domingo, 14 de fevereiro de 2016

C.U.E.E. nunca aprovaria "mediunidade" brasileira


Da forma como é feita a "mediunidade" brasileira, é quase sempre uma bagunça. Mensagens apócrifas que refletem apenas o estilo do "médium", e que apenas "valem" pelas "palavras de amor" transmitidas. Técnicas de manipulação de linguagem como a "leitura fria", que os chamados "auxílios fraternos" dos "centros espíritas" fazem para colher informações sutis de cada falecido e seus relacionados, também permitem a verossimilhança de muitas dessas mensagens.

Quando se tratam de personalidades famosas, a bagunça se torna mais notória. Surgem "médiuns" que se tornam "donos" de cada morto de ocasião. É como se cada um destes supostos médiuns tivessem um "morto de estimação", e representassem os respectivos falecidos através de uma suposta missão de divulgar as "mensagens fraternais do além-túmulo".

Tomados pela emotividade extrema garantida pela fé cega - que, se dizendo "raciocinada", é ainda mais cega por crer numa racionalidade que não existe - , os "espíritas" não verificam as irregularidades. Basta uma mensagem começar como "querida mamãe" e, pronto, é "autêntica psicografia". A pieguice que uma doutrina igrejista como o "espiritismo" brasileiro produz é assustadora, e o êxito em seduzir e manipular corações e mentes é mais espantoso ainda.

Só que, prestando muita atenção, o "espiritismo" brasileiro é uma das poucas doutrinas, talvez a única, que não segue seu precursor. Que há deturpações no marxismo - vide a corrente stalinista da antiga União Soviética, por exemplo - , do pragmatismo de Charles Peirce e no pensamento liberal humanista dos iluministas franceses, isso é notório. Mas o "espiritismo" chega a ser pior, exagerando na dose de sua deturpação.

Afinal, as outras ideologias - exceto o stalinismo - exercem alguma proximidade com seus precursores, algum vínculo ideológico, por menor que seja. Mais próximo do nível de deturpação do "espiritismo" brasileiro está o stalinismo, porque ele deturpou cruelmente o pensamento de Karl Marx ao transformar a sociedade socialista numa ditadura militaresca, estatista e opressora.

E por que o "espiritismo" não segue Allan Kardec? Porque, com tantas alegações tendenciosas de "fidelidade absoluta" ao pedagogo francês, os "espíritas" cometem procedimentos e trabalham ideias que são claramente reprovadas por Allan Kardec, o que se observa de maneira explícita nos livros e artigos que ele publicou ao longo de sua vida.

Um dos sistemas que ele elaborou foi o Conselho Universal dos Ensinos dos Espíritos. Era uma forma da coerência das pesquisas kardecianas não se perderem com o falecimento do Codificador, estabelecendo um roteiro muito cuidadoso para analisar supostas comunicações espirituais.

Segundo o C. U. E. E., uma mensagem espiritual só pode ter sua autenticidade tida como provável - Kardec achava praticamente impossível atribuir veracidade absoluta a uma mensagem espiritual, considerando-a, no máximo, sua probabilidade - se for divulgada por diferentes médiuns que vivem distantes entre si e não tenham qualquer vínculo, mesmo indireto, entre eles.

Mas isso é só começo de conversa. Afinal, Kardec recomendava cautela quanto ao conteúdo de cada mensagem, aconselhando comparar cada uma com a personalidade do falecido e outras informações a ele relacionadas. A cautela também se dava em relação às mensagens em si, e todo o procedimento é feito para evitar qualquer tipo de contradição em relação à natureza pessoal do falecido.

Infelizmente, não é isso que acontece no Brasil. Publica-se qualquer coisa, e, como "palavras de amor" e "mensagens positivas" são transmitidas, todo mundo aceita. Os "centros espíritas" criam até uma encenação, ilustrando as mensagens com fotos de crianças sorridentes ou com fundos musicais piegas, para estimular a emotividade.

Daí que surgem "médiuns" que se dizem "especializados" por cada morto. Há até mesmo acordos de exclusividade entre os supostos médiuns, para um não evocar a personalidade assumida por outro. Isso contraria o C.U.E.E. por não admitir a autonomia de um espírito nem o processo necessário de um espírito se manifestar em diferentes fontes para permitir análise sobre o conteúdo de cada mensagem.

Só que essas "mensagens de amor e paz" desobedecem, de maneira chocante para muitos, as recomendações de Allan Kardec e de seu C. U. E. E.. Primeiro, porque não há qualquer tipo de verificação, muito pelo contrário. O menor questionamento de veracidade irrita muitos "espíritas" e os faz alegarem "falta de fé", "intolerância religiosa" ou até "desrespeito ao médium, que se dedica ao trabalho do bem".

No caso dos "donos dos mortos", nota-se que isso contraria frontalmente o Conselho Universal, por consistir num único indivíduo que se diz médium representar um determinado falecido. Desta maneira, não se pode testar diferentes manifestações espirituais, porque só "existe uma", a do "médium" oficial, o que trai a função originalmente intermediária que deveria ser a do médium.

No Brasil, médium é o centro das atenções, não tem função intermediária. Logo, não é médium, porque não serve de "meio", não é o "canal" de um processo comunicativo entre um falecido (emissor) e um encarnado (receptor). Em muitos casos, o "médium" é o emissor da mensagem, e o falecido torna-se o "canal" simbólico para personificar os apelos religiosos da suposta mensagem espiritual.

Em muitos aspectos, a suposta mensagem espiritual destoa da natureza pessoal do falecido. E aí as pessoas não conseguem entender. Afinal, poucos sabem que a veracidade não se verifica tão somente pelas semelhanças, mas pelas diferenças que possam destoar algum aspecto pessoal.

Se uma mensagem supostamente espiritual apresentar dez semelhanças e mostrar até dados sutis que condizem com a vida pessoal do falecido, se uma única diferença for notada que contradiga um outro aspecto pessoal qualquer, a veracidade é derrubada e não há "querida mamãe" nem "vamos nos unir na paz em Cristo" que possam salvar de forma alguma.

É isso que complica as coisas. Mas os "espíritas" brasileiros continuam presos na cegueira da emotividade religiosa e isso prejudica a real compreensão da coisa. Levam gato por lebre e aceitam tudo porque "é tão lindo", como no comercial do celular. São enganados sem saber e, por isso, são prejudicados com a exploração leviana que os "médiuns" brasileiros, mesmo os mais "tarimbados", fazem dos falecidos.

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