quarta-feira, 19 de março de 2014

É muito fácil o Espiritolicismo forjar "espíritos de luz"


O exemplo ilustrado pela imagem acima é fictício, mas suponhamos que se trata de um livro lançado pelo Espiritolicismo, 50 anos depois do falecimento do senador Antônio Carlos Magalhães, conhecido pelo seu jeito agressivo e reacionário.

Neste exemplo, digamos que ACM tenha sofrido um processo de reabilitação intensa de imagem, incluindo uma engenhosa fabricação de consenso, apoiada por jornalistas, juristas, historiadores, acadêmicos e outros interessados em fazer uma imagem positiva do político baiano para a posteridade.

Digamos que estamos em 2057. E digamos que a mídia conseguiu trabalhar uma mutação de imagem do falecido senador, ex-prefeito de Salvador e ex-governador da Bahia, que passou a ser conhecido como uma figura extremamente amorosa, meiga e gentil.

Nesse processo, foram levados ao exagero qualidades políticas de Magalhães, como a eventual simpatia com aqueles que se identificam com sua figura, ou a realização de obras de cunho urbano - que, dizem as más línguas, são imitações de projetos urbanísticos típicos do Plano de Metas de Juscelino Kubitschek - , com o acréscimo de alguns aspectos surreais.

Constrói-se um mito que só evoca os aspectos positivos de ACM, deixando de lado os momentos de truculência, ocultando os seus defeitos e apenas "adaptando" tais defeitos a um "admirável" senso de austeridade e firmeza contra os "detratores" e "invejosos".

Com isso, cria-se um mito que é trabalhado aos poucos ano após ano. Chegados os 50 anos, o antigo Toninho Malvadeza é transformado num anjinho ancião, no mais elevado sinônimo de mansuetude, meigice e grande evolução espiritual.

Criam-se livros atribuídos à sua autoria espiritual, com mensagens melífluas e confortantes. Criam-se supostas aparições espirituais associadas a supostas curas e supostas mensagens de "amor e fraternidade", de altíssimo teor de pieguice. Cira-se um consenso que transforma o falecido senador em figura iluminada, "espírito de luz", dotado da "mais elevada perfeição moral".

Consolidado o mito, cria-se até mesmo situações surreais, como Magalhães voando sobre as águas, seu fantasma enfrentando ondas para salvar um grupo de pescadores, ou o cheiro de dendê surgir do nada para anunciar sua presença. Tudo narrado como se fosse coisa verídica, através de palestrantes dotados de visibilidade e prestígio e respaldados pelo poderio midiático.

O exemplo, em si, é muito forte, para a comparação com o doutor Adolfo Bezerra de Menezes. Até porque, como político, Bezerra estava mais próximo de um José Sarney um pouco mais filantrópico do que de ACM, e naquela época quem se aproximava do "Malvadeza" era o senador gaúcho José Gomes Pinheiro Machado, assassinado em 1915.

Mesmo assim, cabe aqui ilustrar como é fácil, no Espiritolicismo, apoiado de outros suportes ideologizadores, forjar "espíritos de luz". Criou-se até mesmo um mito fabuloso do católico caipira Chico Xavier, promovido a "guia maior do Espiritismo" e a "figura de indiscutível perfeição moral". Mesmo com todos os erros, vários graves, por ele cometido.

Daí o exemplo acima. Alguém imaginaria, daqui a 50, 100 anos, Antônio Carlos Magalhães sendo sinônimo de meiguice e perfeição? A ponto de muitas mulheres idosas prestarem sua imensa devoção a ele, visto como um santo, um espírito sem falhas? Ou mesmo um espírito cujas eventuais falhas devem ser subestimadas em prol da adoração confortável?

Por isso é que o Espiritolicismo é perigoso, diante das armadilhas que produz para seduzir as massas e inventar "espíritos de luz" conforme sua conveniência. A exemplo do Vaticano, o "espiritismo" brasileiro também tem o cacoete de canonizar pessoas a bel prazer, como se coubesse aos homens mortais e imperfeitos o juízo da perfeição espiritual.

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