sábado, 25 de julho de 2015
O caso Sandra Bland, racismo e "reajustes espirituais"
Um caso recente de violência policial e racismo, ocorrido nos EUA já marcados por intensas tensões raciais, um interminável conflito entre a violência policial e os protestos do povo negro que não raro sucumbe a vandalismos e saques, mostra o quanto o país mais poderoso do continente americano ainda não resolveu suas neuroses sociais.
Enquanto o Brasil começa a sentir o macartismo tosco do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, equivalente "tropical" do senador estadunidense Joseph McCarthy (1908-1957), famoso pelo seu reacionarismo descomunal, os EUA de hoje ainda têm a atuação do grupo nazista Klu Klux Klan e uma metodologia policial branca que age com truculência contra negros.
Um negro chegou a ser baleado mortalmente só porque estava correndo e não atendeu a um chamado de um guarda. E agora, é o caso de uma mulher negra que, detida por desobedecer regras de trânsito e de ter dito a um policial que ela tinha o direito de fumar dentro de seu próprio carro, apareceu morta por estrangulamento na sua cela no último dia 13 de julho.
Para piorar, antes de Sandra Bland, a mulher em questão, de apenas 28 anos, ser levada para a prisão, o policial que a deteve a tirou do carro, jogou-a no chão e ainda a ameaçou com uma arma de choque elétrico. O episódio chocou a sociedade mundial e impulsionou hashtags (palavras-chave) nas mídias sociais, como #WhatHappenedtoSandyBland e #JusticeforSandy.
POLICIAIS QUE MATARAM SANDRA BLAND USARAM A MESMA DESCULPA DOS MILITARES BRASILEIROS QUE MATARAM O JORNALISTA VLADIMIR HERZOG: QUE A VÍTIMA "SE SUICIDOU".
Cínicos e hipócritas, os policiais alegaram que a vítima encontrada morta "se suicidou", na tentativa vã de não assumirem a culpa pela morte dela. É a mesma desculpa que, há 40 anos (a serem completados em outubro), os militares do DOI-CODI, órgão de repressão da ditadura militar, usaram para "explicar" a morte do jornalista Vladimir Herzog, diretor da TV Cultura de São Paulo.
Herzog foi condenado à prisão porque boicotou uma cerimônia de inauguração de uma obra do Governo de São Paulo, manifestando um claro protesto contra a hipocrisia ditatorial. Na Assembleia Legislativa paulista, alguns parlamentares discursavam irritados contra o boicote, e entre os que pediram a prisão de Herzog foi José Maria Marín, hoje dirigente esportivo envolvido em corrupção.
PROTESTOS
Vários famosos se manifestaram contra o assassinato de Sandra Bland. A modelo e atriz Cara Delevigne, as atrizes Chloe Grace Moretz (de Kick Ass 1 e 2, a Invenção de Hugo Cabret e Se Eu Ficar) e as negras Gabrielle Union (de As Apimentadas) Amandla Stenberg (de Jogos Vorazes), a modelo brasileira Carol Trentini e a cantora Nicky Minaj expressaram solidariedade à vítima.
Também negros, o rapper Snoop Dogg e a atriz Kerry Washington (do seriado Scandal) também se manifestaram contra a violência, que foi mais um dos inúmeros fatos que expressam a tragédia envolvendo racismo nos EUA.
Recentemente, um jovem branco que assistiu a uma missa protestante negra decidiu assassinar nove pessoas por puro ódio. Ele foi detido e aguarda julgamento pelo ato. O jovem usou um revólver que havia recebido de presente de aniversário do pai.
Fatos como este e a absolvição de policiais brancos que assassinaram negros causam intensas revoltas sociais, que variam desde protestos pacíficos por iniciativa de populações negras até casos em que pobres negros revoltados chegam a incendiar carros e saquear mercados, indignados com a impunidade.
"REAJUSTES ESPIRITUAIS"
O "movimento espírita" brasileiro não tem uma visão generosa da negritude. Tenta "apreciá-la" de maneira "positiva", mas sua apreciação é contraditória, já que ideologicamente a doutrina encara o fato de ser negro como um "castigo" e uma forma de "expiação" por pecados cometidos em relação a questões raciais ou sócio-econômicas.
A doutrina também peca pela ênfase na culpabilidade das vítimas. Seus membros tentam argumentar que as vítimas "merecem atenção, respeito e carinho", mas não deixam de apontar o dedo acusador supondo nos sofredores alguma punição do passado, generalizando a suposição de que todo brasileiro teria sido um cidadão romano em alguma encarnação passada.
Por isso, o "espiritismo" brasileiro tornou-se a pior doutrina religiosa para quem quiser se livrar de algum sofrimento ou empecilhos na vida. Quem faz tratamento espiritual acaba não apenas se livrando desses problemas, como acaba contraindo outros, após uns poucos dias de "tranquilidade" após a tendenciosa terapia.
E o que os "espíritas" dirão de Sandra Bland? Que ela é reencarnação de uma aristocrata romana? Que ela "atraiu" seu destino porque foi agressiva com o policial? Ou porque ela teria que cumprir essa "triste sina" para expiar e fazer os seus "resgates morais".
Evidentemente, os ideólogos "espíritas", vivendo no seu conforto vital, não percebem os sofrimentos e o desrespeito que outros têm que encarar. Menosprezam o verdadeiro sentido das injustiças e tentam arrumar desculpas para a gravidade de muitos sofrimentos.
Além disso, eles condenam severamente o suicídio, enquanto relativizam o homicídio como "forma de pagamento de crimes". Tentam argumentar que os homicidas "terão o que merecem", mas para daqui a cem anos. Visão não menos cruel do que policiais que matam detentos inocentes e alegam que eles "se suicidaram". As vítimas acabam ficando com o lado pior da culpa.
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