sexta-feira, 28 de abril de 2017

Pessoas de bem já conhecem demais perdas e tragédias. E os espíritos atrasados?


Vivemos uma educação moralista viciada. O moralismo religioso sempre apela para aceitarmos as perdas e ainda tenta forçar a apresentar "novas lições", quando na verdade já aprendemos demais sobre as perdas que sempre temos e estamos até cansados de ter.

Quantos progressos humanos foram adiados por tantas e tantas perdas. Quantas missões humanas foram ceifadas ou interrompidas na sua plenitude, em tarefas desempenhadas de maneira insubstituível, porque não há trainée que faça um canastrão ou arrivista substituir o gênio que se foi.

Certo palestrante "espírita" recomendou o filme A Cabana (The Shack), baseada num best seller literário, sobre um homem que perdeu sua filha mais nova e nunca mais viu seu cadáver e volta ao local da tragédia para encontrar uma lição de vida.

A impressão que temos é que sempre somos masoquistas. Mas tragédia envolvendo pessoas de um caráter mais evoluído é algo que existe há anos e atingiu um número maior de pessoas. Vivemos tantas tragédias desse nível que chega a ser um acinte termos que "obter mais lições" sobre aquilo que a gente aprendeu até demais. Somos pós-graduandos na perda de entes queridos!!

O que quase ninguém percebe é que, agora, quem precisa aprender o que é perda são aqueles que são muito atrasados. Ficamos na visão materialista que defende que um espírito grotesco fique "mofando" a vida toda na esperança de que ele aprenda o que sua vaidade impede de aceitar. Muita gente se recusa a admitir que as pessoas que impõem tragédias e infortúnios aos outros são as que mais se atraem e se prejudicam, criando seus próprios prejuízos e mortes.

O Brasil que se apega ao supérfluo, ao inútil e ao nocivo sempre se portou de maneira dolorosa, nostálgica mas conformada quando perde o que mais necessita. O Brasil sempre se inclina aos retrocessos e só aceita progressos quando eles são desfigurados pelo próprio retrocesso, obtido pela banalização que sempre deturpa uma novidade.

O que há de personalidades de grande valor que faleceram cedo ou no auge de sua tarefa espiritual na Terra, o Brasil já está cansado de saber. Ficamos até resignados e estamos acostumados de ver gente brilhante morrendo de repente, deixando trabalhos em andamento, cancelando uma série de projetos futuros que nunca mais serão realizados.

Mas isso é compreensível. O que não dá para compreender é quanto a homicidas ricos e poderosos que ficam impunes, quando têm suas tragédias potenciais anunciadas - como um câncer ou um sério risco de infarto - , fazem pessoas reagirem como se isso fosse um dado ofensivo. O medo de ver tais criminosos morrerem apavora mais as pessoas do que a perda de um ente querido. Por que será?

Talvez se possa explicar pelo fato da sociedade brasileira ser moralista, conservadora e, de certa forma, vingativa. Uma sociedade que defende o porte de armas e que alega que homicidas ricos e poderosos tenham cometido crimes por um propósito "justo". São "justiceiros de luxo", às vezes vistos como arremedos de Deus pelo "direito de definir a morte do outro", e, por isso, são pessoas que "não podem morrer".

Mas isso é uma grande, aliás, uma gigantesca ilusão. Os feminicidas conjugais (antes definidos como "criminosos passionais"), famosos pela desculpa da "defesa da honra", estão entre as pessoas com o maior alto risco de sofrer infartos no Brasil, não raro antes dos 60 anos de idade. São também jurados de morte em potencial, pela revolta que seus crimes, matando mulheres inocentes por conta de um ciúme doentio, provocam numa sociedade em processo de explosiva convulsão social.

Os pistoleiros que matam camponeses, missionários e ativistas rurais também não possuem uma boa expectativa de vida. Os chamados "jagunços" são mal alimentados, fumam e bebem demais e geralmente parecem mais velhos que são, de forma que dificilmente eles conseguem chegar à velhice, em muitos casos tendo uma vida tão curta quanto as vítimas que mataram, falecendo de câncer, infarto e até por distúrbios alimentares.

