salvo notáveis exceções, mas exceção não é regra.

Há um grande preconceito que se vê sobretudo em profissionais de recursos humanos que analisam currículos ou fazem entrevistas de emprego. Em muitos casos, contrata-se alguém não por saber bem tal especialidade, mas por ser bonito, falar inglês, ser relativamente jovem e saber contar piadas.

Por isso, boa parte da crise econômica que vivemos se deve à incompetência que se saltou aos olhos com o passar dos anos. As pessoas talentosas foram discriminadas, seja por causa da aparência, seja por causa do próprio talento, que pode ameaçar a posição privilegiada do veterano, que simplesmente não quer contratar quem depois lhe irá passar para trás.

Há um grande medo movido por convicções moralistas, elitistas, religiosos, sociais, que trazem preconceitos que podem ser muito, muito cruéis. E é isso que se torna a pior barreira para quem procura um emprego e não consegue, que com todo o esforço e disposição para tomar iniciativa e "meter a cara", sempre bate com a cara na porta fechada de um ambiente de trabalho.

Hoje, mais do que nunca, temos que questionar as atitudes dos privilegiados. Eles são "filhos" de um tempo de clientelismo, trocas de favores, "pistolões" e outros modos menos honestos de "vencer na vida". O desemprego que existe hoje em dia pode ter o fator financeiro como motivo, mas ele é muito mais fruto do preconceito, do medo e da ganância dos empregadores que não querem contratar gente talentosa com medo de perderem seus privilégios.

Cabe, portanto, não nos acomodarmos na complacência à hierarquia. Quem está "em cima" é justamente o que mais está cometendo erros no Brasil, a julgar por esse governo incompetente do presidente interino Michel Temer, ele mesmo a personificação de virtudes hierárquicas que agora estão sendo postas em xeque neste país em crise.

quarta-feira, 20 de julho de 2016

Por que pessoas com mais status não se preocupam com sua decadência?

O PRÓPRIO MICHEL TEMER PARECE INDIFERENTE AOS ESCÂNDALOS DE SEU GOVERNO.

No Brasil, um tipo de sociedade está em declínio. Aristocrata, plutocrata, patriarcal, oligarca, gerontocrata, tecnocrata, midiocrata, burocrata, entre outros ismos e cracias, tudo isso se encontra em estado avançado de perecimento.

No entanto, as pessoas detentores de qualquer uma destas condições surtou em uma teimosia infantil e hoje o que se observa é um esforço, desesperado e persistente, delas manterem suas zonas de conforto de privilégios de posses, de decisões, de poderes ideológicos e tudo o mais.

Vemos de casos aparentemente inócuos como pais de família decidindo demais para seus filhos, mesmo estando estes crescidos, até casos cruéis como um medo descomunal de ver homicidas morrerem de repente, sobretudo feminicidas doentes cujos óbitos, quando ocorrerem, a imprensa nem irá noticiar. Assassino rico é "deus", não morre, e ainda mais quando age em proteção a valores do patriarcado.

No exterior, também isso ocorre. Vide os surtos do Estado Islâmico, as atividades da Klu Klux Klan e outras tendências obscurantistas. O próprio poder dos EUA, a supremacia das multinacionais, os privilégios de grupos mafiosos. Todos agem como se pudessem violentar os outros, até exterminar, mas nunca admitem decadências, fracassos ou tragédias para si.

Daí que, tempos atrás, houve o insólito caso de uma jovem se passar por namorada do psicopata Charles Manson, líder de uma seita que provocou uma chacina da qual, entre outras vítimas, a atriz Sharon Tate, para depois revelar o desejo de ver o psicopata morto e exposto em um mausoléu, na residência do casal.

Aqui as pesssoas reagem com medo a hipótese de um Doca Street, que consumiu os mesmos cigarros e cocaína que mataram um who is who de celebridades e ricaços nos anos 1970, não estar mais vivo para explicar o crime cometido há 40 anos contra a namorada Ângela Diniz, um homicídio que, pela impunidade que o beneficiou, inspirou uma grande onda de feminicídios conjugais nos anos 80 e 90.

E isso num contexto em que nada impede que mesmo os promotores Igor e detetives Pacífico possam morrer de repente, assim como um grupo de extermínio morrer num desastre de carro após cometer uma chacina ou membros da Klu Klux Klan falecerem num desastre aéreo durante um deslocamento de um Estado a outro nos EUA.

Isso é apenas um contexto em que o egoísmo humano e a luta para preservar "num nível aceitável" as desigualdades sociais e os privilégios de toda ordem está sendo posto em xeque. Juntamente com todas as ilusões e complacências que permitem que esse "velho mundo" não só resista como se esforce para frear e até banir os avanços sociais existentes.

A ilusão de quem é rico demais nunca sofrerá prejuízos, quem tem poder em excesso não poderá ser punido por seus abusos, quem tira a vida de outrem nunca morrerá, pelo menos de forma prematura ou relativamente senil, e quem tem mais idade nunca cometerá deslizes dignos de gente imatura, está sendo posta a prova diante de tantos noticiários chocantes.

No Brasil, temos os exemplos recentes de um senhor de 76 anos, conhecido advogado paulista, professor universitário e com livros sobre Direito publicados, estar à frente de um dos mais desastrados, retrógrados, corruptos e impopulares governos da República brasileira. Dentro de um país em que um grande empresário de 63 anos, que havia adquirido parte de uma rede de comunicação sulista, ser denunciado por ter agredido a namorada, uma famosa ex-modelo.

Estamos falando de Michel Temer, presidente interino que se comporta de forma ao mesmo tempo prepotente e insegura, arrogante e atrapalhada, no seu governo. E do empresário Lírio Parisotto, que agrediu a namorada Luíza Brunet numa discussão motivada por um ciúme infantil quando, em Nova York, Lírio foi confundido com o ex-marido de Luíza, Armando Fernandez, pai de dois filhos dela.

Parisotto tenta se fazer de vítima e inverter as coisas, como um machista querendo dizer que "agrediu" porque a namorada agrediu primeiro. E ele quebrou quatro costelas de Luíza, deixando também uma grande ferida no rosto dela, conforme foto divulgada nas mídias sociais.

Já Michel Temer parece confiante em seguir seu governo como efetivo, até completar o mandato da presidenta afastada Dilma Rousseff no final de 2018. Indiferente aos muitos e gravíssimos escândalos, que custaram a saída de ministros e secretários,

Temer tenta legitimar seu governo ilegítimo, ele mesmo instituído através de mecanismos golpistas que envolvem corrupção no Poder Judiciário e nas corporações de mídia, como um Sérgio Moro extremamente parcial em suas condenações e uma Rede Globo sonegadora de impostos cujos donos possuem um imóvel em Parati, ilegalmente construído em cima de uma reserva ambiental.

A própria Rede Globo, como instituição midiática, parece não acreditar em sua decadência. Sem ter o poder de domínio de antes, a corporação midiática faz de tudo para manter sua supremacia, como na recente campanha de difamação e injúrias abertamente cometida por seus veículos jornalísticos e outros associados (revista Época, jornal O Globo, canal Globo News) contra os petistas Lula e Dilma Rousseff.

De repente, as pessoas detentoras do status quo podem roubar, matar, prender injustamente, caluniar. Troleiros e cyberbullies da Internet também acreditam na sua impunidade e reagem com furioso sarcasmo a qualquer aviso de perigo, já que eles são tão desordeiros e agressivos que podem até mesmo serem vítimas de um atentado a bala, devido à "zoada" além dos limites e a não aceitação de ser contrariado ou advertido por suas agressões.

Há até mesmo uma mania da complacência do erro, quando ele é associado a "gente importante", que se baseia naquela frase "Quem nunca errou na vida?", uma espécie de "carteirada moral" que permite as inúmeras gafes, escândalos e até crimes que envolvem ou envolveram gente de grande status, de Chico Xavier a Luciano Huck, de Pimenta Neves a Aécio Neves.

Houve até um sutil modismo dos "heróis dos anos 90", políticos ou personalidades de valor duvidoso que, se apoiando em suposto saudosismo da "moderna" década, tentam ou tentaram estar em alta nos últimos anos, de Fernando Collor a Guilherme de Pádua, passando por Solange Gomes, MC Leonardo, Mário Kertèsz, Bell Marques, Ratinho e Gugu Liberato. Era um meio de promover pessoas que simbolizam o status quo político, econômico e midiático como "acima dos próprios erros".

