quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

Literatura espírita original advertiu contra o excesso de "mel das palavras"


Muitos se iludem com o excesso de mel nas imagens e palavras "espíritas". É surpreendente que a pieguice se torna o maior dos postulados do "espiritismo" brasileiro que, distante de Allan Kardec, tenta usar apelos emocionais para se tornar uma pretensa unanimidade.

Esses apelos emocionais acabam idiotizando as pessoas. "Que importa, tudo é Amor!!!!" é uma das falácias prediletas àqueles que preferem ver o bom senso, a lógica, a coerência e até a ética no lixo, do que perder o êxtase causado pelos transes emotivos da fé religiosa mais fanática. Recusar a realidade com medo de perder aquelas fantasias em que o cidadão voa de mãos dadas com um "médium espírita" percorrendo jardins floridos é dose!!

Enquanto isso, por trás do sabor de mel das palavras de Divaldo Pereira Franco ou do tempero das imagens belas para o moralismo cru de Francisco Cândido Xavier - constatou-se que as frases de Chico Xavier nunca tiveram a beleza que se atribuem, sendo grosseiras de tão "secas", se limitando a um joguinho barato de ideias contrastantes - , escondem venenos peçonhentos.

Nem vamos falar muito de Chico Xavier, porque está óbvio: suas pregações para o sofredor esconder o sofrimento, aguentar toda desgraça porque "tudo passa" (talvez com o além-túmulo ou daqui a cem anos), aceitar os piores infortúnios em troca de 'bênçãos futuras" e outras "lições de vida" que só provam o quanto o anti-médium mineiro era devoto da Teologia do Sofrimento, corrente medieval do Catolicismo.

Divaldo Franco também é adepto dessa corrente católica, mas é mais dissimulado. Artífice da palavra, é adorado pelo seu tom melífluo de dar entrevistas e depoimentos, e pela teatralidade de sua oratória, rebuscada, prolixa e cheia de dramaticidade. Mas é o tom melífluo que chama a atenção e faz com que idiotas o confundam como um "sábio" ou um "filósofo" por causa de ideias dóceis e da pretensão de saber tudo.

Os idiotas ignoram que um sábio de verdade não tem necessariamente voz melíflua, não tem a pretensão de responder a tudo e seu saber não tem o embelezamento da linguagem empolada que vemos em Divaldo. Um verdadeiro sábio não traz respostas, traz questões. Divaldo apresenta caraterísticas que remetem mais aos falsos sábios, criticados tanto por Jesus quanto por Allan Kardec.

Observando bem o que Divaldo diz, percebe-se que venenos peçonhentos se escondem no mel de suas palavras. Em dezembro de 2016, após o encerramento de um evento "espírita" na Espanha, o anti-médium baiano fez um julgamento de valor muitíssimo perverso sobre os infortúnios sofridos pelos refugiados do Oriente Médio, com estas palavras, ditas com o tom melífluo de sempre:

"No campo das deduções e de acordo com o meu pensamento, penso que aqueles que estão hoje, de volta à Europa, são os antigos colonizadores que deixaram, até hoje, a América Latina na miséria.
Como foi negado todo o direito aos seus residentes, como aculturaram os selvícolas, destruindo culturas veneráveis, pela Lei de Causa e Efeito aqueles estão retornando hoje à pátria, no estado de miséria, e que ameaçam os próprios países de onde saíram, para, um dia, buscarem a fortuna para o conforto europeu".

O discurso de Divaldo indica intolerância social e, talvez, religiosa, por muitos desses refugiados serem muçulmanos. Pode sugerir também um preconceito racial, pois a acusação, do mais alto nível de gravidade, atinge pessoas etnicamente ligadas a negros ou árabes. O juízo de valor de Divaldo também sugere um sentimento punitivista em relação ao sofrimento vivido pelos refugiados, e uma acusação leviana de que eles retornariam à Europa em busca de "fortuna para o conforto europeu".

