quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Idosos têm mais dificuldade para se desiludir de seus ídolos do que os jovens

JOVENS SÃO OS QUE MELHOR ACEITAM A DESILUSÃO DIANTE DE ANTIGOS ÍDOLOS, COMO O ANTIGO ESQUERDISTA ANTÔNIO PALOCCI.

Uma discussão familiar foi marcada por uma polêmica em que uma mãe expressava sua devoção a Madre Teresa de Calcutá e o questionamento do filho, que revelou as denúncias de que ela teria deixado seus alojados em condições sub-humanas.

Deu-se uma discussão séria, na qual os pais ficaram profundamente irritados com os relatos do filho, alegando que ele foi "manipulado" por "textos da Internet" (mentiras como as páginas de fake news e de teorias conspiratórias) e que a mãe tinha "liberdade" de acreditar no ídolo religioso que quiser.

As convicções religiosas de idosos em relação a certas "vacas sagradas" da fé extremada e da pretensa caridade, como Madre Teresa, Francisco Cândido Xavier e Divaldo Franco, são tão ferrenhas que nem se Jesus de Nazaré voltasse, com o traje de sua época, para dar os mesmos alertas, seria ouvido ou aceito em suas advertências.

É muito mais fácil dizer para uma criança que Papai Noel não existe do que alertar aos mais velhos que as supostas psicografias de Chico Xavier são fakes. Isso pode parecer surreal, uma vez que os mais velhos parecem mais realistas e as crianças, ou os mais jovens, mais inclinados à fantasia.

Mas a verdade é que a consolidação de ideias e valores sociais, que existe nos mais velhos, faz com que totens e paradigmas se tornem fixos, permanentes e quase inflexíveis. Nas crianças, há valores em formação, assim como nos jovens, o que faz com que eles estivessem mais preparados para abrir mão de ilusões e aceitar melhor a decepção diante de tantos ídolos caídos.

Na louca intolerância de pessoas conservadoras, os mais velhos ficam perguntando, diante da denúncia de irregularidades relacionadas a ídolos políticos, lúdicos ou religiosos. Ficam perguntando, em desesperada irritação: "Quem foi que lhe disse isso? Quem publicou a denúncia?", mas quando se busca responder de forma adequada, os mais velhos, mesmo assim, acham a resposta mentirosa. A denúncia pode vir, por exemplo, de um Nobel da Paz, que não dariam ouvidos de jeito algum.

E olha que são poucos os ídolos religiosos abertamente denunciados, se comparados com os ídolos que caem diariamente do imaginário dos mais jovens. O Rock Brasileiro, por exemplo, tem um considerável elenco de antigos ídolos que causaram muita decepção, como Lobão, Roger Moreira, Dinho Ouro Preto e Samuel Rosa, que manifestaram posições políticas lamentáveis.

Muitos atores de televisão e da música brasileira, antes totens inabaláveis entre os fãs de relativa pouca idade - jovens adultos, diga-se de passagem - decepcionam seus próprios admiradores, que até se acostumam com as sucessivas frustrações de seus antigos "heróis".

A naturalidade da frustração dos mais jovens com seus ídolos inspira até mesmo o mercado de quadrinhos, em que há até mesmo o episódio em que Batman e Superman, antes inabaláveis amigos e aliados na Liga da Justiça, se tornam inimigos mortais.

Entre os mais velhos, porém, o que se vê é, ironicamente, uma adoração digna de contos de fadas a ídolos religiosos como Madre Teresa e Chico Xavier, associados a um aparato de palavras lindas e imagens agradáveis, além da imagem divinizada construída habilidosamente pela grande mídia, mas que evoca sempre sensações agradáveis e confortáveis que deixam os mais velhos tão emocionalmente envolvidos que se enfurecem diante do menor questionamento.

Eles reagem querendo perguntar quais as fontes de denúncias de escândalos, e duvidam de sua veracidade. Mesmo quando, no famoso caso do escritor Humberto de Campos, as obras "psicográficas" não batem, em estilo e linguagem, com o acervo original deixado pelo autor maranhense, os mais velhos se irritam com tal constatação e chegam a reagir com perguntas absurdas como "e se o escritor tivesse decidido mudar de estilo depois de morrer?".

A ironia disso tudo é que os mais jovens são expostos a visões e abordagens fantasiosas, mas aceitam com naturalidade realista a desilusão com seus ídolos. Os mais velhos, expostos a visões a abordagens mais realistas e objetivas, são os que mais resistem à desilusão, mantendo, de maneira preocupantemente persistente, a idolatria em dimensões fabulosas aos seus mitos.

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