Os detentores do status quo de hoje se recusam a ter autocrítica, perder privilégios, ceder de suas ganâncias e, no caso de homicidas, se recusam até a morrer (e a mídia, por sua vez, pouco disposta a noticiar óbitos de assassinos ricos). Os "de cima", em seus vários tipos, não querem ver ruir um "mundo" que construíram e querem ver intato de qualquer maneira.

No mercado de trabalho, onde os preconceitos sociais pesam muito mais pela "falta de dinheiro" dos empregadores, já se abre mão de talento e competência para salvar o status quo dos patrões. No ensino superior, os preços caros das já injustas taxas de inscrição e mensalidade das faculdades revela o caráter elitista, já que boa parte dos custos dessas taxas vai mesmo para o luxo de empresários de ensino e de professores universitários sedentos pelo alpinismo social.

Em outros aspectos, ver que fenômenos ou medidas como a supremacia da Rede Globo no meio televisivo, o domínio da dupla 89 FM / Radio Cidade na condução (desastrosa) da cultura rock, na pintura padronizada nos ônibus, do Rio de Janeiro e outras cidades, que confundem os passageiros na hora de ir e vir, não podem ser cancelados nem sofrer decadência, também é um resultado dessa paranoia e apego extremo ao retrógrado.

Até o "espiritismo", que no fundo nunca passou de uma forma reciclada do Catolicismo medieval, deixado para trás pelos novos rumos da Igreja Católica, tenta também se deixar valer pelo triunfalismo, empurrando suas crises com a barriga e mantendo a postura contraditória de bajular Allan Kardec e praticar o igrejismo que o próprio pedagogo francês reprovaria de imediato.

É um sistema de valores que apodrece, que perece de maneira avassaladora. O problema é que as pessoas detentoras de status quo anda se dispõem de meios para manter esse sistema intato, muitas vezes na marra, diante da cumplicidade ou da complacência de muitos, e em prejuízo aos princípios legais, ao interesse público, à moralidade, à qualidade de vida etc.

Com isso, dois caminhos devem ser feitos. Ou deixemos os benefícios da vida para quem abusa delas, sob o sacrifício dos que mais precisam dos mesmos, ou então abrir mão de reputações, dogmas e totens consagrados e dominantes mas que hoje sofrem um estado grau de perecimento e decadência. A segunda opção é desagradável para muitos, mas se revela mais necessária para o bem de todos.

segunda-feira, 18 de julho de 2016

"Funk", esse estranho fenômeno de um Brasil esquisito

NO ALTO, RODA DE FUNK, ACIMA, "BAILE FUNK" DO PIER MAUÁ - Independente do público, o "funk" é pura mercadoria.

Brasil esquisito, este, nos últimos anos. O fenômeno cultural tido como "mais representativo" nos dias de hoje é, na verdade, um ritmo comercial de baixa categoria, em que os princípios de mercantilização e espetacularização da sociedade se tornam escancarados, mas nunca assumidos, sequer, pelo discurso acadêmico.

O "funk" é esse ritmo estranho, surgido da mente gananciosa de uns DJs que jogaram fora as lições de seus antecessores e reduziram a herança da black music norte-americana a um pastiche restrito a um karaokê com vocais toscos e temas de baixarias ou de "protestos inócuos".

Reunindo um estranho ufanismo que reflete um falso orgulho de morar em favelas - construções irregulares resultantes da exclusão social num cenário de especulação imobiliária - , de uma satisfação pela ignorância e pela pobreza, o "funk" quer se impor desesperadamente como um "movimento cultural" que nunca foi nem tende a ser.

Isso porque o "funk" nunca correspondeu ao processo cultural verdadeiro de interferir na realidade das pessoas. O "funk" apenas "descrevia a realidade" mas nunca fez para mudá-la. Seus símbolos sempre eram preservados e analistas culturais apontam no ritmo um ferrenho rigor estético ditado pelos seus DJs e também empresários. O "funk" só muda ao sabor das conveniências.

Respaldado por uma estrutura mercadológica, política e midiática que envolve multinacionais - que em muitos casos ocultam suas marcas em patrocínios de eventos do "funk" para dar uma falsa impressão de "cultura independente" - , veículos como a Rede Globo de Televisão e a Folha de São Paulo e políticos como Fernando Henrique Cardoso, o "funk" tenta promover uma falsa imagem de "movimento progressista", como se fosse a "cultura popular do futuro".

Não é. Mas como no Brasil tudo é confuso e contraditório, como o próprio "espiritismo" que se acha "futurista" a ponto de querer dar palpites sobre o destino do país nas próximas décadas, o próprio "funk" é reflexo dessa mania do Brasil ser ao mesmo tempo retrógrado e falsamente moderno, a ser conservador e arrumar desculpas para isto ou aquilo.

Por isso é até compreensível que estudantes de uma escola de Curitiba, reduto da tendenciosa Operação Lava-Jato que persegue o PT mas poupa o PSDB, tenham feito um "funk" citando Karl Marx, num mal-explicado tom de paródia. Será que era para "sacanear" o pensador alemão? E isso na cidade onde vive o juiz Sérgio Moro, amigo do PSDB e na prática um astro da Rede Globo?

Movido por uma mania de coitadismo (ato de posar de vítima) e triunfalismo (arrogância de se sentir vitorioso sofrendo derrotas) o "funk", usando uma falsa imagem de "esquerdismo" através das desculpas dadas pelo funqueiro MC Leonardo, expressa um preocupante arrivismo que só consegue causar problemas para as classes pobres, sob diversos aspectos.

As classes pobres já se tornam, com o "funk", reféns de seus estereótipos, manobradas a tanto defender a permanência de uma simbologia que faz apologia à pobreza, à ignorância, aos instintos agressivos e aos valores retrógrados (como o machismo e a violência), o que, em outras palavras, significa abordar as classes populares da maneira mais caricatural possível.

O "funk" nunca foi um movimento cultural e, durante muitos anos, seus críticos apontam um rigor estético tão ferrenho que era proibido um MC tocar um instrumento musical ou compor melodias diferenciadas. O "funk", tido como "cultura riquíssima", teve um mesmo som, fosse o intérprete que for, durante 15 anos e as únicas mudanças ocorridas foram tendenciosas e inexpressivas.

Mesmo assim, as mudanças não impedem a mesmice. Batidas eletrônicas que simulam batuques de umbanda ("tamborzão") ou efeitos sonoros de galope de cavalo e sirenes ou de um MC balbuciando acabam criando uma nova mesmice, como se nota nos celulares tocados por estudantes pobres, em que a base sonora de diferentes MCs, homens ou mulheres, é rigorosamente a mesma.

Há denúncias de que o "funk" simboliza a "terceirização" da música brasileira, com a hierarquização entre o DJ, o "cérebro" do ritmo, e o MC, o porta-voz. E também denúncias de um conservadorismo nunca assumido, como um falso feminismo que faz as MCs nunca fugirem dos paradigmas machistas, simbolizando até o que muitos definem ser um "machismo sem macho", uma misandria implícita.

O "funk" faz um malabarismo para tentar explicar, em vão, suas contradições. Não consegue, por exemplo, esclarecer por que posa de "esquerdista" e depois vai para a Globo comemorar conquistas na opinião pública. Primeiro tenta influenciar intelectuais de esquerda e forçar o seu apoio (baseado em uma abordagem espetacularizada da favela e do povo pobre), depois é foco de eventos promovidos por socialites ou sob promoção de entidades como a própria Rede Globo.

O Brasil não tem o hábito de discutir a questão da "mercadoria" como paradigma de fenômenos aparentemente culturais, a supremacia do mercado ditando regras na cultura popular. Muito dessa omissão, que priva o país de terem equivalentes exatos a intelectuais europeus que questionam a espetacularização da pobreza, a idiotização do público e a mercantilização da arte, se deve aos interesses econômicos envolvidos na "cultura de massa" num país ainda subdesenvolvido.

E é isso que permite que o "funk" diga e faça uma coisa e depois outra. Trabalha o discurso como uma massa de modelar e isso é muito perigoso. Afinal, isso denota falta de sinceridade e coerência, e o que é coerência para uma sociedade que, nos últimos tempos, pensa com o umbigo?

Além disso, o "funk" só complicou sua situação quando o ritmo deixou de ficar quieto, como um pop dançante e estritamente comercial, obcecado com sua imagem de "cultura séria" e "movimento ativista", criando um "papo-cabeça" cheio de desculpas e de muito vitimismo, caindo em contradições o tempo inteiro, com seu desespero de ser mais do que realmente é.

