sexta-feira, 30 de setembro de 2016
A religião "espírita" e os infortúnios
Diante de sua inclinação, nunca assumida, à Teologia do Sofrimento, o "movimento espírita" tem dificuldades de entender a complexidade humana. O atraente desfile de palavras bonitas tenta sugerir que tudo é fácil, que dificuldades são apenas "desafios" e "aprendizados", sem saber o nível das dificuldades de cada pessoa.
Tanto faz abrir mão de talentos, da própria individualidade. É fácil dizer para a pessoa abrir mão até do que é necessário, e, pelo jeito que estão cidades poluídas e cheias de fumantes como Rio de Janeiro e São Paulo, não se tem direito sequer para respirar um ar mais saudável.
O Brasil vive uma realidade bastante maluca, com uma Justiça (Poder Judiciário e Ministério Público) fazendo uma atuação pouco confiável, movida pelas conveniências que fazem as condenações e investigações serem tendenciosas e parciais, favorecendo apenas representantes das chamadas "classes dirigentes", cuja identificação forçada pelo povo brasileiro é obra de intensa campanha da mídia patronal associada.
Mas é o país em que os "ancestrais" do juiz Sérgio Moro deixaram passar um pastiche literário deplorável, a apropriação de Francisco Cândido Xavier sobre o prestígio de Humberto de Campos, através de um empate jurídico diante da omissão em debates questões autorais - a obra do "espírito Humberto" não condiz com o estilo do autor maranhense - , existe o império da incoerência e do absurdo.
O mito de Chico Xavier se agigantou a partir daí, num processo descontrolado. E isso se dá num contexto em que o Brasil está perto de sofrer um quadro político fascista e cada vez mais pessoas se destacam com atos sanguinários, truculentos e fascistas.
Da pistolagem que matou, à luz do dia, o ex-presidente da Portela, Marcos Falcon, a um vídeo gravado por um homem matando a mulher e os filhos, passando por um truculento rapagão de elite, Cláudio Roberto Baldaque, que agrediu o senador Lindbergh Farias e sua esposa, fora os vários homicídios atingindo candidatos a cargos eletivos deste ano, nota-se que o país está numa situação terrível.
Não é falta de Chico Xavier nem de Divaldo Franco que o mundo está assim. Como os dois nunca passaram de farsantes e dissimuladores religiosos - católicos ortodoxos fantasiados de espíritas autoproclamados "autênticos" - , eles trouxeram, através das energias malignas de Emmanuel e Máscara de Ferro, as vibrações pesadas que simplesmente estão derrubando o país.
O "movimento espírita" não é falso porque eu ou você dissemos, mas pelas escolhas equivocadas e contraditórias que teve, e que se agravaram quando, nos últimos 40 anos, se adotou oficialmente a postura dúbia, que é a de bajular Allan Kardec e praticar igrejismo, embora sob o verniz do "espiritismo autêntico".
Nunca comparação ligeira, é como se comparássemos Jean-Baptiste Roustaing ao deputado Eduardo Cunha, diante da falsa impressão de que o respectivo algoz foi tirado de circulação. Mas o legado roustanguista existe, mesmo quando é dissimulado em mentiras cada vez mais descaradas, deturpações tão graves que já deturpam Erasto, deturpam o Controle Universal dos Ensinos dos Espíritos e deturpam até as críticas à própria deturpação, como numa falsa concordância.
O "movimento espírita" construiu seus postulados com base não em Allan Kardec, mas em Roustaing. Já se criou um falso espírito de Kardec, apelando para que se lesse Roustaing. As bases ideológicas são roustanguistas e Chico Xavier claramente adaptou o roustanguismo para o contexto brasileiro, e isso está muito mais do que explícito em seus livros.
Assim como Temer é Cunha e Cunha é Temer, ou seja, o legado de Eduardo Cunha está em Michel Temer e no provável sucessor de eleição indireta, Roustaing é Chico Xavier e Chico Xavier é Roustaing. Os três volumes originais (quatro, na edição da FEB) de Os Quatro Evangelhos gerou os mais de 400 livros que levam a assinatura de Chico Xavier.
Xavier até levou às últimas consequências as deturpações de Roustaing. Ou seja, foi adiante e até longe demais com o roustanguismo. E, prestando atenção nos livros de Chico Xavier, tudo isso se revela uma farsa diante da leitura mais atenta e sem as paixões do deslumbramento religioso, porque sua suposta inclinação ao pensamento kardeciano se dissolve facilmente ao identificar o conteúdo roustanguista e extremamente igrejeiro da bibliografia chiquista.
A exemplo da farsante Madre Teresa de Calcutá - que transformou suas "casas de caridade" em reles depósitos de flagelados - , Chico Xavier era adepto da Teologia do Sofrimento. Enquanto Madre Teresa dizia que o sofrimento era um "presente de Deus", Chico Xavier dizia para o sofredor "sofrer amando" e "sem mostrar sofrimento aos outros".
Os infortúnios são tolerados pelos palestrantes "espíritas" que, ignorando injustiças e desigualdades, apenas dizem para os sofredores "aceitarem o sofrimento", e, com seu juízo de valor, dizer que as desgraças são "apenas desafios e aprendizados".
Pouco importam os abusos dos algozes, o desprezo da sociedade - o próprio Chico Xavier revela seu caráter desumano condenando as pessoas que se queixam da vida porque perturbam o sossego dos afortunados da sorte - , os "espíritas" apelam para os sofredores "aceitarem o sofrimento", serem "felizes" e buscarem "soluções próprias" para tais dificuldades.
Os "espíritas" desprezam a vida material e nem por isso deixam de ser materialistas. Pelo contrário, são materialistas justamente por isso: porque querem deixar a brutalidade da vida material intocável à interferência humana, que só a individualidade e as condições diferenciadas de emancipação humana podem permitir.
Os "espíritas" querem a vida "qualquer nota", como se tanto fizesse para eles que um sofredor se transforme em brinquedo das adversidades cotidianas. E por isso eles fazem seu juízo de valor: o sofredor sofre "por merecer", a desgraça é "aprendizado", o infortúnio é "desafio" e tanto faz a pessoa não ter sequer o necessário, basta olhar passarinhos e rio correndo, como queria Chico Xavier.
Isso desqualifica mais e mais os "espíritas", que cada vez mais sentem o vazio de seus apelos "positivos", trazendo uma pregação igrejista que se torna cada vez mais repetitiva, sem graça, sem trazer estímulo algum e, pelo contrário, só fazendo os sofredores pensarem em coisas horríveis como o suicídio. Em suma: o moralismo "espírita" mostra o quanto seus pregadores são "remediados demais" para entender as limitações e problemas do outro.
quarta-feira, 28 de setembro de 2016
Rio de Janeiro em decadência preocupante
MARCOS FALCON, PRESIDENTE DA ESCOLA DE SAMBA PORTELA - Vítima de pistolagem cometida à luz do dia.
O Rio de Janeiro se provincianizou de vez. Depois de um linchamento em Ipanema, que matou um vendedor ambulante, num episódio típico de cidade do interior que nunca foi urbanizada, agora é a pistolagem ocorrendo em plena tarde, num bairro destacado da Zona Norte.
Na Madureira onde as autoridades cariocas planejavam uma "Zona Sul de mentirinha", criando uma pequena praia com funcionamento limitado - abrindo às 9h, contrariando recomendações médicas - para uma demanda suburbana que, citando Tim Maia, vai do Leme ao Pontal, um homicídio típico de interior paraense aconteceu em plena tarde, anteontem.
O carismático presidente da Escola de Samba Portela, Marcos Falcon, de 52 anos, foi assassinado por pistoleiros dentro de seu comitê de campanha, do qual ele era candidato a vereador, em torno de 16 horas, próximo à Rua Maria José, numa área movimentada do referido bairro. Os pistoleiros pareciam tranquilos e conseguiram fugir.
A pistolagem ocorrida ontem é apenas mais um episódio de uma onda que está atingindo candidatos a cargos políticos na Baixada Fluminense e nos subúrbios do Rio. É um cenário típico do Norte brasileiro, em tempos ditatoriais, quando o coronelismo que apoiava o regime militar praticamente fazia a "limpa" nas zonas rurais, exterminando quem "trazia problemas para os donos das terras".
A gente até conta os dias para ver quando eles serão capturados - consta-se que eram quatro - pois, até a edição deste texto, ninguém foi preso. A título de comparação, um assalto que aconteceu em Aracaju, semanas atrás, numa emissora de rádio, a 103 FM, ocorreu na noite de sábado, com a cidade quase sem movimento nas ruas, e em quatro dias quatro suspeitos foram presos.
O carioca pensa que é brincadeira quando se fala que o Estado do Rio de Janeiro sofre um processo avassalador de decadência, atingindo níveis dramáticos. Parece até que há uma epidemia da Síndrome de Riley Day que faz os cariocas não sentirem mais dor nem noção de graves problemas, com famílias indo felizes para restaurantes diante de um fedorento caminhão de lixo estacionado com seu odor tóxico contaminando os alimentos.
A decadência não é apenas questão de máquina administrativa. Não é questão de falta de dinheiro, porque uma crise não se define tão somente por problemas financeiros, aliás a grana curta é justamente um aspecto menor de uma crise que envolve práticas, mentalidades, visões de conjunto etc.
O Rio de Janeiro decai por muitos e muitos aspectos. Não é uma campanha negativa, afinal, gostaríamos de nunca escrever textos como estes, mas cabe denunciar os piores erros para chamar a atenção das pessoas. A decadência carioca se dá sobretudo por causa de um espírito coletivo de pessoas que, em nome da ética, foram capazes de eleger gente como o deputado Eduardo Cunha, que com muito trabalho (mas também muita hesitação) foi afastado do poder.
Ninguém questiona, ninguém se mobiliza, as pessoas dependem de um Jornal Nacional, de um jornal O Dia, de um Cidade Alerta ou Brasil Urgente para tomar alguma posição na vida. Pouco importa se, na saída de casa, com os ônibus com a terrível pintura padronizada, pessoas com muito sono - sobretudo quando vêm de uma noite com futebol e gritaria de torcedores - , têm dificuldade de discernir o ônibus que vai para Marechal Hermes do que vai para Água Santa.
Ninguém questiona essa aberração sobre rodas que esconde empresas, favorece a corrupção e confunde os passageiros que, acordando com sono e com muitos compromissos pessoais, ainda têm que saber a diferença de uma Matias de uma Verdun, de um Redentor e uma Real Auto Ônibus porque tudo agora tem a mesma pintura, ainda mais com o irritante design de embalagem de remédio.
E não se pode questionar porque, pelo autoritarismo carioca, contestar a pintura padronizada nos ônibus é garantia de reação furiosa de busólogos reacionários - que se comportam como se valorizassem mais tanques do Exército do que ônibus - capazes de criar blogues de difamação gratuita para insultar quem discorda de suas ideias retrógradas.
Mas a decadência carioca que já preocupa com a arrogância narcisista dos fumantes, com o desabastecimento viciado de produtos que demoram a serem repostos nos supermercados - como se o Rio de Janeiro não fosse um dos centros de fabricação e distribuição de produtos - , com a gritaria animalesca de fanáticos por futebol ainda prepara a "monocultura" que se concentrará em dois produtos, o "funk" e o "sertanejo".
E isso quando as relações sociais acabam pautadas pelo consumismo, em que pessoas se encontram para cada uma se isolar no entretenimento supérfluo do WhatsApp e no espetáculo consumista de frequentar boates e lanchar nas piores lanchonetes (que se autoproclamam "restaurantes"!) comprando felizes os combos explosivos que caem como bombas nos estômagos.
A decadência do Rio de Janeiro se observa nas ruas sujas e empoeiradas, na nuvem de poluição que toma conta da vista da Baía da Guanabara, das ruas com aspectos de velhas, dos fios elétricos amontoados e uns caídos no chão, oferecendo risco mortal para os transeuntes, da falta de logística do mercado, da baixa visão do mundo dos cariocas (salvo honrosas exceções, que nem aparecem na mídia), e com uma criminalidade que corre solta à luz do dia.
Isso não é complexidade de vida urbana moderna. Até porque os problemas nessa ordem não atingem a gravidade que se observa hoje. O Rio de Janeiro, seja o Estado e sua outrora imponente capital, decai como se estivesse em queda livre, com um surto de provincianismo que assustaria até caipiras isolados do Norte do Brasil. É hora do Rio de Janeiro se mexer, deixar a arrogância de lado e sair de sua zona de conforto. Há muitos erros, gravíssimos, a serem combatidos.
O Rio de Janeiro se provincianizou de vez. Depois de um linchamento em Ipanema, que matou um vendedor ambulante, num episódio típico de cidade do interior que nunca foi urbanizada, agora é a pistolagem ocorrendo em plena tarde, num bairro destacado da Zona Norte.
Na Madureira onde as autoridades cariocas planejavam uma "Zona Sul de mentirinha", criando uma pequena praia com funcionamento limitado - abrindo às 9h, contrariando recomendações médicas - para uma demanda suburbana que, citando Tim Maia, vai do Leme ao Pontal, um homicídio típico de interior paraense aconteceu em plena tarde, anteontem.
O carismático presidente da Escola de Samba Portela, Marcos Falcon, de 52 anos, foi assassinado por pistoleiros dentro de seu comitê de campanha, do qual ele era candidato a vereador, em torno de 16 horas, próximo à Rua Maria José, numa área movimentada do referido bairro. Os pistoleiros pareciam tranquilos e conseguiram fugir.
