domingo, 5 de julho de 2015

Caso Maju e o violento reacionarismo na Internet

A BELA MARIA JÚLIA COUTINHO, VÍTIMA DE COMENTÁRIOS RACISTAS, NUM TIPO DE CYBERBULLYING NAS MÍDIAS SOCIAIS.

O que há em comum o autoritarismo anti-legalista do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, e os internautas que, em bloco, investem em comentários caluniadores, ofensivos e eventualmente racistas, machistas e homofóbicos, nas mídias sociais, para não dizer a criação de blogues ofensivos destinados à difamação gratuita e grosseira contra alguém?

Simples. É o reacionarismo extremo, raivoso e egoísta, não raro hipócrita, que usa a liberdade e a lei para combater a liberdade e a lei. São fenômenos que preocupam por representarem uma ameaça ao futuro do país, através dessas demonstrações neo-medievais que se observa nos mesmos.

Recentemente, a bela e talentosa jornalista da Rede Globo, Maria Júlia Coutinho, a Maju, foi vítima dos mais abjetos comentários na Internet. Isso se deu há dois dias, quando a página do Jornal Nacional no Facebook divulgou um linque das previsões do tempo.

Xingada por covardes internautas de "preta imunda" e "macaca", além de receber comentários jocosos que diziam que "fita isolante é band-aid de negro", "não tomar café para não ter intimidade com negro" e comparar a negritude à ideia pejorativa de "escuridão", Maju ainda foi vítima de um comentário que atesta a burrice desses reacionários que se autoproclamam "inteligentes".

Uma internauta, que pela foto parecia de uma moça branca "de boa aparência", chegou a reclamar que "em pleno século 2015" (!) se empregavam negros nos meios de comunicação. Racismo, estupidez e burrice num comentário só.

COMO SE DÁ O REACIONARISMO DIGITAL

O comentário contra Maju, felizmente, rendeu o efeito contrário. A simpática jornalista, conhecida por sua graciosidade, recebeu apoio da sociedade, de outros internautas e também de gente famosa. Movimentos nas mídias sociais da Internet com as palavras-chave #SomosTodosMariaJuliaCoutinho e #SomosTodosMaju se multiplicaram em favor à jornalista e ao direito dos negros.

O Ministério Público começa a investigar os internautas que despejaram essas mensagens grotescas. A ação desses grupos reflete o reacionarismo que há muito tempo existe nas mídias sociais, e que só agora começa a ser conhecida pela imprensa.

São internautas que defendem o "estabelecido", acreditando em "verdades vindas de cima". Defendem da gíria "balada" à pintura padronizada nos sistemas de ônibus, de rádios FM comerciais "de rock" ao machismo enrustido das "musas" siliconadas. Enfim, coisas que nem valem tanto a pena mas são impostas como "verdades absolutas" pelo status quo.

Geralmente eles defendem valores impostos por políticos, tecnocratas, executivos de mídia, publicitários, celebridades, para não dizer instituições mais obscurantistas, como no caso dos ataques racistas, homofóbicos, machistas e contra nordestinos.

Esses internautas não aceitam contestação e se agrupam nas mídias sociais sob influência de um líder, geralmente um valentão que possui sua relativa visibilidade numa comunidade em um portal de mídia social, geralmente um complexado que goza seus quinze minutos de fama bancando o fanfarrão na rede mundial de computadores.

É esse valentão o mais radical dos reacionários, e é ele que puxa, diante de reações contrárias àquilo que ele acredita, a adesão dos seus parceiros, que decidem despejar, em qualquer página de recados ou fórum de Internet, podendo ser também e-mails, torpedos (mensagens enviadas por celular) e outros recursos.

De repente, um contestador tem sua página invadida por comentários que alternam entre recados irônicos, ofensas pesadas, piadas agressivas, ameaças e xingações diversas. Geralmente essas mensagens chegam com um pequeno intervalo de tempo, revelando a ação da "panelinha".

Em casos mais extremos, o valentão que lidera a campanha depreciativa cria uma conta para lançar um blogue dirigido à vítima de ocasião. Tudo que é relacionado a essa vítima, de textos de blogues produzidos por esta a fotos pessoais da infância, é reproduzido de forma indevida e com claros fins de calúnia e difamação.