E isso se torna perigoso, sobretudo numa crise cultural em que a MPB e o Rock Brasil soam velhos e se perdem em tributos intermináveis, que só celebram velhos sucessos num eterno saudosismo, e o que temos de "música popular" não passa de péssimas mercadorias musicais forjadas pelas empresas de entretenimento (já acusadas de esquemas de corrupção pela "máfia dos shows" e pela apropriação abusiva de verbas da Lei Rouanet).

Diante dessa crise, não será o "funk" a luz no fim desse túnel. Pelo contrário, a péssima qualidade sonora do ritmo e suas "tardias melhoras" que nada melhoram, já que mesmo com MCs tocando percussão ou havendo inserção de gaita e até violoncelo (como no "Baile de Favela", de MC João), tudo soa postiço, tendencioso e os resultados não são dos melhores.

Símbolo da mediocridade cultural convertida num pretensiosismo desesperado, o "funk" só reflete um país estranho como o Brasil, preso em zonas de conforto e em paradigmas viciados, nos quais a coerência, a lógica, a ética e outros princípios mais realistas são jogados fora, só falsamente valorizados através das desculpas que muitos usam para fazer prevalecer suas causas particulares.

sábado, 16 de julho de 2016

A crise da hierarquia no Brasil é grave


O pior da crise brasileira não é a questão econômica. É a questão da hierarquia. A obsessão de uma parcela de brasileiros para que se retomem os padrões de sociedade controlada de 1974, dentro de valores patriarcalistas, patrimonialistas, economicistas, tecnicistas e outros, fez com que tivéssemos chegado ao confuso governo de Michel Temer.

A crise das hierarquias mostra o quanto o grande erro do Brasil foi sempre maquiar valores antiquados com o verniz de novidade, ou assimilar novidades que são deturpadas para garantir velhos procedimentos. O velho Brasil tenta dar seu rugido de leão ferido, querendo retroceder a humanidade na marra.

A falta de autocrítica e de vigilância dos privilegiados mostra o quanto quem está em algum nível alto de hierarquia social se incomoda quando contrariado. As transformações da humanidade nos últimos tempos revoltam a "boa sociedade" que, no seu mais recente e explosivo surto, querem agora um retorno ao Brasil da Era Geisel, quando o povo brasileiro estava, segundo a ótica conservadora, num "nível ideal".

As pessoas sempre evocaram valores de 1974 como "ideais". Nunca assumiram que o período que se dava entre o fim da Era Médici e o começo da Era Geisel como "anos dourados", da mesma forma que nunca declararam oficialmente que o "ideal" para o Brasil é uma combinação de "milagre brasileiro" com a "distensão geiseliana".

Mesmo a resistência machista sob diversos aspectos, como as ocorrências de estupros e feminicídios e, no lado lúdico, na prevalência de "mulheres-objetos", ganha um tempero ainda surreal quando até a imprensa tem medo de se preparar para Doca Street e Pimenta Neves morrerem, mesmo quando eles já estão muito velhos e com indícios de doenças graves causadas por antigos maltratos à saúde.

Só isso já indica o aspecto surreal da sociedade ainda marcada por valores patriarcalistas, que filtrava o feminismo recomendando que mulheres inteligentes tenham que estar necessariamente casadas e a solteirice só é recomendável para mulheres que só pensam em sexo e curtição. Se o Brasil ainda continua sendo desesperadamente machista, então a coisa está muito séria.

Projetos obscurantistas como o Escola Sem Partido, criada pelo advogado Miguel Najib em 2004, que pretendem censurar o trabalho dos professores e filtrar o projeto pedagógico para não afetar os preconceitos e fantasias religiosos, raciais e sociais da "boa sociedade", estão prestes a crescer em todo o país.

Tudo isso reflete um medo de quem "está em cima" de perder seus privilégios, seus totens, seus dogmas, e explicar todo esse colapso para as novas gerações? Como explicar, por exemplo, que homens que assassinam suas próprias esposas ou namoradas podem também morrer de câncer, de acidente de carro, de infarto ou baleado por um assaltante?

O Brasil tornou-se uma aberração porque acumulou aspectos retrógrados na sociedade. Sempre se filtrou novos valores com procedimentos velhos, como se passasse um verniz novo em madeira podre para fazê-la parecer madeira de lei.

Até mesmo nas famílias muitos pais não admitem ser questionados pelos filhos, mesmo diante de críticas construtivas. E os empregadores não conseguem mais esconder seus preconceitos sociais e seu alarmismo arrivista quando deixam de contratar empregados com talento comprovadamente diferenciado e expressivo.

Isso tudo ainda é acrescido pelo poder abusivo das empresas estrangeiras instaladas no Brasil, que investem pouco no país mas faturam de maneira exorbitante, com a habitual transferência de dinheiro faturado para suas sedes no exterior. E os brasileiros, tão tolamente, são forçados pela Rede Globo a acreditar que esse dinheiro todo foi roubado pelo PT!

Há gente rica demais e há gente ao mesmo tempo privilegiada e irresponsável. Ver um apresentador como Luciano Huck cometer gafes diversas, aparecendo até com "cigarrinho suspeito", conforme denunciou a jornalista Fabíola Reipert certa vez, passar incólume a tudo isso é muito assustador. Fora o amigo de Huck, o senador Aécio Neves, que cometeu um grave esquema de corrupção e sua impunidade tem até o apoio da grande mídia, que agora o esconde nos noticiários.

Se empresas estrangeiras e uma pequeníssima minoria de brasileiros detiveram a maior parte da renda produzida no Brasil, então a situação é grave. Mas o mais preocupante é que os brasileiros, em vez de verificar e reavaliar a realidade vivida, quer buscar velhas soluções, comprovadamente sem eficiência, para a crise nacional.

Seja consultando textos bíblicos vindos de péssimas traduções medievais, seja recorrendo a "remédios" como o golpe político, agora não mais praticado pelas Forças Armadas, mas pela atuação corrompida de setores do Poder Judiciário e do Ministério Público, o Brasil demonstra um medo descomunal de reestruturar valores e posições sociais há muito consolidados mas hoje em sentido cada vez mais perecido.

Forçam a barra querendo voltar a 1974 na marra, seja pela herança que o deputado afastado Eduardo Cunha já deixou adiantada para o governo Michel Temer (boa parte de seu projeto político é resultante das "pautas-bombas" do então presidente da Câmara dos Deputados), seja por movimentos obscurantistas como o Escola Sem Partido, seja o crescimento das seitas evangélicas, representadas no Poder Legislativo pela "bancada da Bíblia" e seus preconceitos sociais estarrecedores.

E é isso que uma parcela de brasileiros deseja para evitar que se reestruturem relações hierárquicas, resultando em toda sina de desordens e retrocessos, que já provam o quanto esses defensores da "ordem e progresso" querem para o país: um Brasil para poucos, para os detentores de privilégios, para garantir a concentração de terra, de renda, de poder decisório para pessoas que só pensam em si mesmas, deixando a maioria dos brasileiros à deriva nos seus infortúnios do dia a dia.

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Os "espíritas" foram apoiar o ódio e a revolta

JANAÍNA PASCHOAL E MARCELLO REIS - Ódio e revolta a uma presidenta que queria melhorar o Brasil.

Tentando aliar um profetismo exageradamente otimista e uma visão política pedante, o "movimento espírita" caiu em grave contradição quando foi elogiar as manifestações do 13 de Março, classificando as passeatas ocorridas na referente data, neste ano, como sinais de "regeneração" da humanidade.

A religião que sempre apela contra o ódio e a revolta foi justamente exaltar movimentos que surgiram dos piores exemplos de ódio e revolta que se observa nas mídias sociais da Internet e em setores reacionários da política, da imprensa e do Poder Judiciário.

O "histórico" 13 de Março, no qual manifestantes pediam até a volta da ditadura militar, foi exaltado pela suposta indignação contra a corrupção política. E, do contrário das manifestações de 2013, foi um evento puramente partidarizado, financiado por corruptos bem piores do que o que se atribui aos ditos "petralhas", nome pejorativo dado aos petistas (pessoas ligadas de alguma forma ao Partido dos Trabalhadores).

Denúncias recentes, reveladas por gravações trazidas por delatores da Operação Lava-Jato, como Sérgio Machado, ex-senador do DEM e ex-presidente da Transpetro, mostram que os organizadores de tais passeatas, como o Movimento Brasil Livre e o Revoltados On Line, foram financiados por partidos como o PSDB, PMDB e DEM.

O financiamento envolveu não apenas pagamento em dinheiro, como remuneração a esse falso ativismo. Ele se deu também pelo fornecimento de serviços gráficos, produção de camisetas, pagamento de lanches e almoços e aluguel de ônibus de excursão. Instituições como a FIESP e empresas estrangeiras instaladas no Brasil também teriam financiado os movimentos.

