domingo, 25 de outubro de 2015

"Espíritas" realmente leem os livros de sua doutrina brasileira?


Os "espíritas" da doutrina brasileira realmente leem os livros por ela publicados? A confusão mental que eles atribuem a seus contestadores na verdade existe nos próprios "espíritas", que fazem juras de amor inabalável a Allan Kardec mas praticamente o apunhalam pelas costas.

Um dos aspectos insólitos que se observa, nesta doutrina mais próxima do Vaticano do que de Lyon, é a instituição do livro como meio de expressão ideológica. E isso num país com pouco hábito de leitura como o Brasil, que chega a ter, pelo menos, três livros para colorir nas listas dos mais vendidos.

Sabe-se que Francisco Cândido Xavier, o adorado Chico Xavier de seus seguidores, fez muito menos, e muitíssimo menos, do que sua tão alardeada bondade tenta nos fazer crer. E sabemos que algumas de suas "bondades" se revelam traiçoeiras, como a apropriação da memória dos mortos através da falsa mediunidade, se promovendo às custas da tragédia alheia e fazendo falsidade ideológica.

Mas a atitude mais perniciosa de Chico Xavier é, sobretudo, através de seus livros. Ele simplesmente jogou no lixo as lições de Allan Kardec, através de um engodo literário dos mais confusos, e, como se isso não bastasse, nem todos os livros atribuídos ao anti-médium mineiro realmente foram escritos por ele.

Nos anos 80 e 90, por exemplo, muitos dos livros "de Chico Xavier" eram feitos por editores da FEB, porque o anti-médium, doente e cheio de compromissos, não poderia escrever ou "psicografar" 100% do que lhe é atribuída a autoria. Tanto que o que se reconhece popularmente como de sua lavra são livros publicados entre os anos 1930 e 1960, e alguma coisa dos anos 1970 e 1980.

Chico Xavier tornou-se uma das expressões máximas do Brasil que mascara as coisas, que diz uma coisa e faz outra, e onde os reacionários que violam as leis juram de joelhos que "respeitam as leis e o interesse público". É o país do jeitinho, da memória curta, reduto tardio mas certeiro do politicamente correto, em que as piores atitudes são sempre justificadas pela "melhor das intenções".

Daí ser compreensível que uma parcela de espíritas autênticos, mas ainda muito, muito ingênuos, ainda acredita que se possa aproveitar alguma coisa de Chico Xavier e Divaldo Franco na hipótese de recuperarmos as bases científicas kardecianas. É evidente que esta postura é confusa, mas é defendida por não pouca gente.

Eles até não conseguem esclarecer o que pode ser aproveitado dos dois. Falam apenas que eles "trabalham pela caridade", embora uma análise bem cuidadosa mostra que o trabalho filantrópico dos dois anti-médiuns é bem mais frouxo, precário e muito menos expressivo e bem menos transformador do que se supõe e se acredita.

Livros? Os espíritas que querem recuperar as bases kardecianas mas têm os corações ainda moles batendo por Chico e Divaldo não conseguem sequer explicar quais os livros servem para serem aproveitados na Doutrina Espírita. Só os mais famosos deles expressam deturpações sérias em relação ao pensamento de Kardec.

As obras de Chico Xavier, Divaldo Franco e de autores derivados não são mais do que engodos de moralismo religioso, narrativas especulativas sobre o mundo espiritual, manifestações de valores conservadores nem sempre de fácil leitura, com obras rebuscadas de um eruditismo falso e grosseiro, daí que nem seus defensores conseguem lê-los de forma atenta e dedicada, não bastassem tais obras apresentarem ideias contrárias ao que Allan Kardec tão trabalhosamente sistematizou.

Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho? O livro traz uma visão historiográfica do Brasil que já era risível em 1938, fruto de livros didáticos de terceira categoria. Nosso Lar? Ele supõe um mundo espiritual do qual a ciência não comprova como certo. E os livros de Divaldo? Ele tem razão quanto às crianças-índigo? Os kardecianos de coração mole não conseguem explicar.

As pessoas leem as pressas, de tal forma que, na imprensa cultural brasileira, por exemplo, aceitam um direitista como o colunista do Farofafá, Pedro Alexandre Sanches - tão devoto do "deus mercado" quanto Rodrigo Constantino - como se fosse "esquerdista" só porque ele, provavelmente sob a proteção de um pistolão nas fileiras petistas, foi trabalhar na Caros Amigos, Carta Capital e Fórum.

Daí que só pode dar "funk carioca" e "sertanejo pegação" como trilha-sonora do futuro "coração do mundo", já que a desinformação generalizada das pessoas, de pouca leitura e menos raciocínio crítico - sobretudo em tempos que a sociedade passou a contestar os contestadores - , faz com que o Brasil caia em verdadeiras armadilhas, aceitando a ratoeira por causa do queijo que está lá como isca.

Se um jornalista que, embora não muito badalado - Sanches perdeu a chance de triplicar sua já alta visibilidade nos meios sócio-culturais trabalhando na Rede Globo - , é muito influente e prestigiado pelos "peixes grandes", que define o futuro do folclore brasileiro através do indigesto cardápio das FMs "populares demais" controladas por políticos e latifundiários, a cultura brasileira só pode estar em crise, por mais que esta ideia seja renegada pela "moçada feliz" das mídias sociais.

E, no âmbito do "espiritismo", vemos as pessoas aceitarem que Humberto de Campos tenha "voltado a nos falar" na forma de um padre católico nas chorosas obras "espirituais" que levam seu nome. E isso é aceito porque poucos têm coragem de ler as obras originais de Humberto de Campos, escritor falecido há mais de 80 anos. Se está difícil até para ler Eu Fico Loko, diante de uma avalanche de livros para colorir...

O hábito de leitura, portanto, é ainda precário. Pessoas até passaram a ler mais e a antiga convicção de uma minoria que estufava o peito para dizer com orgulho que odiava ler livros hoje tornou-se ridícula e preconceituosa. Mas a qualidade da leitura ainda é sofrível e o mercado literário está mais voltado para o sensacionalismo do que para a relevância dos temas abordados.

Mesmo os livros de História precisam ser trabalhados como ficção, não como nos tempos do Segundo Império, quando se criou uma historiografia ufanista de heróis de contos-de-fadas montados a cavalo. O sensacionalismo de hoje está mais próximo do History Channel do que dos primórdios do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Dom Pedro II tem o rosto de Brad Pitt quando jovem e o de Anthony Hopkins quando idoso.

Daí que ninguém consegue entender o que é autêntico ou deturpado nos livros ou reportagens, nos documentários e monografias. Os brasileiros ainda leem pouco, os livros que fazem sucesso ainda são sofríveis - isso quando não se incluem os livros para colorir - e o raciocínio reflexivo se torna uma atitude antissocial de "desocupados rancorosos".

Por isso é que vemos um terreno fértil, ou melhor, estéril, para o contexto atual, em que pessoas ainda querem incluir Chico Xavier e Divaldo Franco no seleto clube do Espiritismo genuíno, só porque os dois eram "bonzinhos". Sem leitura nem raciocínio crítico, absurdos e posturas surreais acabam sendo adotadas e até prevalecendo. O Brasil perde muito com isso.

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