SUL E SUDESTE, SOBRETUDO RIO DE JANEIRO, SÃO REDUTOS DOS REAÇAS VIRTUAIS

Esses comentários podem vir de qualquer parte do país, mas eles predominam nas regiões Sul e Sudeste, que desde os anos 1990 se tornaram focos de intenso reacionarismo social. Dá até para identificar as tendências dominantes nos três Estados brasileiros com maior índice de reacionarismo virtual, Rio Grande do Sul, São Paulo e, principalmente, o Rio de Janeiro.

O Rio Grande do Sul é onde tem as manifestações mais radicais, em especial de caráter golpista e racista. É nele que existe um movimento que tenta relançar a ARENA (Aliança Renovadora Nacional), já com pedido de registro no TRE. O partido que comandou a ditadura militar voltaria como um partido de inclinações de extrema-direita, acolhendo grupos neo-nazistas.

São Paulo é que procura dar um suporte "racional" ao reacionarismo. É reduto dos principais veículos da grande imprensa comprometidos com esse objetivo: Veja, O Estado de São Paulo e Folha de São Paulo. Além disso, é onde militam nomes como Rodrigo Constantino, Reinaldo Azevedo, Rachel Sheherazade e o roqueiro Lobão.

O Rio de Janeiro é o Estado em que o reacionarismo é mais agressivo. É nele onde se concentram os internautas mais violentos, que articulam campanhas difamatórias contra quem não pensa igual a eles, seja em mensagens publicadas em "ritmo industrial" nas mídias sociais, seja em blogues ofensivos.

O RJ também reduto de figuras reacionárias como Eduardo Cunha, Silas Malafaia e Jair Bolsonaro, embora os reaças cultuem também "moderados" como Eduardo Paes, Luciano Huck, o paranaense Jaime Lerner, o craque Neymar e os ídolos do "sertanejo", "pagode", "funk" e do rock mais comercial (como Guns N'Roses, Charlie Brown Jr., Linkin Park e System of a Down).

Os três Estados têm todas as caraterísticas que são apenas predominantes em cada um deles. O jornalista gaúcho Augusto Nunes compartilha com os paulistas na "racionalidade" do reacionarismo. Há neo-nazistas não só em Porto Alegre, mas também na Grande SP e no Grande RJ (mesmo na mestiça Baixada Fluminense).

Além disso, há internautas agressivos em São Paulo, como também há políticos que unem autoritarismo e dribles à lei, já que Geraldo Alckmin e José Serra não são muito diferentes de Eduardo Cunha. Há a curiosidade de Lobão, carioca, agir em São Paulo, e Jair Bolsonaro, paulista, agir no Rio de Janeiro.

Há também outros focos no Paraná, Santa Catarina e Minas Gerais, e, com menos intensidade, nos demais Estados do Brasil. Eles refletem a péssima influência que internautas recebem da grande mídia desde os anos 1990 - época de intenso retrocesso cultural - , além da péssima formação social.

Afinal, trata-se de uma geração que não teve uma boa escolaridade, vivendo um currículo escolar marcado por greves, falta de professores e programa letivo precário. Além disso, também não tiveram a devida atenção familiar, pois seus pais geralmente estavam ocupados com o mercado de trabalho ou tinham vícios pessoais, além das estruturas familiares serem afetadas com divórcios sucessivos.

Eram filhos maltratados ou desprezados pelos pais, mas que recebiam presentes constantemente, e os mais abastados tinham festinhas quase todo fim de semana. Foram criados pela televisão aberta com seus valores duvidosos e sua péssima expressão cultural. Acreditavam na "lei do mais forte" e no "jeitinho brasileiro".

Daí as condições que produziram pessoas tão reacionárias, embora jovens ou jovens-adultas. Daí a ilusão da impunidade e do sucesso fácil que essas pessoas têm, da fantasia de defenderem a "verdade" através do status quo e das mensagens publicitárias, e "ser inteligente" por nada e de burlar a ética e o respeito humano e acreditar sair impune com isso.

O caso Maria Júlia Coutinho acabou chamando atenção da sociedade para esse tipo de reacionarismo, como outros exemplos tristes nos últimos anos. E que podem ser um grave perigo para o nosso país, porque os jovens de hoje poderão ser os líderes de amanhã, e podem levar às últimas consequências a já nefasta e perigosa conduta do deputado Eduardo Cunha.

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