segunda-feira, 23 de maio de 2016

"Espiritismo" brasileiro tem preconceito contra deprimidos


Um texto publicado no blogue Escreva Lola Escreva, a partir de um e-mail enviado por uma adolescente, nos faz pensar em relação ao sofrimento humano, que leva muita gente à depressão, um fenômeno visto com discriminação por uma boa parcela da sociedade.

"Sorria mais! Saia Mais! Depressão não existe", é o título da postagem. Isso lembra alguma coisa? Lembra Chico Xavier, que dizia que, na pior das desgraças, a pessoa deveria sorrir e agradecer a Deus pelas bênçãos que virão. Lembra Divaldo Franco, corroborando Joana de Angelis, que pedia para as pessoas serem felizes e não ficarem tristes por mais de quinze minutos.

Isso é muito grave e mostra o verdadeiro objetivo do "espiritismo" feito no Brasil, um igrejismo medieval muito mal disfarçado por uma falsa apreciação do legado de Allan Kardec: a retrógrada Teologia do Sofrimento, originária dos períodos trevosos da Idade Média.

O "espiritismo" condena o suicídio. Mas o condena não como um erro que pode desperdiçar uma encarnação diante de um ato precipitado e irreversível. O condena como se fosse um crime hediondo, pior do que o homicídio, já que, muitas vezes, o homicida é visto como um "justiceiro moral" pelos "espíritas" e que só "vai pagar pelo que fez" na próxima encarnação (é o "fiado espírita").

O moralismo "espírita" chega a mostrar a felicidade humana não como uma qualidade salutar, mas como uma obrigação na qual as pessoas são obrigadas a esconderem seus sofrimentos e fingirem que estão felizes, sentindo esperança do nada.

Chico Xavier disse com estas palavras: ""Precisamos aprender a sofrer sem mostrar sofrimento, atravessar dificuldade sem passar na pauta dos outros... Estamos matriculados na prova; vamos ver qual será a nota". É a Teologia do Sofrimento, na mais explícita concepção pelo "médium" mineiro.

Daí o desprezo à desgraça humana, e que mostra também uma cruel discriminação. No livro Reportagens de Além-Túmulo, de 1943, em que Chico Xavier usa o nome de Humberto de Campos, há um conto perverso, "A Queixosa", que trabalha uma imagem discriminatória dos contestadores, um prato cheio para Chico levar vantagem no processo que o colocou no banco dos réus no ano seguinte.

O texto é divulgado pelos "espíritas" como uma "lição de otimismo e de esperança", mas é na verdade uma perversidade sem tamanho. Se fizermos uma outra interpretação desse texto, veremos que a cruel lição que este texto dá, não bastasse o dado perverso de Chico Xavier ter usado o nome de Humberto de Campos (que, com certeza, não mandaria um texto destes, prolixo e cansativo, do além), é de que temos que ser felizes à força.

A realidade mostra que, nesse conto "A Queixosa", não é sua protagonista a vilã da estória, mas aqueles que a abandonam. Isso porque, quando alguém reclama, supostamente "em excesso", muitas vezes está chamando a atenção das pessoas para os problemas acumulados.

É como alguém que aponta as muitas sujeiras acumuladas em uma casa, deixadas por negligências, descuidos e descasos anteriores. Imagine as pessoas ficarem felizes com a casa suja e romperem a amizade com alguém que aponta a sujeira que se acumulou. E olha que o "queixoso" muitas vezes se dispõe a ajudar os outros a resolver os problemas.

A PESSOA NÃO SE ATORMENTA PORQUE QUER

Isso quer dizer que o "espiritismo" prega para ficarmos felizes com o "mundo cão", com os retrocessos acumulados, com a sujeira que se juntou no decorrer de anos, com a decadência que veio aos poucos mas que gerou um resultado desastroso.

A verdade é que esse discurso de Chico Xavier revela perversidades e omissões. Além do fato de que Chico muitas vezes escrevia em causa própria, e esse papo de condenar os "queixumes" tem um aspecto um tanto cafajeste de forçar as pessoas a aceitar as fraudes que o "médium" fazia e textos como o aqui mencionado, que Humberto de Campos em verdade nunca escreveria isso, até porque ele claramente foge da boa fluência e da prosa ágil e acessível do autor maranhense.

Por outro lado, os "espíritas", com seu modo medieval de enxergar as coisas, imagina que pessoas cometem suicídio por pura diversão, que pessoas se deprimem porque isso dá um êxtase exótico e as pessoas reclamam da vida porque não têm outra coisa a fazer ou dizer.

Grande engano. Até porque, observando bem, as pessoas mais resmungonas estão por trás daqueles que falam em "felicidade a qualquer preço", que de vez em quando falam da "maravilhosa arte de extrair alegria da dor".

São justamente as pessoas que, com desespero dissimulado, falam demais em "felicidade", "otimismo" e "esperança" que são as mais atormentadas, as mais resmungonas, as mais mal-humoradas e as mais ranzinzas. São elas que, reagindo com rispidez ao menor questionamento dos problemas da vida, desmascaram a sua ilusão forjada da "alegria sem limites".

Enquanto isso, as pessoas que se deprimem e pensam em suicídio adotam tais posturas porque simplesmente não conseguem resolver os problemas. Os obstáculos lhes são demais. Elas se esforçam, fazem sua parte, tentam dar um sorriso, enchem seus corações de esperança, metem a cara para vencer na vida. Mas nenhum esforço, nenhuma alegria, nenhum jogo de cintura consegue fazê-las conquistar as metas desejadas. Daí a depressão, o desejo suicida etc.

O "espiritismo" prefere aceitar as injustiças e achar o sistema de privilégios e desigualdades "irreversível". Tentam argumentar que os abusadores da época presente terão "o que merecem" na "verdadeira vida" ou na "vida futura", enquanto defendem o sofrimento dos desafortunados como se fosse uma gincana para obter o prêmio duvidoso das "bênçãos futuras".

Isso mostra o quanto pessoas que querem "felicidade a todo custo" escondem suas neuroses, muito mais cruéis e preocupantes do que as dos deprimidos e suicidas. São pessoas que se escondem no conforto das ilusões vãs, do elitismo vazio, do deslumbramento da fé religiosa, do egoísmo disfarçado em caridades paliativas e superficiais.

São as pessoas que se dizem "plenamente felizes", no conforto da vida material e religiosa, indiferentes ao sofrimento alheio, que escondem as pessoas mais atormentadas e ranzinzas. E muitos deles nos "centros espíritas", demonstrando uma devoção feliz e enchendo a boca com o mel vocabular cheio de "amor", "caridade", "fraternidade", "humildade" etc.

Tire dessas pessoas dessa situação desconfortável e lhes apresentem os infortúnios de dificílima solução. Teremos também outras pessoas reclamando demais da vida, sentindo depressão profunda e pensando em suicídio. E muitas dessas pessoas podem ser justamente aquelas que se julgam protegidas pela roupagem "espírita".

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