segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Como é mesmo a "fase dúbia" do "movimento espírita" brasileiro?

DIVALDO FRANCO É O MAIOR BENEFICIADO DA "FASE DÚBIA" DO "ESPIRITISMO" BRASILEIRO.

O que é a "fase dúbia" ou "tendência dúbia" do "espiritismo" brasileiro? É uma fase em que o "movimento espírita" assume uma dupla identidade, sob a desculpa de adotar uma postura "equilibrada" e "conciliatória". É uma fase com cerca de 40 anos de vigência, e que foi marcada por graves contradições doutrinárias, causando mais confusão do que equilíbrio.

O termo parece ofensivo para os "espíritas", mas é realista. Afinal, observa-se a coexistência tanto de conceitos igrejistas com ideias cientificistas, dentro de um movimento feito para agradar gregos e troianos, ou melhor, "científicos" e "místicos", embora sob a supremacia destes últimos.

Há raízes históricas que levam à ascensão da fase dúbia do "movimento espírita", e que mostram mais um jogo de interesses do que realmente uma postura equilibrada, até porque o equilíbrio deveria se dar com o menor número de contradições possível, mas o "espiritismo", nas últimas quatro décadas, só agravou as contradições, maiores do que quando os "espíritas" pelo menos se assumiam adeptos do roustanguismo.

As raízes se dão desde o Pacto Áureo de 1949, organizado pelo Congresso da FEB no Rio de Janeiro, em que a cúpula da Federação "Espírita" Brasileira decidiu tudo sem ouvir as federações regionais. Apesar de sediada no Rio de Janeiro, durante anos capital federal, a FEB privilegiava mais a federação regional paulista, a FEESP.

Por outro lado, a postura roustanguista se tornou cada vez mais alvo de denúncias do grupo "científico" que integrava a FEB, mas divergia da orientação dominante no "movimento espírita". Nomes como Deolindo Amorim, José Herculano Pires e Carlos Imbassahy, o pai, denunciavam os arbítrios da corrente roustanguista do "movimento espírita".

No meio do "tiroteio" se encontrava Francisco Cândido Xavier, o maior astro do "movimento espírita", um sujeito arranjado "de fora", porque era um beato católico dotado de dons paranormais e que havia sido excomungado pela igreja de Pedro Leopoldo, mais pela paranormalidade do que pelas crenças católicas, já que Chico Xavier professava crenças ortodoxas e até medievais, como fervoroso beato do interior.

Também se encontrou nesse "tiroteio" Divaldo Franco, jovem baiano que, no final da década de 1950, já como organizador da Mansão do Caminho, iniciou carreira como suposto médium. Assim como Chico Xavier, Divaldo professava o roustanguismo de maneira enrustida, nunca assumida, e, embora sejam ligados à cúpula da FEB - Chico, por exemplo, era cria do presidente da FEB, Antônio Wantuil de Freitas, que agia como se fosse empresário do "médium" - , divergiam da postura centralista.

Eis que, quando Divaldo Franco iniciou seus trabalhos "psicográficos", pela sua inexperiência resolveu plagiar Chico Xavier, este já um plagiador de longa data. Foi um dos membros da cúpula da FEB, Luciano dos Anjos, denunciar tais atividades, que tornou-se aguda a crise no "movimento espírita", no decorrer da década de 1960.

Com isso, entrou em conflito a direção central da FEB e os dirigentes regionais. Como Jean-Baptiste Roustaing era o maior nome defendido pela direção da FEB, o nome de Allan Kardec passou a ser enfatizado como uma formalidade, como se fosse o paraninfo de um partido político dissidente. Mas isso não representava uma tendência dos "espíritas" regionais recuperarem as bases doutrinárias kardecianas para valer, muito pelo contrário.

A partir de 1963, Chico Xavier e Divaldo Franco, tendenciosamente, divulgaram supostas mensagens do médico e ex-presidente da FEB, Adolfo Bezerra de Menezes - que oficialmente permaneceu no plano espiritual, mas tudo indica que ele está em sua segunda encarnação após deixar a vida material em 1900 - , supostamente arrependido do roustanguismo e voltado aos postulados originais de Kardec.

