sexta-feira, 4 de abril de 2014

A canonização terrena do padre José de Anchieta


Os círculos religiosos ligados à Igreja Católica comemoraram o recente feito da canonização do padre José de Anchieta, nascido espanhol (no arquipélago das Ilhas Canárias) e depois residido e trabalhado no Brasil, tendo participado da fundação das primeiras construções que deram origem à cidade de São Paulo.

Tendo completado 480 anos no último dia 19 de março e tendo vivido 63 anos de idade, José de Anchieta é considerado oficialmente Apóstolo do Brasil e foi também poeta e professor jesuíta. Ele havia sido incluído entre muitos colaboradores da Companhia de Jesus solicitados pelo padre Manoel da Nóbrega.

Anchieta foi também um dos primeiros gramáticos brasileiros, tendo escrito a primeira gramática em língua tupi, numa época em que o Brasil era um país bilíngue, incluindo o português, considerada língua de elite, e o tupi, considerado uma língua popular. Isso valeu até o primeiro-ministro português, Marquês do Pombal, mandar encerrar os trabalhos jesuítas no Brasil e proibir o idioma tupi, já no século XVIII.

José de Anchieta é atribuído a alguns milagres, que inspiraram a canonização sem que fossem feitos estudos para sua comprovação. O mais antigo deles remete a 1567, à cura de um filho de uma religiosa que fazia confissões ao padre, e que parecia gravemente doente e teria sido curado.

No entanto, pesa sobre o "santo Anchieta" um fato bastante negativo, quando ele e Manoel da Nóbrega pediram ao governador-geral Mem de Sá a prisão de um herege, o alfaiate francês Jean Jacques Le Balleur, que teria sido um dos primeiros praticantes do protestantismo no Brasil, tendo sido huguenote, ou seja, adepto francês da religião de Jean Calvin, o calvinismo.

Um carrasco que havia sido ordenado a enforcar Le Balleur se recusou a cumprir tal tarefa. Le Balleur era condenado apenas por não seguir a fé católica, mas a fé protestante, daí a heresia. José de Anchieta decidiu então estrangular o prisioneiro, e depois este foi queimado em praça pública. Fontes divergem sobre o local da queima, se teria sido no Brasil ou em Portugal.

Quanto à canonização, entendemos que o ato é puramente humano e segue um julgamento material. Pode ser visto, na melhor das hipóteses, como uma crença natural própria dos católicos, mas a canonização nada tem de serventia para avaliar, de fato, o nível de evolução moral de personalidades religiosas.

Diz a Doutrina Espírita que são os atos de superação do egoísmo e de transformação benéfica da humanidade, por mais modestos que possam ser, que fazem a pessoa se evoluir moralmente. Mas a vida é extremamente complexa para que a humanidade seja capaz de presumir se alguém é espírito superior, santo ou qualquer outro rótulo referente a alguém que teria atingido o topo da evolução moral.

Além disso, a Igreja Católica inventou o processo de canonização, que é de transformar personalidades em "santos", com base na mitologia greco-romana, por inspiração do Império Romano que por sua vez estabeleceu as diretrizes do Catolicismo. A mitologia greco-romana havia criado "deuses" aos quais se atribuía algum tipo de virtude, dentro das perspectivas morais de então.

O próprio "espiritismo" brasileiro, por sua vez, também criou "espíritos de luz" como analogia aos "santos" do Catolicismo. Seriam espíritos dotados de suposta perfeição moral, como Bezerra de Menezes, Mei-Mei, Chico Xavier, Emmanuel, Joana de Angelis e tantos outros. Seriam os "santos" do Espiritolicismo.

O próprio Emmanuel teria sido o padre Manoel da Nóbrega, até por suas caraterísticas de jesuíta de temperamento austero e autoritário, e pelo dom traiçoeiro de usar uma crença alheia - como a cultura indígena no passado e o Espiritismo mais recentemente - para deturpá-la e adaptá-la de acordo com os interesses da própria crença do jesuíta.

Graças a essa associação, no entanto, os apressadinhos de plantão no Espiritolicismo chegaram a dizer que Chico Xavier teria sido José de Anchieta. Embora em ambos os casos a ilusão de grandeza seja bastante discutível, não há fundamento que possa afirmar que Chico teria sido Anchieta. Nem mesmo indícios prováveis existem para tanto, e não vale os espiritólicos inventar.

A canonização do padre Anchieta foi puramente terrena. Aos olhos dos homens, ele tornou-se um santo. Já no mundo espiritual isso não tem a menor importância, pois tudo continuará na mesma: espíritos imperfeitos que buscam superar seus erros, defeitos e debilidades num caminho longo e difícil de evolução. Não será um rótulo de "santo" ou "espírito de luz" que mudará esse curso.

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