A pistolagem ocorrida ontem é apenas mais um episódio de uma onda que está atingindo candidatos a cargos políticos na Baixada Fluminense e nos subúrbios do Rio. É um cenário típico do Norte brasileiro, em tempos ditatoriais, quando o coronelismo que apoiava o regime militar praticamente fazia a "limpa" nas zonas rurais, exterminando quem "trazia problemas para os donos das terras".
A gente até conta os dias para ver quando eles serão capturados - consta-se que eram quatro - pois, até a edição deste texto, ninguém foi preso. A título de comparação, um assalto que aconteceu em Aracaju, semanas atrás, numa emissora de rádio, a 103 FM, ocorreu na noite de sábado, com a cidade quase sem movimento nas ruas, e em quatro dias quatro suspeitos foram presos.
O carioca pensa que é brincadeira quando se fala que o Estado do Rio de Janeiro sofre um processo avassalador de decadência, atingindo níveis dramáticos. Parece até que há uma epidemia da Síndrome de Riley Day que faz os cariocas não sentirem mais dor nem noção de graves problemas, com famílias indo felizes para restaurantes diante de um fedorento caminhão de lixo estacionado com seu odor tóxico contaminando os alimentos.
A decadência não é apenas questão de máquina administrativa. Não é questão de falta de dinheiro, porque uma crise não se define tão somente por problemas financeiros, aliás a grana curta é justamente um aspecto menor de uma crise que envolve práticas, mentalidades, visões de conjunto etc.
O Rio de Janeiro decai por muitos e muitos aspectos. Não é uma campanha negativa, afinal, gostaríamos de nunca escrever textos como estes, mas cabe denunciar os piores erros para chamar a atenção das pessoas. A decadência carioca se dá sobretudo por causa de um espírito coletivo de pessoas que, em nome da ética, foram capazes de eleger gente como o deputado Eduardo Cunha, que com muito trabalho (mas também muita hesitação) foi afastado do poder.
Ninguém questiona, ninguém se mobiliza, as pessoas dependem de um Jornal Nacional, de um jornal O Dia, de um Cidade Alerta ou Brasil Urgente para tomar alguma posição na vida. Pouco importa se, na saída de casa, com os ônibus com a terrível pintura padronizada, pessoas com muito sono - sobretudo quando vêm de uma noite com futebol e gritaria de torcedores - , têm dificuldade de discernir o ônibus que vai para Marechal Hermes do que vai para Água Santa.
Ninguém questiona essa aberração sobre rodas que esconde empresas, favorece a corrupção e confunde os passageiros que, acordando com sono e com muitos compromissos pessoais, ainda têm que saber a diferença de uma Matias de uma Verdun, de um Redentor e uma Real Auto Ônibus porque tudo agora tem a mesma pintura, ainda mais com o irritante design de embalagem de remédio.
E não se pode questionar porque, pelo autoritarismo carioca, contestar a pintura padronizada nos ônibus é garantia de reação furiosa de busólogos reacionários - que se comportam como se valorizassem mais tanques do Exército do que ônibus - capazes de criar blogues de difamação gratuita para insultar quem discorda de suas ideias retrógradas.
Mas a decadência carioca que já preocupa com a arrogância narcisista dos fumantes, com o desabastecimento viciado de produtos que demoram a serem repostos nos supermercados - como se o Rio de Janeiro não fosse um dos centros de fabricação e distribuição de produtos - , com a gritaria animalesca de fanáticos por futebol ainda prepara a "monocultura" que se concentrará em dois produtos, o "funk" e o "sertanejo".
E isso quando as relações sociais acabam pautadas pelo consumismo, em que pessoas se encontram para cada uma se isolar no entretenimento supérfluo do WhatsApp e no espetáculo consumista de frequentar boates e lanchar nas piores lanchonetes (que se autoproclamam "restaurantes"!) comprando felizes os combos explosivos que caem como bombas nos estômagos.
A decadência do Rio de Janeiro se observa nas ruas sujas e empoeiradas, na nuvem de poluição que toma conta da vista da Baía da Guanabara, das ruas com aspectos de velhas, dos fios elétricos amontoados e uns caídos no chão, oferecendo risco mortal para os transeuntes, da falta de logística do mercado, da baixa visão do mundo dos cariocas (salvo honrosas exceções, que nem aparecem na mídia), e com uma criminalidade que corre solta à luz do dia.
Isso não é complexidade de vida urbana moderna. Até porque os problemas nessa ordem não atingem a gravidade que se observa hoje. O Rio de Janeiro, seja o Estado e sua outrora imponente capital, decai como se estivesse em queda livre, com um surto de provincianismo que assustaria até caipiras isolados do Norte do Brasil. É hora do Rio de Janeiro se mexer, deixar a arrogância de lado e sair de sua zona de conforto. Há muitos erros, gravíssimos, a serem combatidos.
segunda-feira, 26 de setembro de 2016
A sordidez do moralismo religioso
Com a efetivação do retrógrado governo de Michel Temer e a consagração de um factoide como um suposto "segundo milagre" para a canonização de Madre Teresa de Calcutá, o "espírito do tempo" do moralismo religioso revela seu lado de sordidez e hipocrisia.
Denúncias de que Madre Teresa teria sido cruel com os "assistidos", tão cruel que não deixava sequer médicos trabalharem em suas casas nem familiares buscarem seus parentes para levá-los a hospitais, derrubam a "inabalável" ideia de que a freira albanesa é a "caridade personificada", sendo usada até como paradigma de generosidade, filantropia ou humildade.
A sordidez do moralismo religioso, que aprisiona o sentido de bondade submetendo-o ao rótulo religioso, permite tanto que governos "laicos" - mas também apoiados por várias seitas religiosas, como o neopentecostalismo e o "movimento espírita" - como o de Michel Temer se consagrem com uma pauta bastante amarga para o povo brasileiro.
Uma pauta que inclui o prolongamento da aposentadoria, num país em que a meia-idade e a velhice mais precisam do lazer, e não do trabalho, para repensar a vida. Ou então que exigirá do trabalhador maior carga horária, enquanto cancela encargos e garantias sociais. Além de receber menos, o trabalhador ainda perderá o direito ao atendimento na saúde pública, pagando planos de saúde privada cujas tarifas caras servem mais para abastecer o luxo dos médicos de nome.
Sofrer é bom? Para a religião, parece que é. E nada como o "espiritismo", religião que, até mais que a própria Igreja Católica, recicla valores do Catolicismo medieval português - difundido pelo movimento jesuíta no período colonial, lembrando que padres, freiras e sorores jesuítas são "mentores" de muitos "centros espíritas" - , para revelar seu vínculo com a Teologia do Sofrimento.
O palestrante religioso chega, em primeira instância, dizer que o sofrimento serve para "reajustes espirituais", jargão que corresponde à expressão católica "purificação dos pecados", e, em seu discurso supostamente racional, o mensageiro de ocasião apela para o sofredor "não reclamar da vida" porque é "na pior das desgraças que a bênção de Deus se instala na alma do sofredor".
Pura hipocrisia. Esse discurso é tão hipócrita que, em primeiro momento, o ideólogo "espírita" é austero e taxativo em seu julgamento de valor. Ele diz que "o sofrimento (por si só) dignifica" - quando o que realmente dignifica é o esforço do sofredor para superar uma desgraça - e diz que a pessoa tem que aceitar o sofrimento, abandonar suas "paixões" e se convencer que o "pior inimigo" do sofredor é ele mesmo.
Isso evidentemente pega muito mal. A apologia do sofrimento, em primeira instância, revela o julgamento moralista severo do "espírita", que se gaba em ser o "dono da verdade" e o possuidor da "palavra final", mas que é criticado por ignorar que as pessoas têm suas necessidades individuais e que a individualidade não é sinônimo de materialismo nem frescura.
Evidentemente, diante das críticas, o "espírita" que se acha (sem assumir, todavia, no discurso) "possuidor da verdade", no entanto, tenta mudar o seu discurso. Ele tenta argumentar que "ninguém veio para sofrer" e o que o sofredor vive são "provas" que são "necessárias para sua superação".
O "espírita" que ficou severo demais no primeiro momento tenta ceder no segundo. Isso já lhe tira o mérito da "palavra final", embora ele sempre insista no seu exército de palavras "bonitas" para tentar vencer a batalha retórica, sob a desculpa de que o referido palestrante, por falar palavras-chave como "amor" e "fraternidade" e, em tese, estar no lado de Jesus e Deus, pode sim, "estar" com a verdade.
E o que ele tenta dizer mais? Ele tenta enrolar dizendo que o sofredor deveria "conhecer novas habilidades", ter "autoconhecimento", "confiar em Deus" e "buscar novas soluções". Quanto a esta última sugestão, isso até é óbvio, porque é sempre do instinto de alguém sofrer buscar uma solução de superação. Outra pessoa aconselhar essa tarefa, além de não acrescentar coisa alguma, chega a ser até chato de se ouvir. Não se aconselha algo que já está sendo feito.
Há uma sordidez nesse moralismo, porque os religiosos, que acham que "conhecem a verdade" e "estabelecem contato com o oculto", não compreendem a complexidade da vida humana. Não sabem que indivíduos têm necessidades diferentes e elas não podem ser vistas como meros caprichos materialistas ou paixões mundanas.
O que há de mais sádico é que os "espíritas" acham que, por existir a vida espiritual e por haver várias encarnações, se pode aceitar que uma encarnação de cerca de 80 anos seja desperdiçada em desgraças e numa degradação da vida em que o indivíduo não molda suas vontades e desejos, mas simplesmente os anula, já que as desgraças são tantas e os esforços para superá-las, inúteis, que o sofredor se reduz a ser um mero brinquedo das circunstâncias adversas.
Isso é muito sórdido. E, se percebermos que o "espiritismo" admira Madre Teresa de Calcutá quase como um ícone da doutrina, faz sentido que a doutrina que se diz kardecista mas nada tem a ver com Allan Kardec seja uma "fábrica de sofredores", transmitindo energias pesadas naqueles que seguem com devoção tal doutrina brasileira.
A religião acaba sendo a fortuna simbólica dos aristocratas da fé e é isso que muitos não conseguem entender quando Jesus de Nazaré fazia duras críticas aos sacerdotes do seu tempo, por práticas extravagantes, preceitos e valores que, ironicamente, são feitos justamente por aqueles que seguem o antigo ativista. Os hipócritas de hoje evitam serem comparados aos hipócritas do passado, bajulando aquele que justamente condena a hipocrisia, independente de que época e pessoa vier.
sábado, 24 de setembro de 2016
O religioso, o sofrimento e os juízos de valor
O Brasil vive uma restauração conservadora preocupante, através do governo de Michel Temer e sua agenda voltada para o obscurantismo social e para o elitismo financeiro. E os religiosos aproveitam isso para se mostrarem triunfantes, sem precisar perder tempo com coitadismo.
Quem está dotado de algum status quo superior, ainda que esteja decaindo em qualidade intelectual e moral, está tentando se impor de maneira desesperada, através de três recursos: investimentos financeiros, brechas jurídicas e persuasão midiática.
Os religiosos, que em si se acham portadores do combo "Deus, Jesus e bondade" que os faz se considerarem "donos da verdade absoluta", tentam pregar a Teologia do Sofrimento de alguma forma, sem no entanto assumir esse nome, que pode assustar os mais ingênuos.
Eles tentam pregar que o sofrimento é "positivo", que ele "leva a pessoa para o caminho da superação" e tudo o mais. Aí a pessoa sofre desgraças sucessivas, sobrevive com extrema dificuldade e, quando, por sorte, atinge a prosperidade, seu exemplo serve para a exploração leviana e ostensiva de religiosos que alimentam suas vaidades às custas do sacrifício alheio.
Há juízos de valor que fazem os religiosos dizerem que o sofredor tem que deixar de ser ele mesmo, buscar outras opções de afirmação pessoal e deixar de lado as necessidades mais essenciais. Se só resta a capacidade de respirar, é a "graça de Deus". Mas, num Rio de Janeiro cheio de fumantes por tudo quanto é canto, deve-se abrir mão até de respirar...
No "espiritismo" brasileiro, sua doutrina não conhece devidamente os conceitos de reencarnação e vida espiritual, apenas tendo uma compreensão superficial que só serve para dar falso diferencial a seu igrejismo medieval,
Isso é grave. Gente que mal sabe o que é vida espiritual se acha no direito de dar seu pitaco ao sofredor que sofre desgraças sucessivas e limitações difíceis de serem superadas. Fala nos tais "resgates espirituais" e ainda diz para a pessoa abrir mão de seus desejos e necessidades. Se o cara tem vocação para ser servidor público e não consegue, então vá ser flanelinha de rua.
Os religiosos não sofrem. É fácil para eles cobrar austeridade dos outros, renúncia à individualidade, confundida com "paixões terrenas" ou "caprichos materialistas". Temos uma encarnação estimada em 80 anos e tanto faz para os religiosos que tudo se desperdice em desgraças gravíssimas, e, no caso dos "espíritas", achar que, se perde uma encarnação, não faz mal, tem outra depois.
Só que nenhuma encarnação é igual a outra. São outros contextos, outras situações, outros impasses. Uma mesma cidade pode mudar muito em cinquenta anos, as oportunidades não se repetem. O Rio de Janeiro de 1958 tornou-se até pior 58 anos depois. Não há como exigir, por exemplo, um cenário de Bossa Nova como no passado ou que uma cantora de axé-music cante com a mesma doçura intensa de uma Sylvia Telles.
