terça-feira, 9 de setembro de 2014

"Movimento espírita" brasileiro e o medo de enfrentar a lógica dos fatos


Ainda sobre o artigo "O Caráter Religioso do Espiritismo", de Célia da Graça Arribas, o histórico que a autora faz das origens do "movimento espírita" brasileiro citam , entre outras coisas, as acusações de charlatanismo da parte dos "espíritas" feita pela comunidade científica.

Sempre encarando tais acusações como "negativas", a pretexto de que o "espiritismo" brasileiro está comprometido com a "caridade" e o "amor ao próximo", a autora reflete uma tendência dos "espíritas" que reagem com pavor e desespero toda vez que são desmascarados em suas práticas duvidosas.

A própria opção pelo religiosismo, em detrimento da verdadeira ciência espírita - tida como "complicada" por "nossos espíritas" - , prejudicou todas as pesquisas sobre o contato com espíritos do além, já que o "movimento espírita" preferiu professar a velha fé no Catolicismo medieval, apenas com adaptações moderadas para o âmbito da "espiritualidade".

A Federação "Espírita" Brasileira surgiu como uma forma da facção espiritólica dos antigos espíritas fazer passar para trás o antigo Centro de União Espírita Brasileira (CUEB), comandado pelos espíritas científicos, fiéis às ideias originais de Allan Kardec.

Com a FEB, não foi a Doutrina Espírita de Allan Kardec que foi adaptada para as tradições religiosas brasileiras, como quer a socióloga Célia Arribas, mas foi o Catolicismo ortodoxo português e de matiz ainda medieval, ainda em vigor no Segundo Império, que foi adaptado para abordagens mais convencionais da Doutrina Espírita, transmitidos a partir de Roustaing.

Abrindo caminho para uma série de distorções, deturpações ou mesmo práticas fraudulentas, o "espiritismo" brasileiro não pode se considerar injustiçado porque foi acusado de charlatanismo. Temos que adotar essa constatação porque a lógica dos fatos não pode ser ignorada em prol de falsas motivações de "amor e caridade".

MENTIRA OU SURREALISMO?

Se não podemos considerar como mentiras as fraudes e deturpações trazidas pelo "movimento espírita", com atos grosseiros que podem ser comprovados a olhos vistos, então teríamos que cair na tese do surrealismo, sucumbindo o Espiritismo pela mesma visão viciada que contaminou, há séculos, a Igreja Católica e as seitas protestantes.

Algumas fraudes podem ser detectadas pela simples observação dos fatos e pelo confronto de supostos fenômenos espirituais com alguns aspectos da realidade, em que contradições apresentadas por esses fenômenos.

Se Divaldo Franco não dá uma pausa sequer entre sua voz propriamente dita e a suposta voz rouca atribuída ao médico Bezerra de Menezes, existe fraude, porque a psicofonia nunca se processaria dessa forma, por serem espíritos diferentes que dificilmente emendariam uma mesma mensagem, o primeiro começando e o outro encerrando, tal qual mensagem de uma só pessoa.

Se, por outro lado, o "dr. Bezerra" de Divaldo Franco apresenta uma voz de velhinho bonachão e sereno e o "dr. Bezerra" de José Medrado apresenta uma voz de um moribundo raquítico e assustado, como se estivesse engolido uma enorme espinha de peixe, existe fraude.

Se o quadro atribuído a Cândido Portinari por José Medrado apresenta contradições sérias de estilo em relação ao pintor original, ainda mais se tratando de um mesmo tema, como o de São Francisco de Assis, existe fraude.

Se as supostas materializações espirituais, várias delas apoiadas por Chico Xavier, se constituem de pessoas cobertas de roupas brancas ou travesseirinhos com "braços" de gaze costurados ao seu redor, e neles são coladas fotos impressas de gente falecida, é porque existe fraude.

ESTRELATO

Seríamos muito ingênuos se, a pretexto de "acreditarmos na força do amor e da fé", aceitarmos esses fenômenos como verdadeiros e autênticos e atribuirmos como "inveja", "perseguição" e "falta de amor" qualquer questionamento a seu respeito.

Por outro lado, o questionamento levanta a questão dos limites da mediunidade, um dos piores problemas do "espiritismo" brasileiro, em que supostos médiuns constroem sua fama e estrelato (isso mesmo, estrelato) às custas de uma mediunidade que é muito mais limitada e frágil do que se pode imaginar.

