segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Para o "Espiritismo" brasileiro, suicidas são piores que homicidas

DA ESQUERDA: O CANTOR INGLÊS IAN CURTIS, A POETISA ANA CRISTINA CÉSAR, O ESCRITOR AUSTRÍACO STEFAN ZWEIG E O EX-PRESIDENTE BRASILEIRO GETÚLIO VARGAS, EXEMPLOS DE FAMOSOS SUICIDAS.

O "Espiritismo" brasileiro é tomado de uma moral muito esquisita, bastante punitiva e revanchista, que volta e meia aparece para contradizer toda sua suposta aura de "amor e caridade", num sentimento moralista herdado explicitamente do catolicismo medieval.

Uma das teses estranhamente difundidas pelo Espiritolicismo (que é o que podemos denominar esse espiritismo distorcido) é que o suicídio é um ato muito mais cruel do que o homicídio, e contra o qual vários palestrantes despejam mil calúnias.

Segundo essa tese, enquanto os homicidas seriam "agentes" para a reparação de "dívidas espirituais" de suas vítimas, os suicidas seriam pessoas bastante covardes que teriam jogado fora suas encarnações e sua missão de expiação de faltas passadas.

No primeiro caso, a vítima é sempre a culpada. Os homicidas sofrem o atenuante de serem "jagunços" das forças superiores, cumprindo o "erro necessário" de eliminar suas vítimas como uma "medida" de "retornar" a estas as punições que haviam cometido no passado.

Os suicidas se tornam então os mais graves, o que é um contrasenso. Afinal, geralmente os homicídios são provocados pelos impulsos do egoísmo material, e são feitos ignorando as necessidades de outras pessoas, o que prova, por uma simples questão de ordem antropológica ou filosófica, que o homicídio sempre é pior do que o suicídio.

O suicídio é condenável, à sua maneira, mas não como o homicídio. O homicida é mil vezes mais condenável, porque tira a vida de outra pessoa, num ato que é puro egoísmo às últimas consequências. Já o suicida apenas tira sua vida por conta própria, numa atitude voluntária que pode até constituir num sério erro, mas nele o grau de egoísmo é simplesmente atenuado.

Além disso, imaginar que os homicidas são apenas "jagunços" terrenos a serviço das "leis do além" seria apostar numa "justiça com as próprias mãos" sob o verniz de "moral espírita". Seria defender a pena de morte de pessoas que, no momento presente (ou pouco antes da morte das vítimas), eram inocentes, simpáticas e estavam dando alguma valiosa contribuição à humanidade.

Só isso nivela os ditos "espíritas" brasileiros, tidos como "superiores", "evoluídos" e "guias da elevação moral da humanidade", aos piores tiranos do Império Romano que se regojizavam em mandar cristãos para encarar leões famintos nas arenas ou a serem queimados diante das multidões nas ruas.

Com um agravante. As autoridades do passado eliminavam cristãos que julgavam associados a valores e interesses que contrariavam essas elites políticas, o que era gravíssimo e desumano, mas estava de acordo com o seu jogo de interesses e sua precária formação ética e moral.

Já os "espíritas", com sua moral dita "elevada" apoiada por espíritos ditos "superiores", muitas vezes se comprazem com os falecimentos precoces de pessoas inocentes, sem qualquer motivo ou interesse determinado, bastando ser simplesmente pessoas de boa índole e boas realizações que "precisavam" ir "na hora oportuna" (eufemismo para mortes prematuras) para "o outro lado".

Enquanto isso, nada se fala quando homicidas, tomados pelas pressões emocionais que sofrem na sociedade contemporânea, ou tomados pelos vícios que lhes debilitam a saúde e os fazem vulneráveis aos acidentes, ou por outros fatores, também perdem a vida relativamente cedo.

Pelo contrário, os espiritólicos acham que os homicidas se destinam a viver longas vidas tranquilas, ou de sofrimentos "recuperáveis" na encarnação presente, evitando as consequências naturais de seus atos, "premiados" pela "jagunçada" a serviço das "forças do além".

Pouco importa se os homicidas fumaram demais, se drogaram até a overdose, cometeram imprudências nos volantes ou têm risco de serem mortos por desafetos, de sofrerem doenças gravíssimas de consequências fatais ou de serem mortos por assaltantes que os encontram no "calor" da liberdade condicional.

Para os espiritólicos, homicida não pode morrer cedo (embora tenha muito mais risco de abreviar suas próprias vidas devido a diversos fatores) e, por mais que desperdice sua vida tirando a dos outros, está "cumprindo sua missão" de suposto resgate das faltas de suas vítimas.

Apenas por uma mórbida supervalorização da vida espiritual, os moralistas espiritólicos parecem ver os homicidas de forma meramente atenuante, suave e quase carinhosa, talvez até adiando a punição para outra encarnação, enquanto desprezam o sofrimento dos familiares de suas vítimas.

Enquanto isso, os suicidas continuam sendo "linchados" pela moral espiritólica, que nem sequer pensa nos problemas que estão por trás desses atos de suicídio, dos dramas pessoais desses infelizes (apenas Yvonne Pereira, dentro dos limites espiritólicos, fez alguma coisa neste sentido).

Por outro lado, os espiritólicos festejam a partida precoce de muitas vítimas sob a ação de outrem, mesmo que vários projetos de transformação da humanidade sejam interrompidos dramaticamente. Que moral "superior" é essa que trata o homicídio como algo menos grave que o suicídio, é de uma estranheza que dá calafrios.

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