sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Sobre a fraude da suposta pintura mediúnica atribuída a Portinari

À ESQUERDA, O QUADRO ORIGINAL DE PORTINARI. À DIREITA, SUA SUPOSTA PINTURA ESPIRITUAL, QUE MOSTRA CLAROS INDÍCIOS DE FRAUDE.

A repercussão da denúncia de que a pintura São Francisco de Assis, atribuída ao espírito de Cândido Portinari (1903-1962) pelo anti-médium José Medrado, teria sido uma fraude, é bem menor do que se esperava, apesar dos fortes indícios de falsificação.

É lamentável, porque observando as duas pinturas, o original (à esquerda) e o "espiritual" (ou falsificado), à direita, constata-se que em nenhum momento há verossimilhança entre uma pintura e outra, e a suposta pintura "espiritual" destoa claramente do estilo de Portinari, como se nota no quadro original, feito em 1941.

Fraudes nos meios ditos "espíritas" são feitas impunemente, porque o pretexto da espiritualidade indica uma motivação sobrenatural que cala muitas pessoas, talvez por intimidação. É aquele medo do fantasma aparecer e assombrar as pessoas, dizer "bu" e tudo o mais.

Aí, surgem pessoas, mesmo alguns especialistas ou até juristas, que legitimam essas obras fraudulentas como sendo de "autores espirituais" pela vaga noção que os faz crer que essas obras se parecem com o que foi produzido em vida.

Em muitos casos, parecem, sim. Mas a intenção da fraude, do pastiche, da imitação é mesmo de parecer com o original. Em dado momento, existe essa semelhança. Mas chega um ponto em que essa semelhança cessa, e aí que se nota o aspecto de falsificação.

Todavia, tanto a questão do sobrenatural quanto a motivação supostamente caridosa ou amorosa intimidam análises mais cautelosas porém mais questionadoras. Em nome da fé e do amor, ou pelo temor das reações "do outro lado", se legitimam fraudes como se elas fossem autênticas.

ATÉ A ASSINATURA MOSTRA QUE A OBRA NÃO É DE PORTINARI. A ASSINATURA ORIGINAL DO QUADRO AQUI EXIBIDO (COM A DATA DE 1941) ESTÁ ACIMA, NESTA IMAGEM. A DA PINTURA FRAUDULENTA (COM O CRÉDITO DE DATA "14", DE 2014), ESTÁ ABAIXO.

Nas redes sociais, uma conhecida comunidade que debate com seriedade a Doutrina Espírita e as irregularidades cometidas no Brasil teve colocada uma postagem a respeito da fraude constatada nessa pintura do suposto espírito de Portinari. Mesmo dentro de um espaço de discussão sério da doutrina, a constatação de fraude mesmo assim causou polêmica.

Uma internauta chegou a sugerir que o quadro saiu "diferente" porque foi pintado no escuro, do contrário do quadro original, que foi produzido sob a luz clara. Só que essa hipótese não procede, sob os seguintes motivos:

1) O espírito desencarnado não tem os limites de luminosidade que encontra na vida material. Ele consegue enxergar no escuro da mesma forma que enxerga sob a luz. Ele não teria se "atrapalhado" para fazer uma pintura num ambiente de pouca luz, como aparentemente eram feitas as pinturas de José Medrado.

2) Mesmo se considerarmos a hipótese de que as "almas do além" sofressem, sem o corpo físico, as mesmas limitações de percepção da luz que sentiam na vida material, mesmo assim o estilo pessoal sobressairia, porque ele teria que se sobressair de qualquer maneira, mesmo manifesto por diferentes médiuns. Afinal, é a marca pessoal de cada indivíduo, não há como escapar disso.

Não existe essa desculpa de que o pintor fez diferente porque estava escuro. Imagine você, leitor, desenhando alguma coisa sobre um papel. Na luz acesa ou na escuridão, você iria desenhar da mesma forma, apenas se atrapalhando no caso do escuro.

Mesmo assim, sua marca pessoal teria que aparecer, seu estilo, sua maneira de desenhar, a visão comprometida pela escuridão não anula seus traços pessoais, por mais que o resultado seja mais desastroso do que aquele feito às claras.

Analisamos os dois quadros, as assinaturas e fizemos uma pesquisa rigorosa confrontando detalhes nos traços, na forma como os pincéis passaram pelos quadros, a distribuição de cores e outros aspectos. Tivemos que constatar, após análise cautelosa, que o quadro de José Medrado é fraudulento, uma farsa, porque nada tem a ver com o estilo original de Portinari.

Para piorar, José Medrado exibia o quadro como troféu em seu programa televisivo, Visão Social, transmitido em Salvador. Isso quando vemos que o cabelo, o rosto, a batina, e mesmo a forma com que aparecem as cores e o tracejado destoam completamente do estilo do original, e só mesmo a ignorância dos "espíritas" para deixar se autenticar uma fraude como essa.

Mesmo um especialista pouco dedicado de artes plásticas pode identificar com facilidade o aspecto fraudulento. Medrado não conseguiu fazer uma imitação verossímil nem sutil de Portinari. A fraude é tão grotesca que nota-se as diferenças gritantes, comparando um quadro com o outro.

Portanto, está fora de lógica acreditar que o espírito do pintor se esqueceu de seu próprio estilo porque foi tomado pela "energia do amor" e pela "universalidade da linguagem". Essas desculpas parecem lindas, mas permitem todo tipo de mentira e fraude. Ter fé, em si, não é um mal e pode ser até benéfica, mas submetê-la ao consentimento da mentira é que se torna nocivo para as pessoas.

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