quarta-feira, 24 de junho de 2015
Por que o Rio de Janeiro regrediu tanto?
Por que o Rio de Janeiro regrediu? Por que o Estado que parecia ser a vanguarda sócio-cultural do Brasil, cuja capital era o referencial de modernidade para o mundo inteiro, foi tomado de um provincianismo tão doentio que faz cariocas e fluminenses parecerem tão matutos quanto os cidadãos de Manaus e Belém do Pará?
O esporte da "religiosização" que aceita arbítrios absurdos como se fossem "ordens divinas" e que, no âmbito religioso, se manifesta no neo-obscurantismo manifesto pelo presidente da Câmara Federal, deputado Eduardo Cunha, e pelo pastor da Assembleia de Deus, Silas Malafaia, tornou-se doença no Estado junto com a negação da diversidade e a intolerância social.
Eduardo Cunha vai na contramão das conquistas constitucionais, através de medidas ou do apoio a projetos que envolvem inúmeros retrocessos sociais, como a redução de benefícios sociais no mercado de trabalho e a criminalização de adolescentes.
Por sua vez, Silas Malafaia havia sido criticado, pela sua intolerância social contra as culturas afro-brasileiras, pelo jornalista Ricardo Boechat, no programa que este apresenta nas manhãs da Band News FM. Boechat comentava a surra que uma menina sofreu depois que saiu, com os pais, de um culto de candomblé.
O espancamento teria sido feito por dois homens tomados de intolerância sócio-cultural e religiosa. Boechat acusou Malafaia de incitar o ódio nessas condições e chamou-o de "pilantra" e "tomador de dinheiro dos fiéis".
Malafaia é conhecido por suas posições ultraconservadoras e um apetite antissocial comparável ao também político Jair Bolsonaro, outra figura carioca (apesar de nascida em São Paulo) e famoso por suas posições fascistas.
É do Rio de Janeiro que vem boa parte dos internautas mais reacionários, que combinam entre si ataques morais, por meio de ameaças ou comentários zombeteiros e irônicos, contra aqueles que discordam de tudo que é imposto pelo poder midiático, político, mercadológico e tecnocrático. Em casos extremos, blogues são feitos exclusivamente para fazerem ofensas pesadas contra quem discorda do "estabelecido", com uso leviano de ideias e até fotos particulares das vítimas.
E isso sem contar de internautas que expressam racismo, homofobia e outros preconceitos sociais violentos, o que, no caso do racismo, é aberrante, tal o desprezo dos internautas com o fato de que essa prática é considerada crime inafiancável. Também, que diferença faz a esses brutamontes digitais se eles talvez continuassem a usar smartphones dentro das celas da prisão?
O que aconteceu com o Rio de Janeiro? A impressão que se tem é que, se os tanques de Olímpio Mourão Filho, general de Juiz de Fora que iniciou o golpe militar de 1964, tivessem chegado ao entorno da Central do Brasil hoje, teriam sido recebidos por grupos entusiasmados de reacionários a festejar a chegada da tropa com serpentinas e champanhes.
A Cidade Maravilhosa, hoje, nem de longe lembra o projeto de modernidade que se via em 1958. Até musicalmente a Bossa Nova deu lugar à tosqueira do "funk" e suas baixarias. E, socialmente, o Rio de Janeiro, segundo várias pessoas comentam, tornou-se uma "Calibama", mistura de Califórnia com Alabama (Estado ultrarreacionário dos EUA), com alguns aspectos mafiosos de Chicago.
Sim, porque é o Rio de Janeiro dividido entre o fisiologismo político de Eduardo Paes, Luiz Fernando Pezão e companhia, pelo obscurantismo religioso dos neopentecostais (representados no Congresso Nacional por Eduardo Cunha), pelo "coronelismo" suburbano dos banqueiros do jogo-do-bicho, pelo "cangaço" do asfalto dos milicianos e pelo "fascismo" favelado do narcotráfico.
Isso para não dizer do totalitarismo do futebol carioca, em que torcer pelos quatro principais times (Flamengo, Fluminense, Vasco e Botafogo) torna-se a medida das relações sociais, a ponto de pessoas que não torcem por um desses times e nem sequer curtem futebol sejam alvo de sutil discriminação social.
E ainda há a poluição do ar, que coloca o Grande Rio acima da Grande São Paulo, com o ar que os cariocas respiram sem perceberem o odor de fumaça em volta, motivada por muitos fumantes inveterados e pela crônica poluição da Baía da Guanabara e da Lagoa Rodrigo de Freitas, que envergonham os esportistas a espera dos eventos olimpicos de 2016.
Não dá para esconder esse quadro de provincianismo no Rio de Janeiro, em que na Economia se manifesta pelas constantes faltas de produtos, como se a região não fizesse parte dos grandes centros e sedes dos grandes distribuidores de produtos dos mais diversos tipos. Muitos supermercados se comportam como se fossem mercadinhos de Macapá, com tantas faltas de produtos e a lentidão que se tem na reposição de estoques.
Mas por que o Rio de Janeiro vive um provincianismo tão grande, pior, em muitos aspectos, do que a Bahia sob o domínio de Antônio Carlos Magalhães, entre 1967 e 2007? O que fez a Cidade Maravilhosa e o resto do Estado se comportarem como se fossem um Estado perdido no Norte do Brasil? Os Eduardos, Paes e Cunha, promovem retrocessos bem piores do que aqueles que foram associados ao "Toninho Malvadeza", que já haviam sido graves.
Seria necessário um estudo por parte de sociólogos, antropólogos e cientistas políticos para ver o Rio de Janeiro sem a máscara dos calçadões de Copacabana e Ipanema, e ver o outro Rio, do excesso de favelas, do provincianismo cultural, do bairrismo, do comportamento "bovino" da população, do obscurantismo religioso, do reacionarismo político-ideológico, da miopia midiática etc.
Difícil fugir dos estereótipos do corredor praiano Leblon-Ipanema-Copacabana-Leme, e do cosmopolitismo carioca hoje ameaçado de extinção. Mas seria melhor ver as raízes desse surto provinciano que preocupa o país, já que é do Rio de Janeiro que se lançam muitos paradigmas que valem para a vida cotidiana nacional.
Ver um Estado da Região Sudeste tomado de tantos retrocessos sociais é algo inimaginável até na visão elitista do prefeito Pereira Passos, há 100 anos, ou mesmo no Rio anterior à sua política do "bota abaixo". Ver que até os "modernos internautas" adotam um terrorismo medieval nas mídias sociais é algo que deveria ser analisado.
Enquanto, oficialmente, o Rio de Janeiro continua sendo o Rio de janeiro, fevereiro e março, na prática a Cidade Maravilhosa e seu Estado se perdem no seu perecimento social, em que ar poluído, religiosos medievais e internautas desordeiros temperam o cotidiano que faz o Estado do Rio de Janeiro se tornar um dos mais retrógrados do Brasil.
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