MARCOS FALCON, PRESIDENTE DA ESCOLA DE SAMBA PORTELA - Vítima de pistolagem cometida à luz do dia.
O Rio de Janeiro se provincianizou de vez. Depois de um linchamento em Ipanema, que matou um vendedor ambulante, num episódio típico de cidade do interior que nunca foi urbanizada, agora é a pistolagem ocorrendo em plena tarde, num bairro destacado da Zona Norte.
Na Madureira onde as autoridades cariocas planejavam uma "Zona Sul de mentirinha", criando uma pequena praia com funcionamento limitado - abrindo às 9h, contrariando recomendações médicas - para uma demanda suburbana que, citando Tim Maia, vai do Leme ao Pontal, um homicídio típico de interior paraense aconteceu em plena tarde, anteontem.
O carismático presidente da Escola de Samba Portela, Marcos Falcon, de 52 anos, foi assassinado por pistoleiros dentro de seu comitê de campanha, do qual ele era candidato a vereador, em torno de 16 horas, próximo à Rua Maria José, numa área movimentada do referido bairro. Os pistoleiros pareciam tranquilos e conseguiram fugir.
A pistolagem ocorrida ontem é apenas mais um episódio de uma onda que está atingindo candidatos a cargos políticos na Baixada Fluminense e nos subúrbios do Rio. É um cenário típico do Norte brasileiro, em tempos ditatoriais, quando o coronelismo que apoiava o regime militar praticamente fazia a "limpa" nas zonas rurais, exterminando quem "trazia problemas para os donos das terras".
A gente até conta os dias para ver quando eles serão capturados - consta-se que eram quatro - pois, até a edição deste texto, ninguém foi preso. A título de comparação, um assalto que aconteceu em Aracaju, semanas atrás, numa emissora de rádio, a 103 FM, ocorreu na noite de sábado, com a cidade quase sem movimento nas ruas, e em quatro dias quatro suspeitos foram presos.
O carioca pensa que é brincadeira quando se fala que o Estado do Rio de Janeiro sofre um processo avassalador de decadência, atingindo níveis dramáticos. Parece até que há uma epidemia da Síndrome de Riley Day que faz os cariocas não sentirem mais dor nem noção de graves problemas, com famílias indo felizes para restaurantes diante de um fedorento caminhão de lixo estacionado com seu odor tóxico contaminando os alimentos.
A decadência não é apenas questão de máquina administrativa. Não é questão de falta de dinheiro, porque uma crise não se define tão somente por problemas financeiros, aliás a grana curta é justamente um aspecto menor de uma crise que envolve práticas, mentalidades, visões de conjunto etc.
O Rio de Janeiro decai por muitos e muitos aspectos. Não é uma campanha negativa, afinal, gostaríamos de nunca escrever textos como estes, mas cabe denunciar os piores erros para chamar a atenção das pessoas. A decadência carioca se dá sobretudo por causa de um espírito coletivo de pessoas que, em nome da ética, foram capazes de eleger gente como o deputado Eduardo Cunha, que com muito trabalho (mas também muita hesitação) foi afastado do poder.
Ninguém questiona, ninguém se mobiliza, as pessoas dependem de um Jornal Nacional, de um jornal O Dia, de um Cidade Alerta ou Brasil Urgente para tomar alguma posição na vida. Pouco importa se, na saída de casa, com os ônibus com a terrível pintura padronizada, pessoas com muito sono - sobretudo quando vêm de uma noite com futebol e gritaria de torcedores - , têm dificuldade de discernir o ônibus que vai para Marechal Hermes do que vai para Água Santa.
Ninguém questiona essa aberração sobre rodas que esconde empresas, favorece a corrupção e confunde os passageiros que, acordando com sono e com muitos compromissos pessoais, ainda têm que saber a diferença de uma Matias de uma Verdun, de um Redentor e uma Real Auto Ônibus porque tudo agora tem a mesma pintura, ainda mais com o irritante design de embalagem de remédio.
E não se pode questionar porque, pelo autoritarismo carioca, contestar a pintura padronizada nos ônibus é garantia de reação furiosa de busólogos reacionários - que se comportam como se valorizassem mais tanques do Exército do que ônibus - capazes de criar blogues de difamação gratuita para insultar quem discorda de suas ideias retrógradas.
Mas a decadência carioca que já preocupa com a arrogância narcisista dos fumantes, com o desabastecimento viciado de produtos que demoram a serem repostos nos supermercados - como se o Rio de Janeiro não fosse um dos centros de fabricação e distribuição de produtos - , com a gritaria animalesca de fanáticos por futebol ainda prepara a "monocultura" que se concentrará em dois produtos, o "funk" e o "sertanejo".
E isso quando as relações sociais acabam pautadas pelo consumismo, em que pessoas se encontram para cada uma se isolar no entretenimento supérfluo do WhatsApp e no espetáculo consumista de frequentar boates e lanchar nas piores lanchonetes (que se autoproclamam "restaurantes"!) comprando felizes os combos explosivos que caem como bombas nos estômagos.
A decadência do Rio de Janeiro se observa nas ruas sujas e empoeiradas, na nuvem de poluição que toma conta da vista da Baía da Guanabara, das ruas com aspectos de velhas, dos fios elétricos amontoados e uns caídos no chão, oferecendo risco mortal para os transeuntes, da falta de logística do mercado, da baixa visão do mundo dos cariocas (salvo honrosas exceções, que nem aparecem na mídia), e com uma criminalidade que corre solta à luz do dia.
Isso não é complexidade de vida urbana moderna. Até porque os problemas nessa ordem não atingem a gravidade que se observa hoje. O Rio de Janeiro, seja o Estado e sua outrora imponente capital, decai como se estivesse em queda livre, com um surto de provincianismo que assustaria até caipiras isolados do Norte do Brasil. É hora do Rio de Janeiro se mexer, deixar a arrogância de lado e sair de sua zona de conforto. Há muitos erros, gravíssimos, a serem combatidos.
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