Isso é estarrecedor. Além do mais, se observarmos bem, todos esses protestos surgiram de campanhas de ódio vindas da imprensa reacionária, como a revista Veja que, recentemente, deu capa ao "médium" João Teixeira de Faria, o João de Deus, que tem como principal colunista o truculento Reinaldo Azevedo, e refletiu nas mídias sociais.

Troleiros, cyberbullies, fascistas digitais, "midiotas" e outros desordeiros, que espalhavam de comentários racistas a defesas de arbitrariedades políticas ou modismos de mídia, eram os mais entusiasmados manifestantes dessa campanha que fazia de Lula e Dilma Rousseff as únicas pessoas que uma boa parcela da sociedade se achava sob o direito de caluniar e difamar sem piedade.

Personalidades como Marcello Reis - do Revoltados On Line - e a juíza Janaína Paschoal mostram o quanto o "espírito do 13 de Março" é carregado de muito rancor. E logo o "espiritismo", que tanto reprova o ódio e a revolta, definindo como "regeneração" e "libertação" uma série de passeatas cujo um dos patrocinadores tem o nome de "revoltados".

Além do mais, toda essa campanha "vitoriosa" resultou num governo marcado por sucessivos escândalos de corrupção, incidentes que não eram apenas constantes, mas muitíssimo graves. Ver que o presidente interino, Michel Temer, é ele mesmo um condenado político, proibido de concorrer a um cargo eletivo por oito anos, devido a um crime eleitoral (doou mais do que devia numa campanha em 2014) é muito preocupante.

REGENERAÇÃO? ORGANIZADORES DAS PASSEATAS DO 13 DE MARÇO POSANDO AO LADO DE EDUARDO CUNHA E JAIR BOLSONARO.

Hoje o Brasil está desgovernado. Recentemente, vieram propostas das mais reacionárias, que praticamente deixariam os brasileiros em um padrão profissional anterior ao da Lei Áurea. E logo o "espiritismo", que superestima a Abolição, apoiar movimentos que resultaram num governo que quer retomar padrões escravocratas do mercado de trabalho.

Imagine: o cidadão ganhando menos salário, perdendo encargos e garantias sociais - não terá mais assistência médica gratuita no caso de sofrer um acidente de trabalho - , tendo uma carga horária semanal de 80 horas e se aposentando apenas aos 75 anos de idade, quando sabemos que, nas classes populares, a pessoa já fica velha e doente com 55 anos.

Foi isso que o governo Michel Temer cogitou fazer dias atrás. E as pessoas, tranquilas com esse "governo de salvação nacional", não sabem a catástrofe que ele representa. E os "espíritas", apoiando direta ou indiretamente esse cenário, caíram em suas próprias contradições, mais uma vez com atos que deixariam Allan Kardec profundamente envergonhado.

O "espiritismo", ao apoiar os movimentos do 13 de Março, portanto, provou ter cometido duas graves contradições, que praticamente desmoralizam a doutrina brasileira:

1) Condenando o ódio e a revolta, o "espiritismo" definiu como "libertadoras" e "regeneradoras" passeatas e manifestações movidas pelo ódio e pela revolta, das quais muitos pediam não só a volta à ditadura militar mas, se preciso, morte a Lula e Dilma Rousseff. Além disso, um dos organizadores do "memorável" 13 de Março é uma instituição com o nome de Revoltados On Line.

2) Superestimando a Lei Áurea, ignorando que a Abolição assinada pela Princesa Isabel não conseguiu resolver os problemas dos escravos libertos, os "espíritas" também se contradisseram quando foram exaltar o 13 de Março definindo-o como "libertador", mas abrindo o caminho para o governo de Michel Temer que propôs medidas para retroceder o mercado de trabalho justamente aos padrões escravocratas ou, quando muito, para os primórdios desumanos da Revolução Industrial.

DONOS DA REDE GLOBO, PROPAGANDISTA DO 13 DE MARÇO, MANTÉM PROPRIEDADE ILEGAL EM PARATI.

Há também o aspecto da desinformação, como o fato de que o evento "libertador" do 13 de Março abriu caminho para votações e processos jurídicos marcados pela corrupção. As manifestações do 13 de Março, supostamente "contra a corrupção", além de ter aberto o caminho para gente muito mais corrupta (na política, na mídia, no Judiciário) também não poderiam ser de conscientização política, porque os mais conceituados analistas políticos afirmam que é um ato de "analfabetos políticos".

É bom deixar claro que a maior rede de televisão que fez propaganda para o 13 de Março, a Rede Globo, que os "espíritas" conhecem pelo carinho que ela trata figuras igrejeiras como Chico Xavier e Divaldo Franco, é de uma empresa que sonega impostos e cujos donos, além de acusados de abocanharem boa parte da grana do Criança Esperança, ainda recebem verbas públicas e, multimilionários, figuram na lista da Forbes entre os mais ricos do Brasil.

Os empresários João Roberto, José Roberto e Roberto Irineu, filhos do falecido Roberto Marinho, ainda estão associados a um triplex em Parati, no Sul fluminense, uma propriedade construída ilegalmente, sem alvará, e sobre um terreno que deveria ser de proteção ambiental, onde deveria ter sido proibida a construção de determinada residência.

Mesmo a suposta imparcialidade do juiz midiático Sérgio Moro - com uma aparência que lembra um Superman hollywoodiano - , típico herói de novela da Globo, se demonstra uma farsa, diante do fato de que o juiz paranaense só se dispõe a prender e investigar políticos do PT, enquanto finge que vai investigar políticos do PSDB e PMDB, neste caso criando desculpas para eventuais vacilações.

Além disso, as "iluminadas" manifestações tiveram como efeitos uma votação patética na Câmara dos Deputados, em 17 de abril, cujo presidente, em menos de três meses depois, renunciou ao cargo diante de tantas denúncias graves de corrupção e até acusações de violentas chantagens.

Sim, se está falando de Eduardo Cunha, um dos ídolos dos organizadores das passeatas de 13 de março de 2016, uma das figuras mais traiçoeiras e ameaçadoras da política brasileira dos últimos tempos. Ele apareceu certa vez recebendo o apoio de membros do Movimento Brasil Livre e Revoltados On Line, responsáveis pelas "memoráveis" manifestações de 13 de março.

É como, usando jargões "espíritas", as "crianças-índigo" se reunissem com um "espírito trevoso" para celebrar uma causa em comum. Aliás, dois "espíritos trevosos", uma vez que, na memorável reunião dos "pais" do 13 de Março, Movimento Brasil Livre e Revoltados On Line, estava não só Eduardo Cunha, mas o líder neo-fascista Jair Bolsonaro, famoso pela homofobia e pela apologia ao estupro e à tortura ditatorial.

O 13 de Março não pode ser considerado um momento de despertar político, porque o desconhecimento da História, o reacionarismo político extremo e os preconceitos morais e sociais existentes revelam, na verdade, uma série de passeatas de "analfabetos políticos", que permitiu tanto a mudança de governo para um cenário calamitoso como o de Michel Temer e companhia, que agora ninguém faz o mesmo contra esta situação.

O "espiritismo" errou mais uma vez, e mais uma vez caiu em uma situação insustentável, exaltando um cenário de profundo reacionarismo político como se fosse o "início de uma época de regeneração" da humanidade. Deu um tiro no pé.

terça-feira, 12 de julho de 2016

Livro "espírita" supõe explicar a crise vivida no Brasil


Que o "espiritismo" brasileiro é sensacionalista, isto é a mais pura verdade, embora muita gente se recuse a admitir isso. Mas a coisa sucumbiu a atitudes ainda mais absurdas, sobretudo num tempo em que o Brasil ameaça se tornar uma teocracia, com a divulgação do traiçoeiro projeto Escola Sem Partido.

Robson Pinheiro, que teve que interromper o andamento de um livro, 2080, por causa do "urgente" lançamento de O Partido: Um Projeto Criminoso de Poder, atribuído ao "espírito Ângelo Inácio", "parceiro" das obras do badalado autor.

A história parece uma ficção fantasiosa: "espíritos do mal" são responsáveis de manipular tudo e todos para o erro, e aqui a força dos espíritos inferiores é superestimada, como se os espíritos encarnados não tivessem vontade própria ou, se tem, são muito mais frágeis do que normalmente se esperaria delas.

