sábado, 23 de agosto de 2014

Chico Xavier não foi tão vítima quanto muitos supõem

CHICO APOIANDO OTÍLIA DIOGO, FANTASIADA DE "IRMÃ JOSEFA". INGENUIDADE?

Há uma visão muito controversa em relação aos erros cometidos pelo anti-médium Francisco Cândido Xavier em relação à Doutrina Espírita. Oficialmente, ele aparece como suposta vítima, e mesmo assim essa condição é argumentada de duas formas diferentes.

Uma é de que Chico Xavier foi "mal orientado" na conversão ao Espiritismo, quando poderia ser melhor aproveitado, por sua aparente mediunidade, para se tornar fiel às ideias de Allan Kardec. Essa tese credita Chico Xavier como tendo sido "espírita", o que muitos analistas consideram pouco provável.

Outra é de que Chico Xavier nunca foi espírita e que por isso foi "mal orientado" pelos dirigentes da FEB para praticar, por boa-fé, as deturpações e abusos em torno do "espiritismo" feito no Brasil, pelo fato dele sempre ter sido um devoto da Igreja Católica.

Estas duas visões predominam em muitos círculos de debates espíritas, mas uma investigação jornalística cautelosa, a partir de fatos diversos - alguns deles mostrados, pasmem, por fontes chiquistas - , mostram que, quando havia conveniência, Chico Xavier foi cúmplice e até mesmo culpado por muitos erros cometidos pelo chamado "movimento espírita".

Chico pode ter sido vítima, sim, em alguns momentos. A partir do próprio espírito "mentor", Emmanuel, que no plano espiritual estava enfurecido com o fim das atividades jesuítas no Brasil e que usou o mineiro de Pedro Leopoldo para promover um neo-jesuitismo travestido de Espiritismo.

Em outros momentos, Chico também foi vítima, seja dos arbítrios da FEB, seja da esperteza dos próprios parceiros, já que Divaldo Franco havia feito um plágio de um texto de Chico, se aproveitando o baiano de suas habilidades de manipulação da palavra, já que Franco é conhecido pelo seu discurso explicitamente erudito e por vezes rebuscado.

Mas Chico também fez das suas, principalmente quando descobriu, secretamente, que sua mediunidade não acontecia 24 horas por dia e, quando ocorria, praticamente se limitava aos contatos que tinha com o traiçoeiro Padre Manuel da Nóbrega, "redivivo" na pessoa de Emmanuel.

Só que, em vez de dizer "deu branco, gente", o que poderia, obviamente, pegar mal, Chico superestimou sua mediunidade limitada e foi produzir ou pedir a outros produzirem livros que eram dotados de muitos plágios e, atribuídos a autores ilustres, demonstravam, apesar da semelhança superficial, queda de qualidade em relação às obras que estes fizeram em vida.

Dois dos primeiros livros de Chico Xavier, Parnaso de Além-Túmulo e Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, comprovadamente não foram psicografados. Neles há fortes indícios de plágios, reconhecidos por especialistas sérios, além da pregação religiosa exagerada, do conteúdo sofrível dos textos e, no caso de Parnaso, das alterações tendenciosas sucessivas.

USURPAÇÕES

Chico também está associado à usurpação leviana de nomes de ilustres falecidos, como Humberto de Campos, Augusto dos Anjos, e tantos outros. Mas sua galeria de usurpados mostra que Chico, não obstante, não era vítima e ele mesmo é que fazia dos outros suas vítimas.

De uma anônima jovem mineira, Irma de Castro, a Meimei, a Marilyn Monroe, personagem de um devaneio quase "sensual" das angústias da atriz, Chico se apropriou de vários falecidos, em mensagens que nem sempre apresentavam semelhanças verossímeis às personalidades evocadas, mas sempre tinham alguma pregação religiosa, mesmo latente.

Pelo seu exemplo e pelo carisma conquistado, Chico permitiu que se fizesse a farra que existe hoje, tida ou não como supostamente espírita, mas sempre voltada à usurpação da memória dos mortos para a expressão monótona e tendenciosa de propaganda religiosa, que não raro traía aspectos peculiares das personalidades dos respectivos finados.

Aí virou bagunça, e os chamados "médiuns", se inspirando no exemplo de Chico, hoje chegam a usar de sua imaginação fértil para inventar falsas psicografias, falsas psicofonias, falsas pictografias, criando trabalhos irregulares e botando tudo na conta dos falecidos. Se Chico abriu esse caminho todo e estimulou toda essa farsa, ele não seria "vítima" dessa manobra.

"NÃO JULGUEIS"?

Contrariando uma das frases prediletas de Emmanuel, "Não Julgueis", Chico Xavier estimulou a prática de "julgamentos severos" dos chamados "líderes espíritas". Em 1966, Chico usou o nome de Irmão X (atribuído a Humberto de Campos, em usurpação sutil) para acusar as vítimas do incêndio de um circo em Niterói, no final de 1961, de terem sido, em outras vidas, patrícios vingativos de uma cidade do Império Romano, já no começo da Idade Média.

