quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015
Tragédia familiar típica do "espiritismo" brasileiro
Moralista e extremamente conservador, o "movimento espírita" traz energias bastante pesadas que, numa primeira instância, podem parecer benéficas para as pessoas, mas depois podem representar sofrimentos futuros.
Um típico drama familiar trazido pelo "espiritismo à brasileira", com seu moralismo patriarcal e seu conservadorismo ideológico rígido acaba influenciando, mesmo indiretamente, nas tragédias que atinem muitas famílias.
Vejam o caso desta ilustração. A hipotética dona Hermengarda, viúva, vivia com três filhos: Julinha, a filha caçula, bela, simpática e muito confidente com a mãe. A filha do meio, Clarice, serviçal e dedicada, mas indiferente à sua mãe, e Marcos, o filho viciado, garoto-problema que vive brigando com a família, principalmente nos seus surtos de drogas.
Num determinado momento, dona Hermengarda, devota de Chico Xavier e admiradora de seus livros, sobretudo os que trazem mensagens de Emmanuel, e frequentadora do "centro espírita" de sua cidade, descobre que tem um câncer no ovário já com algum estágio de desenvolvimento.
Ela recorre então a um médico, por indicação de uma colega de "centro", e resolve então iniciar seu tratamento de quimioterapia, que dura duas sessões num espaço de dois anos. Com fé e resignação, ela depois é noticiada pelo médico de que sua cura está completa.
Alegre, a senhora no entanto, semanas depois, em alguma noite de sábado, é avisada por um telefonema que sua filha Julinha, confidente e conselheira, havia morrido quando deu entrada no hospital depois de, na volta de uma festa, sofreu um acidente de moto com um amigo. Julinha era o único ponto de equilíbrio da família.
Quanta tristeza sentiu dona Hermengarda, que, angustiada, no entanto mantinha sua conformação, diante das lições moralistas porém de palavras melífluas de Chico, Emmanuel e similares. Restou a ela Clarice, que não tem a doçura da falecida irmã, não é disposta a conversar confidências com a mãe e possui desavenças com a mãe. Sem falar do problemático Marcos.
Certa vez, Clarice foi sair para pagar as contas da casa, função que era de Júlia, mas ela havia falecido e sepultada em choroso funeral, e a irmã acabou herdando algumas tarefas de casa. Apenas ficaram dona Hermengarda e o primogênito, que depois resolveu dar uma saída para "passear".
Clarice ainda não havia voltado para casa quando um furioso e desesperado Marcos bateu com violência na porta de casa, e mal a mãe abriu ele a empurrou gritando "Não enche, sua velha" e, com o comportamento alterado, foi para o quarto da mãe, com um saco grande na mão, pegar tudo quanto é dinheiro e objetos pessoais, inclusive relógios, joias e até molduras.
A mãe tentou repreender, mas ficou assustada com a agressividade do rapaz, que ainda por cima pegou roupas dela, avançou para o quarto de Clarice - o de Júlia ele evitou, por sentir afeição pela falecida, que se dava bem com ele - , pegou dinheiro e pertences dela e depois ele mesmo pegou o que ele tinha e foi embora.
Ao sair de casa, um rapaz gritou lá fora, de forma agressiva: "Só isso, seu b*****?", ao ver um saco aparentemente não muito cheio. "É o que eu pude pegar, p****!", gritou Marcos para o outro. Mas o outro rapaz, verificando melhor os pertences, se tranquilizou e disse: "C******, até que está bom demais. Tu pagou a dívida direitinho, gostei", ficando com todos os pertences roubados.
Ao voltar, Clarice ficou arrasada. Teve que consolar a mãe, e as duas choraram. Não havia a meiguice de Júlia e mesmo as conversas não eram muito carinhosas. As duas até se tornaram mais amigas, mas bem longe da relação aprofundada com a falecida jovem. Tiveram que aguentar Marcos drogado por uns dez anos, até ele arrumar uma profissão e ir embora.
Poucos dias após o assalto, dona Hermengarda foi para o "centro espírita" querendo saber de uma mensagem do espírito da filha. Ela o fez através de uma entrevista no auxílio fraterno em que ela contou tudo, até mesmo as anotações do diário que Julinha manteve até o dia do repentino falecimento, e a funcionária ouvia com muita atenção.
Em seguida, ela comunicou à cúpula do "centro", da qual incluiu um dirigente que era tido como o principal médium da casa. Sua mediunidade, todavia, era precária, já bastante limitada na hora dos passes, quando se limitava a "sacudir as mãos" com os olhos fechados, e travava quando a tarefa era a psicografia.
Por isso ele resolveu usar sua própria imaginação e sua criatividade para, a partir das informações que ele recebeu da cliente e frequentadora, escrever uma mensagem de apelo religioso atribuída ao espírito de Julinha e dotada de alguns elementos que fizessem a mensagem parecer verossímil.
Começando com um previsível "Querida mamãe", acrescentando os nomes dos irmãos, ele escreveu uma mensagem com os elementos clichês: a menina sofreu muito, foi socorrida por uma colônia espiritual, aprendeu as lições de Jesus e, se sentindo um pouco melhor, pede "mais fraternidade" aos seus entes e ao povo do Brasil.
A caligrafia é do próprio médium, que nem se esforçou em imitar a caligrafia da jovem morta. Mesmo assim, ao divulgar a mensagem, supostamente atribuída a Julinha, dona Hermengarda se comoveu e afirmou, convicta, quase gritando: "É minha menina!! Minha Julinha!! Oh, Julinha, quantas saudades!!".
E chorou compulsivamente de tanta comoção, sem sequer prestar atenção à caligrafia da carta.
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