quinta-feira, 23 de julho de 2015

'Cinco Dias no Umbral' e 'Colônia Espiritual Amor e Caridade' reciclam temática de Nosso Lar


Quando a indústria de livros "espíritas" parecia ter se esgotado, eis que novos lançamentos tentam repetir as mesmas temáticas místicas e surreais da espiritualidade, sempre juntando propaganda religiosa e pseudo-ciência mais próximo do esotérico.

O "médium" niteroiense Osmar Barbosa divulga dois livros que exploram a mesma temática de Nosso Lar, com todos os aspectos surreais da pretensa vida espiritual, com dados imaginários trazidos através das obras de "André Luiz" por Chico Xavier e descritos e desenvolvidos à revelia da Ciência Espírita de Allan Kardec e do Espírito de Verdade.

Só que, em vez de colocar umbral e colônia espiritual num mesmo livro, Osmar, talvez visando produzir mais livros em vez de um e vender mais "para a caridade", dividiu a narrativa em dois: Cinco Dias no Umbral e Colônia Espiritual Amor & Caridade.

O primeiro livro, atribuído ao "espírito" Nina Brestonini, conta a história desta jovem, que teria falecido aos 24 anos de um problema no coração. Era muito bonita e atraente, segundo sugere a modelo que posou para a capa do referido livro.

A menina teria se despertado numa enfermaria da Colônia Espiritual Amor & Caridade, recebendo tratamento durante um tempo e, uma vez recuperada, foi designada a acompanhar um grupo de missionários, definidos como "caravana de luz", que passariam cinco dias em uma região sombria de espíritos mórbidos que os "espíritas" entendem como "umbral".

Sabe-se que correntes do "movimento espírita" se desentendem quanto ao nível moral do "umbral", para uns vistos como "inferno", outros como "purgatório". Mas, a julgar por obras como Nosso Lar e o livro de Osmar, o "umbral" é visto como na primeira opção, a do "inferno".

A ideia é mostrar aquela mesma pregação "espírita" dos "reajustes espirituais" e "resgates morais", envolvendo perigos, sofrimentos e trazendo a "lição" de que "por que nem sempre compreendemos as lições das esferas superiores", eufemismo para entender que, quando tudo ocorre errado em nossas vidas, temos que aceitar tudo isso porque é uma forma de "reajuste espiritual".


Então, vem o segundo livro, que Osmar não credita a autoria a um "espírito" específico. Trata-se do "explicativo" livro Colônia Espiritual Amor & Caridade, que descreve "diálogos" com "espíritos diversos" reportando sobre a suposta colônia e detalhando os aspectos que viram lá, desde a arquitetura "futurista" até a hierarquia funcional e seus trabalhos.

A capa já sugere isso, com uma cidade feita à maneira das ficções científicas, com pessoas vestindo roupões azulados. Uma criança (?!) aparece falando com alguém que está de costas. Há árvores e arbustos ao redor, além de uma relva com um caminho para os transeuntes percorrerem seu campo.

Esteticamente, lembra muito o que se via nos desenhos da Família Halley, que tentou fazer sucesso através de um especial da Rede Globo de 30 anos atrás, cuja trilha sonora incluiu a interessante "Planeta Morto" dos Titãs e uma versão "rock de arena" de "A Canção do Senhor da Guerra", da Legião Urbana, reprovada pelo grupo do saudoso Renato Russo.


ALLAN KARDEC NUNCA FALOU QUE UMBRAL EXISTIA

A ilustração acima, usada pela editora Fraternidade Espírita, pertencente à instituição do mesmo nome, reforça o pretensiosismo que a atual fase do "movimento espírita", adotada desde 1975, expressa: o suposto rigor na fidelidade ao pensamento de Allan Kardec.

Há um círculo envolvendo a foto do pedagogo francês com as expressões "Fraternidade Espiritualista" e "Amor e Caridade" escritas no idioma do país europeu. Tudo para forjar um vínculo "rigoroso" com a doutrina original de Kardec, que na prática, todavia, não ocorre.

Afinal, nunca em suas obras Kardec havia descrito que o umbral existia, nem falou sobre a existência das colônias espirituais. É verdade que ele viveu num tempo em que não foram alcançadas muitas das descobertas de hoje, tanto na tecnologia quanto no âmbito do desconhecimento, mas Kardec continua atualíssimo ao descrever a vida espiritual como diferente de nossa compreensão materialista.

É ainda um grande mistério a vida espiritual, mas o que se sabe é que não existem zonas geológicas inferiores, como muitos tentam imaginar através da figura fictícia de ambientes que misturam cavernas, esgotos e áreas pedregosas e selvagens. Não existem pesquisas que possam afirmar como realmente é o mundo espiritual.

O que é certo, tomando como base o raciocínio deixado por Allan Kardec na sua trabalhosa obra em que ele procurou nos esclarecer o máximo possível sobre a natureza espírita, é que o "umbral", na verdade, não passa de uma sensação emocional do espírito atormentado, nada tendo a ver com um ambiente equiparado a uma dimensão física no mundo espiritual.

Ou seja, não há uma zona cavernosa, um lodaçal ou uma selva na vida espiritual. O que há é uma sensação de mal-estar de espíritos que faleceram deixando como legado, na vida terrena encerrada, erros gravíssimos e prejuízos sérios.

A vida terrena nos dá essa sensação de humor. Na vida cotidiana, há dias de sol que parecem bastante horríveis, porque estamos mal-humorados, brigamos com alguém ou tivemos algum prejuízo sério. Por outro lado, podem haver dias de tempestade maravilhosíssimos, em que estamos com bom humor e ao lado de pessoas que gostamos e com as quais estabelecemos excelente relação social.

O que Allan Kardec quer dizer é que, no mundo espiritual, o que há são sensações espirituais de bem ou mal-estar, conforme a situação. Nada a ver com umbrais ou colônias espirituais, que não passam de formas ficcionais de cunho materialista, uma espécie de ficção científica ruim e feita sob a pretensão de parecer "realista", "científica" e "verídica".

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