quinta-feira, 6 de julho de 2017
Técnica duvidosa de análise de textos testou obras de Chico Xavier
O que é a nossa imprensa. Um texto de Yahoo! Finanças falando sobre o teste de um programa eletrônico para analisar o estilo de obras de Francisco Cândido Xavier começou mal com o título mostrando um erro em português, "Máquinas põe Chico Xavier à prova e resultado é surpreendente".
Sem qualquer questionamento, a reportagem, num contexto em que nosso jornalismo é tão decadente que apresenta textos gramaticalmente errados, desinformativos e até mentirosos, com a grande imprensa praticando até fake news, como se nota o noticiário político. O assunto, o uso da "inteligência artificial" para analisar os estilos de três supostos autores espirituais publicados pelo "médium", revela uma técnica bastante duvidosa e sem eficácia verdadeira.
Ela vem de uma máquina chamada Deep Learning, utilizada pela empresa Stilingue, para analisar obras dos três supostos autores, Emmanuel, André Luiz e Humberto de Campos. O processo se dá a partir da leitura digital de uma enorme quantidade de dados.
Nesse processo, o computador passa a "compreender" as relações entre os dados sem precisar saber o que é um substantivo e um verbo. Com isso, o programa tem condições de, por exemplo, "reescrever" a Bíblia, "reconhecendo" que, antes de cada frase, terá que colocar um número antes como indicativo de um versículo.
A técnica foi usada para tentar reconstituir o estilo do dramaturgo inglês William Shakeaspeare, e conseguiu-se imitar seu estilo, mas apresentando certa margem de erros. No teste feito com as obras de Chico Xavier, o aparelho apresentou "êxito", como se os estilos dos supostos autores espirituais fosse "realmente diferente".
Juntando um livro de cada um, tentou-se misturar os supostos autores de forma que um tentasse escrever a obra de outro. A máquina apontou suposta diferença de estilo, quando aparentemente um suposto autor não conseguiu reproduzir o estilo de outro. Como Emmanuel reescrevendo um livro atribuído a Humberto de Campos.
A TÉCNICA NÃO VALEU
A técnica deve ser um dos apelos desesperados para tentar salvar a reputação de Chico Xavier e tentar supor alguma autenticidade de suas obras supostamente mediúnicas. Ultimamente, devido aos escândalos causados por denúncias de fraudes sobre seus livros, a propaganda sobre o "médium" estava concentrada nas ações de "filantropia" (Assistencialismo) e nas "cartas" atribuídas a parentes mortos de famílias não-famosas.
Há vários pontos a analisar sobre essa técnica, que pode ser válida, por exemplo, para identificar doenças e genes, mas é bastante duvidosa quando a questão é analisar estilos literários. Sabe-se que um robô não pode definir se um estilo é diferenciado ou autêntico e, havendo margem de erros, é capaz também de apontar estilos diferentes confrontando dois livros de um mesmo autor em que um foi lançado na juventude e outro na fase mais idosa.
A técnica que avaliou os livros de Chico Xavier não garantiu autenticidade na suposta psicografia. O que podemos avaliar, a respeito da suposta diferença de estilos nos livros atribuídos a Emmanuel, André Luiz e Humberto de Campos se deve a algumas considerações:
1) Informações não-oficiais, porém verídicas, mostram que tais livros, na verdade, são uma autoria coletiva, mas de gente da Terra: Chico Xavier teria feito às obras com parceria, geralmente com o presidente da FEB, Antônio Wantuil de Freitas e vários colaboradores, entre redatores, revisores e consultores literários. Isso se constata porque Chico era incapaz de reproduzir estilos diferentes sozinho, mas também se atribuir autenticidade às "psicografias", apresentará irregularidades sérias em relação aos estilos originais que os autores alegados deixaram em vida.
2) Entendendo as supostas psicografias, evidentemente que Chico Xavier, considerando suas psicografias fake - classificação desagradável a muitos de seus fiéis, mas bastante realista - , teria que criar "estilos diferentes" para cada suposto autor, como o padre e "pensador espírita" Emmanuel, o médico e "cientista" André Luiz e a paródia igrejeira do falecido Humberto de Campos.
3) O uso de apenas três livros - os nomes das obras não foram citados na reportagem - é insuficiente para que os resultados fossem "surpreendentes". Além disso, os "acertos" são frágeis, em se tratando de um mero programa eletrônico, e não serão os algoritmos que irão afirmar que a suposta psicografia de Chico Xavier é autêntica.
4) O critério de colocar um autor para "reescrever" livro de outro é também duvidoso. Faltou também analisar a obra original de Humberto de Campos confrontada com a obra do suposto espírito. Evidentemente, o resultado apontaria diferenças de estilo se o Humberto de Campos original "reescrevesse" os livros do suposto espírito e vice-versa.
Nada substitui o conhecimento humano e, por isso, a análise de conteúdo, combinada com um profundo saber literário, já afirma que a literatura "mediúnica" de Chico Xavier é bastante irregular, apresentando exatamente as mesmas caraterísticas de erros estilísticos que as obras fake que se observam na Internet.
É bastante doloroso para muitos admitir que Chico Xavier foi o pioneiro dos textos fake, mas isso, infelizmente (para eles), é verdade, porque uma simples leitura é bastante para observar que os supostos autores espirituais não condizem nas "psicografias" porque, em que pese as eventuais semelhanças, elas escapam dos estilos e das personalidades originais dos mortos alegados.
Daí que não dá para apelar para tolices como "o espírito estava tão tomado de amor que se esqueceu do próprio estilo" ou "o espírito doou seu estilo para a caridade". Bobagens como "linguagem universal do amor" também condizem. É necessário abrir mão das paixões religiosas e admitir que obras fake também podem ser produzidas a pretexto de transmitir "mensagens positivas". Também pode-se usar o "amor" para enganar as pessoas.
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