Os religiosos que recebem medalhinhas, condecorações, têm representantes no Congresso Nacional, são cortejados pela grande mídia patronal, são intocados pela Justiça por mais que cometam erros gravíssimos, eles não sabem a natureza de quem sofre infortúnios.
Os juízos de valor parecem lindos e sábios quando tomados do verniz de falsa superioridade em que se apoia a retórica religiosa. Crueldades imensas podem ser legitimadas por um discurso dócil, paternal, que sugere que até mesmo o holocausto pode ser um "sacrifício necessário" a ser aceito sem queixumes, sob a desculpa de que haverá "outra vida" e "bênçãos futuras" mais adiante.
Não é o religioso que perde a casa por causa de uma tempestade. Não tem um parente morto em um assalto, não leva um fora de uma mulher que ele considera ideal, não perde o emprego no qual estava preparado para exercer, não sofre impasses que dependem de uma overdose de pais-nossos para serem resolvidos.
O religioso está aí, com seus desfiles de palavras bonitas, formosas e eloquentes, um desfile fashion da cosmética retórica das boas frases. E os "espíritas" são os que mais investem nesses desfiles, principalmente agora, no governo Temer, em que apelos desesperados pelo conformismo alheio diante dos retrocessos pesados que virão são dados.
Usando como pretexto ideias como "Deus", "Jesus" e "caridade", os "espíritas" se acham beneficiados pelo juízo de valor que fazem e pela palavra final que acreditam possuir. Acham que um bom desfile de palavras bonitas irá resolver as coisas da vida, mas aí a gente se lembra de um famoso ditado popular.
Assim como, segundo a alegoria, no inferno há uma abundância de boas intenções, nele também repousam as mais belas palavras. E o "umbral" dos "espíritas" é onde residem as mais lindas palavras e os mais belos exemplos que, na verdade, só conseguem mostrar o quanto sofredores deram duro para obter algum benefício e isso só serve para alimentar as vaidades paternalistas dos palestrantes do "espiritismo".
quinta-feira, 22 de setembro de 2016
A catástrofe do cenário político do Brasil de hoje
A situação que o Brasil vive hoje é simplesmente assustadora. E mais assustadora porque a sociedade considerada "mais influente" permance na sua indiferença, como pais de família que acham que o incêndio a atingir os quartos de dormir deles e dos filhos fossem apenas uma festinha com churrasco.
O quadro é caótico e o Brasil está à deriva. Setores do Poder Judiciário, do Ministério Pùblico e da Polícia Federal movidos pela compreensão tendenciosa e parcial das leis e pela condenação seletiva apenas de suspeitos "mais incômodos". Uma grande mídia de rádios e TVs decadentes, e de uma imprensa que cada vez mais esquece seu compromisso com a informação, publicando mentiras aberrantes e descaradas.
Capitais que sofrem sérios retrocessos sociais como Rio de Janeiro e Curitiba cada vez mais perdem a condição de servirem de "cidades-modelo" para qualquer coisa no país. Nem para popularizar campeonatos de cuspe à distância como se fossem a "última palavra do entretenimento" no Brasil essas capitais, e muito menos São Paulo, servem mais.
Desde que toda uma campanha para derrubar Dilma Rousseff, com base em acusações infundadas e muito vagas, referentes a práticas que seriam normais a qualquer presidente da República, o Brasil não só não resolveu sua crise econômica como a fez se agravar e, o que é mais grave, a ela acumulando uma série de crises de natureza política, social, institucional, jurídica e midiática.
Existe até a crise cultural, que há muito tempo fez a chamada cultura popular se degradar com fenômenos da música, da imprensa, das (sub)celebridades etc patrocinados pela mídia oligárquica e patronal como se fossem "representantes autênticos" das classes populares e apoiados por uma intelectualidade associada e pseudo-progressista.
O Brasil vive uma verdadeira catástrofe no qual as forças retrógradas sociais se extasiaram com a volta aos "bons tempos" (leia-se Era Geisel, quando a sociadade brasileira estava, aos olhos da plutocracia, num patamar ideal). Até a onda de feminicídios conjugais, que já intensificava desde 2013, voltou a todo o vapor, fazendo a festa de machistas que "brincam" com facas, revólveres ou, às vezes, venenos.
E toda essa catástrofe, que faz com que especialistas sérios afirmem que o Brasil entrou na Idade Média, deixa as pessoas indiferentes vivendo uma felicidade assustadora, não pelo suposto otimismo ou esperança que possam representar, mas pelo desprezo ou pela ignorância de coisas piores que já estão acontecendo e outras que têm sua vinda anunciada para 2017.
A degradação do mercado de trabalho, a entrega das riquezas brasileiras para corporações estrangeiras e projetos legislativos que tentam reverter os avanços e as conquistas sociais obtidos nos últimos 80 anos - embora se fala até na revogação da Lei Áurea, são a tônica desse "novo" país que se desenha com o fim da Era PT no Governo Federal.
Aliás, a revogação da Lei Áurea, que parece piada de Stanislaw Ponte Preta, não é tão anedótica assim. A "bancada do Boi" (ruralista) no Congresso Nacional pretende transformar em lei a PEC 3842, que retira as expressões "jornada exaustiva" e "condições degradantes de trabalho" das definições de crime de "trabalho escravo".
Isso é muito grave porque, através da reforma trabalhista do governo de Michel Temer, os patrões terão seus abusos autorizados por lei, como descumprir obrigações trabalhistas, fazer prevalecer seus interesses nos acordos coletivos de trabalho, pagar menos salários aos trabalhadores e forçá-los a trabalhar mais horas por mais anos de serviço, se aposentando (e mal) mais tarde.
É assustador o masoquismo um tanto alienado das pessoas, que pensam agir com esperança e otimismo diante desse cenário desolador. Acham que basta ter fé para sobreviver a qualquer retrocesso, e que podem entender a realidade sem poder compreender metade de sua natureza complexa, que nunca é difundida pela grande mídia nem pelo status quo plutocrático de hoje.
É assustadora a situação de catástrofe que atingirá o Brasil em dimensões trágicas. Atingirá não só as classes populares ou os novos agentes sociais - como a sociedade LGBT - mas as alegres elites felizes na areia da praia, que mal saberão que a felicidade cega das festas de hoje pode gerar uma ressaca trágica amanhã. O Brasil entrou em colapso e isso afetará sobretudo quem não está sequer preparado a admiti-lo.
É uma situação grave, com um país desgovernado por um presidente que chegou ao poder de maneira institucionalmente violenta, passando por cima das leis e sob a corrupção de setores legislativos e jurídicos.
É um quadro político aberrante, para o qual nenhum otimismo preguiçoso poderá resolver, pois o que vem por aí será duro demais para a "fé-licidade" cega das pessoas passar por cima. O Brasil está muito abaixo para poder passar por cima de nuvens trovejantes.
terça-feira, 20 de setembro de 2016
O Rio de Janeiro de torcedores barulhentos, poluição e gente fumando muito
O Estado do Rio de Janeiro sofre uma decadência vertiginosa nos últimos tempos. Com muito sacrifício teve que desfazer, relativamente, da presença do deputado Eduardo Cunha no cenário nacional. Relativamente, porque há o risco da influência nefasta do ex-presidente da Câmara dos Deputados continuar existindo nos bastidores da política.
O Rio de Janeiro sofreu uma série de retrocessos e sucumbe também por causa do conformismo do seu povo, não de todo ele, mas de uma maioria influente, que parece viver num "paraíso" enquanto o Estado se transforma num inferno.
Já na saída de casa os cariocas têm que dobrar a atenção ao pegar os ônibus padronizados, com empresas se escondendo por trás de uma pintura única, confundindo os passageiros que ainda têm que enfrentar acidentes de ônibus cada vez mais constantes e perigosos. Um deles, há poucos dias, em Brás de Pina, deixou 23 feridos, quatro deles com gravidade.
Os cariocas estão aceitando qualquer coisa, embora também seu conformismo revele indiferença e descaso a tudo. Contraditoriamente, a juventude estava satisfeita com a existência de uma "rádio rock" medíocre, a Rádio Cidade, mas de tão ocupados com WhatsApp e festas com "sertanejo", também deixaram a rádio morrer de podre, sem deixar muita saudade.
O Rio de Janeiro assiste a um cenário político neocoronelista e a pistolagem da Baixada Fluminense é uma realidade, com vários pré-candidatos a cargos políticos assassinados. A violência corre solta nas zonas suburbanas e favelas e houve até arrastão no novo túnel Marcello Alencar, no Centro da outrora Cidade Maravilhosa.
Mas as pessoas estão felizes no Rio de Janeiro, uma alegria que já é viciada, sem motivo, marcada apenas por "glórias passadas" - a paisagem tropical, o status de capital sócio-cultural, os antigos holofotes do mundo inteiro e o glamour que só existiu, de fato, em 1958 - , sem saber que tudo mudou, e para pior.
Ou então, quando sabem, se comportam como determinados senhores que transformam problema em piada porque não são eles que sofrem tais infortúnios. Lendo as manchetes de jornais, esses senhores esnobes parecem despejar uma ponta de ironia quando falam sozinhos diante dos jornais nas bancas: "o Rio de Janeiro não tem jeito, mesmo".
Como nos filmes de Buñuel, o antes glamouroso carioca, famoso por sua cordialidade, passou a dar lugar a um estereótipo grosseiro reforçado por um comportamento dominante nas ruas e nas redes sociais. Cariocas que já não se importam com o fedor de fezes de cachorros ou de carros de lixo muito mal conservados - na "preguiçosa" Salvador, na Bahia, caminhões de lixo circulam sem exalar mau cheiro - também demonstram comportamento agressivo, sarcástico e ameaçador.
O que chama a atenção nesse cenário trágico do Rio de Janeiro é que a decadência atinge todos os aspectos, que vão muito mais que a crise econômica e de segurança que aparecem nos jornais, e se manifestam até em famílias felizes que vão para o restaurante diante de um caminhão de lixo exalando fumaças de fedor tóxico ou entram entusiasmados ao McDonald's comprar combos de valor nutricional duvidoso de funcionários que trabalham em condições subumanas.
Há também o contexto de Niterói, cidade que chegou a ser capital do Estado do Rio de Janeiro durante décadas enquanto o Rio de Janeiro era capital do país e da Guanabara. Com a fusão imposta pela ditadura militar, o município do índio Arariboia só agora se resignou em ser uma cidade de um provincianismo doentio, conformada em ser um mero quintal caipira da vizinha do outro lado da Baía da Guanabara.
No Grande Rio, se vê gente berrando, em pleno final de noite, por causa do fanatismo do futebol carioca, que, por causa de seus poderosos dirigentes, os "cartolas", sempre arrumam um jeito para os quatro times cariocas (Flamengo, Fluminense, Vasco e Botafogo) saírem vitoriosos. Não podem "comprar" vitórias o tempo todo, para não despertar desconfiança, mas começa a ser notória a indústria de manipulação de resultados que sempre põe os quatro clubes em boas posições nas tabelas.
O fanatismo do futebol é tratado como uma ideologia totalitária, que se torna fator determinante para as relações sociais a ponto de haver discriminação e constrangimentos sociais contra quem nem sequer curte futebol. Um sentimento doentio, que faz com que torcedores berrem feito trogloditas quando o respectivo time favorito faz um gol numa partida.
E isso vai sobretudo nas quartas-feiras à noite, e mesmo quando um jogo se arrasta até 23h45, se houver um gol a favor do time carioca envolvido, a gritaria é ensurdecedora, com pessoas berrando de maneira estridente, ignorando que há pessoas querendo dormir para trabalhar no dia seguinte.
E isso se torna grave quando houve rumores de que o governo Michel Temer iria aumentar a carga horária de trabalho, o que forçaria as pessoas a dormir e acordar bem mais cedo. Diante da pressão da sociedade, Temer e sua equipe ultimamente andaram tentando desmentir o fim ou diminuição de vários direitos trabalhistas.
Mesmo assim, isso não justifica que o fanatismo doentio e obsessivo dos torcedores de futebol lhes dê direito de gritar nas altas horas da noite, de maneira cega, sem observar o direito do outro, que precisa de silêncio para dormir. Para piorar, os torcedores, só por "pirraça", chegam a ficar em silêncio em um bom momento de jogo, até que o gol faça voltar, do nada, a irritante barulheira.
O Rio de Janeiro é considerado Estado onde existe maiores abusos e maior intolerância vindas de jovens de classes abastadas ou mesmo de classe média que sempre corroboram com os interesses dos mais ricos ou de setores sociais retrógrados. Para piorar, os retrocessos ocorridos no território fluminense não impedem do Estado ser considerado "modelo" para o país, o que pode ser um risco de medidas e hábitos retrógrados e viciados serem "exportados" para o resto do país.
Um dado grave no Grande Rio é que a poluição chega a superar a Grande São Paulo. Segundo relato da agência de notícias Reuters, o ar do Rio de Janeiro é "sujo e mortal", e é na ex-Cidade Maravilhosa que se mostra a maior parte das mortes relativamente prematuras que atingem brasileiros, por causa de doenças respiratórias, cardíacas ou vários tipos de câncer.