As pessoas que, em geral, tiram a vida do outro, provocam duas tragédias: a da vítima, uma "tragédia à vista", e a de si mesmas, uma "tragédia às prestações". É certo que não vamos sair matando homicidas impunes, porque é outra atrocidade, mas, assim que devemos respeitá-los em suas vidas, também devemos nos preparar para a própria tragédia que eles contraíram para si.

É aquela coisa: "deixemos eles viverem em paz, mas também deixemos morrer em paz, também". Mas se é um homicida que ocupou os noticiários nacionais, sobretudo durante julgamentos transmitidos em redes de TV, não há também como a imprensa omitir.

Há um medo de noticiar o falecimento de algum homicida rico, sobretudo um feminicida conjugal, uns com medo de despertar a consciência trágica nos machistas, outros para não estimular a comemoração do movimento feminista.

A omissão faz com que este tipo de homicida seja o único tipo de pessoa que "não pode morrer" e que, portanto, quando é para morrer, "morre sem morrer", sendo apenas presumidamente morto a partir dos 93 anos, por mais que tenha morrido bem antes.

A sociedade moralista se apavora com tais tragédias, achando que os homicidas ricos e poderosos "precisam de tempo" para ressocialização. Mas aí um desequilíbrio ético se ressalta, pois os homicidas, ainda tomados de muita vaidade, apenas zelam para recuperar os privilégios materiais que seus nomes terrenos representam. Poucos são aqueles que realmente sentem remorso pelo que fizeram e aprendem rigorosamente a má lição de seus crimes.

As pessoas se apavoram só de pensar que um feminicida rico morra antes dos 60 anos de idade. Mas aí vem o refrão "olha só quem fala". Pessoas que se preocupam com a tragédia de um homicida se resignam quando seus próprios filhos morrem antes de entrar na faculdade e realizar seus valiosos projetos pessoais, em muitos casos de alto nível altruísta. Por outro lado, não se importam em ver homicidas vivendo até os 85 anos como se fosse um "turista" na Terra.

Em muitos casos, o homicida que morre apenas têm como "prejuízo" a perda de seu nome material. Sua ressocialização não se encerra, e, em muitos casos, é benéfica: livre daquele nome ilustre manchado com o sangue de outra pessoa, ele não precisará cobrir de ouro as manchas sangrentas da encarnação anterior e, sob o risco de "aprendizado", retomar todos os privilégios e arrogâncias.

Em vez disso, ele terá uma nova encarnação, mais "limpa" e sem os atributos sociais que as condições terrenas da encarnação anterior mantinham. Em vez de passar a velhice tentando apagar as manchas de sangue que comprometem seu ilustre nome e seus privilégios, ele encontrará situações novas, talvez até limitações, que poderão remodelar sua personalidade de forma a preveni-lo de um novo crime.

Em muitos casos, o feminicida conjugal que havia sido, em tal encarnação, um empresário, profissional liberal, jurista etc, pode reencarnar como alguém que sofre desilusões amorosas e consegue apenas empregos modestos.

Sem o status profissional, ele poderá se preocupar mais com o trabalho, podendo, em vez de usar o prestígio social para praticar um crime de vingança e depois recuperar em vão a reputação perdida, ele poderá usar o emprego modesto para construir seu progresso espiritual, diante da impossibilidade de conquistar a mulher que ele queria namorar.

Da forma como ocorrem tragédias e não-tragédias no Brasil, os espíritos atrasados, que mais precisam de desilusão para regular seus desejos e instintos abusivos, são os que mais se livram desta necessidade, preferindo fazer turismo encarnacional que os faz cada vez mais privilegiados.

O consentimento de uma sociedade moralista com isso, enquanto deixa pessoas de grande valor morrerem antes até de iniciar qualquer tarefa de progresso social, só serve para o Brasil ficar ainda mais atrasado, iludido com a conciliação entre as forças do atraso e do progresso, acreditando num falso equilíbrio.

Hoje o que se vê é um progresso antes condicionado pelas restrições do atraso, ser cada vez mais deixado de lado pelos retrocessos que perdem a vergonha de serem impostos à população. E, como numa fruta nova contagiada pelo fungo da fruta podre, o apodrecimento ameaça até mesmo o que parece relativamente novo nas atividades diversas de nosso país.

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