quarta-feira, 3 de agosto de 2016

"Espiritismo" deixou a máscara cair quanto ao contexto sócio-político

OS DESGRAÇADOS "TUDO" PODEM, BASTANDO SÓ A "ACEITAÇÃO".

O "espiritismo" terceiriza a vida. Ao sofredor, aconselha apenas aguentar as desgraças, sob a promessa de "bênçãos futuras" que ninguém sabe realmente do que se trata e que "pode ser obtida" até mesmo no além-túmulo.

Insensíveis, os "espíritas" pouco se importam se pessoas desperdiçam um prazo de cerca de 80 anos de encarnação com tantas barreiras e desgraças e, em certos momentos, culpam as próprias vítimas pelas angústias que sofrem. Culpam o peixe que não consegue escalar uma árvore, acusando-o de não ter coragem.

Os últimos textos "espíritas" publicados na imprensa e na Internet trazem uma revelação contundente, se aliados ao decadente cenário político que atinge o Brasil, com o governo ilegítimo de Michel Temer e sua agenda ultraconservadora que não teria acesso natural na livre votação dos brasileiros.

Notem o sentido resumido de várias mensagens, muito parecidas entre si:

1) "Nas dificuldades, não se atormente no desespero. Confie em Deus e tudo passará";

2) "Abra mão dos seus desejos. Viva o hoje, da forma que lhe convém viver";

3) "Felicidade não é ter, é ser. Na pior das pobrezas, tenha a certeza da riqueza maior que a vida oferece a você";

4) "Não se perca nas ilusões, acredite na sua vida, você já é beneficiado por Deus".

Muitas mensagens parecem otimistas e confortadoras, mas na verdade não são. Em muitos casos, está implícito o juízo de valor "espírita", que não estabelece diferenças entre as necessidades fundamentais de um cidadão e o luxo e a extravagância dos que querem demais na vida.

O que devemos chamar a atenção é a estrutura discursiva. O "espírita" que prega mensagens é um privilegiado que vive no seu conforto por vezes opulento. Ele é o "eu" que não tolera críticas, mas é o "bom mestre" a aconselhar o "outro" a fazer o que o "espírita", naturalmente, não teria coragem nem interesse e muito menos disposição em fazer.

Além disso, ele fala sempre para um sofredor. Ele não vai dizer a um rico: "Abra mão de seus desejos e privilégios". Ele vai dizer isso para quem não tem, que nem precisa de luxo ou opulência, mas apenas uma vida em que as necessidades essenciais sejam atendidas.

O rapaz que quer uma mulher de caráter, não um "troféu" sexual, mas acaba atraindo justamente uma mulher pouco atrativa, grotesca mas que, no seu meio suburbano, é um "troféu" sexual de um monte de machos brutamontes e vingativos.

A mulher que quer um homem de caráter, não um símbolo de força física e poder financeiro, acaba atraindo um homem com algum status sócio-econômico notável, porém de caráter muito medíocre. Há outros exemplos de desequilíbrio e desigualdades amorosas entre casais hetero ou homossexuais no país, em diversos contextos.

A pessoa que quer um emprego digno, que não representasse necessariamente uma ascensão social vertiginosa mas garante um salário que dê para uma qualidade de vida minimamente satisfatória, acaba apenas tendo a seu acesso um emprego numa empresa corrupta, que garante apenas o alpinismo social, com bom salário e fama, mas sem muita dignidade, apesar das aparências sugerirem isso aqui e ali.

Já recebemos queixas de um rapaz de Salvador que, após de fazer tratamento espiritual em busca de um emprego e uma companheira amorosa (e ele nem queria luxo, mas dignidade), só pôde atrair oportunidades levianas e até perigosas, aconselhado duas vezes a trabalhar em uma rádio corrupta (Metrópole FM, de Mário Kertèsz, cuja origem se deu sob grave esquema de corrupção, com grande desvio de dinheiro público) e, na vida amorosa, só podia atrair "periguetes" ou funqueiras.

Isso mostra o quanto é o moralismo "espírita" que faz a doutrina brasileira ser portadora de energias negativas. E, diante da agenda ultraconservadora de Michel Temer e suas diversas bases de apoio, dá para perceber de que lado estão os "espíritas" que agora pedem para "orar em favor" do presidente.

Os apelos para os sofredores e desafortunados a abrir mão de desejos, não reclamarem das desgraças cotidianas, "vencerem" a si mesmos (ou seja, combater a própria individualidade), aceitarem as dificuldades intransponíveis como "desafios", serem "testados a todo momento" e tudo o mais, tem muito a ver com a retrógrada "Ponte para o Futuro" sugerida pelo presidente interino.

Michel Temer pretende desfazer as conquistas sociais históricas, muitas obtidas nos governos de Lula e Dilma Rousseff, mas muitas outras obtidas em épocas como os governos de Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek e João Goulart. Ele pretende desfazer de muitos direitos sociais garantidos pela Constituição de 1988.

Temer quer promover um mercado de trabalho injusto, com pessoas trabalhando mais horas e por mais anos (já se falou em adiar a aposentadoria para 85 ou 90 anos), perdendo encargos e outras proteções (o SUS está ameaçado de extinção e até a licença-maternidade está sob risco), além da desvalorização dos salários dos trabalhadores. Haverá também cortes de gastos na Educação e na Saúde, cada vez mais entregues ao setor privado, insensível às demandas sociais.

Diante disso, haverá a terceirização total do mercado de trabalho - em que a mão-de-obra assalariada se nivelará aos padrões do mercado informal - , uma precarização que tanto fará os trabalhadores serem mais vulneráveis a acidentes de trabalho, quanto os fará pagar caro com isso, seja pagando tratamentos hospitalares, seja simplesmente pagando com a própria morte.

E o que vêm os "espíritas", adeptos da Teologia do Sofrimento a partir do "belo exemplo" de Chico Xavier? Forçar os que serão prejudicados pelo governo de Michel Temer a ficarem felizes e esperançosos diante do próprio sofrimento, tendo que aceitar viver desgraças por tempo indeterminado, sem reclamar, sem se queixarem, sem mostrar sofrimento para os outros e, de preferência, sem sequer gemer de dor.

Daí que a dita "religião da bondade", o "espiritismo" brasileiro de raiz roustanguista, revelou sua verdadeira face, sendo o apoio incondicional a cenários políticos bastante conservadores que garantam o sossego dos privilegiados e o silêncio dos desafortunados.

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