Um dos trechos do livro cita a instrução de um espírito trevoso considerado de "alta hierarquia":

"Entre os encarnados, a técnica para dominá-los sem que o saibam consistirá em falar aquilo que eles querem ouvir, dando-lhes apenas migalhas, porém, prometendo sempre mais... A verdade não importa! Gravem bem em sua memória: é a mentira que querem ouvir. Portanto, mintam! Mintam com convicção e descaradamente, mas sem perderem o ar piedoso e a aura de virtude... Acusem os inimigos de tudo o que fazemos e negamos peremptoriamente. Sejam impiedosos que eles se vergarão à humilhação pública... Nossas técnicas de persuasão em massa continuam as mesmas: pressionar, intimidar, difamar, aniquilar a imagem e a reputação de nossos opositores perante toda a gente... eis o cerne da nossa estratégia de guerrilha: negar sempre, não assumir jamais os ardis a que recorremos; tal deve ser a regra observada rigorosamente por nossos comparsas no mundo físico... Nossas marionetes, recrutaremos entre os mais instruídos - pois, como já foi dito, escolas, universidades e imprensa serão alvos prioritários da estratégia traçada - , como também em meio aos que propagam ideias espiritualizantes... Mesmo homens de bem precisam ser enganados; aliás, eles precisam se converter em nossos maiores aliados!... Dominem o que lhes apraz; a nós não interessa este mundo, a não ser sua aniquilação."

Aparentemente, a obra é ideologicamente "imparcial" e Robson Pinheiro ainda apareceu, numa foto de divulgação do livro, no YouTube, usando uma boina e vestindo camisa vermelha. Muitos perguntam se isso é paródia de Ernesto Che Guevara ou alguma gozação ao PT.

ROBSON PINHEIRO DE BOINA E CAMISA VERMELHA: PARODIANDO CHE GUEVARA E O PT?

Tudo parece mesmo uma coisa surreal e fantástica. "Magos negros" formando artilharia contra Brasília, influenciando as pessoas a praticar corrupções e arbitrariedades, além de induzi-las a falar mentiras de todo tipo. Como se fossem feiticeiros tentando dominar crianças!...

O que chama a atenção é o lado "coxinha" de uma passagem do livro, o que indica que, em que pese o "boné Che Guevara" e a "camisa petista" da foto de divulgação, Robson Pinheiro, na verdade, estaria fazendo oposição ao governo Dilma Rousseff, como sugere a interpretação de uma passeata neste trecho:

"As energias colhidas e armazenadas nas manifestações pacíficas ocorridas na Avenida Paulista, no dia 13 de março de 2016, e em outros locais do país foram empregadas pelos guardiões em tarefas últimas junto ao povo brasileiro... Naquele dia memorável, a nave dos guardiões sobrevoou a Avenida Paulista, absorvendo as energias emanadas da multidão e as armazenando em seu bojo para as usarem oportunamente. Torres de captação das irradiações mentais e emocionais foram erguidas pelos especialistas e pelos técnicos do astral... era possível captar e reter emanações que seriam essenciais, mais tarde, para enfrentarem as milícias das sombras aquarteladas no Congresso Nacional."

Isso é constrangedor. Afinal, as referidas passeatas intuídas por "guardiões" (os tais "benfeitores espirituais"), um "dia memorável" de transmissão de "energias elevadas" - termo que não aparece explícito no trecho em questão - , correspondem, na verdade, ao ápice das manifestações anti-PT que haviam ocorrido desde 2015.

MENSAGENS VINGATIVAS, BAIXARIAS, CLAMORES GOLPISTAS E ATÉ EXIBIÇÃO DE UMA SUÁSTICA NAZISTA ESTIVERAM NAS "PACÍFICAS" MANIFESTAÇÕES "CONTRA A CORRUPÇÃO".

O ridículo disso tudo - dentro de uma perspectiva que classifica o parcial juiz Sérgio Moro, um sujeito que se recusa a prender tucanos (PSDB) corruptos com a mesma agilidade (e pressa) que combate o PT, como um "herói" - é que as "maravilhosas manifestações contra a corrupção" eram na verdade uma coleção de incidentes infelizes.

É necessário lembrar também que esses protestos anti-PT, que Robson Pinheiro descreve como se fossem "vibrações positivas" da população, o que pressupõe um manifesto coletivo de solidariedade e união, foram na verdade manifestações de puro ódio e rancor.

As fotos não deixam mentir. Uma senhora segurando um cartaz dizendo "Por que não mataram todos em 1964?" é de um rancor vingativo descomunal. Manifestantes mostrando os traseiros para o governo Dilma Rousseff e mensagens pedindo intervenção militar para o país (espécie de eufemismo para golpe militar, como era a palavra "revolução" há 42 anos) também foram notados.

Mas o pior disso tudo é que, em algumas dessas manifestações, chegou-se a exibir uma suástica nazista, o que é uma atitude das mais deploráveis, por razões óbvias. Como é que Robson irá atribuir, a esses protestos culminados no 13 de março de 2016, uma "vibração positiva" diante de eventos tão lamentáveis, só para usar uma definição mais "educada"?

O livro O Partido também peca pelo maniqueísmo fácil existente entre políticos e povo. Os políticos seriam a "podridão" do país, o povo a massa sedenta por "bondade e fraternidade". Tudo muito simplório, ignorando que a vida é muito mais complexa e que aquele "memorável treze de março" era na verdade uma podridão muito pior do que erroneamente se atribui ao PT em supostas denúncias que mais parecem rumores e boatos confusos e muito mal explicados.

E todos esses processos "contra a corrupção" deram origem a um governo mais corrupto ainda. E isso é terrível. Afinal, o país na verdade vive uma crise de valores e o que se está em jogo hoje é a plutocracia e outras elites associadas (patriarcado, oligarquias, tecnocracia, aristocracia, empresariado etc) que tentam fazer o Brasil voltar aos padrões de uma sociedade castrada de 1974.

Chama a atenção também o nome de um espírito "representante máximo da justiça divina": Miguel. O nome é uma variante de Michel, nome do presidente interino que está associado a forças muito mais corruptas do que aquelas que supostamente cercaram a presidenta afastada.

Robson Pinheiro também comete a asneira de comparar, no sentido positivo, o 13 de maio de 1888 e o 13 de março de 2016. Se os dois fatos são comparáveis, isso se dá pelo lado negativo: fatos que geraram crises profundas. Não que a escravidão não devesse ser abolida, mas da forma como foi feita, com o Brasil levando mais de seis décadas para eliminar esse triste método de exploração humana, deixou os negros à deriva.

A única coisa realmente comparável que aconteceu foi que, enquanto, em 1888, a plutocracia da época, como os senhores de engenho e os emergentes senhores do café, decidiram derrubar o Império, forçando o afastamento do imperador Dom Pedro II (que saiu do país de forma melancólica), a plutocracia de hoje decidiu mandar afastar a presidenta Dilma Rousseff, em processos de votação de uma maioria de corruptos clamando por este afastamento.

E todos eles clamando "pela Família cristã", o que poderia tranquilizar os "espíritas". Estes falam no impeachment como uma "libertação", quando na verdade vemos o Brasil desgovernado e prisioneiro de seus paradigmas mais antigos.

As pessoas querem retroceder em uma versão mais radical de 1974, com mais machismo, mais mistificação, mais racismo, mais capitalismo, mais escravidão moderna (algo que foi praticado até por uma editora "espírita"), mais poder midiático, para atender aos interesses de pessoas dotadas de maior status social, seja ele político, econômico, acadêmico, lúdico (famosos), tecnocrático e até religioso.

Robson Pinheiro cita Francisco Cândido Xavier indiretamente, descrevendo a "missão" do Brasil em ser "coração do mundo e pátria do Evangelho". Com esse livro "coxinha", Robson condiz com a postura reacionária do "movimento espírita" (do qual ele se envolve de maneira "independente", sem ter vínculo formal à FEB), que defendeu o golpe de 1964 e, em 1971, mostrou Chico Xavier defendendo abertamente a ditadura militar na TV, quando ela estava em sua fase mais cruel.

Diante disso, só se pode esperar de O Partido uma obra reacionária e fantasiosa, cheia de preconceitos moralistas religiosos e uma confusa e maniqueísta abordagem da vida política nacional. Mais uma obra lamentável de uma longuíssima antologia de lamentáveis obras "espíritas".

domingo, 10 de julho de 2016

O confuso otimismo do "movimento espírita"

DESDE QUE VOCÊ ACEITE OS ARBÍTRIOS DE SEU SUPERIOR, ESTÁ "TUDO BEM".

Diante da intensa crise que assola o Brasil, junto a ocorrências caóticas que atingem o mundo, como o recente atentado a uma boate gay na Flórida, EUA, o "movimento espírita" brasileiro parece ter sangue de barata e ficar falando em "amor" e "otimismo".

