segunda-feira, 3 de novembro de 2014

Isto É havia feito reportagem equivocada sobre Doutrina Espírita

EM ATO FALHO, ISTO É DEFINIU CHICO XAVIER COMO "DISCÍPULO FIEL DO KARDECISMO".

Pior do que um leigo tentar entender aquilo que não conhece, é esse leigo tentar entender aquilo que não apenas desconhece, mas que já foi deturpado. Investindo em fontes oficiais, mas bastante mentirosas, ele molda sua compreensão a partir da visão predominante, mas não muito coerente, da ideia apreciada.

É o que se observa no "espiritismo" brasileiro. Os leigos acabam conhecendo a "doutrina de Allan Kardec" a partir de fontes nada kardecistas, que haviam deturpado completamente as ideias trazidas pelo pedagogo francês, trazendo um perfil ideológico que mais tem a ver com moralismo religioso e misticismo esotérico do que com uma ciência que estuda a natureza do espírito.

A reportagem da revista Isto É, intitulada O papa dos Espíritas, escrita por Andres Veras e publicada há um ano, já segue a linha do "roustanguismo light" em que as ideias de Allan Kardec são superficialmente apreciadas, ou talvez apenas bajuladas, enquanto o antigo religiosismo de Jean-Baptiste Roustaing é mantido na sua essência, tirando apenas os aspectos mais polêmicos.

A reportagem, é claro, corresponde ao lançamento do tendencioso livro Kardec - A Biografia, de Marcel Souto Maior, publicação que tenta estabelecer o vínculo de Allan Kardec com Chico Xavier, mineiro que comprovadamente se mostrou um completo ignorante em conhecimentos kardecistas.

A própria reportagem é tendenciosa porque começa exaltando a missão científica de Allan Kardec, descrevendo seu ceticismo, seus trabalhos de analisar a vida e a comunicação de espíritos do além através de ideias colhidas de diversas áreas do conhecimento, a partir do Eletromagnetismo.

Depois a reportagem "desce" para o religiosismo, embora citasse o único conflito admissível relacionado ao "movimento espírita", que é a briga com a Igreja Católica, sem determinar se é com setores ortodoxos ou heterodoxos do Catolicismo. A título de exemplo, uma facção como a esquerdista Teologia da Libertação inexiste para os ideólogos atuais do "movimento espírita".

De repente, veio a tese surreal: a "predominância" de mensagens brasileiras no túmulo de Allan Kardec, no cemitério de Père-Lachaise, em Paris - onde vários famosos estão sepultados, como o escritor Oscar Wilde e até mesmo o cantor e poeta do grupo californiano The Doors, Jim Morrison - traz a ideia falaciosa de que o kardecismo é uma "criação brasileira".

"Há um consenso entre biógrafos céticos, estudiosos da religião ou espíritas devotos: o kardecismo é praticamente uma criação brasileira. Três fatores ajudaram a disseminação da doutrina: o sincretismo brasileiro, que facilita a convivência entre crenças, a proximidade entre espiritismo e cristianismo e, por último, um certo médium de Uberaba, em Minas Gerais", delira o texto da reportagem.

O texto de Isto É também tenta fazer crer que o "espiritismo" cresce no Brasil, atingindo um índice de 65% entre 2000 e 2010 e tendo sido favorecido pelo "certo médium de Uberaba", que, sabe-se, é o mesmo Chico Xavier radical mas excentricamente católico e um dos piores alunos das lições do professor Kardec.

Daí a reportagem termina com a exaltação, em ligeiras palavras, da figura do anti-médium mineiro, numa alusão sutil ao religiosismo que predomina na orientação do "espiritismo" brasileiro, e que em muitos aspectos deturpou as lições de Kardec até se afastar completamente da essência de seus ensinamntos. Definitivamente, o kardecismo NÃO é uma criação brasileira.

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