Em primeiríssima mão, depois de cautelosas pesquisas sobre as irregularidades na suposta psicografia de Humberto de Campos por Francisco Cândido Xavier, constatamos que Humberto nem de longe chegou perto do anti-médium mineiro, um "devorador de livros" que sentia um fascínio doentio por mortos prematuros e que havia se obsediado do escritor, morto aos 48 anos em 1934.
Pesquisamos textos atribuídos a Humberto por Chico Xavier e comparamos com vários textos que o escritor maranhense publicou em vida. Consultamos, por exemplo, tanto O Brasil Anedótico (1927), de Humberto, como a suposta psicografia intitulada Crônicas de Além-Túmulo, lançada dez anos depois.
O disparate é assustador. O estilo elegante, mas coloquial, de Humberto em vida se contradiz com o religiosismo choroso do suposto espírito. Em muitos aspectos, a prosa do suposto espírito de Humberto de Campos soa prolixa e cansativa, não bastasse o tom melancólico mais próximo a de um velho padre de uma paróquia municipal do que de um escritor membro da Academia Brasileira de Letras.
Concluímos que Humberto nem de longe chegou perto de Chico Xavier. Este, com suas manias e sua personalidade muito estranha, é que se tornou "dono" de Humberto de Campos a pretexto de "promover a caridade". Pesquisas criteriosas e cautelosas, portanto, comprovam que Humberto nunca se envolveu com Chico Xavier, que apenas sonhou com ele como qualquer fã poderia sonhar com seu ídolo.
Escrevemos aqui uma mensagem, que pode ser imaginária - não somos covardes de tomar como "mediúnica" uma mensagem produzida em próprio punho - , mas, na tentativa de se aproximar do estilo de Humberto de Campos, reflete sua tristeza e aflição por ver seu nome apropriado indevidamente por Xavier.
Os próprios especialistas literários já alertavam que Chico Xavier e a FEB eram oportunistas e se apropriavam do nome de Humberto de Campos por ele ter sido popular em seu tempo, embora Chico, com falsa modéstia, tenha dito que só agia "por caridade".
Em contrapartida, o "afável" Chico e os "misericordiosos" líderes da FEB tinham também sua língua ferina, acusando de usura os herdeiros de Humberto de Campos, que apenas queriam proteger a obra e a imagem do falecido escritor.
O texto a seguir mostra o que Humberto de Campos provavelmente diria a respeito da obsessão de Chico Xavier pelo escritor maranhense. Humberto negaria, de forma convicta, que teria se envolvido com o anti-médium mineiro e ficaria triste e preocupado com a apropriação que o mineiro passou a ter sobre o nome do antigo imortal da Academia. Peço que leiam com a devida atenção.
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NUNCA TIVE ENVOLVIMENTO COM CHICO XAVIER
Ele passou a cismar comigo, desde que eu fiz aquela resenha do livro dele, Parnaso de Além-Túmulo, do qual descrevi minhas primeiras impressões, que não teriam sido definitivas, porque eu mesmo fiz uma leitura da obra da qual não pude perceber todo o seu conteúdo. Muitas vezes não se observa a mensagem definitiva de uma obra por meio de uma primeira leitura, e só depois de retornar ao que se chama de "pátria espiritual" é que percebi que muito do que estava escrito em Parnaso não era outra coisa senão um pastiche.
Evidentemente, eu não poderia dar uma leitura e uma interpretação finais do livro. Eu pude apenas traduzir na minha resenha de suas partes as impressões que eu tive na ocasião. Se eu, ao menos, pudesse ter vivido uns 30 anos a mais, o que não seria impossível pelo prazo que se tem normalmente o ser humano, eu teria, talvez, feito uma outra interpretação.
Já tinha ciência, fora do plano terrestre, das confusões que o sr. Xavier causou, que me deixaram profundamente horrorizado. Não me constrangi quando meus parentes, visando ficar com os direitos autorais da suposta obra espiritual, processaram Chico e a FEB por causa dos livros atribuídos a meu nome. Minha família apenas cumpriu seu dever de proteger minha memória. Fiquei constrangido, muito antes, da posse que Chico Xavier e seus patrões da tal federação espírita passaram a fazer ao meu nome, como se fossem proprietários de meu carisma, jogando em meu nome coisas que eu nunca escreveria em tempo algum.
Ficava muito estranho ver meu nome vinculado a textos que mais pareciam meras pregações religiosas. De repente, na Terra, eu, escritor, cronista, poeta, membro da Academia Brasileira de Letras, passava a estar associado, nos planos do além, a um estilo de escrita que se aproximava a de um padre de igreja, a um melancólico pároco de funestas palavras.