É um otimismo confuso, que tem o descaramento de recorrer a Allan Kardec, já que o que temos é a postura dúbia que insiste em persistir diante da Doutrina Espírita. Roustanguistas enrustidos, bajulando Allan Kardec e seguindo Chico Xavier e Divaldo Franco, misturando igrejismo com cientificismo, praticamente promovendo a "confraternização do joio com o trigo".

Sim, é o "convívio fraterno" do joio e do trigo, do alho com o bugalho e da árvore com a erva daninha que norteia o "espiritismo" brasileiro que põe na conta de Allan Kardec meias-verdades ou ideias mal-interpretadas que o pedagogo francês não defenderia exatamente, embora aparentemente ela venha de livros seus, mas em traduções igrejeiras (como das editoras FEB e IDE).

A prece é apenas uma "porta de emergência" para perigos e dificuldades de última instância. Nem de longe ela deve ser encarada como solução definitiva para as crises humanas. Quando muito, serve apenas para ajudar as pessoas quando os impasses são pesados demais e as ameaças extremamente perigosas e iminentes.

O ato de orar uma prece, portanto, não é um brinquedo a ser feito pelo conforto da fé religiosa, e a realidade mostra que nem sempre ela é eficaz diante de situações bastante complexas, que exigem uma postura mais combativa e não uma aparente misericórdia que soa mais consentimento e conformismo.

Por exemplo, temos um governo composto de gente corrupta, que é o do presidente interino Michel Temer. No seu círculo político de apoio, tivemos pessoas claramente associadas à roubalheira administrativa, como Eduardo Cunha, Aécio Neves (considerado "chato" por cobrar grandes valores em propinas) e até mesmo Jair Bolsonaro.

Seria suficiente apenas recorrermos à prece para pedirmos a esses políticos "pensarem pela humanidade" e "terem um pouco de misericórdia e amor ao próximo"? Será que boas energias da prece bastam para mudar as circunstâncias e transformar políticos indiferentes ao povo em serviçais quase perfeitos da humanidade?

A vida é tão complexa que, em muitos casos, a misericórdia significa "entregar o ouro a bandido" e a prece um recurso inútil para resolver problemas. Isso é desagradável, mas é verdade. Como, por exemplo, num concurso público em que a prece pela aprovação, mesmo diante de sacrifícios de estudo sobrecarregado, não consegue atingir a meta desejada.

Neste caso, fatores diversos como o programa de provas opressivo - como de organizadoras como CESPE - , possíveis fraudes (em muitos concursos, o gabarito chega a ser propositalmente errado em uma média de cinco questões), exigências desnecessárias (como um concurso para Técnico em Comunicação que exige Matemática) e até mesmo fatos da vida particular do candidato complicam a conquista da meta almejada.

Fala-se sobretudo dos equívocos de expressões tão exaltadas pelo "movimento espírita", como "aceitação", "perdão", "abnegação", "desapego" e outras coisas parecidas. Que se espera pedir desapego a uma religião que prega o apego desesperado e fanático a Chico Xavier?

É certo que temos que parar de buscar privilégios, ceder em desejos que se revelam desnecessários. Só que nessa confusa religião "espírita", as pessoas têm que ceder no que elas precisam enquanto se resignam em ter aquilo que soa mais luxuoso e materialista do que o luxo e o materialismo que os "espíritas" dizem condenar.

"MODERAR" DESEJOS OU DEGRADAR A VIDA?

Por exemplo. Um nerd deseja namorar uma mulher do perfil de Emma Watson, que além de sua beleza deslumbrante demonstra ser bastante culta e interessante para conversar. O nerd a valoriza pelo caráter que ela demonstra e parece bastante real, mas as circunstâncias o impedem até de ter uma equivalente, mesmo fora do meio das celebridades, no seu cotidiano de brasileiro comum.

Para o "espiritismo", desejar Emma Watson é "querer luxo e luxúria", "desejar demais", "apelar para o sensualismo (sic)". Por outro lado, o nerd costuma atrair o assédio das chamadas "periguetes" (mulheres grotescas que se oferecem como brinquedos sexuais).

No entanto, o moralismo "espírita" descreve as "periguetes" como "modestas", vendo apenas a origem "humilde" de várias delas. Segundo essa visão, o fato do nerd atrai-las para a vida amorosa é uma "oportunidade para superar diferenças" e "aprender a simplicidade (sic)" do "amor sem extravagâncias" e da "moderação (?!) dos desejos impulsivos".

Quer dizer, a classuda Emma Watson, até pelo fato de ter sido atriz de uma franquia de estórias de fantasia, por ter uma formação refinada e mostrar sua inteligência em entrevistas, representa, para os "espíritas", um "sensualismo muito perigoso". Já a periguete do "pagodão" ou do "funk", que vive de mostrar o corpo e trata o sexo como mercadoria, representa a "simplicidade" e a "moderação dos desejos".

"Moderação dos desejos" é eufemismo para a pessoa abrir mão de seus próprios interesses e encarar a vida conforme os "desígnios do Alto (Deus)". O "espiritismo" costuma criminalizar a vontade humana e o que prega é que a pessoa abra mão de sua vontade e de suas habilidades e viva uma experiência "qualquer nota". "Querer" é o pecado; "se virar" é um dever.

Mas será que essa "moderação de desejos" não pode forçar a pessoa a ser autoritária? Quantos homens se tornam machistas e mandões quando se casam com moças que não são de suas afinidades? Quantas mulheres se tornam exigentes demais com aqueles com as quais elas não se identificam?

Do mesmo modo, quantas são as ambições humanas quando as limitações se tornam pesadas demais? Quanta ganância se forma diante da miséria irresolúvel? Quantos desvios morais podem haver com os infortúnios pesados? Quantos assaltantes surgem na sombra do desemprego inevitável e quantos corruptos nascem diante da execução de um trabalho alheio aos talentos pessoais de cada um?

Que otimismo é esse dos "espíritas"? É o teatrinho fácil da "bondade" em que os algozes são tolerados em seus abusos, os sofredores aguentam desgraças sem reclamar e, no meio, os "filantropos" aparecem sob a sombra da religião para sorrirem para os dois lados, e juntos os três tipos morais (algoz, filantropo e sofredor) se dão as mãos para cantarem hinos de louvor a Deus.

Fácil aceitar os abusos dos algozes e imaginar que "ele terá o que merece" depois, mesmo que seja para daqui a cem anos, em outra encarnação. Da mesma forma que é fácil aceitar desgraças visando umas tais "bênçãos futuras" que não passam de uma bobagem que ninguém é capaz de definir. Sob a religião, pode-se ser "fraterno" e aceitar que o egoísmo dos outros ocorra de maneira impune, agravando as injustiças sociais.

Perdido, o "espiritismo" já não sabe mais o que é Doutrina Espírita, o que é filantropia etc. Confuso, o "espiritismo" é vítima de suas próprias contradições, e desconhece a crise que vive o próprio país. O "espiritismo" quer mostrar bom-mocismo, mas o que traz é tão somente um igrejismo pretensamente conciliador que não acompanha a natureza complexa da sociedade em que vivemos.

sexta-feira, 8 de julho de 2016

O mal dos "de cima" é querer demais


Um dos maiores problemas do discurso religioso é a relação do "eu" e do "outro". Sobretudo quando o caso é a Teologia do Sofrimento. No discurso religioso, apela-se para o "eu" abrir mão de desejos, e, se for o caso, das necessidades e até dos talentos, para "vencer na vida", aguentando desgraças sucessivas em tempo indeterminado e ainda sendo induzido a ser alegre e perdoar carrascos e algozes.

Isso é fácil, afinal, o "eu" na verdade não somos nós que sofremos e temos que abrir mão até do que precisamos para sobrevivermos com o mínimo do mínimo do mínimo de qualidade de vida. O que esquecemos é que nós somos o "outro" do discurso religioso, pois quem apela para abrirmos mão de nossos desejos é justamente quem quer demais na vida.

O governo Michel Temer mostra que o Brasil sofre a mais grave das crises: crise de hierarquia. Pessoas mais ricas, mais velhas, com formação acadêmica, poder político, econômico e midiático, alta visibilidade e outras formas de prestígio e privilégio, estão cada vez mais mostrando sua decadência e tornando-se impotentes para mostrar algum bom exemplo para a sociedade.

