sexta-feira, 27 de março de 2015

"Espiritismo" tem como regra pedir fraternidade. Isso não é bom


Não há coisa mais irritante que mendigar fraternidade. Num mundo tenso, turbulento e complexo como o nosso, os "espíritas" só ficam "pedindo" união, amor, luz, fraternidade, caridade. Tudo num belo desfile de "palavras lindas" que para nada servem.

E isso necessariamente alegra e conforta as pessoas? Não. Muitas vezes, as pregações nos "centros espíritas" e as mensagens trazidas por seus palestrantes, ou pelos seus líderes, mais constrangem, irritam, envergonham e revoltam as pessoas. E não adianta reclamar.

Dizer com calma, simular um ambiente de alegria e mansuetude, carregar no semblante sereno, criar todo um aparato de luminosidade, tocar melodias dóceis no fundo musical, tudo isso é inútil diante do contexto em que vivemos nesse mundo complexo e violento.

Isso só faz piorar as coisas. E faz lembrar aquele vício tão conhecido no jornalismo, quando um jornalista pergunta a alguém que sofre ao perder um ente querido como está se sentindo. Imagine ver alguém já triste e perguntar o que ela está se sentindo. Soa ofensivo e cruel, mesmo sem querer.

O pior que se vê são nas ditas mensagens espirituais, todas iguais umas às outras. O apelo à fraternidade, muitas vezes, pode esconder atos fraudulentos, e palavras amorosas são usadas a serviço da falsidade ideológica e da exploração leviana da comoção alheia, o que é gravíssimo.

É aquele mesmo papo de alguém que sofreu muito depois de morrer, foi socorrido nas colônias espirituais, que encontrou a luz, passou a se sentir melhor e se manifesta para pedir que todos se unam no amor e na fraternidade.

Pode ser quem for. Mas as famílias, sobretudo as mães ou alguém tomado da mais profunda saudade, acabam acreditando numa veracidade que não existe, apenas porque alguns aspectos pessoais são anunciados, não raro "pescados" de alguma entrevista prévia com os familiares.

CHICO XAVIER PREJUDICOU MUITO COM ISSO

Em muitos casos, essas "palavras de amor" geram efeitos contrários nas pessoas. A repetição de palavras "amorosas" num contexto de muita gente estressada e irritada, sofrida e sobrecarregada, apenas causa mais revolta e irritação, e a resposta mais provável é um curto e grosso "Não enche!".

Durante duas décadas, nos anos 1940 e 1960, fez muito sucesso o personagem Amigo da Onça, desenhado durante muitos anos por Péricles Maranhão e, depois da morte deste, pelo colega de O Cruzeiro Carlos Estevão, criador do Dr. Macarra e da hilária série "As Aparências Enganam" (em que silhuetas que sugerem atrocidades revelam situações inofensivas e alegres).

O Amigo da Onça, que os mais velhos querem esquecer e os mais jovens não querem conhecer, era famoso por dizer frases gentis e fazer conselhos bondosos que levavam as pessoas a alguma encrenca ou tentavam consolar as pessoas que sofrem algum infortúnio.

Difícil não pensar em Chico Xavier, o Amigo da Onça da religiosidade brasileira. Era ele que costumava dizer para as pessoas suportarem o pior dos sofrimentos sob o pretexto de receber bênçãos e graças divinas, e que aguentassem tudo na oração em silêncio, sem queixumes. Divaldo Franco corrobora a tese chiquista e ainda diz: "Nada que um Pai Nosso não resolva".

Alguém pisa no seu calo e você tem que ficar quieto e orar em silêncio, orar agradecendo pelas graças a serem concedidas não se sabe de que maneira e você tem que sorrir para tudo o que pior lhe acontecer. Se sua vida está um azar de dar dó, você é um "sortudo", aos olhos das "máximas" chiquistas.

Isso é um grave prejuízo. Gravíssimo. E é assustador que Chico Xavier seja visto como um vice-deus por causa disso, se aproveitando da angústia humana para dizer, cinicamente, que as pessoas já são beneficiadas por besteiras que se conhecem como "mananciais de luz" e "searas de amor", meros joguetes de palavras diabéticas.

CONDIÇÕES CAUSADORAS DA REVOLTA HUMANA

Imagine então as centenas e centenas de palestras "espíritas" em que todo mundo fica pedindo fraternidade. "Vamos nos unir", "vamos valorizar a fraternidade", "vamos reviver o amor", assim, sem mais nem menos, e  com todo o aparato de "boas vibrações" que se tornam inúteis e, se depender do caso, até muito mais nocivas do que se pode imaginar.

O que os "espíritas" ignoram e que mesmo os mais dedicados "auxílios fraternos" - traduções frouxas e ainda mais inócuas do confessionário católico - não conseguem perceber, com todos os esforços que são por eles feitos, são as raízes das revoltas e indignações dos homens.

A vida é muito complexa e as necessidades humanas mais ainda. O "espiritismo" que sempre defende que as pessoas possam ceder em tudo, até no seu progresso intelectual e no seu desejo de justiça social, para aceitar as imposições da vida e até a ser refém e escravo do egoísmo alheio, não entende o sofrimento alheio.

Como pedir fraternidade em mentes ainda revoltadas, se nenhuma condição é feita para superar e romper com os motivos de sentimentos tão duros? Por seu método de educação e ativismo social, o ateu Paulo Freire entendeu muito mais, e mil vezes mais, o sentido de fraternidade do que todos os "espíritas" brasileiros juntos, incluindo Chico Xavier e Divaldo Franco.

Por isso é que o "movimento espírita" se tornou inútil e inócuo na transformação das pessoas. Sua doutrina e seus procedimentos irregulares só fazem com que sua suposta missão de evoluir e melhorar as vidas das pessoas seja feita em vão.

Mais preocupada com seu moralismo e com suas mistificações e mitificações, o "espiritismo" brasileiro acaba virando uma "indústria do sofrimento", uma "fábrica de sofredores" na qual todas as "palavras de amor" e todo o aparato de "boas energias" só causam ainda mais constrangimento e irritação. Fraternidade não se pede, fraternidade se faz. A "fraternidade espírita" só faz falar.

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