quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

O sado-masoquismo "espírita"


Nós não viemos para sofrer, mas, se sofremos, teremos que aguentar tudo sem queixumes. Essa é a máxima da "moral espírita", princípio de uma doutrina que não está aí para resolver os problemas, mas tão somente a nos oferecer paciência para aguentar qualquer tranco na vida.

Inventando o principio de "Lei de Causa e Efeito", distorcendo as análises de Allan Kardec a respeito de atos e consequências humanos, o "movimento espírita" apenas quer que suportemos as limitações até o momento em que o acaso nos presenteie com alguma coisa "boa", não se sabe quando.

A Teologia do Sofrimento que constituiu na "filosofia" (prestem atenção nas aspas) de Francisco Cândido Xavier é a pedra angular da "moral espírita" brasileira. Dizia Chico Xavier para sofrermos "amando" e "em silêncio", sem queixumes e sem "botar na pauta do outro" o nosso sofrimento.

Em outras palavras, temos que suportar o sofrimento e fingir que não sofremos. Temos que ficar alegrinhos, sorrir para tudo, sorrir para a dor, sorrir para nossos algozes, até que o acaso venha com alguma "libertação", não se sabe quando, talvez até depois de morrermos.

E aí tem Nosso Lar, a fantasia do "mundo perfeito", dos prédios imponentes que se vê aqui na Terra nas propagandas de grandes condomínios ou novos shopping centers, da grande relva verde cheia de árvores imponentes e flores belíssimas, sobre as quais voam pássaros adoráveis. Temos que aguentar o sofrimento sonhando com esse paraíso como prêmio para nossas angústias consentidas.

Pois, a partir dos apelos que Chico Xavier havia deixado para que "aceitássemos o sofrimento", o "espiritismo" constrói seu sadismo através do qual o sofrimento dos infortunados é apenas uma "prova" a ser suportada em nome dos "prêmios" da "vida futura".

A doutrina brasileira não mede necessidades humanas. Se a pessoa tem um excelente diferencial e um potencial para tal atividade importante e todas as barreiras lhe roubam até as mais modestas oportunidades, essa pessoa tem que fazer outra coisa, se sujeitar ao jugo de um imbecil prepotente e esperar que possa aproveitar seu potencial...na próxima encarnação, de preferência.

Só que a outra encarnação não apresentará os mesmos contextos sociais para esse trabalho. Serão outras coisas, talvez melhores, talvez piores. Numa encarnação, a pessoa poderia trabalhar uma causa transformadora, mas não encontra chance para isso. Na encarnação posterior, ele pode até trabalhar esta causa, mas encontrará, em vez de opositores, usurpadores. Valeu a pena?

Em muitos casos, as transformações sociais banalizam certos aspectos da vida, e, em outros, ganham adesões tendenciosas de canastrões, canalhas e cafajestes. O Brasil de Leila Diniz (1945-1972) não é o Brasil das "mulheres-frutas", e se Leila voltasse, talvez renascendo nos anos 80, veria hoje os paradigmas de feminismo serem deturpados de maneira bastante deplorável.

Mas isso os "espíritas" não entendem. Para eles, a pessoa sofre porque "fez alguma coisa para isso", e aí eles até vem com um comentário sádico: "Talvez o irmãozinho tenha feito algo em outra vida, o jeito é ter paciência, amigo, aguentar tudo isso, baixar a cabeça e orar, de preferência em silêncio ou em sussurro mais baixo".

Para os "espíritas", vale a vida qualquer nota. Eles não enxergam as individualidades humanas, A pessoa tem que receber uma oportunidade qualquer nota, pouco importa se o aspirante a historiador tem que trabalhar como flanelinha de rua e ser ameaçado pelos seus concorrentes.

O "espiritismo" não aceita a intervenção do espírito nas imposições da vida material e dos materialistas, por isso há sempre os apelos de que "não queixais", "não reclames", "não questiones". Acham que até o mais tranquilo quesitonamento é "veneno da revolta" e a doutrina, complementando a trinca "disciplina, disciplina e disciplina" do jesuíta Ismael, pede para os infortunados que sofrem para "aceitar, aceitar e aceitar".

De um lado, o sadismo dos mercadores das belas palavras, que acham o sofrimento "lindo", desde que seja com os outros. Não é o líder "espírita" que tem sua mulher morta em um assalto, vê sua filha morrer num acidente de moto, vê seu filho morrer afogado numa praia, ver seu tio sendo assaltado depois de ganhar na loteria e vê seu avô sofrer um sequestro-relâmpago num canto da cidade.

Os sacerdotes à paisana que são os palestrantes e articulistas "espíritas" apenas dão piruetas e cambalhotas com suas palavras bonitas. Circenses da retórica, sempre arrumam um malabarismo para dizer como é "lindo" o sofrimento, e são capazes de adotar um discurso alegando que "não nascemos para sofrer, mas temos que aguentar o sofrimento e não sofrermos com isso".

Eles são sádicos achando que podemos sofrer infortúnios e tragédias e depois ter "cabeça" para olharmos passarinhos. E nós temos que ser masoquistas e "agradecer a Deus" pelo sofrimento contraído, mesmo quando estamos com o nome sujo na "praça" por conta de algum mal-entendido ou alguma trolagem de Internet.

Falam que Madre Teresa de Calcutá era o "anjo do inferno" por ter pregado que o sofrimento humano era uma "dádiva divina". Corretíssimo e de contundente veracidade. Mas temos que ver também o mesmo com Chico Xavier, que apelava para não comunicar nosso sofrimento para os outros, aconselhando a gente a sofrer em silêncio. Algo tão cruel quanto a declaração de Madre Teresa.

Esse é o sado-masoquismo "espírita" que explica por que as pessoas sempre têm algum prejuízo quando entram em contato com a doutrina. Isso não é maledicência, é algo observado até nos devotos mais entusiasmados do "espiritismo", que sem saber acabam "sacrificando" seus filhos, que não bastassem a morte prematura sem necessidade, ainda têm seus nomes roubados por "médiuns" que forjam da própria mente as supostas mensagens espirituais.

Tanta desonestidade só pode dar nisso: a má energia do "espiritismo" e o moralismo retrógrado e igrejista de seus ideólogos, sempre jogando com as palavras para defender o obscurantismo sob a máscara do esclarecimento e da consolação.

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