O próprio Michel Temer, que personifica um senhor de idade (o que supõe experiência de vida), advogado que escreveu livros e foi professor universitário (o que supõe conhecimento de leis e obtenção de sabedoria), aparentemente elegante e de fala articulada (o que supõe bons modos), e é presidente da República (em tese responsável por uma nação inteira), está envolvido em graves escândalos de corrupção e se mostra um político incompetente de ideias retrógradas.

As pessoas dotadas de algum nível superior na hierarquia é que acabam cometendo os excessos. O apego a valores retrógrados, a exigência excessiva ao outro, a supremacia das convicções pessoais e do dogmatismo religioso e moralista sobre a realidade, tudo isso encontra-se numa séria crise, mesmo quando existem esforços homéricos para salvá-los ou recuperá-los.

A sociedade pós-moderna está em colapso. Pessoas desesperadas querendo salvar valores já obsoletos e estruturas hierárquicas em crise, plutocracias, teocracias e até tiranias sendo propostas ou instauradas na marra, às vezes sacrificando vidas, impondo-se como uma suposta urgência e atropelando qualquer contexto de evolução da humanidade.

Mas mesmo nas situações do cotidiano, valores considerados "sagrados" da hierarquia política, religiosa, sócio-econômica, étnica etc são postos em xeque, e até por xeque-mate, desde o fato de pais exigirem demais para os filhos até concursos públicos que exigem demais dos candidatos que têm que estudar dois meses para um programa de estudo que só dá para ser bem compreendido e bem estudado em quatro.

Os concursos públicos que exigem Matemática até em cargos que não aplicam essa matéria, ou o mercado de trabalho que exige mais frescuras do que talentos, como o aberrante clichê de pedir trabalhadores com menos idade e maior experiência possível.

Diante disso, há também um considerável número de "coroas" e "idosos" dotados de muito status e algum poder de influência que cometem erros graves na vida, praticam de gafes a crimes hediondos, derrubando a ilusão de que a sabedoria cresce com o descolorir dos cabelos.

Gente idosa ou quase idosa extremamente confusa, sem poder ensinar coisa alguma, diante de uma realidade instável. Parece cruel dizer isso, mas, paciência: jovens durante a ditadura militar, eles não tiveram uma formação humanista adequada dentro de uma época em que valores retrógrados eram impostos como dogmas absolutos, e contrariar a eles era risco de cadeia ou morte.

O "espiritismo" também está dentro desse cenário de "querer demais" e "exigir demais" dos outros. No discurso religioso, sabemos que o "eu" que simbolizamos nos conselhos de "desejar o menos possível", "abrir mão até do necessário", "aceitar o sofrimento, sorrir e desejar boa sorte aos carrascos" é, na verdade, o "outro" de quem transmite esse discurso.

Afinal, não é o "líder espírita" que vê seus filhos morrerem em acidente de carro ou doenças graves vindas do nada, que no trabalho é hostilizado por um chefe tirânico, que quando se esforça para conquistar uma meta encontra obstáculos insuperáveis e põe tudo a perder e só vê desgraças se amontoando na sua trajetória.

O "líder espírita" é feliz. Pode usurpar um autor falecido em falsa psicografia que nunca será punido por falsidade ideológica ou qualquer infração aos direitos autorais. Isso num país em que um Sérgio Moro vira herói escondendo o ultracorrupto Aécio Neves debaixo do tapete. Isso num país em que o povo dá ouvidos a uma Rede Globo cujos donos são sonegadores fiscais e abocanham até parte da arrecadação do Criança Esperança para suas contas pessoais.

O "líder espírita" recebe medalhas de parlamentares corruptos, e todos acham isso ótimo. Tão "desapegado" à matéria, acumula prêmios na sua extravagância mística de se julgar "sábio" e tido a "tudo responder", mesmo quando sua "sabedoria" seja composta de mofados valores igrejeiros e austeros valores moralistas.

Claro, Francisco Cândido Xavier e Divaldo Pereira Franco são considerados "superiores" em um país que ainda considera a chance de ser governado por um Jair Bolsonaro, e que vê como "imparcial" uma imprensa cada vez mais decadente, tão decadente que apresenta momentos debiloides, como um comentarista como Guilherme Fiúza inventar que o New York Times era patrocinado pelo PT.

É um sintoma dos tempos, a imprensa brasileira publicar mentiras. O edifício das hierarquias e superioridades pega fogo, como no filme Inferno na Torre, e os esforços para se manter tudo isso em pé soam como jatos de água inflamável jogados no fogo intenso.

Ver que no Brasil se tenha que descartar dogmas e totens que prevalecem há pelo menos 40 anos é muito doloroso. Se até ateus e esquerdistas parecem apegados em Chico Xavier e Divaldo Franco, fica difícil tirar esse bolor das paredes valorativas dos brasileiros.

O pessoal está apegado a tudo: ao governo Michel Temer, a Chico Xavier, a Divaldo Franco, ao "funk", à Rede Globo, aos ônibus com pintura padronizada, etc. Chega a ser constrangedor que uma fanática por Chico Xavier tenha recorrido à abusiva "carteirada" para reagir, rispidamente, a uma internauta que contestou os méritos do anti-médium: "Quem é você para falar de Chico Xavier?".

O próprio Chico Xavier que pedia aos outros "não quererem demais" (leia-se não querer o justo e o necessário) acabou querendo demais em sua vida: de um funcionário público relativamente paranormal, atuando como plagiador de livros, transformou-se num monstruoso ídolo religioso, tido tendenciosamente como "cientista", "filósofo" e outras qualidades que ele nunca teve.

Ele acabou tendo um status quo gigantesco, querendo as fortunas simbólicas do misticismo religioso e da superioridade social trazida por essa condição. Pior do que os ricos da Terra, Chico Xavier, como um VIP da religião, queria ser um rico do céu, com pressa em se tornar um aristocrata do além a voar como um querubim ao redor de Deus.

É assustador, porém realista, ver que pessoas que estão "em cima", dizendo para os que estão "embaixo" aceitarem o sofrimento e pararem de querer o necessário, estão vendo o mundo que construíram ideologicamente ruir de forma trágica.

Há uma necessidade de rever valores, e é sobretudo as pessoas que acreditam em plutocracias, teocracias, meritocracias, tecnocracias e outras formas de supremacia social são as que mais são cobradas.

E aqui vale até um "olhe só quem fala": os "espíritas" adoram dizer para os outros não julgarem e nem maldizerem. Mas Chico Xavier julgou, acusando as vítimas do incêndio de um circo de Niterói de terem sido "romanos sanguinários" e chamou o ceticismo justo dos amigos de Jair Presente quanto às irregularidades psicográficas de "bobagem da grossa".

A Dona Queixosa de um conto de Chico Xavier falsamente atribuído a Humberto de Campos deve estar lamentando em som de "tsc, tsc". Chico era mais um a pedir "faça o que eu digo, não faça o que eu faço".

quarta-feira, 6 de julho de 2016

Delinquentes e fascistas da Internet mudam de estratégia


"Xiii... La vem aquele chato!", "Ih, é aquele cara com a mesma conversa!", "Nossa, Fulano está de volta para nos azucrinar!". Os delinquentes e fascistas digitais, vendo a má repercussão das humilhações que eles faziam contra quem discordasse do "estabelecido", agora tentam uma nova estratégia.

Querendo evitar escândalos de cyberbullying, eles agora adotam um discurso sutil feito para enganar as pessoas. A ideia é que os fascistas e desordeiros das redes sociais se passem por "gente normal", enquanto atribuem ao discordante da ocasião uma má reputação, como se o desordeiro digital fosse este e não aqueles.

É o que se nota no Facebook e outros fóruns da Internet. Uma espécie de humilhação pelo avesso. Gente desordeira e encrenqueira agora acusa o discordante e ser "desordeiro e encrenqueiro", como se fosse transferir para outrem os defeitos que as próprias pessoas têm.

Isso é grave porque acaba forjando uma blindagem dos antigos humilhadores. Agora eles não partem para blogues ofensivos, ataques em série, nem em "visitas" na cidade onde vive o desafeto para, pelo menos, intimidá-lo.

Agora a ideia é fazer uma "guerra-fria". Quem defende coisas e ideias de valor duvidoso mas que correspondem ao que pessoas dotadas de muito status - de tecnocratas a famosos, passando por empresários e políticos - decidem ou divulgam, é agora considerado "normal". "Normal" é aquele que por exemplo, cultua as "mulheres-frutas" como o "símbolo maior da mulher brasileira".

Se a pessoa discordar desses valores "estabelecidos", ela não recebe mais aqueles ataques em série, aquelas simulações de chats combinadas por um grupo organizado fazendo ofensas e ameaças. Isso repercutiu tão mal em casos famosos que os desordeiros da Internet resolveram mudar para evitar serem denunciados pela polícia.