Incoerência? Não. O "não julgueis" citado por Emmanuel corresponde à reprovação da contestação dos atos abusivos ou equivocados feitos pelo "movimento espírita", mas o próprio complexo de superioridade de seus envolvidos já lhes faz cometer "julgamentos" contra aqueles que haviam sofrido algum infortúnio e não eram queridos pelos "espíritas".

Os "julgamentos" sempre colocavam as vítimas como os culpados, criando um moralismo cruel que fazia dos suicidas criminosos piores do que os homicidas, estes considerados os "justiceiros" dos "resgates espirituais". Um sentimento de impunidade para quem realmente comete crimes, contra pessoas que muitas vezes só queriam o progresso da humanidade.

Xavier então impulsionou essa onda toda que causou repercussões negativas. Como no caso de Woyne Figner Sacchetin, que, imitando Xavier, usou o nome de Alberto Santos Dumont para acusar as vítimas de um acidente aéreo de 2007 de terem sido patrícios romanos. Só que Woyne não tinha o carisma de Chico e a realidade jurídica era outra, daí o esperto "médium" ter sido processado judicialmente, tendo que retirar do mercado o livro com tal acusação.

O APOIO A FRAUDES

Chico Xavier não poderia ser inocente, diante dos casos de fraudes de materialização, porque esses casos chegaram a durar pelo menos um ano antes de serem denunciados, e Chico acompanhava os processos com gosto, assinando documentos "legitimando" os atos e posando em fotos ao lado de fraudadores.

Nenhuma vítima de fraude apareceria assim, tão alegre, satisfeita e confiante. Seria um absurdo que Chico só soubesse da fraude de Irmã Josefa na última hora, já que ele apareceu em fotos ao lado dela, sorrindo, brincando e sentindo. Se Chico era cego ou míope, até isso é controverso, mas mesmo na cegueira é possível sentir a presença de outrem através do tato.

Chico não era tão ignorante ou ingênuo quanto se imagina, e ele mesmo só recuou, em 1973, ante um plano de criar uma tradução ainda mais grotesca dos livros de Allan Kardec do que a já alarmante tradução de Guillon Ribeiro, depois que Herculano Pires denunciou a farsa num programa de rádio e o caso virou escândalo nos meios "espíritas".

E O "BOM CHICO"? COMO É QUE FICA?

Antes que alguém venha a reclamar que aqui só falamos de aspectos negativos de Chico Xavier, há a fama dele ter sido uma pessoa generosa, bondosa e caridosa. Pode até ser que ele também tenha sido generoso e simpático quando lhe era possível, mas a tão alardeada bondade do anti-médium está longe de representar algo profundo e transformador.

Se ele "enxugou lágrimas", como dizem seus defensores mais entusiasmados, no entanto ficava indiferente quanto às tragédias ocorridas, atribuindo aos clichês moralistas do Catolicismo medieval como "desígnios de Deus", "reparação de faltas passadas" e outras alegações severas que mais entristecem e irritam do que consolam as vítimas.

Fácil enxugar lágrimas diante do "leite derramado". Mas o "espiritismo" conduzido por Chico Xavier, como seu maior expoente, em nada fez para promover ou transformar a verdadeira espiritualidade humana, mas a fez subordinada a um moralismo religioso conformista e até mesmo masoquista.

Mesmo as caridades pregadas por Chico Xavier eram inócuas. As doações de alimentos e coisas, que poderiam ser emergenciais e secundárias - já que as pessoas "recebiam o peixe" mas não eram "ensinadas a pescar" - , tornaram-se prioritárias, imobilizando as classes populares e viciando as pessoas abastadas numa filantropia de resultados, paternalista e forçada.

CONCLUINDO

Assim, o "homem chamado Amor" perdeu, na sua missão "fraternalista", diante de uma galeria de outras personalidades, várias sem vínculo religioso, que superaram em ações em favor do próximo do que o anti-médium que "enxugava lágrimas".

É só ver os outros exemplos. Paulo Freire, Milton Santos, Mário de Andrade, Profeta Gentileza, o assumidamente ateu Oscar Niemeyer, todos eles de alguma forma pensando no próximo de maneira criativa e generosa, lutando pelo progresso social, promovendo transformações sem se limitarem ao paternalismo puro e simples.

Por isso Chico Xavier acabou prejudicando muito. Ele mesmo permitiu, através do seu carisma e de sua visibilidade, que muitos dos abusos e erros, muitos aberrantes, cometidos em nome do "espiritismo", fossem feitos e ampliados.

Pelo seu exemplo, ele não pode ter se tornado vítima, porque em muitos momentos apoiou e incentivou, mesmo indiretamente, todos os erros cometidos por seus pares. Pelo seu consentimento, Chico Xavier já perdeu muito de sua elevada reputação, tornando-se em parte responsável por muitos dos descaminhos vistos no "espiritismo" brasileiro.

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