quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Espíritos zombeteiros se divertem com o caso do livro 'Nossa Nova Caminhada'


Gravíssima e preocupante a iniciativa dos familiares de algumas vítimas da tragédia da boate Kiss, em Santa Maria (RS), ocorrida em 2013, terem que financiar um livro, Nossa Nova Caminhada, baseado em mensagens supostamente espirituais de crédito duvidoso.

Mero apanhado de panfletarismo religioso, e já apresentando irregularidades nas assinaturas e na natureza das mensagens, o livro, que pretensamente apresentaria cartas atribuídas aos espíritos dos mortos, aparentemente colhidas por supostos médiuns situados em Uberaba e no interior paulista, já se soma às fraudulentas publicações que mancham o "movimento espírita" no Brasil.

Iludidos com a lembrança de Chico Xavier - que, entre outras fraudes, foi cúmplice de Otília Diogo nas "materializações" e bolou Parnaso de Além-Túmulo junto a editores da FEB e consultores literários - e recorrendo ao seguidor e conhecido ex-figurão da FEB, Carlos A. Bacceli, para colher supostas mensagens espirituais, os familiares investiram em algo perigoso e traiçoeiro.

Afinal, as mensagens não têm a menor garantia fidedigna e rigorosa de que foram realmente feitas pelos espíritos das vítimas e os ditos médiuns já seguem uma "metolodogia" que, no "espiritismo" brasileiro, já é marcada por tantos desvios de ordem ideológica, técnica e moral da Doutrina Espírita originalmente formulada por Allan Kardec.

NOSSA NOVA CAMINHADA SERIA REPROVADO POR ALLAN KARDEC

Kardec havia advertido quanto a irregularidades que, as menores que sejam, invalidam a veracidade de uma mensagem original, O livro Nossa Nova Caminhada seria firmemente reprovado pelo Controle Universal dos Ensinos Espíritas, grupo que Kardec criou na tentativa de perpetuar o rigor e o discernimento na avaliação das mensagens espirituais e teses relacionadas ao Espiritismo.

Infelizmente, no Brasil, prevalece o religiosismo que permite toda sorte de erros, desvios e fraudes, principalmente quando vemos que, da forma como foi feito, o "espiritismo" brasileiro nunca passou de uma repaginação do antigo Catolicismo medieval português, que havia sido trazido ao Brasil pelos jesuítas.

Diante dessa falta de controle e da emotividade cega e crédula dos familiares das vítimas do incêndio na boate Kiss, permite-se que se lance um livro desses que não é mais do que a mesma lorota do panfletarismo religioso, pois mais uma vez os nomes dos mortos são usados para uma mesma mensagem, igualzinha, de apelação para a "fé, amor e luz" em torno da "Misericórdia divina".

Todo o mesmo papo, como se o mundo espiritual fosse uma grande igreja. As mensagens são tão padronizadas que a gente até desconfia da veracidade mediúnica, já que é muito provável que haja um modelo de "mensagens espirituais" que as lideranças "espíritas" devem veicular, independente de estarem ou não de acordo com os clichês das qualidades dos mortos bastante conhecidas por nós.

Que os espíritos do além podem se comunicar, isso é verdade. Mas o mundo espiritual não é apegado a sentimentos religiosos. Pode haver uma mensagem de conteúdo laico, tanto quanto se produz entre nós na Terra. É muito estranho esse sentimentalismo quase uniforme, que se nota na literatura dita mediúnica no Brasil, porque a religiosidade se torna sua maior e totalitária caraterística.

O propagandismo religioso prevalece até mesmo na expressão de alguns aspectos pessoais conhecidos dos falecidos. E não há garantia de que os médiuns realmente desconheçam os detalhes íntimos, porque nos "centros espíritas" há uma entrevista prévia e, nos bastidores, alguém sempre comenta alguma coisa sobre o "de cujus" para um membro desses "centros".

Ha muita esperteza entre esses líderes e as "mensagens de amor" e o panfletarismo religioso, muitas vezes feitos para seduzir e explorar a emotividade dos familiares de um morto, é também feito como artifício para supostos médiuns que, na verdade, não conseguem exercer, ao menos plenamente, o poder mediúnico que dizem possuir.

Se "dá branco" no processo mediúnico, a solução fica fácil: o suposto médium cria a mensagem com sua própria imaginação, carrega de sentimentalismo, dos mais piegas, e do mais extremo apelo religioso, e só tempera com os clichês de alguns aspectos e situações relacionados ao ente falecido que tem seu nome usurpado para a autoria de uma mensagem que não é sua.

Em outras palavras, o dito médium não precisa sequer entrar em transe. Ele cria da sua mente uma mensagem e ela vem carregada de apelo religioso, como, por exemplo: "Eu sofri muito ao morrer, depois fui socorrido, hoje estou melhor sob a força de Deus, estou consciente do meu resgate espiritual e peço a vocês que rezem, amem e se unam no amor e na fraternidade".

As palavras mudam e um e outro aspecto muda, mas o roteiro é o mesmo. A encenação "espírita" envergonha, porque, por mais que se fale em "identidades pessoais do espírito", o que vale mesmo é o apelo religioso acompanhado de "palavras de amor". Não raro estilos, aspectos pessoais, detalhes mínimos, são traídos em prol de uma mensagem "fraternal" que, não obstante, não é muito diversa.

E o que acontece diante desses casos? Os espíritos zombeteiros se divertem, porque tudo virou bagunça e eles adoram. Enquanto isso, coitados são os 242 mortos - e alguns outros relacionados, que morreram doentes ou em outros acidentes, mas eram relacionados com as vítimas do incêndio - que não podem falar e têm seus nomes usados em mensagens apócrifas de panfletarismo religioso.

Daí o grave perigo que isso representa. E os familiares gastaram suas granas com o comércio da fraude, da mentira. Isso é extremamente vergonhoso, porque os familiares vendem sua saudade em troca do sensacionalismo, com prejuízo de qualquer chance de contato com seus entes queridos, constrangidos de verem que não são eles que se dirigiram às famílias para escrever as tais cartas.

O "movimento espírita" brasileiro acaba, dessa feita, afastando os bons espíritos, os entes queridos, os grandes conselheiros do além, constrangidos, tristes e humilhados com esse espetáculo da fraude e da exploração da imagem dos mortos. E isso se torna um desserviço à espiritualidade e ao bom senso.

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