Observa-se até estranhas "neblinas" na paisagem carioca vista de Niterói ou vice-versa. As duas cidades vizinhas mostram um ar tão sujo que basta andar pelas ruas e depois experimentar cheirar a palma da mão ou o braço para sentir um odor parecido com fumaça de carro ou de nicotina. Mesmo não-fumantes têm esse odor, o que é uma séria ameaça à saúde.
Mas o pior é a arrogância que uma boa parcela de cariocas tem para fumar cigarro. Os niteroienses, por conseguinte, seguem o mau exemplo. Uma quantidade considerável de pessoas fumando nas ruas, com a fumaça e o odor contagiando não-fumantes, que se tornam fumantes passivos com sério risco de morrerem pelo cigarro que por si não fumaram.
A coisa chega a ser tão ridícula que os vaidosos fumantes - que parecem ter dinheiro de sobra para comprar os terríveis maços que contém até veneno de rato como uma de suas substâncias - chegam, só de sacanagem, a andar quarteirões só com o cigarro na mão, e, em ruas quase fechadas, tragam os cigarros soltando uma fumaça que incomoda quem está ao lado.
Isso já é um cenário trágico, de catástrofe, e prova que o Rio de Janeiro está decadente, como o restante do Sul e Sudeste brasileiros, regiões antes associadas ao desenvolvimento social e econômico, mas que sofreram surtos violentos de provincianismo e ultraconservadorismo que reflete até no decadente cenário político que vivemos, com o decadente governo de Michel Temer.
Todo esse cenário decadente de plutocratas no poder, com tucanos esperançosos em devorar ainda mais o dinheiro público com privatizações e outros mecanismos, é servido a todo o Brasil como um presente de grego das elites do Sul e Sudeste que, em nome da moralidade, permitiram a ascensão de políticos como Eduardo Cunha, que ajudaram a pôr o Brasil na deriva de hoje.
domingo, 18 de setembro de 2016
O "espiritismo" também "não tem provas, mas convicções"
O que poderia ser um "golpe certo" contra o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva acabou se tornando uma grande gafe. O discurso do procurador do Ministério Público Federal, Deltan Dallagnol, com seus simplórios esquemas gravados em arquivos de Power Point, que foram alvo de muitas gozações nas redes sociais.
Ele até tentou colaborar com a plutocracia. Com seu juízo de valor e uma linguagem duvidosa no âmbito jurídico - mas compreensível se percebermos o quanto Gilmar Mendes e Sérgio Moro também fazem com as leis, manipulando-as tendenciosamente - , Dallagnol definiu Lula como "comandante máximo da corrupção" e usou adjetivos nada objetivos como "maestro" e "general".
Sobre a acusação de que Lula seria proprietário de um triplex no Guarujá - na verdade um modesto apartamento de classe média, do qual Lula e Marisa desistiram de comprar - , Dallagnol partiu para a gafe: "não temos provas, mas convicções".
A mídia de direita tentou desconversar, dizendo que "não foi exatamente isso que foi dito", mas se juntar as peças do quebra-cabeça discursivo do homem do esquema simplório do Power Point, verá que é justamente isso: condena-se alguém sem provas, mas por "pura convicção" de que esse alguém é culpado.
No "espiritismo", vemos a mesma coisa, só que "pelo bem". Vide Richard Simonetti, um dos "sábios" palestrantes "espíritas" que havia atribuído levianamente ao ateísmo um estímulo ao suicídio no seu artigo "Os que matam a esperança", que em determinado trecho diz, através destas palavras:
"Admitindo que haja leis que regem a Natureza, pergunta-se: quem as instituiu? Quem as sustenta? É só usar o bom senso para perceber que a presença de um Criador se impõe, por mais sofisticados sejam os raciocínios dos que pretendem justificar a existência do ovo sem a galinha, do Universo sem Deus.
O grande problema é que, como diz a sabedoria popular, para aquele que crê nenhuma prova é necessária; para o que não crê, nenhuma prova é suficiente.
E na medida em que a Humanidade segue pelo perigoso caminho da Ciência sem Deus, amplia-se o número dos que afundam no materialismo, com perturbadora concepção de que a vida termina no túmulo".
Buscando misturar um suposto cientificismo dotado de muito pedantismo e um igrejismo convicto, Simonetti tenta parecer neutro, mas na sua retórica, quando compara que "para aquele que crê nenhuma prova é necessária" e "para o que não crê, nenhuma prova é suficiente", estabelece uma preferência à primeira opção.
A criminalização do raciocínio questionador já se observou sobretudo no caso de Francisco Cândido Xavier e suas obras mistificadoras, quando a crescente observação de irregularidades nas atividades "mediúnicas" do anti-médium mineiro faziam os "espíritas" ficarem preocupados com tamanhas repercussões.
Daí que o próprio Chico Xavier sempre pregava, através de suas palavras dóceis ou pelo ditado do espírito de Emmanuel, para que ninguém questionasse, ninguém reclamasse, ninguém contestasse. Muita gente acha isso muito lindo, mas há um motivo nada nobre nesses apelos, que é o de Chico Xavier salvar sua própria pele.
As observações sobre irregularidades nas obras "psicográficas", sejam livros que envolvem nomes de autores famosos falecidos, se acumularam com provas consistentes, agravando ainda mais os escândalos e deixando Chico Xavier em grande desvantagem.
O marketing religioso que, por sorte, encontra respaldo na sociedade, é que permitiu que Chico Xavier contornasse os obstáculos usando de coitadismo e triunfalismo, no primeiro caso se posando de vítima, no segundo achando que será um vencedor através de muitas derrotas.
Daí que se percebe o apelo medieval do "tóxico do intelectualismo", dos "males da ciência", da "overdose de raciocínio" e do "perigo de pensar". Acham que o pensamento científico, por estar sujeito a erros, não pode ir adiante, mas isso se compara a alguém que, por tropeçar uma vez, é proibido de continuar andando.
O caso de Humberto de Campos, nome associado à maior farsa literária que foi beneficiada pela impunidade, já mostra o jeito "Dallagnol" do "movimento espírita", que, embora se autoproclame "simpatizante" da Ciência e do pensamento questionador, sempre reage com indignação medieval quando os questionamentos atingem o terreno da fé religiosa dos "espíritas".
Daí que os "espíritas" gostam dessa ideia de "não ter provas, mas convicção". Logo a doutrina que se diz "ligada à lógica e o bom senso" os desrespeita, de maneira constrangedora, quando aceita obras irregulares em nome de mitos, dogmas e totens relacionados aos estereótipos de "bondade" e "caridade".
A aceitação de Chico Xavier, mito religioso patrocinado pela mesma Rede Globo que aplaudiu Dallagnol e seu Power Point de aluno de primeira série, preocupa diante dessa carteirada religiosa e da complacência com irregularidades, quando elas são feitas sob o pretexto da "bondade" e outras qualidades semelhantes.
No entanto, a espécie humana, dotada da capacidade de raciocínio, deve colocar a lógica e a coerência acima até mesmo do deslumbramento religioso, sob pena de ver o conceito de "bondade" corrompido diante da complacência com a fraude e com a mistificação.
Nem sempre o amor pode tudo, como no caso da cumplicidade com obras duvidosas e irregulares que envolvem falsidade ideológica, fanatismo religioso e outros vícios. Nunca se pode justificar o amor e a caridade para enganar e iludir as pessoas.
sexta-feira, 16 de setembro de 2016
"Espíritas" insistem em servir a dois senhores
Que coerência espírita se espera para aquele que se serve a dois senhores, apreciando o cientificismo de Allan Kardec mas exaltando o igrejismo medieval de Francisco Cândido Xavier? Nenhuma, por mais que o palestrante "espírita" da ocasião insista em falar numa coerência que ele mesmo ignora.
Jesus de Nazaré havia dito que ninguém pode servir a dois senhores ao mesmo tempo. Mas os "espíritas" insistem em desobedecer os ensinamentos do próprio Jesus, sobre o qual derramam palavras viscosas e gosmentas de bajulação.
Por um lado, falam da "propriedade e atualidade" dos ensinamentos kardecianos. No outro, se referem a Chico Xavier como "profeta da sabedoria universal". Num momento, dizem que Erasto tem razão. No outro, afirmam ver coerência em Emmanuel, cujo perfil Erasto reprovaria sem hesitação.
É lamentável que os palestrantes do "movimento espírita" insistam com tamanhas contradições, logo eles que se dizem os "paladinos da coerência". Chegam mesmo a dizer que as obras de Chico Xavier "ampliam" e "atualizam" os postulados da Doutrina Espírita, quando percebemos a inconsistência dessa tese tão absurda, embora agradável a muitos.
De que adianta, por exemplo, os palestrantes que juram defender o rigor científico de Allan Kardec, apelar para Emmanuel e o fictício André Luiz, cujos livros não apenas rompem com os postulados kardecianos como inserem absurdos para os quais não há uma hipótese plausível?
Sobre a suposta realidade espiritual que se observa no livro Nosso Lar, o próprio Allan Kardec renegaria esta obra, por verificar que, do mundo espiritual, não se tem qualquer ideia que possa ser considerada cogitável, pois faltam estudos sérios a respeito, como faltavam nos tempos do pedagogo francês e ainda são muito precários até os nossos dias.
Portanto, não há provas cabíveis que mereçam sequer a condição de palpites sobre a suposta existência de colônias espirituais. Além disso, a presunção dos "espíritas" da existência desses lugares, uma pretensa "compensação" para os sofrimentos e amarguras que se acumulam nas pessoas, revela um materialismo gritante.
Há até uma contradição, na qual há um desgosto com a vida material daqui, com o "mundo cão" que os próprios "espíritas" comprovam serem impotentes para resolver. Há uma ojeriza sutil a tudo que seja qualidade de vida na Terra, em que até ter um emprego de acordo com o talento de alguém é visto como "extravagância" e, namorar alguém por afinidade, uma "luxúria".
A vida "qualquer nota" defendida pelos "espíritas", que não veem individualidades e acham que todos somos uma multidão de nadas querendo fingir falsos papéis sociais, revela a insensibilidade dos "espíritas" quanto à necessidade de aproveitar a brevíssima encarnação não para aguentar desgraças, mas para buscar progressos.
Muitos "espíritas" se contradizem - contradizer é, aliás, a única coisa que fazem - quando tentam omitir a Teologia do Sofrimento, alegando que "ninguém nasceu para sofrer" e tentam verdadeiros dribles retóricos para manter a razão sempre ao seu lado, ainda que digam não ter pretensão para tal finalidade.
Acham que a pessoa "pode trabalhar seus talentos", mas não explicam por que certas pessoas só conseguem sofrer desgraças e infortúnios, e com dificuldade descomunal só conseguem superar depois de tanta dor, tanto martírio e conseguindo um benefício aquém do esperado.
Essas contradições todas partem porque os "espíritas" tentam usar Allan Kardec para explicar o igrejismo. E tudo isso com traduções malfeitas, como as das editoras FEB e IDE. Fica fácil ficar pregando através de tais traduções, pois nelas o pedagogo francês é transformado, tendenciosamente, num padre, e o que se vê nesses livros são os postulados da "igreja do padre Kardec".
Que conselhos, portando, os "espíritas" têm moral para dar? Num momento, dizem que ninguém nasceu para sofrer. Num outro, dizem que as desgraças mais pesadas são necessárias para "dissolver paixões terrenas". Num momento, exaltam Erasto, no outro louvam Emmanuel. Numa ocasião, falam em Ciência, noutra pregam a Religião.
Com tantas contradições, não há coerência que encontre morada. A palavra coerência pode ser até evocada, milhões e milhões de vezes, bajulada, acariciada, com textos enfeitados, perfumados, açucarados, ou até fazendo mil poemas a respeito. Mas, onde tem contradição e confusão, a coerência pode ser chamada aos berros que ela nunca virá. Ela não encontra morada nesses ambientes.
quarta-feira, 14 de setembro de 2016
Os "espíritas" são mais queixosos e teimosos que se imagina
Os "espíritas" andam fazendo seu juízo de valor a respeito do sofrimento alheio. Definem que as desgraças que o outro sofre são "desafios", "testes sucessivos" e "sacrifícios necessários" e sempre exigem dele que "confie em Deus", "não reclame jamais" e "mude os seus pensamentos".
Exigir dos outros é muito fácil e o que se observa é que também parece cômodo que nós, estando do outro lado do plenário das palestras, sejamos sempre os portadores de erros, fraquezas, hesitações e exageros. Nós somos o "eu" para nós, mas poucos percebem o "eu" dos "conselheiros espíritas" os quais esquecem dos próprios equívocos que cometem.
O "espiritismo" brasileiro é uma sucessão de erros graves. Em que pese a gravidade que as religiões evangélicas de padrão "pentecostal", que lideram a Bancada da Bíblia no Congresso Nacional, trazem para o país, propondo um modelo de sociedade nos moldes do século XVIII, o "espiritismo" em muitos casos é até pior diante de sua desonestidade doutrinária não assumida.
Ver palestrantes que, num momento, exaltam a "brilhante atualidade" do pensamento de Allan Kardec e, depois, vão exaltar o igrejismo "de Francisco Cândido Xavier e Divaldo Pereira Franco, é altamente constrangedor. E mais preocupante é que tudo permanece num ciclo vicioso que parece longe de terminar.
Falta autocrítica no "movimento espírita". Além do mais, o Brasil vive uma tendência, notada em diversas atividades, em que as pessoas se sentem reféns de suas próprias contradições, criando um apego a ideias e práticas retrógradas e ao mesmo tempo a um pretensiosismo em fazer tudo parecer novo e moderno.
