domingo, 24 de agosto de 2014

Getúlio Vargas também foi usado em proselitismo religioso. Junto a Eça de Queiroz!!


O panfletarismo religioso do Espiritolicismo tornou-se uma indústria em que nomes ilustres são utilizados para divulgar as mesmas "palavras de amor", apoiadas no mesmo dramalhão que envolve sofrimento espiritual, assistência dos amigos do além e redescoberta da religiosidade.

A impressão que se tem é que o mundo espiritual é uma grande igreja e não podemos sequer ter outros prazeres na vida, ou, quando muito, eles estão em segundo plano. Simbolicamente falando, os espíritos do além se reduziram a meros propagandistas da religião "espírita", dentro dos clichês aqui há muito conhecidos.

Há 60 anos o então presidente da República, o gaúcho Getúlio Vargas, de 71 anos, havia se matado com um tiro no coração, enquanto parecia se preparar para dormir no Palácio do Catete. Era uma reação à violenta campanha contra ele, agravada quando seu segurança, Gregório Fortunato, foi acusado de mandar matar o maior opositor, o jornalista Carlos Lacerda.

Carlos Lacerda não morreu no atentado ocorrido 18 dias antes, mas seu segurança, o major da Aeronáutica Rubens Florentino Vaz, foi morto com um tiro ao tentar conter um pistoleiro que iria matar o jornalista e político udenista.

A morte de Vaz só fez as Forças Armadas se revoltarem contra Vargas, criando até mesmo uma comissão paralela para investigar o crime, chamada de "República do Galeão", já que os oficiais se reuniam no famoso aeroporto, o atual Aeroporto Internacional Tom Jobim.

Aí, conhece-se a história toda. Mas o Espiritolicismo tentou criar uma "nova história", trazendo a suposta vida espiritual do político nacionalista, com direito até a uma adaptação, meio "engraçadinha" da frase "Saio da vida para entrar na História", contida no testamento de Vargas. O "espírito" de Getúlio passou então a dizer "Volto da História para ensinar a vida".

GETÚLIO E EÇA NUMA MESMA CILADA

É conhecido nos meios ditos "espíritas" o livro Getúlio Vargas: Em Dois Mundos, de 1998, que a médium espiritólica Wanda A. Canutti (1932-2004) lançou sob a autoria atribuída ao escritor português Eça de Queiroz, que teria aparecido por "psicofonia", embora não se tenha conhecimento de uma gravação sonora da voz do escritor, em tecnologia então recente e em quase todo indisponível.

O livro tem uma escrita correta, mas não parece ter o diferencial necessário para ser uma obra do mesmo autor de O Primo Basílio. Muito pelo contrário. Só pela parte que relata toda a trajetória conhecida de Getúlio Vargas, até o momento do tiro fatal, mais parece um daqueles textos de História que aparecem em apostilas para o ENEM. Correto, mas nada surpreendente.

O que pesa, porém, é quando se entra na fase "espiritual". É aí que a coisa pega. A influência de Nosso Lar, que Chico Xavier lançou sob autoria do misterioso André Luiz (que, tudo indica, é alter ego de Waldo Vieira), é notória nessa fase em que a narrativa mais parece um novelão de segunda categoria do que mais um clássico literário do autor português.

O dramalhão começa com o suposto Getúlio entrando numa colônia espiritual, acolhido primeiro por "irmão" Fulgêncio e depois por "irmã" Darcy. Depois vem "irmã" Cíntia e "irmão" José. Herança católica esse título de "irmão" ou "irmã". A narrativa é maçante logo na primeira vista, sem a movimentação de ações e personagens da obra de Eça.

A linguagem também não tem diferencial, por ser apenas um agrupamento de palavras corretas. Mas nota-se o tédio da narrativa pachorrenta, que perde muito tempo na pregação religiosa dos diálogos frios e entediantes, nos "problemas morais" do Espírito, nas angústias, na "necessidade" do resgate espiritual e outras baboseiras.

Há a citação, de cunho materialista, de vários aspectos da Colônia. Há a paisagem da Natureza, há a Biblioteca, há todos aqueles clichês de serviço assistencial, de evocação à fraternidade, à caridade etc etc etc. Mas não existem os tipos psicológicos caraterísticos da distinta obra que Eça de Queiroz produziu em vida.

A narrativa também não apresenta uma linguagem diferenciada como dos grandes escritores do século XIX. Mais parece uma narrativa superficial, em que apenas há a pregação religiosa, em que um "atormentado" Getúlio é socorrido por pessoas de um temperamento friamente bondoso, mais parecendo a bondade como técnica do que como uma generosidade espontaneamente dada.

A obra praticamente não tem ação. A autora perde tempo colocando no papel diálogos que mais parecem pregações religiosas, algo que ela já fazia em suas palestras e depoimentos. Uma narrativa monótona que, logo de cara, não tem o estilo de Eça, não há tipos psicológicos caraterísticos da literatura de seu tempo e os diálogos se limitam a um panfletarismo religioso.

A obra não passa de um grande oportunismo literário, usando os nomes de Getúlio Vargas e Eça de Queiroz para promover sensacionalismo dentro de uma história que mais parece ficção, e que nem de longe condiz ao estilo pessoal de Eça, um dos maiores escritores da língua portuguesa de todos os tempos.

Getúlio Vargas: Em Dois Mundos, portanto, nada tem de grande obra literária. O livro é extremamente ruim para ser realmente de Eça de Queiroz. Bastante cansativo, piegas, monótono. Não por acaso, o livro só repercutiu nos meios espiritólicos, porque soa duvidoso demais para repercutir positivamente além de seus limites. Os fãs de Eça iriam estranhar esse livro logo de cara.

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