Com isso, cria-se um discurso que tenta isolar o discordante. Mensagens combinadas que podem seguir um modelo que exemplificaremos abaixo, ou pode adotar alguma diferença de acordo com o contexto:

DISCORDANTE - Esse modismo não tem o menor sentido. Aquilo não tem pé nem cabeça e acho que isso não vai acrescentar coisa alguma na vida das pessoas. É uma coisa inútil que transforma a pessoa num grande imbecil.

RESPOSTA 1 - Xiii... Lá vem o Discordante com aquele papo.
RESPOSTA 2 - Muito chato, mesmo.
RESPOSTA 3 - KKKKKKKKKKKKK
RESPOSTA 4 - Alguém sabe me dizer em que planeta ele vive?
RESPOSTA 1 - Com certeza, muito chato. Chato de galocha.
RESPOSTA 5 - Até entendo que o modismo não é aquela maravilha, mas dizer que ele não tem valor é um exagero.
RESPOSTA 6 - Deixa as pessoas aderirem ao modismo.

Isso mostra o quanto os desordeiros digitais, muitas vezes, são "cães de guarda" do establishment, mas agora estão mais adestrados. Sabendo que as velhas humilhações podem levar qualquer um para a cadeia, eles tentam maneirar.

Mas eles continuam cruéis neste contexto e a ideia agora é depreciar sutilmente o discordante pelo "isolamento": o discordante agora é que é visto como "anormal", diante da "normalidade" dos desordeiros digitais, que não sabem, no entanto, a ilusão em que vivem.

Fora das redes sociais, intelectuais e jornalistas conceituados começam a questionar o fenômeno dos "midiotas" e dos "fascistas digitais", pessoas dotadas de visões de fora da realidade mas que as defendem por elas fizerem parte do establishment consagrado pela mídia comercial e pelo mercado, baseado em relações de status quo que atribui superioridade a quem decide tudo isso.

Isso quer dizer que a reputação dos "midiotas" e dos "fascistas digitais" - os primeiros apenas "zoam", os segundos já têm uma convicção mais autoritária - não irá melhorar quando eles se passarem pelos "normais da Internet".

Pelo contrário, a nova atitude tem o mesmo objetivo de humilhar, só que bem mais implícito, e os interesses de defender o "estabelecido" são os mesmos. Apenas existe uma dissimulação, para evitar que os desordeiros sejam denunciados e presos.

segunda-feira, 4 de julho de 2016

"Movimento espírita" reassume postura direitista

REVISTA VEJA E O "MÉDIUM" JOÃO DE DEUS - Hostil aos movimentos sociais, é muito generosa com a "bondade espírita".

Alguns fatos relacionados ao "movimento espírita" nos últimos meses chamam a atenção. Três situações que mostram o quanto a doutrina igrejeira brasileira sempre foi conservadora, mas, depois de umas poucas décadas dissimulando sua postura ideológica, passou a reassumir a postura direitista que chegou a professar de maneira mais explícita. Antes de irmos a esses fatos, vamos relembrar o que havia antes.

O historiador Jorge Ferreira havia chamado a atenção pela participação de "kardecistas" (eufemismo para seguidores do "espiritismo" brasileiro, evidentemente não o de Allan Kardec, mas o de Francisco Cândido Xavier) na Marcha da Família Unida com Deus pela Liberdade, o protesto ocorrido em 1964 (houve reedição comemorativa há poucos meses) que pediu o golpe e a ditadura civil-militar.

No programa Pinga-Fogo da TV Tupi de São Paulo, no final de julho de 1971, o próprio Chico Xavier manteve toda a pregação ideológica reacionária, esculhambando explicitamente os operários e os camponeses e dizendo que o golpe militar veio para "salvar a família cristã". E mais: pediu para rezarmos para os militares (do general Médici a brutamontes como Sérgio Paranhos Fleury e Brilhante Ustra) porque eles "estavam construindo o reino de amor do Brasil futuro".

Para uma religião que faz coro a setores retrógrados da sociedade, como os machistas, quando prega a ideia moralista de que "a vítima é a culpada", faz sentido essa queda de máscara que mostra o "movimento espírita" como uma religião reacionária que sempre foi.

Muitos esquerdistas foram muito ingênuos ao dar alguma consideração a Chico Xavier. Ficaram iludidos com sua imagem de "humilde" e "frágil" que muitos esqueceram ter sido construída pela célebre Rede Globo de Televisão, que queria um "católico sem batina" para fazer frente à ascensão de "pastores eletrônicos" como R. R. Soares e Edir Macedo que surgiram na TV da época, fim da década de 1970.

Recentemente, a Globo recorre a seguidores como Divaldo Franco e João de Deus para adoçar as mentes perplexas dos brasileiros, diante de uma crise similar ao que se viveu na Era Geisel. enquanto tenta salvar o Chico Xavier alvo de tantas denúncias publicadas na Internet.

Ainda há a blindagem do YouTube e do Facebook, e, no caso do primeiro, há centenas de canais de vídeos com muitas visões próprias do "movimento espírita", incluindo verdadeiras tolices relacionadas aos "dons proféticos e filosóficos" de Chico Xavier. No caso do Facebook, o que se destacam são os memes, vários deles enfeitados com flores, corações, jardins e crianças sorrindo, com frases do próprio anti-médium mineiro.

Agora vamos aos fatos recentes. A revista Veja, conhecida pelo seu reacionarismo acima dos limites, capaz de publicar mentiras aberrantes só para desmoralizar o Partido dos Trabalhadores, veio com uma reportagem respeitosa sobre o suposto médium curandeirista João Teixeira de Faria, o João de Deus, que enfrenta um tratamento contra o câncer feito pela medicina tradicional.

João de Deus causou estranheza por causa disso, uma vez que, tido como "médium de curas espirituais", supostamente responsável por doenças graves, não quis usar seus próprios "dons" para se curar. E veio com a seguinte desculpa, digna de um charlatão: "O barbeiro corta o próprio cabelo?".

O "médium" que atua em Abadiânia, no interior de Goiás, é um dos dois "médiuns" blindados pela Rede Globo, juntamente com Divaldo, como um artifício ideológico para deslumbrar as pessoas carentes, pobres ou não, diante de um "catolicismo à paisana" que é o "movimento espírita", através de um suposto curandeiro e um suposto filantropo e orador.

Além da revista Veja, vemos a publicação do livro supostamente mediúnico, O Partido - Projeto Criminoso de Poder, risível obra de Robson Pinheiro, sobre uma multidão de espíritos perversos que facilmente manipula os brasileiros para o mal, num maniqueísmo simplório.

Apesar de "imparcial", a obra sugere uma postura direitista, com a alusão da palavra "partido" (que tem as letras da sigla PT), a atribuição dele a um "projeto criminoso", o que sugere uma referência à suposta atuação do PT nos escândalos do "mensalão" e do "petrolão", e a classificação de "memorável" aos protestos de 13 de março de 2016, na verdade um ponto máximo de uma série de passeatas reacionárias que pediam, entre outras coisas, a volta da "ditadura militar".

A mesma postura parece ser do periódico "Correio Espírita", do Rio de Janeiro, que na edição deste mês incluiu um texto falando da "conscientização política" dos jovens brasileiros, tomando como gancho as mesmas manifestações do "Fora Dilma", e alega que tais eventos simbolizam a "entrada do Brasil numa fase de regeneração".

O próprio Robson Pinheiro, ícone dos best sellers religiosos, havia definido os protestos de 13 de março como "libertação", através da causa do impeachment. Não se sabe se por ironia ou gozação, Robson aparece num vídeo usando boina preta e blusa vermelha, o que soa uma paródia para ícones esquerdistas como Che Guevara e o Partido dos Trabalhadores.

O "espiritismo", através das ideias de Chico Xavier, já tinha seu reacionarismo reconhecido na Teologia do Sofrimento, corrente ultraconservadora e medieval da Igreja Católica defendida pelo "médium" de Pedro Leopoldo. Esta ideologia consiste em dizer que os sofredores devem aguentar suas desgraças como sendo "caminho para Deus" e não questionar privilégios nem abusos cometidos por pessoas de maior status.

Através desses episódios, observa-se que o "movimento espírita" brasileiro se distancia de Allan Kardec não só pela desonestidade doutrinária, mas também pelo reacionarismo que inexistiu no pedagogo francês, ele um intelectual pós-iluminista e progressista que havia tido caraterísticas de centro-esquerda, naquele país europeu.
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