É justamente na parcela da sociedade brasileira com maior status quo que ocorre um processo de decadência e crises irrecuperáveis, mas que há todo um esforço em, pelo menos, botar a sujeira debaixo do tapete ou empurrar a tragédia iminente com a barriga.
O "espiritismo" paga o preço caríssimo de ter feito a opção catolicizada. E, como tudo acontece no Brasil, vide manobras como o "jeitinho brasileiro" e a "memória curta" que sempre beneficia os malandros de ocasião, o igrejismo, nos últimos 40 anos, anda dissimulado por uma falsa adesão ao cientificismo kardeciano.
Só isso abre caminho para tantas e tantas irregularidades. Como no próprio caso de Chico Xavier, ele que virou "ícone da caridade" de graça, e sob a ajuda da manipuladora Rede Globo, sedenta em lançar uma "água com açúcar" religiosa para abafar a crise da ditadura militar e concorrer, "à paisana", à ascensão de pastores eletrônicos como R. R. Soares e Edir Macedo.
O próprio Chico Xavier mostrou aspectos condenáveis, como o juízo de valor e a maledicência. O "médium" que dizia para "ninguém julgar quem quer que fosse" acusou, sem provas, as pobres vítimas da tragédia de um circo em Niterói, em 1961, de terem sido romanos sanguinários. Para piorar, ainda botou a responsabilidade a Humberto de Campos, nome usurpado por Xavier e muito mal disfarçado pelo cínico pseudônimo de Irmão X.
Quanto a maledicência, o caso de Jair Presente é ilustrativo. Irritado com o ceticismo dos amigos de Jair Presente, que o conheciam bem e, por isso, desconfiaram das "psicografias" lançadas por Chico Xavier, este definiu o ceticismo como "bobagem da grossa". Como ficar do lado de um ídolo religioso e não de gente que conviveu com um falecido e se sentiu lesada por supostas mensagens do além, é algo bastante preocupante.
Chico Xavier se irritava, reclamava e o próprio fato de pregar para ninguém se queixar da vida é algo que deve ser pensado com muita cautela. Afinal, as pessoas que nunca suportam ver os outros infelizes ou reclamando da vida são mil vezes mais queixosos e mais resmungões e, para piorar, são os que reclamam dos que reclamam da vida com mais razão.
Porque, muitas vezes, as pessoas que supostamente "reclamam demais" da vida sofrem muitos prejuízos e têm dificuldade extrema em superá-los. Os que não aguentam esses queixosos é que querem um mundo de ilusão, de faz-de-conta, de mar-de-rosas, e em vez de ajudar os outros julgam o sofrimento extremo como "aprendizado" e não como desgraça.
Em outras palavras, para o palestrante "espírita", sempre se achando detentor da "melhor palavra" e da "lição certeira", tanto faz a pessoa ser prejudicada. A vítima é a "culpada", e ela é que pague pelo seu próprio prejuízo. Fica fácil dizer para os outros aguentarem o sofrimento, terem paciência aqui e ali.
Ora, os sofredores já encararam suas desgraças com muita paciência. Há muito reformularam seus pensamentos na tentativa de ter alguma esperança. Redobraram seus esforços para superar grandes obstáculos.
Portanto, os conselhos que os "espíritas" sempre dão aos sofredores sempre chega tarde demais. Se o sofredor não consegue superar suas dificuldades, nem sempre é culpa dele, até porque as barreiras são impostas por outrem. Aí que está um dos maiores erros dos "espíritas", achar que dar murro em ponta de faca é aprendizado, achar que a asfixia ensina a respirar melhor.
segunda-feira, 12 de setembro de 2016
Parábola do religioso "espírita" e do rico
Dois homens faleceram com a mesma idade, na velhice. Um era um aristocrata, um homem rico que viveu do luxo e da luxúria, com dinheiro, festas e outras curtições. Outro era um religioso "espírita", que fazia atividades filantrópicas e vivia de fazer pregações em palestras e livros.
Os dois se dirigem ao Departamento do Além, que avalia o que as pessoas teriam feito em suas vidas recém-terminadas. Funcionários são designados para atender aos espíritos que deixaram a vida terrena, e analisam suas trajetórias de vida, dando um parecer final depois.
Diante da espera, o homem rico pergunta para o "espírita":
- O que será que vai dar? Será que ganharemos algum benefício por nossas vidas?
- Da minha parte, creio que sim. Eu que fiz tudo pelo próximo, acho que terei meu ingresso ao lado do Pai Maior.
O funcionário chama o homem rico para conversar. O homem rico se dirige ao balcão, e o funcionário lhe diz algumas coisas e ouve as respostas do aristocrata. Depois o funcionário se retira, para ver documentos e analisar o caso, enquanto o rico espera com paciência.
Depois, o funcionário retorna e dá algumas palavras, recebendo eventuais respostas do interlocutor. Este às vezes balança a cabeça de maneira positiva, como se estivesse consentindo e o funcionário parece falar mais algumas coisas. De repente, o homem rico é dispensado e este se dirige ao "espírita".
- O que é que aconteceu? Você foi enviado para o céu? - perguntou o "espírita", inocentemente, embora acreditando na hipótese negativa.
- Não fui para o céu. Tenho que viver novas encarnações. Tenho muitas dívidas sociais a fazer e o caminho é muito longo. - disse, calmamente, o homem rico.
O funcionário chama então o "espírita", que interrompe a conversa e pede licença ao rico, que acaba por esperar o outro.
O "espírita" reage não com a indiferença do homem rico, mas com a esperança de que sua missão pode ter chegado ao fim. Mas o funcionário manteve a mesma frieza profissional, o que não causou estranheza ao "espírita", já acostumado com a conduta dos servidores na Terra.
O funcionário fez suas perguntas. O "espírita" respondeu com serenidade e uma tranquilidade de alguém que se considerava triunfante, apesar de simular modéstia.
- Sabe como é, eu me dediquei ao próximo, dei a boa palavra, criei instituições que assistiam os necessitados, vivi completamente em nome da caridade e aceitava condecorações como um reconhecimento humilde ao trabalho que realizei.
- Certo, certo.
- Será que terei assento ao lado do Pai Maior, o Deus Criador?
- Um momento.
O funcionário foi ver os documentos. Verificou a trajetória do "espírita" em outras encarnações. Quando viu os papéis mais recentes, prestou muita atenção, ficando parado por uns instantes prestando atenção no texto. No entanto, reagiu com uma expressão não muito feliz. Ao retornar, simplesmente disse:
- Senhor...
- Sim. - respondeu o "espírita".
- Você não irá para o céu. Sinto muitíssimo, mas o que você fez na Terra foi no mínimo constrangedor.
- Como assim? Que eu não tenha assento junto ao Senhor, ainda vai, mas dizer que meu trabalho foi constrangedor é algo que me entristece muito.
- Pois, para sua tristeza, eu revelo que o que você fez não teve um milésimo da importância que as paixões religiosas da Terra atribuem.
- Mas como?
- Você foi um mistificador que usava a caridade apenas como um meio de complementar sua campanha religiosa. Difundiu ideias fora da realidade, enganou multidões, explorou a boa-fé de todos, e ainda se envaideceu com os prêmios terrenos que recebia.
- Isso é impossível! Eu trabalhei pelo próximo! - disse, irritado, o "espírita".
- Pois não é isso que parece. Tudo o que você fez foi um igrejismo piegas, desonesto, exaltando farsantes ao lado de figuras autênticas como Allan Kardec, e seu moralismo era tão ruim que inspirou alguns suicídios.
- Suicídios? Eu, que sempre preguei para as pessoas não se suicidarem, porque era um ato lamentável...
- Mas você sempre fez apologia ao sofrimento, dizia para as pessoas aguentarem dificuldades sem reclamar, não aprovava a tristeza prolongada e achava que as pessoas deviam abrir mão de suas necessidades e terem autoconhecimento para outros desejos e interesses.
- Mas o que isso tem a ver com o suicídio de algumas pessoas?
- Simples. Por reprovar a individualidade humana, achando que desejar e necessitar de algo é frescura materialista, você frustrava as pessoas que, moralmente humilhadas, tiravam suas próprias vidas. Nem o fato de falar em vida eterna ou bênçãos futuras adiantou, porque, a essas alturas, tanto faz os sofredores se desgraçarem na Terra quanto no além-túmulo.
- Sinto muito pelo que aconteceu.
- Só que você influenciou isso, mesmo sem querer. Mas, por não ter evitado isso, você terá que enfrentar as consequências desse desprezo ao sofrimento alheio.
- Mas aí é demais. Nada falei de tão grave.
- Falou, sim. E eu devo citar o caso daquele homem rico que atendi antes.
- Como assim?
- Ele era um fanfarrão, um homem que vivia de luxo, gozos abusivos e poder. Mas, no intervalo do julgamento do divórcio de sua primeira esposa, o homem rico foi fazer um lanche e trocou um papo com ou depressivo engraxate, que lamentava as suas dificuldades de ascensão na vida, com tanto custo para cuidar de sua família.
- E o que ocorreu?
- O pobre rapaz contou para o rico que sentia vontade de matar, e que estava na situação limite para obter coragem e tomar veneno de rato. E eis que o homem rico lhe comentou que gostava de ouvir um disco de Dave Brubeck, um músico de jazz, o famoso Take Five, para curar de momentos de depressão.
- E o que ocorreu depois?
- Olha, os dois nem se reencontraram. Eu é que informei ao homem rico que o engraxate comprou o disco e virou músico de jazz. Nunca mais ficou deprimido, usava a música como terapia para suas frustrações emocionais. E pode ajudar ainda mais sua família com a renda dos concertos.
O "espírita", decepcionado, chegou perto do homem rico.
- E aí, o que aconteceu? - disse o aristocrata.
- Não vou para o Paraíso. Me falaram que eu prejudiquei as pessoas com meu moralismo religioso. Quanta tristeza eu tive ao ouvir o funcionário me falando coisas de machucar o coração!
- Eu nunca imaginei que iria para o Paraíso. - disse o aristocrata. - Eu vivi as ilusões da vida material, mas de tal forma que, quando encerrei minha vida na Terra, já me diverti o suficiente, me preparando para uma vida mais responsável. E como vivi sempre alegre, apesar dos abusos de minha riqueza, às vezes tinha um talento oculto de ajudar as pessoas, que mesmo minha vaidade não pôde perceber.
- E aí?
- Aí que isso se tornou um atenuante para mim e eu, preparado para admitir a distância do caminho para o Alto, recebi a sentença de maneira tranquila. Pelo menos minhas ilusões eram materiais e eu pude abandoná-las quando chegou a hora. As suas ilusões você achou que nunca abandonaria, daí essa sua inesperada decepção.
sábado, 10 de setembro de 2016
Por que os casamentos espontâneos se dissolvem com mais facilidade?
Há poucos dias, um dos casais que eram símbolo de cumplicidade e amor sincero, dos apresentadores William Bonner e Fátima Bernardes, chegou ao fim, depois de 26 anos de casamento, com três filhos crescidos. A separação pegou de surpresa a opinião pública, que nunca esperou um desfecho desses. O mais incrível é que a separação já ocorria há alguns meses e só recentemente foi noticiada.
Com bem menos cumplicidade, casamentos que não são movidos por amor tendem a durar mais, mesmo quando existem crises e divergências. Há pelo menos duas ou três apresentadoras de televisão que, casadas com executivos de TV ou empresários, vivem uma relação sem muita cumplicidade e até com eventuais crises, mas que mesmo assim não resultam em divórcio ou separação.
É um fenômeno a ser estudado. Há mulheres aparentemente bem casadas que aparecem na mídia quase sempre sozinhas, abaçando seus filhos ou comparecendo a eventos sociais sem seus maridos. Na busca do Google, há mais fotos dessas mulheres desacompanhadas de seus cônjuges do que juntamente com eles, geralmente vestidos com insossos trajes formais de terno e gravata.
No entanto, há casais marcantes que se separam e, mesmo assim, por mais que as mulheres se tornam solteiríssimas, a maioria das aparições registradas na Internet as mostra com seus ex-maridos, ainda que haja uma quantidade crescente de fotos com elas solteiras e sem as alianças de casamento em eventos mais recentes.
Por que casamentos formados com mais espontaneidade se dissolvem com mais facilidade que os casamentos movidos pelas conveniências? É uma questão tão complicada quanto questionar por que as mulheres que seguem valores machistas tendem a ficar mais solteiras do que aquelas que não os seguem.
No caso do machismo, é reflexo de uma sociedade machista que o Brasil, ainda apegado aos valores retrógrados (vide o governo de Michel Temer e todo o seu projeto político), mantém, e que "premia" às mulheres que obtém fama como meras mercadorias sexuais (como a Mulher Melão e a ex-banheira do Gugu Solange Gomes) com solteirice, enquanto "aconselha" as mulheres que buscarem se emancipar com inteligência e bom senso a viverem "sob a sombra do marido".
Isso quer dizer que a mulher precisa ter seu feminismo "vigiado". A mulher que cumpre seu papel na sociedade machista, sendo mulher-objeto ou fazendo o papel estereotipado da empregada infantilizada que ouve música brega (ou os sucessos radiofônicos "populares" de hoje em dia), personificando estereótipos de mulheres submissas a valores machistas, estão dispensadas de ter a companhia amorosa de um macho, porque elas já seguem sozinhas o machismo.
