domingo, 25 de dezembro de 2016
Sangue de São Januário e a "profecia" da Data-Limite
Em tempos de retomada ultraconservadora, sobretudo no Brasil, além da emergência de fenômenos dramáticos como a pós-verdade e as convulsões sociais - isso para não dizer dos ataques terroristas e da guerra civil que, por ora, atinge a cidade de Aleppo, na Síria - , uma crença católica, embora fantasiosa, cria uma perspectiva sombria que coincide com o contexto realista de hoje.
Trata-se da crença do Sangue de São Januário. Diz a lenda da Igreja Católica que o bispo Januário de Benevento, morto em 305 por decapitação depois de se opor à tirania do Império Romano, teve seu sangue recolhido por um idoso, guardado num frasco de água enchido por uma mulher, e preservado num relicário na Catedral de Nápoles, na Itália, terra do sacerdote.
Três datas são atribuídas anualmente pela Igreja Católica para o ritual da liquefação, quando o sangue armazenado se torna líquido. Uma é 19 de setembro, outra 16 de dezembro e, antes de ambas, o primeiro domingo de maio.
Segundo os católicos, a liquefação tem que ser realizada para que a humanidade na Terra tivesse um mínimo de sossego possível, ou seja, esteja livre de perigos de alta gravidade e grandes proporções. Se caso não ocorre a liquefação, há um risco iminente de catástrofes e desastres de todo tipo.
No último dia 16, o papa Francisco I esteve em Nápoles para a cerimônia, como reza (olha o trocadilho) a tradição. A liquefação não aconteceu e, uma vez divulgado o resultado, os católicos passaram a ficar apreensivos, acreditando que uma grande catástrofe vai acontecer em 2017.
Sabe-se que 2016 foi um ano sombrio, trágico, de retomada ultraconservadora que fez com que boa parte do mundo, sobretudo o Brasil, passasse a viver um cotidiano kafkiano, em que Dilma Rousseff, ou talvez Dilma R., se sentiu como o Josef K. de O Processo, condenada sem ter cometido crime.
No entanto, 2017 tende a ser bem mais trágico, sobretudo quando as elites, no Brasil, retomaram seus privilégios com apetite redobrado e o desastrado presidente da República, Michel Temer, protegido pela mídia e representante dos interesses do "deus" mercado, propõe medidas de clara exclusão social, embora os noticiários da grande mídia veiculem mentiras que coloquem as nefastas PEC do Teto e as reformas trabalhista, previdenciária e educacional como "positivas".
A crença no Sangue de São Januário pode ser fantasiosa, mas é compreensível porque ela é uma crença cultural dos católicos. Mas confronta-se essa crença com a "profecia" da Data-Limite trazida por Francisco Cândido Xavier e se resulta numa interpretação nada favorável aos "espíritas".
INDECISÃO
Os partidários da tese da "regeneração" no "espiritismo" brasileiro não conseguem decidir coisa alguma, preocupados em criar palpites de datas nos quais a realidade desmente frontalmente, como num jogo em que os "espíritas" tentam lutar contra o tempo para impor suas convicções messiânicas em detrimento de ocorrências realistas.
Isso é típico do "espiritismo" da FEB, de Chico Xavier, de Divaldo Franco, de "poetas alegres" etc. Mas Allan Kardec rejeita tudo isso, por não ver coerência em prever datas determinadas sobre ocorrências futuras, alertando haver nisso um grave risco de mistificação.
Os "espíritas" já determinaram datas para a "regeneração". Disseram que era em 1982, 2000, 2010, 2012. Agora apostam em 2019, ou então 2052 ou 2057. Não se decidem e até como se dará a "regeneração" é bastante controverso, pois uns dizem que ocorrerá "sem conflitos", outros afirmam que ocorrerá "com muitas dificuldades".
Tentando puxar a brasa para sua sardinha, os "espíritas" tentam pregar um otimismo exagerado, mesmo quando admitem a ocorrência de fatos sombrios. O Sangue de São Januário, ainda que seja uma fantasia católica, pelo menos, na sua não liquefação, trouxe uma perspectiva bem mais realista, e que coincide com as tendências que acontecem no nosso mundo.
Vale lembrar que a não liquefação coincidiu com ocorrências que vieram depois, como o início da Segunda Guerra Mundial, a entrada da Itália no confronto e a sua subordinação ao império nazista. Outras ocorrências muito trágicas como um terremoto de grandes proporções em Irpínia, no centro da Itália, também estão associadas, pelos católicos, à não liquefação.
A situação trágica de 2016, com os falecimentos massivos de tantos artistas e intelectuais de valor - como David Bowie e Umberto Eco - , pode se repetir em 2017, embora também haja as baixas de uma plutocracia ao mesmo tempo gananciosa, autoconfiante em excesso e imprudente. O que se sabe é que ela também pagará o preço caro pelos retrocessos forçados e pela busca voraz de recuperar e ampliar privilégios às custas dos sacrifícios de muitos.
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