sábado, 25 de outubro de 2014

Suposto Humberto de Campos "fala" como Chico Xavier em livro 'Crônicas do Além-Túmulo'

A FEB NÃO TERIA GOSTADO DAS CRÍTICAS DE HUMBERTO DE CAMPOS A PARNASO DE ALÉM-TÚMULO E REAGIU SE APROPRIANDO DO NOME DELE, ATRAVÉS DE CHICO XAVIER.

Observando os aspectos ocultos do "movimento espírita", suas atividades e seus totens, nota-se que há muita coisa grave por trás desse turbilhão de palavras bonitas e do religiosismo exacerbado que desviou o Espiritismo que é feito no Brasil da rota segura de Allan Kardec.

A questão da espiritualidade foi deturpada, distorcida ou mesmo negligenciada em prol de um propagandismo religioso, em que palavras como "amor", "fraternidade" e "luz" são tão frequente quanto levianamente pronunciadas. É Evangelho demais e pesquisas sobre a vida espiritual de menos.

Lendo o livro Crônicas de Além-Túmulo, de 1937, um dos primeiros atribuídos ao autor de O Brasil Anedótico e cartão de visitas para o dito autor de Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho, obra lançada no ano seguinte, nota-se que o ranço dos textos do "espírito Humberto de Campos" na verdade guardam um "sotaque" mesclado entre o carioquês febiano e o mineiro chiquista.

Só a partir do prefácio, intitulado "Ao Leitor", e alguns de seus primeiros capítulos, a começar pelo tendenciosamente intitulado "De um casarão de outro mundo", dá para perceber que, embora a primeira impressão de alguns apreciadores vagos da obra de Humberto de Campos aponte alguma semelhança da obra "mediúnica" em relação à original, uma observação cautelosa a desfaz.

Toda imitação busca semelhança em relação à fonte original. A intenção da imitação é de se passar pela fonte, o que, até certo ponto, se identificam semelhanças entre o falso e o verdadeiro que, em certos casos, convencem tranquilamente. O que não significa que o falso, por parecer com o verdadeiro em certos aspectos, possa ser, por isso mesmo, realmente verdadeiro.

Nota-se, de um lado, argumentos típicos das palestras e depoimentos deixados por Francisco Cândido Xavier, e, de outro, alguma erudição a mais que pode ter sido fruto de uma colaboração dos doutos editores da Federação "Espírita" Brasileira.

Os textos são muito sisudos e religiosos demais para o estilo que Humberto de Campos deixou em vida. E, no préfácio, alegando a tese de que poucos intelectuais na Terra podem admitir que escritores possam lançar livros depois de "mortos" e que ele mesmo era cético quanto a isso, o suposto autor espiritual compara a espiritualidade com a audácia dos navegadores portugueses.

Ele cita o caso de Medeiros e Albuquerque e Coelho Neto, famosos escritores da época e contemporâneos de Humberto, que teriam aderido à apreciação da espiritualidade como os antigos navegadores portugueses ao "descobrimento" do Brasil, antecipando a euforia ufanista de Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho:

"Apegando-me ao resignado materialismo dos meus últimos tempos, desalentado em face dos problemas transcendentes do além-túmulo, não tive coragem de enfrentá-los, como, um dia, fizeram Medeiros e Albuquerque e Coelho Neto, receoso do fracasso de que deram testemunho, como marinheiros inquietos e imprudentes, regressando ao porto árido dos preconceitos humanos, mal se haviam feito de vela ao grande oceano das expressões fenomênicas da Doutrina, no qual os espíritas sinceros, desassombrados e incompreendidos, são aqueles arrojados e rudes navegadores da Escola de Sagres que, à força de sacrifícios e abnegações, acabaram suas atividades descobrindo um novo continente para o mundo, dilatando as suas esperanças e santificando os seus trabalhos".