Já a mulher que tem bons referenciais culturais, não segue papéis impostos pelo machismo e representa até ameaça aos valores machistas, "precisa" da influência "moderadora" do marido, geralmente um empresário ou alguém relacionado a uma posição de comando ou liderança.
Em alguns casos, a mulher não-machista se torna "machista" pela influência do marido. Passa a ter gosto por festas de gala, pela religiosidade conservadora, por uma vida cheia de formalidades, passa a fazer cobranças demais para os outros, deixa de ser a moça de personalidade interessante e divertida que a fazia muito atraente.
No entanto, a mulher machista que se torna solteira por conveniência não aprimora sua personalidade a não ser mediante muita pressão, e mesmo assim de forma relativa, forçada e superficial. Custa a abrir mão de sua imagem de "mercadoria sexual" e resiste a se livrar da imagem "sensual", usando desculpas pseudo-feministas como o "direito à sensualidade" e "a liberdade do corpo".
No casamento espontâneo, o único vínculo é o sentimental. Como os casais se formam com liberdade e de maneira espontânea, o casamento também se dissolve de forma livre e espontânea. Não há outros vínculos sociais obrigatórios, e mesmo que muita gente se decepcione com o divórcio, ele acontece sem "pendências".
Já no casamento por conveniências, o vínculo sentimental nem chega a se dissolver porque, de tão frágil, apenas "cai de podre". Mas há outros condicionadores sociais, como contatos influentes, pensões alimentícias, preocupação maior com a ascensão social dos filhos, a separação se torna mais dolorosa, porque a relação é muito mais um consórcio, um contrato social e não uma simples relação de amor.
Além disso, há o outro lado. Nas relações espontâneas, o vínculo de imagem dos cônjuges como um casal é maior. Nas relações por conveniência, a mulher pode "ficar solteira" e aparecer desacompanhada em quase todos os eventos. O marido é mais um patrocinador que compartilha a cama de casal e acompanha a esposa nos eventos formais ou nos passeios com o(s) filho(s). Até quando cita o homem mais bonito, a mulher dificilmente se lembra do marido.
Só mesmo entendendo as nuances da sociedade de valores conservadores e do pragmatismo das conveniências que é o Brasil para entender esses casos. No mundo dos famosos, diante de tantos casamentos frágeis que perduram e resistem, há casamentos aparentemente sólidos como os de William e Fátima que se encerram de repente.
É porque houve liberdade para se separar da mesma forma que houve liberdade para se unirem. Algo que os casamentos por conveniência não têm, pois, em que pese a superficialidade conjugal, são casamentos muito difíceis de serem dissolvidos, por ser alto o custo social de tais dissoluções.
quinta-feira, 8 de setembro de 2016
Madre Teresa e o sofrimento humano
Quanta ilusão é o deslumbramento religioso. Vocês leem os textos de "espíritas", eles se julgam detentores da realidade, donos da palavra final, senhores da visão mais objetiva da vida, e no entanto o que eles transmitem é fantasia, mito, ficção. E fala-se até mesmo de Divaldo Franco, que os incautos têm a tolice de definir como "professor" ou até "filósofo".
A religião acaba se tornando uma farsa, afinal, a metodologia de sua construção ideológica tem como ponto de partida o Catolicismo medieval. Mesmo divergindo em vários pontos, o protestantismo pentecostal - como a Assembleia de Deus e a Igreja Universal do Reino de Deus - , definido como "neopentecostal" pelo apelo midiático e pela atuação parlamentar mais intensos, e o "movimento espírita" devem muito ao Catolicismo medieval em muitas ideias e práticas.
A recente santificação de Madre Teresa de Calcutá, felizmente, mostrou o lado controverso da coisa. A grande imprensa teve que admitir que muitas pessoas criticaram a tarefa, já que um documentário de Christopher Hitchens denunciou que a freira albanesa era corrupta e fazia maus tratos aos seus "assistidos", reduzindo suas casas de "caridade" em verdadeiros holocaustos.
Nestas casas, consta-se que, enquanto a freira albanesa, cujo nome de batismo era Agnes Bojaxhiu, estava viva, 29 mil de seus "assistidos" morreram por males que vão da falta de higiene desses "lares", da má alimentação, da remediação precária e, entre outros descasos, de se expuserem uns aos outros contagiando doenças graves.
E o que Madre Teresa dizia disso? Que eram 29 mil almas que "purificaram seus pecados e agora estão ao lado de Jesus Cristo". Essa visão, não muito diferente de certo austríaco, é respaldada até mesmo pelos "iluminados espíritas" e suas "palavras de amor".
As casas eram apenas depósitos de gente, quase que pré-necrotérios. Sem higiene, sem equipamentos, as próprias casas tentavam se manter em situação precária para dar um aparato de "humildade" que encantou muitas e muitas pessoas. As geladeiras e despensas quase não tinham alimentos e as poucas seringas eram reutilizadas e lavadas apenas com água de torneira (que não é aquela limpeza toda), o que traz um risco mortal para a saúde de alguém.
Madre Teresa arrecadava fortunas imensas para sustentar suas casas de "caridade". Abastecer de alimentos, bons equipamentos, limpar os lugares etc, tratar bem os enfermos e tudo o mais, tudo isso poderia ter sido feito. Mas não. Ela desviava o dinheiro, que ia todo para os cofres da cúpula do Vaticano, enriquecendo o já milionário alto clero da Igreja Católica.
O pior é que Madre Teresa não aceitava que médicos voluntários trabalhassem nestas casas e nem que familiares recolhessem os enfermos para transferi-los para hospitais. Ela acreditava que, quanto mais as pessoas sofriam, mais estavam perto do Céu, o que é uma perversidade sem tamanho para uma beata que se tornou oficialmente "símbolo máximo da bondade humana".
CHICO XAVIER: A "NOSSA MADRE TERESA"
É bastante curioso ver comparações entre Madre Teresa de Calcutá e Francisco Cândido Xavier. Os dois são adorados pelos "espíritas", que costumam exaltar suas supostas missões de caridade. É até clichê dizer atribuir a cada um "uma vida inteira dedicada ao amor ao próximo".
Mas tudo isso é uma grande ilusão. Observando os mitos de Madre Teresa e Chico Xavier, eles tiveram a mesma construção. Não se fala da confusa construção do mito de Chico Xavier antes do final dos anos 1970, quando seu mentor terreno, o presidente da FEB Antônio Wantuil de Freitas, lançou mão de escândalos para transformar um caipira plagiador de livros em "porta-voz dos mortos".
O mito de Chico Xavier que hoje se aprecia é "mais limpo", e vem desde os anos 1970. Claro que o mito de "filantropo" estava sendo trabalhado mais ou menos desde os anos 1950, mas ele era atropelado por inúmeros escândalos, muitos deles graves. E Wantuil não tinha senso publicitário e deixava que o mito de seu criado fosse trabalhado com um sensacionalismo bastante exagerado.
A coisa só mudou pouco depois. A TV Tupi e a revista O Cruzeiro - já procurando "limpar" a imagem de Chico Xavier, depois da farsa de Otília Diogo que provocou o rompimento do "médium" com seu discípulo Waldo Vieira - já fizeram um ensaio parecido, mas foi a Rede Globo de Televisão que construiu a imagem de Chico Xavier que hoje é alvo de adoração de muitas pessoas.
E como no Brasil muita coisa se copia, o mito de Chico Xavier é exatamente idêntico ao de Madre Teresa de Calcutá. Quanto aos aspectos positivos, os "espíritas" não escondem essa semelhança e até acham o máximo. Uma onda de adorações e devoções religiosas, com um sentimentalismo carregado de pieguice, é alimentado e se expande até para outras figuras, como Divaldo Franco, por exemplo.
E tudo isso veio da mente de um jornalista católico, o inglês Malcolm Muggeridge, que criou o documentário Algo Bonito para Deus (Something Beautiful for God) em 1969 para construir o mito de Madre Teresa que serve para o consumismo emotivo de seus devotos. Muggeridge era tão beato que a equipe técnica torcia o nariz com os devaneios do jornalista, que atribuía a Deus até mesmo os avanços tecnológicos da Kodak e seus modernos equipamentos para a época.
A partir desse documentário, criou-se todo um roteiro de "filantropia" que muitos amam: o "filantropo" chega a uma casa de "caridade", acolhido pela multidão, carrega bebê no colo, acaricia as cabeças de velhos doentes, conversa com mendigos, vê crianças tomando sopa e depois dá depoimentos com frases pretensamente sábias, que se transformam em "filosofia" sobretudo num Brasil em que muitos pensam ser "filosofia" um repertório de pequenas frases soltas.
E o que foi feito de Chico Xavier? A mesma coisa. E com um contexto próprio: o Brasil vivia uma crise política da ditadura militar, e seitas pentecostais como a Igreja Universal e a Igreja Internacional da Graça de Deus estavam se ascendendo, criando problemas com a católica Rede Globo.
A Rede Globo não poderia competir com as seitas pentecostais usando um ídolo de batina. Teria que enfrentar Edir Macedo e R. R. Soares de maneira mais sutil, e aí o beato católico Chico Xavier caiu como uma luva, porque ele era como um padre sem batina, e sobre ele havia o verniz de "novidade" diante da oficial, mas altamente discutível, associação com a Doutrina Espírita.
Aí vemos Chico Xavier cumprindo o receituário de Muggeridge: chegando a um "centro espírita" acolhido pela multidão, carregando bebê no colo, falando com mendigo, passando a mão na testa de um velho doente, vendo crianças tomando sopinha, dando depoimentos pseudossábios que servem para enfeitar a "filosofia de bolso" de alguns midiotas e por aí vai.
Chico Xavier também foi adepto da mesma Teologia do Sofrimento que fez de Madre Teresa de Calcutá um "anjo do inferno". Seria Chico um "anjo do umbral"? O que se sabe é que Chico, com suas próprias palavras, dizia para os sofredores não demonstrarem sofrimento para os outros, além de não se queixarem da vida em momento algum.
Para piorar, ele recomendava orar em silêncio, porque o "silêncio é a voz da sabedoria". É uma crueldade comparável a de Madre Teresa. O maior absurdo é que Chico Xavier é visto como "ativista" e até "progressista" com suas visões bastante retrógradas e moralistas!
E se Madre Teresa alojava doentes e desabrigados para morrerem à própria sorte, sob a desculpa de "serem entregues a Deus", Chico Xavier prolongava tragédias familiares com a exploração sensacionalista das mesmas através de supostas mensagens espirituais que mostravam irregularidades severas.
Uma tragédia com um ente querido que poderia se minimizar em duas semanas virava um luto muito mal dissimulado pela "mensagem espiritual" que durava anos e anos. Famílias eram enganadas, como no trote telefônico em que o sequestrador imita a voz do filho de alguém para inventar que ele está bem.
"Reféns" da esperteza de Chico Xavier, os entes queridos falecidos "reapareciam" em supostas mensagens que contradizem com as respectivas naturezas pessoais e, se apresentam as mais sutis semelhanças, é porque a chamada "leitura fria" das conversas diversas nos "centros espíritas" (sobretudo no "auxílio fraterno") e as pesquisas de fontes contribuem para tamanha farsa.
O próprio Chico Xavier usava apelos como "não reclame da vida", "não conteste" e "não questione", dadas por ele ou ditadas pelo traiçoeiro mentor Emmanuel, para tirar vantagem. Afinal, Chico Xavier era acusado de praticar plágios e pastiches literários em supostos livros psicográficos - o caso mais aberrante envolve o nome de Humberto de Campos - , com provas consistentes de tamanho delito, e por isso precisava ficar impune de tais acusações.
Daí as alegações de "tóxico do intelectualismo", do "mal de questionar as coisas", do "excesso de raciocínio" e da "overdose de Ciência", desculpas esfarrapadas que condenam o ato de pensar, quando o foco passa a ser a fé religiosa e seus dogmas mais absurdos.
Isso é um ponto de vista medieval. É a condenação ao ato de pensar, e à tese de que, se a Ciência e o pensamento crítico falham, não é pelo banimento que se resolvem essas falhas. É como se dissesse que as pessoas deveriam parar de andar só porque escorregaram uma vez e levaram um tombo. Neste caso, a própria biologia mostra bebês se esforçando a andar e, diante de tantas quedas, só conseguem corrigir os passos errantes andando.
Mas a religião não quer que o pensamento "ande" depois de "tropeçar". Se o pensamento falha, ele deve ser banido ou escravizado pela fé. Quando o "conhecer" se torna equivocado, ele tem que ser aprisionado pelo "acreditar".
Só que é através do pensamento, da nossa capacidade de raciocinar, que podemos identificar irregularidades sérias em Madre Teresa de Calcutá e Chico Xavier, enquanto o ato de "acreditar", de abraçar uma ideia que, em vez de ser questionada e verificada, é apenas adorada, os deixa impunes em suas perversidades ocultas.
É terrível que movimentos religiosos, inclusive o "espírita", apelem para coisas como "existem mistérios que a razão é impotente em resolver", "coisas sublimes que o raciocínio humano é definitivamente incapaz de analisar", abordagens que parecem "lindas", mas são dignas do mais terrível obscurantismo da Idade Média.
E ver que esses dois devotos da Teologia do Sofrimento são endeusados pelos mesmos brasileiros que comemoram a saída do poder de uma chefe do Executivo que buscava diminuir as irregularidades sociais, é chocante. E mostra o quanto muitos consideram a bondade como um mero subproduto da fé religiosa. Triste.
terça-feira, 6 de setembro de 2016
Mais sobre a farsa do "espírito Humberto de Campos" por Chico Xavier
O VERDADEIRO HUMBERTO DE CAMPOS NÃO NARRAVA COMO PADRE.