É como se ele dissesse: "Bem feito para os antigos colonizadores". Só que o "médium" fez seu julgamento ao arrepio da Ciência Espírita, revelando também um sentimento impiedoso, porque a encarnação atribuída, se já é uma atribuição duvidosa, remete a uma encarnação muito antiga e, provavelmente, superada.

Outra "pérola" do "médium" é quando, seguindo a tendência "espírita" da criminalização do prazer, Divaldo, em entrevista dada ao jornal Zero Hora em razão de um evento "espírita" em Porto Alegre, veio com essa: "Podemos ser felizes na doença, na pobreza, na situação deplorável".

Ser feliz em situação deplorável? Ser feliz morando na rua, sendo ameaçado por mendigos rivais, por marginais ou milicianos, vivendo na fome e no abandono, exposto a graves doenças por causa dos lugares sujos? Feliz no desemprego e no acúmulo de contas, como a simpatizante do "espiritismo" brasileiro, Maria Tereza Maldonado, disse numa entrevista?

Quanto veneno pode esconder em palavras que têm excesso de mel, numa sociedade em que os verdadeiros altruístas e sábios não se preocupam em adoçar suas bocas e suas gargantas para fazer soar vozes angelicais ou sacerdotais! Aqui nos lembramos então do texto do espírito Lázaro, publicado em O Evangelho Segundo o Espiritismo, que parece um recado aos próprios deturpadores que hoje se apropriam, no Brasil, do legado deixado pelo mestre lionês.

É um texto que foi publicado no capítulo 09, Bem Aventurados os Mansos e Pacíficos, e que está incluído entre as Instruções dos Espíritos. Embora seja uma mensagem para destinatários gerais, ela soa como um puxão de orelha aos "espíritas" que carregam demais no mel das palavras, sem esconder o veneno das ideias moralistas e de apologia ao sofrimento humano.

Da mesma forma, também é uma mensagem para os seguidores do "espiritismo" brasileiro, que, quando não são contrariados, parecem angelicais de tanta simpatia e afabilidade, mas, diante do menor questionamento, se explodem em raivas, ameaças e reagem com violentos sarcasmos e agressivas ironias, como se comprovou em vários seguidores de Chico Xavier e Divaldo Franco. Vejamos o texto:

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I – A Afabilidade e a Doçura


Pelo Espírito Lázaro - Paris, 1861.

6 – A benevolência para com os semelhantes, fruto do amor ao próximo, produz a afabilidade e a doçura, que são a sua manifestação. Entretanto, nem sempre se deve fiar nas aparências, pois a educação e o traquejo do mundo podem dar o verniz dessas qualidades. Quantos há, cuja fingida bonomia é apenas uma máscara para uso externo, uma roupagem cujo corte bem calculado disfarça as deformidades ocultas! O mundo está cheio de pessoas que trazem o sorriso nos lábios e o veneno no coração; que são doces, contanto que ninguém as moleste, mas que mordem à menor contrariedade; cuja língua, doirada quando falam face a face, se transforma em dardo venenoso, quando falam por trás.

A essa classe pertencem ainda esses homens que são benignos fora de casa, mas tiranos domésticos, que fazem a família e os subordinados suportarem o peso do seu orgulho e do seu despotismo, como para compensar o constrangimento a que se submetem lá fora. Não ousando impor sua autoridade aos estranhos, que os colocariam no seu lugar, querem pelo menos ser temidos pelos que não podem resistir-lhes. Sua vaidade se satisfaz com o poderem dizer: “Aqui eu mando e sou obedecido”, sem pensar que poderiam acrescentar, com mais razão: “E sou detestado”.

Não basta que os lábios destilem leite e mel, pois se o coração nada tem com isso, trata-se de hipocrisia. Aquele cuja afabilidade e doçura não são fingidas, jamais se desmente. É o mesmo para o mundo ou na intimidade, e sabe que se podem enganar os homens pelas aparências, não podem enganar a Deus.        

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