"CULTURA ROCK" ESTEREOTIPADA: Ídolos, instituições e ícones do consumismo do roqueiro caricato.
Oficialmente, hoje é o Dia Mundial do Rock. É uma escolha muito estranha, porque o pretexto usado para a data, o Live Aid, que celebra 30 anos de realização, era um evento eclético, em que até nomes do pop convencional, como Madonna e George Michael, se apresentaram.
Curiosamente, foi um evento filantrópico, destinado a ajudar flagelados da Etiópia, embora a arrecadação tivesse destinação controversa, já que os críticos do evento alegavam que apenas uma parte do dinheiro e bens ia realmente para os etiopianos, isso quando os soldados guerrilheiros não confiscam os bens e as autoridades não desviam a grana para si.
O Live Aid nem significou muito para o rock, até porque havia centenas de nomes roqueiros no circuito alternativo que desconfiavam do caráter marqueteiro do evento. Mesmo para o Brasil, com toda a histeria pelo Live Aid, o evento inspirou mais o Criança Esperança da Rede Globo do que qualquer evento genuina e especificamente roqueiro.
No Brasil submisso, em que o Sul e Sudeste são ainda mais subservientes ao poder midiático, mercadológico e tecnocrático e o Estado do Rio de Janeiro leva isso às últimas consequências, todos aceitam que um evento pop eclético seja celebrado como "histórico" para o rock.
Embora a data se relacionasse também com eventos ligado ao rock, como o surgimento dos Rolling Stones, em 1962, ela corresponde ao Live Aid, com base num pedido do cantor e músico Phil Collins para criar a efeméride, ela só é comemorada no Brasil. Ninguém levou a sério o apelo do músico inglês.
No exterior, a data praticamente não é lembrada. E no Brasil ela passou a ser comemorada nos anos 1990, para alimentar um mercado "roqueiro" movido por empresários e publicitários, muito mais próximo de uma imagem de consumo do que de uma cultura socialmente compartilhada.
No Brasil, a "cultura rock", depois de dignos e heróicos exemplos como o até hoje prestigiado Rock Brasil e rádios como a Fluminense FM (RJ) e 97 Rock (SP), e, antes, a Eldo Pop FM (RJ), sucumbiu a um comercialismo iniciado por rádios pop e consagrado por emissoras como a 89 FM (SP) e Rádio Cidade (RJ), que tratam o rock mais como "seita" do que como cultura.
Junto a isso, há um mercado que, eventualmente, promove publicitariamente uma imagem ao mesmo tempo fanática e estereotipada do fã de rock, mais preocupado em clichês de som, comportamento e atitudes do que em ter uma personagem própria, humana e racional.
Trata-se de um público consumista cuja "rebeldia" se limita a aspectos formais como a linguagem ao mesmo tempo informal e agressiva, ao vestuário de certa forma arrojado e a gestos como botar a língua para fora, fazer "air guitar" e fazer o sinal do diabo com as mãos e que, ideologicamente, é capaz de ser o completo oposto da verdadeira rebeldia roqueira marcada sobretudo pelos anos 1960.
Primeiro, porque o roqueiro estereotipado brasileiro se conforma com os nomes comerciais do rock - sobretudo Guns N'Roses, mas também grupos como System of a Down, Offspring, Linkin Park e o "alternativo" Queens of The Stone Age, além do "pragmatismo" das bandas nacionais dos anos 90 - e se contentam facilmente com os grandes sucessos das paradas, felizes em ouvir as mesmas músicas 10 vezes por dia.
Evidentemente, são aspectos completamente anti-roqueiros, pois os roqueiros autênticos são conhecidos por sua postura política definida, majorativamente progressista - embora haja reacionários, sobretudo influentes, como Johnny Ramone e o brasileiro Lobão - , e não iriam ficar satisfeitos em ouvir apenas um punhado de greatest hits despejados pelas FMs comerciais fantasiadas de rock.
CONSUMISMO E RELIGIOSIZAÇÃO
Essa "cultura rock" de fachada é ancorada por emissoras de rádio FM que se dizem "especializadas em rock" e que, só pelo quadro de locutores, nota-se total despreparo com o segmento, agindo e falando como se dirigissem a fãs do One Direction.
Eles guiam todo o consumismo, como se fossem "babás eletrônicas" dos jovens "rebeldes". Apenas tocam o rock comercial que serve de trilha sonora de uma catarse que nada tem a ver com cultura, porque é apenas um estereótipo que precisa ser encenado 24 horas por dia, e mais parece uma "seita religiosa" do que uma rebeldia de verdade.
Os "roqueiros" manobrados por tais FMs e regidos pelo mercado dominado por donos de empresas de entretenimento, são trabalhados para ser apenas um rebanho submisso para lotar plateias de grandes festivais tidos como "de rock", que cobram ingressos caros e abrigam lojas que vendem roupas, calçados, outros produtos e também refeições com preços bastante caros.
Daí a rebeldia formal que apenas reproduz clichês caricatos do roqueiro rebelde. Daí a religiosização, que, como toda religião, abraça uma causa eliminando sua essência original, como no caso do Cristianismo medieval, sem qualquer relação real com a doutrina original de Jesus.
Esse "rock" é apenas uma "seita" na qual toda uma mística de "superioridade" é atribuída a ele. "Roqueiros" desse porte parecem devotos de um ritmo no qual não conseguem entender, e que em muitos casos gostam muito menos do que parece. Dizem gostar de AC/DC, por exemplo, mas não suportam ouvir mais do que um mero acorde introdutório da música "Back in Black".
São apenas pessoas que exaltam mitos com histeria que corrompe a consciência. Nem sabem por que dizem gostar de Renato Russo, por exemplo, embora esse público já tenha detestado ele quando o revival dos anos 80 não se tornou um fenômeno comercializado pela grande mídia.
Esses "roqueiros" dizem que o rock é "a música superior do mundo", mas, fora o rock comercial - sobretudo Guns N'Roses, surrealmente superestimado pelos provincianos brasileiros - , não valorizam devidamente o gênero. E são capazes de seguir, como carneirinhos, a decisão de uma data como a do Live Aid sem questionar, ignorando que o festival filantrópico não era só de roqueiros.
Esses jovens se contentam em ouvir, sobretudo de FMs canastronas, só os sucessos, apreciam as bandas comerciais e relativamente mais recentes (sobretudo anos 90), são despolitizados mas tendem, quando contrariados, a superar o reacionarismo de Lobão, aceitam pagar caro num evento "de rock" e ainda aceitam que um evento que teve Madonna e George Michael seja lembrado numa efeméride sobre rock.
Com toda a certeza, nada menos roqueiro do que essas atitudes que os "roqueiros" tentam fazer convencer que se trata da verdadeira atitude rock. Eles não conseguem entender o estado de espírito do rock, preferindo o "estado da matéria" dos estereótipos, da forma e não do conteúdo.
Não é por acaso que uma das rádios preferidas se chama Cidade. Para eles, o mundo pouco importa, só a cidade, só a província. Só importa o lugar onde eles vivem, a visão provinciana que faz com que só eles comemorem, no dia do Live Aid, o Dia Mundial do Rock, quando o resto do mundo nem leva essa data tão a sério.
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