GETÚLIO VARGAS ANUNCIANDO O ESTADO NOVO, EM 10 DE NOVEMBRO DE 1937.
Sabe-se, com toda a certeza, apesar da insistência de "espíritas" e leigos, que Humberto de Campos nunca escreveu Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, atribuído a seu espírito. Isso porque a obra destoa completamente do estilo original do autor, além da qualidade do texto estar abaixo do legado que Humberto deixou em vida.
O que poucos sabem é que a obra, um dos primeiros trabalhos em que o sinistro anti-médium mineiro Francisco Cândido Xavier atribuiu a Humberto de Campos e cujo sucesso consagrou a obsessão que o "iluminado médium" teve pelo autor maranhense, foi feito por encomenda do Departamento de Imprensa e Propaganda do Estado Novo, governado por Getúlio Vargas.
Vargas decretou o Estado Novo, regime autoritário inspirado nos regimes fascistas europeus, embora de forma relativamente flexível e, depois, frouxa. Nos seus primórdios, porém, era uma fase política enérgica, em que pese as conquistas trabalhistas realizadas pelo presidente.
Naquela época, o Brasil era bem mais conservador do que hoje, que já é um período ainda de muitos retrocessos sociais (sobretudo no Rio de Janeiro, que em 1937-1938 era capital do país e hoje é uma província com ganas de impor valores retrógrados para o Brasil), e o domínio religioso católico era muito mais rígido do que hoje.
Por isso, nem o já conservador "movimento espírita", que demonstrou ter jogado no lixo as lições de Allan Kardec, tinha vez na sociedade da época. Formar um "centro espírita" era uma ação de risco, já que, à primeira denúncia, a polícia invadia tais estabelecimentos e prendia seus envolvidos, sob o pretexto de práticas clandestinas de curandeirismo e rituais considerados duvidosos.
Diante desse quadro de repressão, que fortalecia até o coitadismo que depois virou marketing para os "espíritas", o presidente da Federação "Espírita" Brasileira, Antônio Wantuil de Freitas, teve que negociar com as autoridades do Estado Novo, sobretudo ligadas ao Departamento de Imprensa e Propaganda, órgão de censura das atividades culturais e informativas da época.
As negociações visavam transformar o "movimento espírita" numa instituição respeitável, fazendo encerrar a repressão policial que invadia os "centros" e prendia as pessoas que nele estavam. Os representantes do Estado Novo acataram o pedido, mas impuseram uma condição.
A Federação "Espírita" Brasileira teria que produzir um livro que estivesse de acordo com o tipo de ufanismo que o Estado Novo trabalhava para o Brasil. Um livro que exaltasse a pátria brasileira e definisse seu nacionalismo como algo superior.
E assim foi feito. Chico Xavier e Wantuil de Freitas foram trabalhar o livro, com base em livros didáticos da época, dentro da narrativa ufanista muito conhecida nas bancas escolares, em que os personagens da História do Brasil eram descritos como supostos grandes heróis da pátria e até mesmo genocidas como os bandeirantes e a atuação brasileira na Guerra do Paraguai eram assim exaltados.
E aí houve o resultado. Como num dos trabalhos anteriores, Chico Xavier escreveu o livro a quatro mãos com Wantuil e depois atribuiu a autoria do livro a Humberto de Campos, como apelo sensacionalista para a venda do livro.
Essa é a realidade que enterra de vez o mito de que o livro teria sido feito por inspirações superiores vindas de um autor maranhense. Nem o plágio de uma passagem de O Brasil Anedótico, livro que Humberto havia lançado em vida, em 1927, ajudou, muito pelo contrário. Reproduzir como relato sério uma crônica satírica - melhor dizendo, uma anedota - é bastante constrangedor.
Com isso, Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho é um péssimo trabalho de História do Brasil, nunca recomendável para quem quiser entender o país. O livro nunca passou de um gancho para promover o "movimento espírita" junto ao cenário político de então, sem falar que Chico Xavier e companhia foram, décadas depois, de mãos dadas com Filinto Müller apoiar a ditadura militar.
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