A prova, no entanto, de que a promessa de recuperação das bases doutrinárias originais era conversa para boi dormir estava na forma com que o suposto Bezerra de Menezes definiu tal promessa, através da expressão "kardequizar", uma clara corruptela do termo "catequizar", que era o método com que os jesuítas do Brasil colônia adotavam para converter os indígenas para o Catolicismo.

Essa era a senha para a fase dúbia do "movimento espírita", que parecia ensaiar um distanciamento do grupo de Wantuil, o "mentor" terreno de Xavier, já que o presidente da FEB já se tornava idoso e, em 1970, se aposentava, doente, encerrando um ciclo que se fechou oficialmente com sua morte, em 1974.

Enquanto surgiam escândalos associados às fraudes de materialização respaldadas por Chico Xavier, e as relações entre este e Divaldo pareciam estremecidas, o "movimento espírita" ainda acentuava seu roustanguismo quando, nos anos 1970, se planejou uma deturpação ainda mais radical na tradução da obra de Allan Kardec, plano denunciado, até em programa de rádio, por José Herculano Pires.

Chico Xavier chegou a apoiar esse plano, mas, como era amigo de Herculano ("amigos, amigos, negócios à parte", vale lembrar), voltou atrás. Com o fim da era Wantuil, e, mais tarde, a falência da TV Tupi - emissora que blindava o "movimento espírita" na mídia - , o "movimento espírita" iniciava um novo ciclo com a fase dúbia, já sob o suporte midiático da Rede Globo de Televisão.

Com isso, criou-se uma postura cheia de contradições, mas com um discurso engenhoso e, em aparência , conciliador, que deixou de lado o "alto clero" da FEB, isolando o grupo liderado pelo sucessor de Wantuil, Francisco Thiesen, e Luciano dos Anjos. Roustaing seria descartado da mesma maneira que, recentemente, foi o ex-deputado Eduardo Cunha: ideias aproveitadas, idealizador deixado de lado.

Criou-se então uma postura dúbia: a apreciação das bases doutrinárias originais era politicamente correta, com a aparente evocação de fatos e personalidades científicos e filosóficos que, no entanto, soa pedante e temperada de muito misticismo esotérico. Misturava-se alhos com bugalhos confundindo ideias kardecianas com outras que lhes são opostas e associadas aos nomes de Emmanuel e André Luiz, entre outros.

A "mediunidade" continuava sendo o faz-de-conta dos simulacros que deixam dúvidas quanto à veracidade das mensagens ditas espirituais, porque apresentam muitas falhas em relação a aspectos pessoais dos autores mortos alegados.

Pior: ela crescia e o número de "médiuns" se tornou maior nessa época, algo muito estranho porque a lógica diz que essa atividade é complexa e diferenciada demais para que houvessem tantos especialistas assim. Em tese, todo mundo poder ser médium (embora o termo correto seja "paranormal"), mas poucos conseguem ter a concentração e a ação responsável para isso.

Daí que, quando surge um monte de "médiuns", é arrivismo. E aí a fase dúbia do "espiritismo", como se não bastasse o igrejismo propagado em palestras, "psicografias" e até romances "mediúnicos" - arremedos ruins de novelas da TV - , deu margem a muitas contradições, misturando cientificismo com moralismo medieval, lançando mão de profetismo barato, pedantismo intelectual etc.

Hoje essa fase se encontra em declínio, porque não consegue mais resolver suas contradições. Palestrantes misturam alertas de Erasto sobre os deturpadores da Doutrina Espírita com recados oportunistas e mentirosos trazidos pelo espírito-símbolo da deturpação, o jesuíta Emmanuel. Daí o nome "fase dúbia" ou "tendência dúbia", que fez do "espiritismo" brasileiro a religião mais contraditória do Brasil.

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