segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Por que os "espíritas" costumam se envergonhar do roustanguismo que seguem?


Quem é especialista no histórico do "movimento espírita" brasileiro sabe que a doutrina, que se diz "kardecista" só para não assustar a criançada, se fundamentou em ideias e práticas trazidas pelo livro Os Quatro Evangelhos, do sinistro advogado francês Jean-Baptiste Roustaing.

Foi esse livro que desenhou o "espiritismo" no Brasil, a ponto de inserir na doutrina "kardecista" ritos que se encontram paralelos quase literais na Igreja Católica: missas católicas como doutrinárias, confessionários católicos como auxílios fraternos, águas bentas como águas fluidificadas e por aí vai.

Até mesmo a bibliografia segue essa linha. Se existe a Bíblia, há os livros de Francisco Cândido Xavier. Até o coitado de Allan Kardec, tratado feito gato-e-sapato pelo "movimento espírita", é jogado nessa analogia: os principais livros da Codificação são definidos, à maneira dos livros do Antigo Testamento, como "pentateuco" (de "penta", referente a cinco livros tidos como essenciais).

Esse religiosismo contaminou o Espiritismo, pela raiz de suas adaptações brasileiras, e tirou de escanteio aqueles que reivindicavam o respeito absoluto ao pensamento de Allan Kardec, não pela submissão a ele, mas pela honestidade de apreciação de ideias.

A coisa se arraigou de tal maneira que o religiosismo toma conta até mesmo de dissidências do poderio da Federação "Espírita" Brasileira, e as crises que a instituição sofreu ao longo dos anos nunca representaram uma esperança de recuperar o pensamento kardeciano tão bajulado quanto desprezado no Brasil.

ROUSTANGUISMO ENVERGONHADO

Fora as ações da cúpula da FEB, que agora vê reassumir o poder o grupo abertamente roustanguista - aquele que luta para manter Os Quatro Evangelhos como livro obrigatório do Estatuto da FEB - , o que se nota é uma espécie de herança envergonhada do roustanguismo, em que quase sempre o nome do advogado francês é relegado ao mais absoluto esquecimento e ignorância.

Há quem entre nos "centros espíritas" e não tenha ideia de quem teria sido Jean-Baptiste Roustaing. Dele não há sequer imagens sobre sua aparência. Às vezes, surgem palestras citando que Roustaing tentou "destruir o Espiritismo", ele tornou-se superado e as pessoas voltam para casa felizes com essa "tranquilizadora informação".

Sim, é um dado surreal: roustanguistas dizendo que o roustanguismo foi derrotado, Kardec saiu vencedor e vamos contentes para os "centros espíritas" para assistir às missas (doutrinárias) com água benta (água fluidificada) e às vezes marcar horário com um confessionário (auxílio fraterno) que nos recomendará alguma penitência (aguentar as palestras de Divaldo Franco em CD ou vídeo, por exemplo).

Que roustanguismo envergonhado é esse? Por que o legado de Roustaing foi mantido em quase toda sua essência, se seu nome é ignorado pela maioria dos seguidores "espíritas" e as lideranças veem o nome do autor de Os Quatro Evangelhos como um "palavrão"?

Sabemos que houve interesses tendenciosos e que a tendência dos últimos 40 anos do "espiritismo" fingir rigorosa fidelidade a Allan Kardec foi apenas para tentar abafar o barulho dos oposicionistas da linha dominante. Estes oposicionistas, como José Herculano Pires, Deolindo Amorim, Carlos Imbassahy e outros, acabaram vencendo batalhas, mas perdendo o campeonato.

Para piorar, os oportunistas que agora "são rigorosamente fiéis a Kardec" chegaram mesmo a divulgar supostas mensagens atribuídas ao médico Adolfo Bezerra de Menezes, que na condição de presidente da FEB apresentou Roustaing aos brasileiros, alegando "arrependimento" e passando a pedir ao "movimento espírita" para "kardequizar", sutil corruptela para o jargão católico (e jesuíta) "catequizar".

E, o que é pior, roustanguistas entusiasmados como Chico Xavier e Divaldo Franco (que jura nunca ter tido tempo para ler Roustaing), alegaram serem "completamente fiéis e rigorosamente vinculados" ao pensamento de Allan Kardec.

Cínico, Divaldo Franco chegou mesmo a usar como desculpa os critérios do Controle Universal dos Ensinos dos Espíritos (C. U. E. E.) para justificar as acusações de plágio de um texto de Chico Xavier que já era uma suposta psicografia.

Em primeira hora, quando os escândalos da opção roustanguista começaram a se tornar insustentáveis, Chico e Divaldo formaram o grupo dos supostos "kardecistas autênticos" - já denunciados por Carlos Imbassahy - que no entanto mantém todos os ritos religiosos trazidos pela visão de Roustaing.

É essa corrente que domina o "movimento espírita" brasileiro nas últimas quatro décadas, dotada de tanta demagogia discursiva que é capaz de usar em causa própria ensinamentos autênticos do próprio Erasto, de Allan Kardec e outros esclarecedores, usurpados justamente por aqueles que eram denunciados por esses mestres.

Sim, isso mesmo. "Espíritas" que seguem Roustaing mas dizem combater o roustanguismo. Pessoas que traem Allan Kardec e que no entanto usam Allan Kardec para combater os que atribuem ser "os traidores" (provavelmente roustanguistas muito radicais e mais explícitos), como bandidos que, depois de praticarem o assalto, telefonam para a polícia para denunciar o ocorrido e fogem.

Como é que pessoas assim, que deturpam a Doutrina Espírita, ainda têm o cinismo de usar até Erasto, que na verdade endereçava seus avisos contra os mesmos deturpadores que fingem apoiar a urgente advertência?

Por que esse roustanguismo envergonhado? Inferimos que pode ser para manter os "espíritas" maleáveis às conveniências, indo ao "sabor do vento" sem, evidentemente, seguirem de fato a tão alegada "fidelidade à Kardec".

O que se sabe é que, agindo assim de forma contraditória, os "espíritas" acham que estão sendo conciliadores e ecumênicos. mesclando ciência e religião numa enjoada e gosmenta gororoba. Só que estão sendo mais mistificadores e agem para confundir as pessoas, mesmo quando evocam a tal "doutrina do esclarecimento".

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