Só mesmo no Brasil para se aceitar obras farsantes em nome das mensagens religiosas. O caso Humberto de Campos, a pior das apropriações indevidas feitas por Francisco Cândido Xavier, é uma aberração sem tamanho, numa farsa sem precedentes na História do Brasil, num ato dos mais deploráveis vindos de alguém que muitos insistem em ver como um espírito supostamente puro.
A farsa se mostra escancarada apenas com uma simples leitura. O estilo de Humberto de Campos original é simplesmente inexistente no do suposto espírito, só se percebermos que o "espírito Humberto" escrevia parágrafos muito mais longos que o original e tinha uma narrativa pesada, prolixa, deprimente e sem a fluência textual do autor maranhense. E "escrevia" como se fosse padre, não como escritor e intelectual.
Portanto, é um pastiche que nenhum Ad Passiones ("apelo à emoção"), falácia que sempre protegeu Chico Xavier, pode justificar. Muito pelo contrário, torna-se um convite tentador para que se aceitem fraudes em nome de supostas mensagens de amor, onde a filantropia está a serviço da desonestidade, onde a bondade é cúmplice do engano, a verdade, da dissimulação, o amor, da mentira.
Deve-se rejeitar o "Humberto de Campos" dos livros "espirituais" porque nota-se a fraude no estranho desfile de palavras que não lembra as obras que o autor maranhense deixou em vida. Semelhança não é autenticidade, o que "lembra algo" pode não ser a forma legítima desse algo, pois se há sempre algum aspecto que contradiz, um único apenas, a semelhança se dissolve na farsa.
Erasto havia dito que é melhor rejeitar dez verdades do que aceitar uma única mentira. Aqui aceita-se a única mentira, se ela se chama Chico Xavier. O "médium" brasileiro foi a mancenilheira personificada, cujas palavras dóceis e todo o verniz de amor e caridade, deslumbrou muita gente que atraiu azar para suas vidas depois que recorreu a ele com adoração e submissão.
Chico Xavier personifica o farsante, o manipulador de corações e mentes dos mais habilidosos e traiçoeiros, que Erasto havia advertido quando, em espírito, se manifestou no tempo de Allan Kardec. Ele havia avisado dos mistificadores da Doutrina Espírita, dos inimigos internos que fariam as "coisas mais lindas" para enganar e dominar as pessoas.
O que Erasto não advertiu é que os próprios mistificadores também usariam o próprio aviso do mesmo espírito para se promoverem. É como um ladrão que telefona para a polícia para dizer que alguém assaltou um lugar. É lamentável ver os próprios deturpadores da Doutrina Espírita usando Erasto para benefício deles, como mentirosos que buscam sempre a posse da verdade.
E aí Chico Xavier, arrivista e ilusionista, um dos piores farsantes da História do Brasil e um dos maiores enganadores que o país viu em mais de 500 anos, torna-se o dono da verdade e o proprietário de qualidades humanas que muitos nunca acreditam repousarem fora da sombra da religião.
Chico nunca ajudou de verdade, porque, se ajudasse, o Brasil nunca teria sofrido as crises que sofreu nos últimos 50 anos. E não é por "falta de Chico Xavier" que Uberaba é uma das cidades mais violentas do Brasil, até porque o "médium" que lá viveu suas últimas décadas é sempre lembrado, na cidade existe um mausoléu em homenagem a ele e um verdadeiro programa turístico e historiográfico existe para preservar sua memória.
O "médium" arrivista, achava que podia passar por cima de qualquer obstáculo, que podia até mentir, usurpar e enganar desde que "falasse de amor" e evocasse palavras como "caridade" e "Jesus Cristo", praticamente virou "dono" dos mortos a ponto do "movimento espírita" usar nomes como Carlos Chagas, Auta de Souza, Humberto de Campos e Meimei para batizar instituições e eventos. Uma coisa que parece linda, mas é humilhantemente leviana e constrangedora.
E a "posse" do nome de Humberto de Campos, mesmo quando Chico Xavier ludibriou a mãe e o filho do escritor - respectivamente Ana de Campos Veras e Humberto de Campos Filho - , nada justifica, sendo um processo de apropriação indébita e que se agrava pela forma que Chico usou para seduzir e forçar o apoio de suas vítimas.
Se aproveitando das comoções de Ana, Chico Xavier escreveu uma mensagem dócil, ciente de que assim a conquistaria de imediato. Conseguiu realizar seu plano, atraiu sua vítima com a mais perfeita armadilha.
Já em relação ao cético Humberto de Campos Filho, a princípio desconfiado com as "psicografias", teve mais trabalho: Chico teve que inventar psicografias forjando uma mensagem "paternal" e atribuiu ao falecido escritor.
Em 1957, em Uberaba, o "médium" acolheu o filho de Humberto de Campos, o convidou para assistir a uma "doutrinária espírita" e ostentou atividades "filantrópicas", como cozinheiras preparando uma sopa e um humilde interno, idoso, de comportamento abobalhado, triste mas rapidamente convertido em alegria tolamente infantil, depois que Chico lhe sussurrou alguma coisa.
E haja mensagens de afeto atribuídas ao escritor Humberto de Campos. O recurso falacioso do Ad Passiones era a maior arma do ilusionista Chico Xavier, no qual se desenvolve a habilidade de envolver emocionalmente o público de tal maneira que ninguém pode contestar nem desconfiar, porque mesmo um questionamento mais positivo era tido como "ofensa a um homem de bem".
Isso é realmente terrível e mostra que Chico Xavier foi o maior caso de impunidade existente em toda a História do Brasil. O que ele fez é de uma irresponsabilidade desmedida, e que certamente rendeu dolorosas sensações depois que Chico faleceu após os "brasileiros" (leia-se João Havelange, Ricardo Teixeira e companhia) ficaram "felizes", em 2002.
Enquanto isso, os chiquistas se afogam em ilusões e fantasias religiosas que juram "não ser ilusão" e serem a "mais absoluta realidade". A alucinação religiosa é a pior das fantasias, o deslumbramento religioso a pior das luxúrias e a humildade como um subproduto da religião a mais perigosa e opulenta das fortunas. Quem imagina que, depois da morte, não sofrerá o choque da dor por se julgar protegido por tais ideias, estará completamente enganado.
Só mesmo no Brasil para se aceitar obras farsantes em nome das mensagens religiosas. O caso Humberto de Campos, a pior das apropriações indevidas feitas por Francisco Cândido Xavier, é uma aberração sem tamanho, numa farsa sem precedentes na História do Brasil, num ato dos mais deploráveis vindos de alguém que muitos insistem em ver como um espírito supostamente puro.
A farsa se mostra escancarada apenas com uma simples leitura. O estilo de Humberto de Campos original é simplesmente inexistente no do suposto espírito, só se percebermos que o "espírito Humberto" escrevia parágrafos muito mais longos que o original e tinha uma narrativa pesada, prolixa, deprimente e sem a fluência textual do autor maranhense. E "escrevia" como se fosse padre, não como escritor e intelectual.
Portanto, é um pastiche que nenhum Ad Passiones ("apelo à emoção"), falácia que sempre protegeu Chico Xavier, pode justificar. Muito pelo contrário, torna-se um convite tentador para que se aceitem fraudes em nome de supostas mensagens de amor, onde a filantropia está a serviço da desonestidade, onde a bondade é cúmplice do engano, a verdade, da dissimulação, o amor, da mentira.
Deve-se rejeitar o "Humberto de Campos" dos livros "espirituais" porque nota-se a fraude no estranho desfile de palavras que não lembra as obras que o autor maranhense deixou em vida. Semelhança não é autenticidade, o que "lembra algo" pode não ser a forma legítima desse algo, pois se há sempre algum aspecto que contradiz, um único apenas, a semelhança se dissolve na farsa.
Erasto havia dito que é melhor rejeitar dez verdades do que aceitar uma única mentira. Aqui aceita-se a única mentira, se ela se chama Chico Xavier. O "médium" brasileiro foi a mancenilheira personificada, cujas palavras dóceis e todo o verniz de amor e caridade, deslumbrou muita gente que atraiu azar para suas vidas depois que recorreu a ele com adoração e submissão.
Chico Xavier personifica o farsante, o manipulador de corações e mentes dos mais habilidosos e traiçoeiros, que Erasto havia advertido quando, em espírito, se manifestou no tempo de Allan Kardec. Ele havia avisado dos mistificadores da Doutrina Espírita, dos inimigos internos que fariam as "coisas mais lindas" para enganar e dominar as pessoas.
O que Erasto não advertiu é que os próprios mistificadores também usariam o próprio aviso do mesmo espírito para se promoverem. É como um ladrão que telefona para a polícia para dizer que alguém assaltou um lugar. É lamentável ver os próprios deturpadores da Doutrina Espírita usando Erasto para benefício deles, como mentirosos que buscam sempre a posse da verdade.
E aí Chico Xavier, arrivista e ilusionista, um dos piores farsantes da História do Brasil e um dos maiores enganadores que o país viu em mais de 500 anos, torna-se o dono da verdade e o proprietário de qualidades humanas que muitos nunca acreditam repousarem fora da sombra da religião.
Chico nunca ajudou de verdade, porque, se ajudasse, o Brasil nunca teria sofrido as crises que sofreu nos últimos 50 anos. E não é por "falta de Chico Xavier" que Uberaba é uma das cidades mais violentas do Brasil, até porque o "médium" que lá viveu suas últimas décadas é sempre lembrado, na cidade existe um mausoléu em homenagem a ele e um verdadeiro programa turístico e historiográfico existe para preservar sua memória.
O "médium" arrivista, achava que podia passar por cima de qualquer obstáculo, que podia até mentir, usurpar e enganar desde que "falasse de amor" e evocasse palavras como "caridade" e "Jesus Cristo", praticamente virou "dono" dos mortos a ponto do "movimento espírita" usar nomes como Carlos Chagas, Auta de Souza, Humberto de Campos e Meimei para batizar instituições e eventos. Uma coisa que parece linda, mas é humilhantemente leviana e constrangedora.
E a "posse" do nome de Humberto de Campos, mesmo quando Chico Xavier ludibriou a mãe e o filho do escritor - respectivamente Ana de Campos Veras e Humberto de Campos Filho - , nada justifica, sendo um processo de apropriação indébita e que se agrava pela forma que Chico usou para seduzir e forçar o apoio de suas vítimas.
Se aproveitando das comoções de Ana, Chico Xavier escreveu uma mensagem dócil, ciente de que assim a conquistaria de imediato. Conseguiu realizar seu plano, atraiu sua vítima com a mais perfeita armadilha.
Já em relação ao cético Humberto de Campos Filho, a princípio desconfiado com as "psicografias", teve mais trabalho: Chico teve que inventar psicografias forjando uma mensagem "paternal" e atribuiu ao falecido escritor.
Em 1957, em Uberaba, o "médium" acolheu o filho de Humberto de Campos, o convidou para assistir a uma "doutrinária espírita" e ostentou atividades "filantrópicas", como cozinheiras preparando uma sopa e um humilde interno, idoso, de comportamento abobalhado, triste mas rapidamente convertido em alegria tolamente infantil, depois que Chico lhe sussurrou alguma coisa.
E haja mensagens de afeto atribuídas ao escritor Humberto de Campos. O recurso falacioso do Ad Passiones era a maior arma do ilusionista Chico Xavier, no qual se desenvolve a habilidade de envolver emocionalmente o público de tal maneira que ninguém pode contestar nem desconfiar, porque mesmo um questionamento mais positivo era tido como "ofensa a um homem de bem".
Isso é realmente terrível e mostra que Chico Xavier foi o maior caso de impunidade existente em toda a História do Brasil. O que ele fez é de uma irresponsabilidade desmedida, e que certamente rendeu dolorosas sensações depois que Chico faleceu após os "brasileiros" (leia-se João Havelange, Ricardo Teixeira e companhia) ficaram "felizes", em 2002.
Enquanto isso, os chiquistas se afogam em ilusões e fantasias religiosas que juram "não ser ilusão" e serem a "mais absoluta realidade". A alucinação religiosa é a pior das fantasias, o deslumbramento religioso a pior das luxúrias e a humildade como um subproduto da religião a mais perigosa e opulenta das fortunas. Quem imagina que, depois da morte, não sofrerá o choque da dor por se julgar protegido por tais ideias, estará completamente enganado.
domingo, 4 de setembro de 2016
As piores paixões terrenas estão no âmbito da religião
Boa parte de quem ocupa o topo da pirâmide social, no Brasil, está sofrendo os piores deslizes. Um exemplo é juízes e advogados que integram o Poder Judiciário ou o Ministério Público cometendo erros propositais, selecionando quem deve ou não ser investigado ou condenado perante as convicções pessoais.
Há os empresários que querem tudo e não abrem mão de ceder um centavo de suas fortunas, só se livrando dos bens quando suas vontades pessoais assim desejam. Há os executivos de mídia que querem ser os senhores da opinião pública. Há os tecnocratas que decidem arbitrariedades cruéis e nocivas, motivados pelo envaidecimento do diploma e da roupagem técnica de seus atos.