Em seguida, o suposto Humberto de Campos, a pretexto de se desfazer das dúvidas que teve em vida com o livro Parnaso de Além-Túmulo - a obra de "pureza originária" que foi remendada cinco vezes em duas décadas - , alegou ser um livro que "prova" a identidade com os estilos que os supostos poetas expressavam em vida:

"Em 1932, um dos meus companheiros da Academia (Brasileira) de Letras solicitou minha atenção para o texto do Parnaso de Além-Túmulo. As rimas do outro mundo enfileiravam-se com a sua pureza originária nessa antologia dos mortos, por meio da mediunidade de Francisco Cândido Xavier, o caixeiro humilde de Pedro Leopoldo (MG), impressionando os conhecedores das expressões estilísticas da língua portuguesa. Por minha vez, procurei ouvir a palavra de Augusto de Lima, a respeito do fato insólito, mas o grande amigo se esquivou ao assunto, afirmando: 'Certamente, entre as novidades de minha terra, Pedro Leopoldo concorre com um novo barão de Münchausen'".

Note-se que, na conversa com o escritor e colega na ABL, Antônio Augusto de Lima, o suposto espírito descreve um suposto comentário de comparação entre Chico Xavier e o conhecido aventureiro alemão Karl Friedrich Münchausen, o Barão de Münchausen, conhecido pelos seus relatos que misturavam detalhes reais com outros bastante fantasiosos, biografia que inspirou uma produção cinematográfica nos anos 80.

No decorrer do livro, o suposto Humberto, carregado de muito religiosismo, numa das primeiras campanhas de proselitismo religioso em larga escala do "espiritismo" da FEB, descreve a aparente despretensão nas questões de registro autoral, além de realçar a aparente humildade de Chico Xavier, dentro da perspectiva conformista das "renúncias e abnegações santificadoras".

Note-se também que o suposto Humberto não pretendia enviar os textos para a livraria do amigo José Olympio (a histórica José Olympio Editora), para evitar "incômodos", que até ocorreram, como o caso do processo judicial movido pelos herdeiros do escritor contra Chico Xavier. Os comentários do suposto Humberto seriam repetidos depois em mensagem publicada pelo livro A Psicografia ante os Tribunais, de Miguel Timponi, advogado da FEB:

"Desta vez, não tenho a necessidade de mandar os originais de minha produção literária a determinada casa editora, obedecendo a dispositivos contratuais, ressalvando-se a minha estima sincera pelo meu grande amigo José Olympio. A lei já não cogita mais da minha existência, pois, do contrário, as atividades e os possíveis direitos dos mortos representariam séria ameaça à tranquilidade dos vivos".

 Evidentemente, a "ameaça à tranquilidade" descrita seriam os debates e questionamentos quanto à veracidade dos textos ditos mediúnicos produzidos no Brasil, quase todos dotados de proselitismo religioso por meio do qual podem destoar até da natureza da personalidade de cada falecido, desde que mantenham os tais "recados fraternais".

Daí que, na chamada mediunidade brasileira, vale tudo, até mesmo o roqueiro Chorão mandando mensagem escrevendo que nem vigário de igreja do interior, em clara contradição com o estilo rebelde que marcou a vida do finado cantor do Charlie Brown Jr.

Humberto de Campos teria sido usado pelos dirigentes da FEB, por intermédio de Chico Xavier, porque a cúpula da federação não gostou dos comentários um tanto céticos e irônicos que o escritor de O Brasil Anedótico, no final da vida, havia feito da discutível antologia poética "espiritual", que do contrário que descreveu "o espírito de Humberto", não era muito bem visto pelos renomados estudiosos literários.

Pelo contrário, mesmo comentários menos negativos como os de Agripino Grieco e Monteiro Lobato sobre Parnaso de Além-Túmulo, erroneamente vistos pela FEB como "comprovações" da mediunidade de Xavier, eram na verdade relatos de dúvidas que, só por não negarem uma tese, não quer dizer que necessariamente afirmem seu contrário, alvo de igual ceticismo.

Os escritores simplesmente estavam em dúvida quanto à obra de Xavier. Não negavam nem afirmavam, daí que, por não negarem, não significa que eles houvessem afirmado, já que em relação à tese da veracidade mediúnica eles eram igualmente céticos. A própria lei, que em 1944  julgou "improcedentes" as ações judiciais dos herdeiros de Campos, foi na mesma postura.

O ceticismo, no entanto, se volta para a tese contrária, já que a obra do "espírito Humberto de Campos" é carregada de igrejismo piegas e fantasias infantis e sentimentaloides que o escritor maranhense nunca tinha nem teria escrito em vida, e que se assemelha em muitas partes com o discurso de Xavier em seus depoimentos, apenas "aperfeiçoado" pelos editores da FEB.

O Barão de Münchausen teria sido bem mais realista.

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