quinta-feira, 20 de novembro de 2014
Celebridades e a idolatria a Chico Xavier
Uma amostra de que o religiosismo do "espiritismo" brasileiro jogou para o escanteio as teses racionais de Allan Kardec, pondo em seu lugar a idolatria piegas a Chico Xavier, está na reportagem que a revista Minha Novela fez para o filme Chico Xavier, dirigido por Daniel Filho, na edição de 16 de abril de 2010, ano de lançamento do filme.
A reportagem entrevista várias celebridades, quase todas bastante conhecidas, e mostra seus clichês de "superioridade espiritual" do anti-médium mineiro, além de explorar a glamourização do sofrimento, e os estereótipos de humildade e caridade bastante conhecidos.
Atores e atrizes que se deixam levar pela mitologia de Xavier, contagiadas pelo próprio clima de melodrama, de ficção, de fantasia, que cerca uma figura não muito confiável, mas cuja "confiabilidade" se garante com a reunião de clichês relativos à pobreza, velhice, bondade e pela dicotomia ignorância / sabedoria.
Os próprios famosos se rendem, portanto, a essa imagem novelesca e folhetinesca do caipira que escreve frases dóceis e que está vinculado a tradições religiosas que fazem bater os corações ainda muito conservadores de muitas celebridades, que à primeira vista parecem "modernas", mas estão ainda presas a valores retrógrados prevalecentes no nosso país.
Mal sabem os famosos das inúmeras e gravíssimas irregularidades que o "movimento espírita" apresenta. E, não sabendo, fica pior ainda, porque os famosos são os primeiros a inspirarem as pessoas comuns a aderirem a essa forma deturpada da Doutrina Espírita, pela própria influência que atores e atrizes têm como formadores de opinião, de gostos e de crenças pelo grande público.
Da Doutrina Espírita, o "movimento espírita" brasileiro que até hoje tem Chico Xavier, mesmo falecido há mais de dez anos, o seu maior propagandista, só se aproveitou a consciência da vida espiritual e da reencarnação, mas na essência NADA foi aproveitado do professor lionês.
Mesmo assim, como se vê na reportagem, o "espiritismo" aparece na forma asséptica, posterior aos escândalos do roustanguismo explícito, seguindo a atual orientação de um "roustanguismo light com Kardec", em que personagens polêmicos dos dois lados, como Jean-Baptiste Roustaing (espiritólico) e Afonso Torteroli (anti-espiritólico) e Amauri Pena (que denunciou fraudes de Chico Xavier) foram ocultados.
Daí a "abordagem" pura que se nota na pequena biografia de Chico Xavier publicada pela revista, no box localizado no canto direito da segunda página. Alguns trechos são notórios dessa linha "pura" do "movimento espírita" e seu "roustanguismo light com Kardec e sem Roustaing". Diz uma parte selecionada deste texto:
"Nascido de uma família pobre em Pedro Leopoldo (MG), Francisco de Paula Cândido foi educado na igreja católica e teve seu primeiro contato com a doutrina espírita em 1927, após fenômeno obsessivo verificado com uma de suas irmãs. A partir daí, passa a desenvolver sua mediunidade, que, como relata em nota no livro Parnaso de Além-Túmulo, somente ganhou maior clareza em finais de 1931. O seu nome de batismo foi dado em homenagem ao santo do dia de seu nascimento, São Francisco de Paula, substituído pelo nome paterno de Francisco Cândido Xavier logo que rompeu com o catolicismo. O mais conhecido médium brasileiro contribuiu para expandir a religião e encorajar os espíritas a revelarem sua adesão à doutrina sistematizada por Allan Kardec. Sua credibilidade serviu de incentivo para que médiuns espíritas e não espíritas realizassem trabalhos abertos ao público. Chico é lembrado por suas obras assistenciais em Uberaba (MG), cidade onde faleceu".
Nele há os notórios clichês de religiosidade, humildade e caridade, além da apresentação da "doutrina espírita" brasileira como algo higienizado das polêmicas dos dois lados, mesmo aquelas que defendia com veemência o religiosismo típico dos "espíritas" brasileiros.
Um aspecto típico dessa manobra é apenas a dicotomia feita entre o "espiritismo" brasileiro e o catolicismo (no caso, o mais ortodoxo), conforme foi escrito pelo redator da revista, sobre a "ruptura" de Chico Xavier com o catolicismo que, sabemos, não foi total e nem mexeu na sua essência, já que o próprio Chico ainda se demonstrava católico em 1971, ano de sua famosa entrevista no programa Pinga-Fogo, da TV Tupi de São Paulo.
Além disso, há uma citação superficial de Allan Kardec, mas, como sabemos aqui, na prática, ele foi completamente desprezado pelo chiquismo, já que, conforme o saudoso analista espírita José Manoel Barbosa disse, Chico Xavier nasceu, viveu e morreu sem entender coisa alguma da Doutrina Espírita. Se Chico foi analfabeto de alguma coisa, ele foi analfabeto do kardecismo.
Há também a citação ligeira do primeiro trabalho, Parnaso de Além-Túmulo, que, sabemos, não foi o trabalho autêntico de mediunidade que tanto se diz. O livro já é estranho por ser uma "mensagem acabada" de "lições amorosas" que teve que ser reparada cinco vezes em pouco mais de duas décadas, o que mostra uma falta de firmeza de Chico Xavier, provada em produção de um livro.
Xavier não teve as menores condições de ser líder, seja errando de propósito ou não. Sua falta de firmeza não pode ser confundida com humildade. Suas hesitações não podem ser confundidas com adaptações às mudanças do tempo. Sua ignorância em relação à Doutrina Espírita não pode ser confundida com originalidade.
Daí que Chico falhou gravemente na condução da Doutrina Espírita no Brasil. Representou os interesses roustanguistas com gosto, com alegre submissão. Usou de seu carisma para popularizar as violentas deturpações da doutrina de Allan Kardec, e fez uma série de bobagens religiosas e moralistas serem vinculadas erroneamente às lições do professor francês.
Por isso, se Chico Xavier errou, o fez da pior forma possível. Os fatos comprovam. E, na essência, Chico Xavier nunca rompeu com o catolicismo, mas tão somente com correntes mais ortodoxas. Seus adeptos e seguidores, de uma forma ou de outra, acabam comprovando isso, mesmo sem assumir no discurso essa influência católica que lhes é perene.
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