Mas há também os religiosos, que se consideram representantes do "Criador", para os quais não cabe qualquer tipo de contrariedade. É certo que católicos e evangélicos, estes da linha pentecostal, começam a enfrentar sérias crises, mas hoje se observa que os "espíritas" ainda estão imunes, mesmo quando suas irregularidades sejam aberrantes.
Recentemente, o pastor Marco Feliciano (PSC-SP) está envolvido num escândalo em que é acusado de assédio sexual a uma jovem jornalista. Outros personagens estão envolvidos e, mesmo quando a ilusão de imunidade permite que o processo se inverta e Feliciano tente processar a denunciante, acusada de suposto suborno, seu escândalo já repercutiu negativamente perante a opinião pública.
No "espiritismo", porém, não há um escândalo que oficialmente se repercuta com amplitude nos meios de comunicação. Sabe-se que as instituições já sucumbiram ao processo obsessivo que Allan Kardec chama de "subjugação", já que o deslumbramento religioso acaba cegando juristas, jornalistas e acadêmicos que têm medo de investigar com isenção as irregularidades "espíritas".
Num dado momento, chega o recurso falacioso do Ad Passiones, o "apelo à emoção". Quando se tenta investigar alguma irregularidade, os "espíritas" reagem com seu "canto da sereia". falando em "bondade" e "caridade" e se aproveitando dessa carteirada moral quando tenta convencer de que "erra muito, sim, mas pelo menos pratica caridade".
Esse "rouba mas faz" do "espiritismo" beneficia figuras como Francisco Cândido Xavier e Divaldo Pereira Franco, e mostra o quanto a carteirada beneficia certos setores sociais. Se você quiser ser impune, pode escolher duas coisas: filiar-se ao PSDB e ser "espírita". Você pode até furtar a bolsa de uma senhora numa rua movimentada que ninguém mexe consigo.
As fraudes literárias que Chico Xavier e Divaldo Franco fizeram, e a usurpação do nome de Allan Kardec para dar um verniz "racional" aos livros "psicográficos", dotados do mais gritante igrejismo medieval, são deixadas para lá, impunemente.
Ficamos imaginando se o senador Aécio Neves pudesse também exercer atividade de "médium espírita", e lançasse livros supostamente mediúnicos com mensagens igrejistas. Aí seria a consagração, ele alcançaria o "paraíso" presumido pelos seus apaixonados seguidores e abaixo-assinados de milhares de páginas seriam lançados pedindo o Nobel da Paz.
A carteirada religiosa faz com que se use e abuse de uma suposta superioridade social. E isso é ruim porque o religioso acaba deixando de lado suas responsabilidades, se é que a religião, essa ilusão que faz os homens se acharem "embaixadores de Deus", pode fazer alguém responsável por alguma coisa.
Vendo os últimos textos produzidos pelas páginas "espíritas" na Internet, verifica-se uma pregação moralista que, embora parecesse "sábia", é desumana. Revelam a nunca assumida Teologia do Sofrimento, corrente católica medieval que pregava que as pessoas devessem suportar um maior número de desgraças para atingir as "bênçãos divinas".
São textos que não conseguem dizer claramente a que vieram. Viemos para sofrer ou não? Temos que ser perseverantes ou não? Temos ou não temos talentos? Nossas vocações são luxúria terrena? Nossas necessidades são caprichos levianos? Exigimos demais quando queremos apenas o que precisamos? Devemos ou não mudar nossos pensamentos?
O que chama a atenção é que os "espíritas" não entendem a individualidade humana. Eles deixam subentendido que as individualidades são apenas meros caprichos materialistas, porque no fundo os espíritos não passam de um rebanho de ovelhas que depois vai para a pátria espiritual viver apenas na "fraternidade".
Quantas ilusões foram produzidas sob o rótulo de "espiritismo" no Brasil e quantas paixões terrenas têm os "espíritas" sem que eles mesmos pudessem admitir, tomados pela "santa" vaidade de se acharem os "paladinos da moral cristã".
Para piorar, a impunidade de Chico Xavier em se apropriar dos mortos, produzindo, sob o nome deles, mensagens que destoam dos respectivos aspectos pessoais, torna-se, infelizmente, inabalável, garantida a carteirada religiosa diante da qual nenhum esforço definitivo se faz para combater.
Mas a coisa chega ao ponto deplorável de Chico Xavier ter seduzido, com sua estratégia falaciosa do Ad Passiones, tanto a mãe quanto o filho de Humberto de Campos, respectivamente Ana de Campos Veras e Humberto de Campos Filho, com o agravante de que este último chegou a ter uma postura extremamente cética em relação às supostas psicografias que levavam o nome do pai.
A religião "espírita" é a que mais sucumbe às paixões terrenas do que mil orgias aristocráticas. A ilusão da riqueza espiritual não é muito diferente do acumular de moedas e títulos, porque é tão abundante quanto aquelas e tão pomposo quanto estes.
A ilusão do juízo de valor diante do sofrimento alheio, a ilusão da presunção de existência de um "ente superior" concebido pelos preconceitos materiais da sociedade ocidental, chamado "Deus", para o qual não se comprova existência, a ilusão dos prêmios dos ricos ao suposto trabalho da "caridade", a ilusão da suposta humildade, tudo isso deslumbra os "espíritas".
É essa ilusão, que os "espíritas" não consideram desta forma, que os corrompe e os faz vulneráveis a uma desencarnação que, depois, será muito dolorosa. Já se observa a surpresa desagradável que um Divaldo Franco terá quando falecer, a exemplo das dores e do choque sofridos por Chico Xavier quando encerrou sua encarnação.
O próprio Divaldo se valeu da carteirada religiosa diante dos prêmios que a aristocracia dava a ele, e ao título de "maior filantropo do país" dado assim de graça, quando as atividades da Mansão do Caminho, não bastasse um método pedagógico inócuo e de acordo com os preceitos da Escola Sem Partido, só conseguiram beneficiar menos de 0,01% de toda a população brasileira.
Isso é desagradável para muitos, mas é essa a realidade dura e dolorosa de quem, iludido com as luzes artificiais do status religioso, elas em si holofotes não menos levianos que muitos que iluminam mansões em vaidosas orgias, não sabe o choque que terá, ao perceber que a fé também acoberta tantas e tantas paixões, tantos e tantos sentimentos de sensualismo, vaidades estremas, orgulho e omissão.
sexta-feira, 2 de setembro de 2016
A grande mídia pode transformar lorota em uma linda história
O relato parece comovente. Um engenheiro que passava lua de mel em Gramado, com sua esposa, em 2008, teria se sentido mal. Voltando para a cidade de origem, Santos, ele foi internado em um hospital católico e o médico diagnosticou oito abcessos no cérebro, dizendo que são pouquíssimas as chances de sobrevivência.
A esposa, então, foi para uma paróquia, pediu ajuda a um padre, que lhe deu uma medalha de Madre Teresa e o folheto de uma oração. A mulher foi então orar e o engenheiro, de 35 anos, que havia entrado em coma antes da esposa ir para a paróquia, acordou, perguntou aos médicos o que fazia ali e levantou por conta própria e tomou o café, como se nenhuma coisa tivesse acontecido.
Oficialmente, o episódio do engenheiro Marcílio Haddad Andrino intrigou médicos e cientistas, constituindo num suposto milagre atribuído à Madre Teresa de Calcutá, falecida em 1997. O engenheiro irá ao Vaticano assistir à cerimônia de canonização, daqui a dois dias. Mas o episódio é bastante tendencioso, se percebermos vários aspectos relacionados.
No Brasil, o episódio é narrado com muito entusiasmo pelo Fantástico, jornalístico de variedades da Rede Globo de Televisão. É o mesmo programa que insistiu num triplex de Lula que documentos comprovam nunca ter sido dele nem de sua esposa, mas da empreiteira OAS.
A Rede Globo é um dos mais tendenciosos veículos da mídia brasileira. Esteve empenhada na campanha de desmoralização de Dilma Rousseff e na defesa do governo de Michel Temer, composto de uma retrógrada agenda política.
Diante da campanha violenta contra o PT, contra o qual se estimulam até calúnias, difamações e mentiras - há um vídeo fraudulento em que um suposto Lula ameaça matar Sérgio Moro. Uma mentira descarada, mas se até a revista Isto É trata Dilma Rousseff como se fosse uma descontrolada, Lula também receberia o mesmo tratamento ofensivo por parte da mídia e seus seguidores.
Já no caso de Madre Teresa de Calcutá, a coisa é diferente. Transforma-se uma lorota em uma bela história, causando comoção no público, que tem suas fraquezas emocionais exploradas dessa forma tão leviana. Não há provas que Marcílio realmente teria tido um coágulo devastador no cérebro.
O que pode ter acontecido é que Marcílio deve ter tido um mal-estar, talvez um formigamento no cérebro depois de uma refeição exagerada. e o "mal devastador" teria sido apenas um problema de intoxicação alimentar, já que o relato dá indícios disto. O "coma" teria sido apenas um repouso prolongado.
Mas a farsa do "milagre" tem ainda outro detalhe: o hospital onde Marcílio foi internado se chama São Lucas. É um hospital católico. Além disso, há um indício de exclusividade da versão oficial da Igreja Católica, conforme admite o irmão do engenheiro:
"É um assunto que está sendo coordenado de forma única (pela Igreja Católica), assim evitamos diversas fontes de informação que no final podem vir a causar problemas", disse o irmão de Marcílio em entrevista ao jornal O Globo.
Isso já indica parcialidade. E mostra o quanto o episódio tem que ser comprovado sem a confrontação de fontes adversas. É o contrário do que ocorre com a informação, na qual se confrontam pontos de vistas diferentes para buscar a coerência dos fatos.
Há, portanto, a sonegação de qualquer questionamento. A Igreja Católica quer estabelecer um monopólio de informação, cabendo apenas a ela a prevalência da visão oficial, banindo qualquer questionamento antes de qualquer exame e ponderação. Transformar uma possível intoxicação alimentar num tumor devastador de cura quase impossível é um gancho para forçar o milagre de Madre Teresa de Calcutá, um mito religioso que se revelou uma farsa.
O mais engraçado é que Madre Teresa vai virar santa dependendo de um segundo "milagre". O primeiro se revelou uma farsa, já que a indiana Monica Besra diagnosticada com câncer em 2002, conforme revelou o próprio marido da paciente, Selku Murmu, se curou da doença porque cumpriu rigorosamente todo o tratamento para combater o tumor, sobretudo tomando os remédios adequados e cumprindo recomendações para a saúde.
Madre Teresa precisava ter dois milagres confirmados para ser considerada santa. Teve o primeiro deles largamente contestado, com provas consistentes. E talvez seja isso que faça com que a Igreja Católica queira exercer monopólio de fontes, para evitar que, considerando outras fontes de informação, o "milagre" ocorrido no Brasil possa ser questionado como foi o de Monica Besra.
O mito de Madre Teresa de Calcutá foi construído por Malcolm Muggeridge, jornalista católico da BBC, que criou um documentário chamado Algo Bonito para Deus (Something Beautiful for God), em 1969. Nele foram inseridos os conhecidos elementos do marketing religioso, que criou paradigmas que agradaram multidões, sobretudo no Brasil.
Dá para perceber que tanto a Rede Globo quanto o "movimento espírita" adoram Madre Teresa. Ela é praticamente adotada pelos "espíritas" como se também fosse da doutrina brasileira, mesmo que ela tenha sido albanesa e atuado num bairro de Calcutá, na Índia.
O próprio mito de Francisco Cândido Xavier foi reciclado pela Rede Globo nos moldes que Muggeridge fez com Madre Teresa. Todos os elementos publicitários de "filantropia", observados em Madre Teresa, foram adotados de forma explícita para Chico Xavier, desde carregar bebê no colo, passar a mão na cabeça de um idoso doente e observar crianças tomando sopa no almoço.
Além disso, Madre Teresa e Chico Xavier foram adeptos da Teologia do Sofrimento, a macabra corrente medieval da Igreja Católica que faz apologia ao sofrimento humano como processo de "purificação da alma", uma espécie de "holocausto do bem".
É através da Teologia do Sofrimento que se investigou o porquê de tantos doentes e miseráveis alojados nas casas dirigidas por Madre Teresa serem tão maltratados, tendo péssimo regime alimentar, sendo remediados apenas com paracetamol e aspirina, recebendo injeção de seringas reutilizadas e deixados expostos uns diante dos outros, para o contágio de doenças graves como a Hanseníase.
A madre disse que o sofrimento é um "presente de Deus" e que o mundo teria que "aprender com o sofrimento humano". Chico Xavier não era diferente. Ele pedia para as pessoas que sofressem desgraças fingissem que está tudo bem, sem demonstrar sofrimento para os outros, sem se queixar, sem fazer um questionamento sequer e, de preferência, orando em silêncio para não perturbar o sossego dos algozes.
É sob essa perspectiva cruel e desumana, mas que encanta muitas pessoas pela forma dócil e bonita como se arrumam as palavras do discurso religioso, que faz com que Madre Teresa tenha garantido o caminho da santificação, um processo que esconde interesses comerciais do Vaticano, que envolvem sobretudo parcerias com o mercado turístico, já que as agências de viagens acham maravilhoso que Madre Teresa seja uma santa. É dinheiro que está em jogo no processo de santificação.
E a grande mídia brasileira, capaz de desmoralizar uma presidenta honesta por coisa nenhuma, também é capaz de santificar uma freira que deixava doentes expostos uns aos outros, contagiando doenças e sendo infectados por seringas reutilizadas, além de mal alimentados e muito mal assistidos.