HUMBERTO DE CAMPOS E ITAMAR ASSUMPÇÃO - Dois nomes diferentes da cultura brasileira, mas cujo prestígio é usurpado de forma oportunista por outrem.
É verdade que o "espiritismo" brasileiro tem como principal habilidade a apropriação indébita do prestígio de personalidades falecidas, pegando carona nelas e distorcendo até mesmo seu legado em prol de interesses escusos e oportunistas.
Sabe-se o exemplo de Humberto de Campos, usurpado pela imaginação fértil de Chico Xavier e sua plêiade de espíritos zombeteiros, que imitaram falecidos intelectuais e artistas, de forma bastante medíocre, orientados pelo único "ilustre" admissível, o antigo Padre Manoel da Nóbrega, já que seu codinome Emmanuel mostra uma personalidade realmente idêntica à do padre jesuíta.
Herdeiros do finado escritor e acadêmico tentaram processar Xavier contestando a autenticidade da autoria, verificada pelo advogado que observou que os escritos do "espírito" eram inferiores e até risíveis em relação ao que Humberto havia sido em vida.
A apropriação indébita envolveu de Olavo Bilac a Casimiro de Abreu, passando, através de outros médiuns, por Raul Seixas, Noel Rosa, Juscelino Kubitschek, Eça de Queiroz, Santos Dumont e até Marilyn Monroe, todos a serviço de um moralismo panfletário, místico e falsamente fraternal.
Só que mesmo intelectuais fora do "espiritismo à brasileira" se apropriam desse prestígio. Temos uma intelectualidade cultural brasileira, influente nos seus meios e dominante nos redutos acadêmicos e midiáticos, que aposta na degradação cultural brasileira sob o pretexto do "reconhecimento da diversidade cultural de nosso país".
São jornalistas, historiadores, cineastas, antropólogos, sociólogos e artistas que acham que o melhor é transformar o Brasil num território cercado de breguice por todos os lados, com as classes populares mergulhadas no subemprego, no alcoolismo, na mediocrização artístico-cultural e na degradação de valores morais.
Eles, com o mesmo prestígio duvidoso mas tido como "unânime" e "inabalável" que Chico Xavier, também fazem a "arte" de se apropriarem do prestígio de personalidades falecidas, distorcendo, em causa própria, o legado e os pontos de vista de artistas e intelectuais falecidos.
Por exemplo, para defender o "funk", ritmo musical marcado pela imbecilização sócio-cultural e pela apologia à miséria, à ignorância e à imoralidade, os intelectuais mais badalados chegam a recorrer a intelectuais falecidos há mais de 50 anos, ou até vários séculos antes, para a defesa desse ritmo que trabalha uma imagem caricata das populações pobres.
Se, por exemplo, há muita baixaria no "funk", os intelectuais badalados recorrem à Gregório de Mattos, poeta do século XVI, para "explicar" os "valores" defendidos pelo ritmo popularesco. Se o "funk" é muito americanizado, recorrem à "antropofagia" de Oswald de Andrade.
Para defender o "funk", o brega e outras mediocridades, os intelectuais recorreram a tantos nomes que variam de Malcolm McLaren, o artífice do punk rock, até Antônio Conselheiro, o profeta militante da Revolta de Canudos. Até Itamar Assumpção, nome da MPB alternativa, também foi usado para "defender" a bregalização do país.
Daí que tem o mesmo sentido ultrajante, hipócrita e usurpador um médium usar o nome de Raul Seixas para defender um misticismo debiloide que o cantor baiano nunca teve e que encerrou a vida despido do antigo misticismo que havia tido antes, como artistas de "sertanejo" e axé-music - gêneros que Raulzito odiava - pegarem carona em pretensas homenagens ao artista.
Os intelectuais distorcem conceitos, posturas, atitudes, e houve o caso de Adriana Calcanhoto dizer que o poeta Vinícius de Moraes apoiaria o "funk", o que seria um absurdo. O mesmo Vinícius que a mente de Chico Xavier nunca permitiria "psicografar" poemas românticos e sensuais que o poeta carioca costumava fazer em vida.
Dessa forma, o "jeitinho brasileiro" de certos oportunistas tentam deturpar o legado dos finados, distorcendo posturas e pontos de vista para que eles sejam usados pelos oportunistas de cá para defender em causa própria tudo aquilo que nem vale a pena ser defendido, já que simboliza a mediocrização, a imbecilização cultural ou a promoção de moralismo duvidoso.
Daí a desonra que isso representa, quando pessoas que não conseguem entender a verdadeira natureza dos ilustres falecidos se sentem "donas" de seu prestígio, a pretexto de sua suposta solidariedade. Supondo homenageá-los, intelectuais e médiuns acabam ofendendo os falecidos, na medida em que distorcem suas ideias em prol de causas bastante duvidosas.
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