domingo, 16 de agosto de 2015

Que "exemplos" terá o Brasil do futuro?

GUILHERME DE PÁDUA É CONHECIDO POR SUA ARROGÂNCIA.

Que exemplos terá o Brasil do futuro? Com tantos retrocessos e um preocupante conformismo social das pessoas - algo inimaginável mesmo em 1965, quando a ditadura militar se anunciava como definitiva - , assusta o surrealismo que ultrapassa as fronteiras da ficção.

O caso Guilherme de Pádua é algo que parece ter vindo tanto de um filme de Luís Buñuel (1900-1983) quanto de uma obra de Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto, 1923-1968) da série Febeapá - Festival de Besteiras que Assola o País - , dois fenômenos da crítica surrealista brasileira.

Muito se fala de uma cena do filme O Fantasma da Liberdade, que Buñuel, cineasta espanhol, dirigiu em 1974, em que um franco atirador, de um andar alto de um prédio, atirava a esmo matando qualquer pessoa que mirava à frente. Matava como quem matava passarinhos, com sua espingarda.

A cena muda imediatamente para a de um julgamento, em que o franco-atirador recebe a sentença final, sendo em tese condenado à morte. No entanto, os guardas da prisão retiram as algemas e o assassino é solto, e ainda por cima ele dá autógrafos para as fãs.

De Pádua lembra esse caso, embora com um tempero bem Febeapá. Afinal, o homem que, com sua então esposa Paula Thomaz, matou, em 28 de dezembro de 1992, a atriz Daniela Perez, chegou a ameaçar processar a mãe desta, a dramaturga Glória Perez, por danos morais, só porque ela o chamou de "psicopata".

O adjetivo, no entanto, não foi em vão. Depois que Guilherme e Paula Thomaz tiraram a vida da bela atriz com 18 golpes de tesoura, não se sabe por que motivo (Daniella tinha boa índole e era conhecida pelo seu jeito gentil, simpático e amigável), o hoje ex-ator foi consolar os familiares pelo óbito prematuro que ele mesmo, em parte, provocou. Daniela teria feito 45 anos no último dia 11.

Depois de seis anos de prisão, decretata em 1993, Guilherme e Paula foram soltos. Chegou-se a "anular" a pena do hoje ex-casal e Guilherme, após passar uma temporada como frequentador e até pastor evangélico, voltou para a curtição.

Há muitos aspectos surreais. Guilherme tem ficha limpa, contou com a blindagem da grande imprensa, que o tratou de forma cordial, e zela por sua imagem mais do que ele merece, em suas condições de criminoso impune. Assim como o ex-jornalista Antônio Pimenta Neves, Guilherme tem na arrogância um traço forte de sua personalidade.

FOTOS DE DANIELA PEREZ PUBLICADAS NO INSTAGRAM DA MÃE.

Tendo se casado com uma outra bela mulher, xará da anterior, a veterinária Paula Maia, a relação, embora sem grandes conflitos, terminou de forma nada harmoniosa, pois Paula Maia o via como um manipulador, uma pessoa gananciosa, que quer sempre que suas vontades sejam atendidas.

"Soube que agora ele tem turminha, uma vida pessoal intensa. Dizem até que ele está saindo demais. Na minha época era casa igreja, igreja casa", revelou a veterinária e hoje ex-mulher dele. Paula Maia, no entanto, foi duramente criticada por ter se casado com ele antes.

O lado assustador é que Guilherme de Pádua tenta conquistar espaços na sociedade com uma avidez surpreendente. Imaginar ele vivendo até os 95 anos assim é tenebroso, embora tenha havido relatos de vidente, divulgado em 1993, de que Guilherme morreria na casa dos 55 anos, de doença incurável.

Hoje Guilherme tem 46 anos incompletos (seu aniversário é em novembro). Embora toda predição de vidência seja discutível e muitíssimo duvidosa, o passado promíscuo do ex-ator pode sinalizar que ele possa não ter muito tempo de vida, como um Doca Street de intenso passado de nicotina e cocaína e um Pimenta Neves que ingeriu uma overdose de remédios.

Independente disso, porém, a impunidade que cerca Guilherme de Pádua, que chega ao ponto da impunidade social, quando não apenas a condenação criminal é descartada como a ressocialização se torna fácil e vantajosa demais, preocupa o país. Será esse o "exemplo" que o Brasil terá para o futuro? São pessoas assim que irão contar suas histórias para seus netos?

Para piorar, Guilherme de Pádua é um dos beneficiados entre tantos personagens diversos que estão relacionados, cada um com seu contexto diferente, ao processo de degradação de valores sociais, culturais, políticos e morais do período entre 1990 e 1992.

O próprio presidente da República no período, Fernando Collor de Mello, foi beneficiado quando, depois de ter direitos políticos cassados, voltar à cena política posando de "político progressista" e conciliando com antigos opositores.

Curiosamente, diferentes personagens do período 1990-1992 tiveram tempos semelhantes de ostracismo ou condenação. Fernando Collor de Mello teve direitos políticos cassados quase que na mesma época em que Guilherme de Pádua foi preso, o primeiro entre 1993 e 2001, o segundo entre 1993 e 1999.

Outros personagens, como o compositor brega Michael Sullivan, o ex-prefeito de Salvador, Mário Kertèsz, vários intérpretes do "funk carioca", o apresentador Gugu Liberato e a sub-celebridade Solange Gomes, tiveram períodos mais ou menos semelhantes de "entressafra" até voltarem à evidência com apetite redobrado.

O que preocupa é que esse elenco poderá ser exaltado em uma campanha de revival dos anos 1990 a ser articulada por empresários e publicitários ligados à indústria do entretenimento, associados a jornalistas e acadêmicos influentes.

Através dessa nostalgia forjada do período 1990-1992, a ser vendido como uma época "dourada" e "valiosa", esse elenco será promovido como se seus membros fossem os "heróis" de uma época "inesquecível", podendo serem vistos como "exemplos a serem seguidos". Como não bastassem os caricatos "pagodeiros" e "sertanejos" da época, que hoje são vistos como "artistas geniais".

Guilherme de Pádua faria o papel da "polêmica sub-celebridade" que daria, de vez em quando, entrevistas "bombásticas" mediante um generoso cachê. Ele se alimentaria de "polêmicas" através de revelações "sensacionais", enquanto curte a vida ao lado de "sua turminha". Triste saber de um Brasil que acredita poder haver "heróis" como ele.

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