domingo, 4 de maio de 2014

Enquanto Chico Xavier pedia para que oremos pela ditadura, Dom Tomás Balduíno ajudava os perseguidos


O que é a caridade? Palavras de amor, doações paternalistas que nada transformam e mensagens de consolo que mais parecem ultrajantes de tão conformadas com a tragédia alheia?

Não, nada disso. Com o recente falecimento do católico Dom Tomás Balduíno, que havia sido bispo emérito da cidade de Goiás - ou Goiás Velho, antiga capital de Goiás - , perdeu-se um homem que transformou os ensinamentos de Jesus num verdadeiro e vigoroso ativismo social que não temeu enfrentar o arbítrio da ditadura militar ou, fora dela, do coronelismo latifundiário.

Dom Tomás defendeu a justiça social, denunciando os abusos do latifúndio, que para expandir suas propriedades expulsava trabalhadores, pequenos proprietários rurais, agricultores e seus familiares e até populações indígenas, assim como também alertou para a gravidade dos conflitos rurais, que na maior parte das vezes expressa o poderio dos grandes fazendeiros às custas da morte dos que vão contra seus interesses.

Dom Tomás viveu em Minas Gerais, Goiás e Pará, onde pôde vivenciar a realidade do povo pobre, das classes trabalhadoras e dos humildes moradores de áreas rurais. Ensinou, em 1950, filosofia na cidade de Uberaba, no interior mineiro, onde a essas alturas Chico Xavier, o astro maior do Espiritolicismo, já fixou residência depois de ter sido excomungado pelos católicos de Pedro Leopoldo, terra natal do anti-médium.

Enquanto Chico Xavier aparecia, em 1971, ano de intensa repressão da ditadura militar, pedindo para que oremos em favor dos generais e, quem sabe, daqueles que executavam a repressão e a censura, ignorando a realidade de torturas, mortes e outras opressões, Dom Tomás passou o mesmo período enfrentando o arbítrio ditatorial e de seus seguidores civis, inclusive latifundiários.

Dom Tomás era mestre em Filosofia, foi professor da matéria na Faculdade de Filosofia (hoje integrante da Universidade Federal de Juiz de Fora), aprendeu a língua dos índios Xicrin e Kayapó, esteve sempre assistindo comunidades indígenas e protegeu vítimas e perseguidos da ditadura militar, oferecendo esconderijo quando necessário.

Através de um pequeno avião, ele sobrevoou para diversas cidades interioranas, sempre perseverante no seu ativismo social. Prestou solidariedade a parentes e amigos do padre Rodolfo Lunkenbein e do índio Simão Bororó, assassinados por pistoleiros a serviço dos proprietários de terra do interior do Mato Grosso.

O próprio Dom Tomás chegou a ser ameaçado por uma emboscada que, descoberta a tempo por um jornalista, foi evitada. E o padre também teve atuação decisiva para o crescimento de movimentos como a Campanha Nacional pela Reforma Agrária e o Movimento do Custo de Vida, este com o objetivo de diminuir os impactos da carestia ao povo pobre.

Enfim, Dom Tomás foi um dos homens que ampliou o conceito de caridade para além dos limites paternalistas das religiões tradicionais. Uma lição que faz os espiritólicos se envergonharem com suas "caridades" que não transformam e com seu "amor" que mais amordaça e intimida do que encoraja.

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