sábado, 10 de outubro de 2015

Sentido da caridade está preso a dogmas religiosos


O que é caridade? Dar a "boa palavra" a alguém? Dar esmolas? Consolar alguma pessoa depois da tragédia? É evidente que o sentido de caridade, entendido por muitos, é equivocado, por ser meramente paliativo, convencional e simplesmente vago e repetitivo.

Surgem os consoladores de fim de enterro, os doadores de ocasião, os caridosos de conveniência, os generosos a troco de algo. Todos presos no paradigma meramente religioso e medieval da caridade, um processo de meros donativos e palavras confortadoras que em nada resolvem problemas sérios da humanidade.

Que palavras consoladoras são estas que consolam mais quem as diz, iludido com a aparente bondade de suas belas frases, do que quem as recebe, muitas vezes sem entendê-las direito? E que caridade é essa de donativos temporários que os pobres recebem mas que, uma vez esgotados, os devolvem à situação miserável de antes?

O "espiritismo" usa a ideia da caridade com desvio de foco de sua incompetência em entender e seguir os ensinamentos de Allan Kardec. Na falta de capacidade de explicar seus deslizes, os "espíritas" recorrem ao bom-mocismo, definindo o "espiritismo" brasileiro como a "doutrina da bondade".

Isso é bastante patético, porque vê a bondade como algo excepcional. Se um movimento religioso usa a "bondade" como seu diferencial, é sinal de que algo está errado, não só com a sociedade, mas também com essa mesma instituição religiosa.

Chico Xavier, com seus deslizes gravíssimos não só correspondentes à sua falta de compreensão e, podemos dizer, total desprezo ao pensamento de Allan Kardec - no fundo o anti-médium mineiro nunca foi com a cara do pensador francês - , tem sido defendido por seus seguidores por causa da filantropia que, em tese, está associada à trajetória do brasileiro.

Só que sabemos que, se a "caridade" de Madre Teresa de Calcutá, de acordo com o que se revelam pesquisas, não só era paliativa, mas precária e deficitária, a de Chico Xavier era vaga e superficial, muito aquém da importância que sua imagem ideológica costuma sugerir.

Doações bastante duvidosas, apenas corretas em parte, já que boa parte dos lucros dos livros de Chico Xavier iam também para a Federação "Espírita" Brasileira, o que tranquiliza muitos que se esquecem que a FEB é uma entidade tão aristocrática quanto, por exemplo, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

E que símbolo de solidariedade é um Chico Xavier que falava que as pessoas deveriam sofrer sem queixumes, aguentar todo tipo de limitações, de infortúnios, e esperar que as graças divinas cheguem, de preferência postumamente? Quer dizer, temos que desperdiçar uma encarnação sofrendo à toa e sorrindo enquanto gememos de dor?

Aliás, nem gemer de dor deveríamos, se levarmos em conta os ideais de Xavier. Não, nada de reclamar, até as orações têm que ser feitas em silêncio, para não perturbar o sossego dos opressores e algozes. Eles é que são os coitadinhos, esperando 100 anos pagar pelo seu egoísmo, ou seja, na próxima encarnação. É o "fiado espírita".

Comparemos. Madre Teresa de Calcutá foi chamada de "anjo do inferno" porque defendia que os desgraçados deveriam suportar o sofrimento para receberem graças divinas na "vida eterna". Chico Xavier dizia a mesma coisa e é visto como "ativista" e "progressista" e endeusado por boa parte dos brasileiros.

Aos sofredores, as esmolas e o "que tiver aí". Não se observa a complexidade da vida e, no Brasil, o que se observa é que medíocres, canalhas e criminosos se dão muito melhor na vida, há a desigualdade de distribuição de oportunidades e talentos. As festas são comandadas por penetras. As causas são representadas por gente que não se especializa nas mesmas.

Fica muito complicado. Afinal, já beijamos as mãos dos egoístas, elegemos corruptos, arrumamos namoradas para feminicidas, entregamos causas e competências para quem não sabe fazê-las, aceitamos o autoritarismo alheio como se fosse algo benéfico, mesmo quando somos claramente prejudicados.

É por isso que o sentido da caridade se torna muito precário e preso a dogmas religiosos das esmolas, do ensino básico do básico (que só permite aos alunos ler e escrever, mas não a pensar o mundo de forma criativa) e das palavrinhas de consolo.

Presa a esses dogmas, a caridade se restringe aos pudores do moralismo, ao paliativo elitista e a medidas que nada resolvem de maneira profunda e definitiva os problemas sociais diversos, assim como não consegue enfrentar novos desafios e novas questões.

E é isso que livra Chico Xavier de qualquer enrascada. Afinal, para muitos, ele pode ter feito pseudo-mediunidade, apoiado fraudes de materialização, defendido a ditadura, errado nas "profecias" e manchado a doutrina de Allan Kardec com o catolicismo fervoroso do anti-médium. Mas ele continua sendo aceito por muitos porque simplesmente ele é...  "bonzinho".

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