"Eu", entre aspas, mais parecia um evangelista perdido, que, se pudessem, o sr. Francisco Xavier e seus confrades teriam escrito O Evangelho Segundo Humberto de Campos, se suas pretensões lhes permitissem tamanha aventura. Seria um homem conhecedor dos mais profundos segredos bíblicos, os quais me seria pretensioso demais eu assumir ou querer ser, por serem tempos tão longínquos no tempo e no espaço, dos quais muitos documentos haviam se perdido em páginas rasgadas, livros perdidos total ou parcialmente, depoimentos cuja forma original também se perdeu com o viajar dos séculos. Não, não seria de minha competência passar-me por testemunha de tempos bíblicos.
As mensagens atribuídas a mim não correspondem ao que eu escrevia ou que gostaria de escrever nos tempos de minha vida. No famoso processo de meus queridos familiares, que com certeza não iriam se enriquecer às custas do meu nome, mas garantir proteção à minha obra e à minha imagem tão levianamente deturpada por Chico Xavier e seus parceiros, a mensagem que se atribuiu à minha pessoa, no fim de tão alardeado processo, não condiz com o que eu gostaria de expressar aos juízes ou á sociedade, não somente àqueles que me prestam apreço e admiração mas a todos que tomaram conhecimento de minha vida e trajetória.
Para se dar um exemplo, não escreveria jamais que sentiria desprezo à minha patente literária e que um nome é um mero ajuntamento de sílabas. Não me passaria pela cabeça acreditar que as melhores obras necessariamente se expressam pelo anonimato, de forma a menosprezar a veracidade do trabalho que, de forma não autorizada, carrega o meu nome. Sem querer fazer aqui ataques ou acusações violentas, mas isso me dá a impressão de que o sr. Francisco Xavier e os líderes da FEB se servem da omissão para que possam fazer o que desejarem com meu nome e com minha imagem, agindo como se fossem proprietários de minha pessoa, reduzida a uma simples marionete de seus caprichos sacerdotais.
Já ouvia, de longe, os brados indignados de um Osório Borba, notável crítico literário que me ensinou sobre os equívocos de Parnaso de Além-Túmulo. Eu que, numa leitura apressada, não pude perceber o grau de caricatura e grave desleixo que se deu à poesia atribuída a muitos autores, em especial meu estimado Olavo Bilac, que era impecável em seus poemas, de deliciosa leitura por sua musicalidade silábica pela qual deslizam harmoniosamente seus versos de rima exemplar, e que foi reduzido a um pachorrento pregador nos poemas ditos espirituais que carregaram seu nome.
Quanto constrangimento ao saber que o sr. Xavier age assim porque teve alguns sonhos comigo. Como um admirador que sonha com o seu ídolo, e decide idealizá-lo, moldar o seu objeto de admiração à semelhança do admirador, de acordo com suas convicções pessoais nem sempre certeiras. Xavier me idealizou como um pregador religioso, de escrita bem mais taciturna, de carregada melancolia, a qual eu seria incapaz de escrever mesmo nos momentos de maior enfermidade, que lamentavelmente me abreviaram a vida e me impediram de tantos projetos, sabidos ou não sabidos de mim, porque vários deles me seriam conhecidos pela ocasião da posteridade. E, mais do que me entristecer pelo que não consegui fazer, me entristece mais ainda estar associado ao que nunca faria, pois toda a pena de Francisco Cândido Xavier feita em meu nome destoa do meu pensamento, escapa completamente de meu estilo e reflete uma leitura muito mais cansativa, atribuída a mim, que procurava escrever de maneira concisa para poder me dirigir ao leitor comum, e não apenas a meus doutos companheiros de atividades intelectuais.
Encerro esta mensagem afirmando não ter tido qualquer relação com os textos que o sr. Xavier publicou usando meu nome, além daqueles que, parodiando um de meus pseudônimos, tomaram como crédito o Irmão X. Nunca estive, em momento nenhum, associado ao sr. Francisco Cândido Xavier e aos seus companheiros, e, não fosse essa mania insana de se apropriarem de meu nome e de minha pessoa, eu poderia, na mais favorável das hipóteses, sentir uma distante simpatia pelo trabalho do caixeiro mineiro. Mas, a essas alturas da cavalgada, eu só posso sentir muita tristeza por ele e um certo medo do que Chico e seus confrades seriam capazes de fazer com minha pessoa.
Sempre me mantive afastado deles e nunca me passou pela cabeça ser participante direto ou indireto de qualquer empreitada que eles decidissem fazer. Sinto muito a todos vocês.
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