sábado, 30 de setembro de 2017

O médico Leonid Rogozov foi muito mais digno que o "médium" João de Deus


"Barbeiro corta o próprio cabelo?", perguntou, cinicamente, o "médium" João Teixeira de Faria, o João de Deus, o mais novo "sacerdote da Rede Globo" e o terceiro, depois de Chico Xavier e Divaldo Franco, a receber o culto à personalidade blindado pela poderosa corporação midiática e associado a um conceito de "bondade" mais apropriado para dramalhões de novela.

A pergunta se refere ao fato do "médium" - que muitos consideram ter dado o "beijo da morte" à ex-primeira-dama Marisa Letícia Lula da Silva, já que João de Deus é latifundiário e protegido da mídia reacionária - ter recorrido aos cirurgiões de um hospital de São Paulo para curar-se de um tumor, em vez dele mesmo realizar uma autocirurgia.

A declaração de João de Deus contraria sua imagem "santificada" de terceiro "médium" blindado, símbolo da pretensa meiguice promovida pelo discurso midiático-religioso e que pega muita gente boa desprevenida, diante de um "espiritismo" que vive de mitomania e dissimulação com maior intensidade desde os anos 1970, quando os "espíritas" passaram a bajular Kardec, se dizerem "fiéis aos postulados espíritas originais" mas praticarem o igrejismo roustanguista.

Pois a História registra a trajetória do médico russo Leonid Rogozov, o "barbeiro que resolveu cortar o próprio cabelo" num momento de grande dificuldade. Aos 27 anos, em 1961, ele descobriu sofrer de uma grave apendicite quando sua equipe trabalhava na Antártida.

Rogozov não poderia viajar de avião, sob risco de sofrer choque de temperatura e morrer durante a viagem. Mas também não tinha cirurgiões de plantão, a não ser ele mesmo. Ele, então, resolveu recorrer apenas a dois assistentes: um para segurar o espelho, e outro para fornecer os equipamentos, enquanto o próprio Rogozov, com paciência surpreendente, realizou sua própria cirurgia.

A cirurgia, em circunstâncias muito mais difíceis, complicadas e arriscadas, foi bem sucedida. Não havia sequer garantia de êxito, pois o ambiente era muito frio e o estágio da doença estava avançado. Mas tudo deu certo e Rogozov só morreu em 2000, com os efeitos naturais da velhice, aos 76 anos.

Já João de Deus, mundialmente conhecido - seus fãs estrangeiros até o apelidam de "John of God" - , tinha a sua aparente grandeza e as condições favoráveis para fazer autocirurgia. Poderia mesmo usar sua fé para retirar seu próprio tumor, usando de instrumentos que diz utilizar para operar outras pessoas. Poderia até sair divinizado com isso. E poderia até ter evocado o próprio espírito de Rogozov!

Mas isso revela a farsa que é o "espiritismo" brasileiro e seus "médiuns" idolatrados como se fossem mocinhos de novela da Rede Globo. Ainda se vai analisar as supostas cirurgias espirituais e seus efeitos placebos - desconfia-se que os "médiuns" não curam, mas a autocura de pessoas esperançosas, que poderiam ter outras crendices que o efeito seria o mesmo - e fatos estranhos como o fato de cirurgias não curarem as paralisias dos movimentos de braços e pernas.

Infelizmente, as atividades "mediúnicas" são irregulares e até mais corrompidas do que se atribui às políticas do Partido dos Trabalhadores pela mesma mídia que endeusa os "médiuns espíritas". Psicografias fake, pinturas falsas e supostas psicofonias que mais parecem imitações de stand up comedy.

E isso com supostas cirurgias sem métodos nem efeitos confiáveis, feitas ao arrepio da Ciência como se a fé pudesse criar, para si, uma "ciência paralela". Não pode. Somos seres humanos e não podemos aceitar que haja uma realidade que sobrevivesse alheia à nossa capacidade de raciocinar, criando um terreno do surreal e do absurdo atribuído ao sobrenatural, mesmo sob as mais deslumbradas alegações próprias da fascinação religiosa.

Portanto, o exemplo de Leonid Rogozov tornou-se mil vezes mais digno e corajoso do que o do festejado João de Deus. E isso mostra que é fora das paixões religiosas que se encontram exemplos que são bem mais humanistas do que o falso humanismo apaixonado atribuído aos ídolos religiosos tomados de pleno culto à personalidade.

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