Os médiuns brasileiros deixaram de ser médiuns para serem os centros dos espetáculos "espíritas". São os médiuns-estrelas, os anti-médiuns porque não são intermediários entre a comunicação de espíritos do além e seus entes aqui na Terra.

Os médiuns passam a ser o centro das atenções, e os espíritos do além, mesmo hipoteticamente, deixam de ser os emissores das mensagens espirituais, reduzindo-se a meros canais para o proselitismo religioso, a ponto de muitos espíritos falecidos nem de longe serem os verdadeiros responsáveis pelas mensagens atribuídas a eles pelos ditos médiuns.

Os espetáculos "espíritas" acabam se nivelando ao entretenimento das "mesas giratórias", e toda sorte de fraude é feita porque os "médiuns" brasileiros não se dispõem de concentração nem de dedicação suficientes para assimilar as manifestações espirituais supostamente atribuídas.

Na mediunidade, mesmo astros como Divaldo Franco, Chico Xavier e José Medrado só exercem mediunidade, quando muito, através de contatos intuitivos com seus "mentores", respectivamente os católicos Joanna de Angelis, Emmanuel e frei Carlos Murion. Mas não têm forças suficientes para se concentrarem e assimilarem as manifestações espirituais sobre eles atribuídas.

Isso é praxe. E os supostos médiuns, como não podem dizer para o público "Ih, deu branco!", preferem distorcer e fingir que receberam espíritos. Criam trabalhos duvidosos de psicografia, psicofonia e psicopictografia, e dissimulam esses trabalhos grotescos com pregação religiosa, porque basta ser "mensagem de amor" para ser aceita assim de bandeja.

Só que a lógica dos fatos mostra que o amor não pode se sobrepor à coerência, ao discernimento nem às leis físicas e psicológicas que vemos na realidade. A religião não pode ser um refúgio do surrealismo e da alucinação, um exílio confortável no qual ocorrências absurdas são aceitas e legitimadas em prol do "mistério da fé e do amor".

Isso não existe. Se a religião vai contra a lógica, a coerência e a transparência, ela produz efeitos negativos como qualquer fenômeno que vai contra a lógica, a coerência e a transparência. Nenhum ilusionismo pode ser considerado verídico a pretexto de "amor e caridade".

Enquanto toda essa pregação "amorosa" tenta justificar esses fenômenos aberrantes como "autênticos", os espíritos do além evocados pelos astros do "espiritismo" brasileiro se afastam, envergonhados pelo uso leviano de seus nomes.

Humberto de Campos, por exemplo, nunca esteve com Chico Xavier, como tantos outros espíritos do além nunca estariam com os médiuns que alardeiam suas presenças e supostas contribuições. Todos eles estão muito longe desses médiuns, muito longe mesmo e talvez já reencarnados no momento em que suas supostas mensagens espirituais são produzidas.

De Pierre-Auguste Renoir a Raul Seixas, de Augusto dos Anjos a Renato Russo, passando por Marilyn Monroe e pelo próprio Allan Kardec, além de Deodoro da Fonseca, José do Patrocínio, Ayrton Senna, ou mesmo o roqueiro Chorão, ninguém deles fez contato algum com qualquer médium, ao menos nessas mensagens que são divulgadas.

Isso é seguro porque, se eles estabelecem contatos com gente da Terra - isso quando não foram para a reencarnação - , não é por esse contato tendencioso feito tão somente para divulgar pregações religiosas dentro da mesma ladainha de "sofri no umbral, fui para a colônia espiritual e reencontrei a luz".

Se existem contatos de gente do além com gente na Terra, eles provavelmente seriam como duas pessoas encarnadas. As mesmas conversas, os mesmos interesses. Mas isso ainda é um mistério a ser desvendado cientificamente, num processo de pesquisa e raciocínio que os "espíritas" da FEB se recusaram a assumir, mesmo quando fingem que apoiam, não sem pedantismo ou tendenciosismo.

Até lá, os espíritos do além continuarão esperando, muito longe do estrelismo dos anti-médiuns brasileiros, uma verdadeira oportunidade de se manifestarem verdadeiramente para nós.

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