sexta-feira, 10 de outubro de 2014
Chico Xavier foi ou não adepto de Roustaing?
Quando se fala do roustanguismo no "movimento espírita", um dos pontos mais controversos é a adesão de Francisco Cândido Xavier aos ideais do autor de Os Quatro Evangelhos, Jean-Baptiste Roustaing.
O mineiro, tido oficialmente como o ícone maior da mediunidade no Brasil, foi muito mais uma figura cheia de controvérsias do que alguém que pudesse garantir uma confiabilidade plena. Sorte que a maioria dos brasileiros ainda prefere o deslumbramento fácil, os benefícios das conveniências e vantagens imediatas do que a coerência dos fatos. Daí a imunidade de Chico Xavier.
No entanto, em sua trajetória há desde acusações de charlatanismo e de envolvimento em fraudes (como plágios de livros e falsas materializações) até de hesitação em muitos momentos, o que poderia derrubar por definitivo sua reputação de "líder maior da espiritualidade", não fosse a condescendência de muitos.
O envolvimento de Chico Xavier com as ideias de Roustaing se deu porque Chico, católico fervoroso mas dotado de mediunidade - fato que consideramos concreto, mediante análises, mas bastante limitado em suas comunicações com Emmanuel e alguns poucos processos - , havia entrado em contato com os dirigentes da Federação "Espírita" Brasileira.
Durante muito tempo, Xavier foi praticamente o "garoto de recados" da FEB, se envolvendo em produções supostamente mediúnicas nas quais se apontaram provas de plágios literários e fortes indícios de colaboração de uma equipe editorial, fato considerado "absurdo" pelo "movimento espírita" brasileiro.
Xavier fez uma propaganda de Jean-Baptiste Roustaing, no livro Brasíl, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, supostamente atribuído ao espírito do escritor Humberto de Campos, mas comprovadamente plagiado do texto do seminário Brasil, Berço da Humanidade, Pátria dos Evangelhos, que Leopoldo Machado lançou num congresso da FEB, em 1934.
O próprio "orientador" de Xavier, o espírito Emmanuel - que, pela associação de ideias e traços de personalidade, condiz com o antigo Padre Manuel da Nóbrega - , era um católico reacionário, de fortes ideias medievais, com todos os preconceitos de sua elite, e não poderia mergulhar fundo na Doutrina Espírita sem prejudicá-la com deturpações fortemente catolicizantes.
Até que ponto Chico Xavier passou a se envergonhar do roustanguismo não se sabe. A tese do Jesus "fluídico" lhe agradava a princípio, pelo fato de sua crença católica heterodoxa - mas nada realmente espírita - admitisse uma imagem "nem tanto divina, nem tanto humana" do ativista judeu.
Da mesma forma, Xavier também gostava das pregações católicas de Os Quatro Evangelhos, que fugiam das lições científicas e objetivas de Allan Kardec que assustavam aqueles que optavam pelas crenças espíritas mas sem abrir mão de suas convicções fortemente católicas.
Observa-se, porém, que Xavier passava a evocar Allan Kardec já nos anos 40, como uma mensagem atribuída a Humberto de Campos divulgada em 1942, e que reproduziremos em outra oportunidade. Mas, talvez depois de 1973, Xavier fosse "inclinado" a defender a suposta fidelidade a Kardec, numa estranha reviravolta do espiritolicismo que sempre desprezou o professor lionês.
Chico Xavier adotava posturas dúbias, contraditórias e desempenhava atividades duvidosas. Apoiou fraudes de materialização e estava ao lado de seus organizadores, sorrindo, contando piadas, sabendo dos detalhes de bastidor. Apoiou medidas de deturpação das ideias kardecianas, e negociava reparos editoriais em seus livros.
O mineiro apoiou Roustaing e seu religiosismo, mas quando o advogado de Bordeaux passou a ser pivô de violentos escândalos em torno da FEB, Chico omitiu esse apoio e pareceu, aos olhos dos incautos, que passou a defender uma maior fidelidade a Allan Kardec, quando os analistas espíritas mais sérios comprovam que Xavier NUNCA foi, de fato, um conhecedor espírita.
Chico Xavier, além disso, era um ávido leitor de livros e, se ele podia ser considerado um "analfabeto", ele era em relação à Doutrina Espírita de Allan Kardec, cujas ideias científicas eram muito complicadas para serem sequer consideradas pelo mineiro de Pedro Leopoldo. Em contrapartida, Xavier sempre se manifestou profunda identificação com a Igreja Católica e seus valores mais conservadores.
O que se pode concluir, pelo religiosismo católico que marcou a trajetória de Xavier, é que ele sempre foi, ao longo de sua vida, um adepto fiel de Jean-Baptiste Roustaing (o "João Batista" do livro sobre o Brasil), pela sua forma de diluir o Espiritismo através de ideias herdadas do Catolicismo medieval.
Tirando os aspectos mais polêmicos de Roustaing, Chico Xavier comprovadamente adaptou e consolidou as ideias do roustanguismo para a realidade nacional, permitindo que a FEB passasse depois a esconder o nome do autor de Os Quatro Evangelhos porque havia outro que assumisse a responabilidade por essas mesmas ideias, sem causar incômodos ou escândalos.
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