terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Correio Espírita e o conceito medieval dos "resgates coletivos"

MORTE E VIDA DO GADO HUMANO.

A edição deste mês do Correio Espírita, espécie de "diário oficial" do "movimento espírita" fluminense, mostra em sua manchete principal o tema, tão difundido por seus membros, dos chamados "resgates coletivos".

A ideia consiste em atribuir uma predestinação comum às diferentes pessoas que se tornam vítimas de uma tragédia comum. Um incêndio, uma queda de um edifício, uma avalanche, um terremoto, um acidente de ônibus ou de avião, um massacre e por aí vai.

Pessoas que não se conhecem passam a ser uma espécie de sócias de um clube de condenados a uma tragédia comum. De repente você, desatento, se junta a um amontoado de infelizes que nunca se viram na vida presente - muitos nem nas passadas - e todos passam a ser irmãos de um "destino comum".

A visão, trabalhada de um caráter extremamente místico, carregado de um julgamento abertamente moralista, que o "espiritismo" brasileiro defende com um certo pedantismo supostamente científico e fatalista.

Os critérios são bastante duvidosos, mas são permitidos pelo fato de haver credibilidade dada, equivocadamente, às atividades mediúnicas duvidosas, não obstante fraudulentas, de supostos médiuns que se acham na capacidade de julgar e definir quem foi quem em vidas passadas, havendo completa falta de estudos a respeito de paranormalidade, magnetismo e outros temas.

PROCEDIMENTO MEDIEVAL

A tese dos "resgates coletivos", um termo próprio do jargão moralista do "movimento espírita", ao lado dos "reajustes espirituais" usados para "punir" inocentes que sofrem alguma tragédia ou infortúnio, apresenta, na verdade, um procedimento tipicamente medieval.

Embora seja hábito dos "espíritas" reprovar o procedimento de antigos imperadores e políticos do Império Romano na sua fase final (durante os primeiros séculos da Idade Média), que mandavam recolher condenados aqui e ali, entre hereges, inadimplentes, bandidos, escravos rebeldes e outros infratores, para reuni-los em arenas para serem queimados ou devorados por leões famintos.

O que os "espíritas" não sabem é que, adotando a tese dos "resgates coletivos", eles se comportam, mesmo de forma simbólica, da mesma maneira que os antigos imperadores, governadores, cônsules e outras autoridades romanas quando juntam pessoas para uma condenação comum.

Não há, portanto, uma diferença entre juntar pessoas de diferentes procedências para reuni-las no centro de uma arena para serem queimadas ou devoradas por leões, e os "espíritas" juntarem pessoas que nada tinham a ver umas com as outras e também tinham diferentes procedências para serem reunidas para uma "tragédia comum".

Pouco importa se diferentes pessoas que não se conheciam nem se falavam, mas estavam juntas, por exemplo, durante o trágico incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria, tornam-se "irmãos" só porque morreram juntos num mesmo momento.

Se, quando pessoas nascem juntas não possuem relação umas com as outras, por que teremos que relacionar as vítimas de uma tragédia comum? O moralismo medieval dos "espíritas" ignora que haja individualidades.

Mas até mesmo para julgar as tragédias das pessoas, o "espiritismo" ignora que se morre também por desatenção. A desencarnação é vista como um processo fatalista, já que o "espiritismo" também vê na vida carnal um "fardo pesado".

Tudo é punição, condenação, sofrimento, fatalidade, ninguém tem individualidade, porque as individualidades são simplesmente padronizadas num panfletarismo religioso. Somos um gado cumprindo as imposições do além-túmulo e dos "reajustes espirituais" na vida carnal.

E tudo isso até que haja tragédias que façam ceifar muitas vidas, enquanto supostos médiuns se apropriam dos nomes das vítimas e redigem, cada um desses "médiuns", mensagens de sua própria imaginação que expressam mero panfletarismo religioso.

Daí os tais "resgates" e "reajustes". Não podemos viver felizes, somos condenados a morrer antes de cumprirmos nossa missão, somos julgados por faltas que nem sabemos que cometemos e ainda somos usados por supostos médiuns para dizer mensagens religiosas que nunca teríamos coragem (ou covardia) de escrever.

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