domingo, 10 de maio de 2015

"Espiritismo" e o vandalismo digital no Brasil


O vandalismo digital no Brasil é um grande problema, refletindo o zeitgeist - o estado de espírito do lugar e do tempo - dos últimos anos em que o "estabelecido" pelo poder midiático, mercadológico, lúdico, político e tecnocrático criam seus "cães de guarda" na Internet.

Nas mídias sociais, é comum lançar ideias consistentes e coerentes, ou questionar arbitrariedades, e, de repente, surge um movimento organizado de humilhação e desmoralização que surpreendem pela agressividade e pelo sarcasmo violento.

Essas mensagens, difundidas por uma diferença pequena de tempo, parecem terem sido combinadas por um grupo de internautas, geralmente lideradas por alguém mais agressivo e dotado de carisma dentro de uma comunidade virtual, e que consiste no bully digital, praticante de uma forma de bullying feita à distância e através de uma rede de computadores.

O Brasil é um país altamente conservador, só que esse conservadorismo é bastante complexo. Afinal, não é um conservadorismo que se baseie em métodos tradicionais, ele traz um verniz "moderno", "arrojado" e "rebelde".

Desde que personalidades consideradas arrojadas como o roqueiro Lobão, a ex-VJ da MTV Sônia Francine e o jornalista Fernando Gabeira mostraram seu lado reacionário, ser conservador no Brasil passou a ser visto como algo que vai além da questão da aparência. Sem falar de uma "galera irada" cujo extremo reacionarismo é aos poucos desmascarado pelas circunstâncias.

Nos EUA, o falecido guitarrista Johnny Ramone, um dos fundadores dos Ramones, era simpatizante do reacionário Partido Repúblicano. Ao lado dele, o guitarrista de hard rock, Ted Nugent, também se tornou famoso por posturas bastante reacionárias, além dele ser um defensor entusiasmado do comércio e porte de armas de fogo.

Mas tudo isso são expressões moderadas diante do que se vê na Internet. Jovens que falam palavrão, que se vestem de forma desleixada - que variam entre skatistas, hippies, surfistas e rastafáris, ou, quando muito, do estilo casual do jovem de hoje - , adotam comportamento "rebelde" mas são dotados de um reacionarismo que faria Olavo de Carvalho ficar de cabelo em pé.

Para quem não sabe, Olavo de Carvalho se diz filósofo, vive nos EUA e é um dos maiores representantes do pensamento ultraconservador brasileiro, apegado a valores medievais. Seus discípulos, os jornalistas Reinaldo Azevedo, de Veja, e Diogo Mainardi, da Globo News, soam como se fossem traduções pop de seu mestre.

Pois os modernos vândalos digitais no Brasil, que em maioria "patrulham" contestadores com humilhações, ameaçando, se não "invadir" as contas dos discordantes, pelo menos criar blogues ofensivos contra eles, são uma espécie de tradução hardcore de Olavo de Carvalho,

É claro que existem outros vândalos digitais sem caráter ideológico algum e em maioria só querem bagunçar, como os troleiros (do inglês troller), mas aqui preferimos falar dos casos mais graves, quando o vandalismo digital está a serviço do "estabelecido" vigente no Brasil.

Há desde o membro do fã-clube da "dupla sertaneja" que "patrulha" internautas discordantes até grupos neo-nazistas impondo seus pontos de vista na Internet. Há desde fanáticos por futebol até homofóbicos e racistas doentios, passando por busólogos defendendo arbitrariedades político-empresariais e ouvintes de "rádios de rock" caricatas em ascensão no mercado.

Há também, no Brasil, pessoas que são tão reacionárias que precisam usar uma "máscara" de alguma tendência "progressista" para levarem alguma vantagem, impressionar ou agradar amigos e colegas de mídias sociais. Pessoas que agem e pensam como Reinaldo Azevedo, mas que precisam se vincular a partidos de esquerda para não ser marcado por seus ideais radicalmente direitistas.

Em casos extremos, a "galera tudo de bom" (como se autoproclamam os vândalos digitais, que tentam ter uma alta reputação em seu grupo social) parte para ofensas racistas, das quais foram vítimas as belas negras Maria das Dores Martins, em 2014, e Cristiane Damacena, xingadas de "macacas" e "escravas" por internautas que parecem ter combinado entre si para fazer uma gozação conjunta, como em todo vandalismo digital.

E O "ESPIRITISMO"?

O "espiritismo" não está isento de praticar tais atrocidades. Muito pelo contrário, a fúria é um sentimento existente em muitos adeptos da doutrina, por mais que eles neguem com firmeza. E isso não é de hoje. O caso do sobrinho de Chico Xavier, Amauri Pena, foi um grande exemplo das reações de ódio, fúria, intolerância e revolta consideradas "inconcebíveis" entre seus membros.

Manifestações desse tipo ocorrem, sim. E o próprio Chico Xavier tinha momentos de irritação e até de língua ferina. A diferença é que boa parte dos seguidores do "espiritismo" brasileiro mais radicais tentam medir o uso das palavras, já que o esporte favorito dos "espíritas" é a retórica.

Houve casos de um internauta criticando a chamada "música espírita", geralmente de gosto duvidoso e considerada supérflua para atividades que deveriam ser de divulgação da Ciência Espírita, e veio um outro indivíduo dizendo, com maliciosa ironia, "A musica do Kardec é tão doce".

A propósito, Allan Kardec foi compositor? Não. E a tal "música espírita" não difere muito da pieguice de músicas "evangélicas" ou "católicas", ou, quando tocam canções laicas, tanto faz seja uma música respeitável como "Canção da América", de Milton Nascimento, ou a melosa "Um Dia de Domingo", de Michael Sullivan e Paulo Massadas.

Um vídeo que questionava a "profecia" de Chico Xavier sobre a "data-limite", sugerindo que o sonho previa e desejava uma teocracia brasileira nos moldes do antigo Império Romano / Bizantino, foi duramente atacado por adeptos do anti-médium mineiro.

Mas até mesmo os jornalistas investigativos que cobriam o caso Otília Diogo, a serviço da revista O Cruzeiro, também receberam ameaças de "espíritas" irritados com a revelação da fraude de materialização, que por muito pouco não incriminou também Chico Xavier. E há suspeitas de que Amauri Pena teria sido envenenado por ordem de algum "espírita".

Isso faz com que a agressividade seja também um risco potencial dentro do "espiritismo". Principalmente se levarmos em conta que sua ideologia prega o rigor punitivo, sob o pretexto dos "resgates morais" e "reajustes espirituais" que, não obstante, transformam vítimas em "culpadas".

Daí que o cyberbullying e a trolagem podem ser práticas de internautas "espíritas", sobretudo quando questionamentos avançam e crescem causando surpresa a todos, dentro de um debate ainda maior que, no mundo inteiro, analisa os abusos cometidos pelas diversas religiões do planeta.

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