quinta-feira, 6 de agosto de 2015
A perigosa defesa do "silêncio da prece"
Recentemente, houve no Twitter uma mensagem de uma internauta "espírita" dizendo que "o silêncio é a melhor oração". O "silêncio da prece" também era uma das bandeiras de Francisco Cândido Xavier e um dos "remédios" por ele indicados para as pessoas em sofrimento.
Fala-se que o silêncio é a "melhor voz" e é de praxe nas tradições igrejistas trazidas pela Igreja Católica de que ficar calado é a "melhor expressão" de uma pessoa, atribuída miticamente a um ato de coragem e paciência.
No entanto, essa tese é muito, muito perigosa. O problema não é ficarmos calados quando a situação recomendar ou quando alguma ameaça faz com que qualquer voz que se levante contra um opressor obrigue que tenhamos que nos calar para salvar nossa vida.
O grande problema, de extrema e preocupante gravidade, é que o silêncio seja visto como lei máxima para a evolução humana, quando a realidade nos mostra que essa tese é uma forma velada e sutil de censura, já que as religiões costumam agir contra as qualidades naturais humanas, que são a fala e o pensamento.
As religiões pregam, como se fossem "qualidades superiores", a rejeição ao pensamento questionador e à expressão da fala contestadora, como se acreditar em dogmas e ficar calados fossem caminhos de emancipação. É lógico que não são.
Eles são caminhos de servidão, de submissão, de conformismo. O "silêncio da prece" mais parece um silêncio imposto para não perturbar a tranquilidade dos opressores. A oração silenciosa e sem queixumes é visto pelos religiosos como se fosse um gesto de serenidade, mas a verdade é que se trata tão somente de uma forma de apelo sem atrapalhar o privilégio descansado dos algozes.
COM O "ESPIRITISMO", ISSO SE AGRAVA
Se o "silêncio da prece" se torna um recurso mais perigoso quando é associado ao "espiritismo". É de se compreender que católicos e evangélicos, dentro de sua ideologia conservadora (embora moderada nos últimos tempos) e seus mitos tradicionalistas, permita que as pessoas, no sofrimento, fiquem caladas e orem praticamente sem pedir, de preferência para agradecer até pelos males obtidos.
No "espiritismo", que se autoproclama a vanguarda dos movimentos espiritualistas a ponto de se arrogar em até julgar o futuro da humanidade de forma "mais transparente" - como as tais "profecias" que prometem a redenção da humanidade para 2057 - , o "silêncio da prece" se torna uma ideia ainda mais deplorável.
Pois a doutrina que diz abraçar a ciência e o raciocínio investigativo e filosófico se contradiz severamente quando recomenda o silêncio ante o sofrimento e a oração calada como expressão da alma humana. Repetindo: de preferência para agradecer tudo de bom e até de ruim obtido e, quando muito, só para pedir paciência para aguentar infortúnios.
Isso não é manifestação de nobreza, de superioridade nem de altivez humana. Do contrário que alardeiam seus ideólogos "espíritas", o "silêncio", seja na reação aos infortúnios, seja na prática da oração - que, em si, deveria ser algo emergencial, não um "adoçante" para a preguiça da alma - , é nada mais do que um perigoso atestado de subordinação e conformismo.
As pessoas acabam se entregando aos próprios infortúnios e, agradecendo-os, permite que eles se prolonguem. A dor, sufocada pelo silêncio resignador, pode transformar a pessoa num debiloide, porque a asfixia moral da dor resignada e da opressão aceita podem criar fortes danos psicológicos, já que não reagir a dificuldades causa efeitos negativos na alma e na consciência.
Se o silêncio passa a ser a "único meio de emancipação (sic) humana" recomendável pelos ideais "racionais" e "transformadores" do "espiritismo", isso significa que a doutrina que estimula o pensamento questionador e o manifesto do debate contradiz ao querer que pessoas fiquem caladas para conseguir benefícios futuros na vida (ou talvez postumamente, como frequentemente é).
A partir da defesa do "silêncio" como forma utópica de emancipação humana, o "espiritismo" demonstra mais uma vez ser uma doutrina retrógrada, que através dessa defesa faz com que as pessoas fiquem ainda mais submissas, mais conformadas, mais preguiçosas e, até mesmo, mais enlouquecidas.
Sim, isso mesmo. As pessoas ficam enlouquecidas porque precisam compensar a falta de indignação, de questionamento e mobilização com crenças em fantasias, o que as faz mais alucinadas e delirantes e, com a atrofia emocional, tornam-se mais deprimidas e estressadas. Ficar sempre calado pode ser uma forma perigosa de oprimir a alma e prolongar de forma indeterminada o sofrimento.
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