segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015
Evolução do Brasil segue lógica "penitenciária"
Nos últimos anos, o Brasil, em diversos ramos da atividade humana, adotou uma lógica "penitenciária". Mas isso segue também uma lamentável tradição de que nosso país, para construir o novo, precisa manter velhas estruturas e nelas implantar alguma coisa nova.
Por isso, o país nunca tem uma transformação profunda. Se alguma mudança drástica ocorre, é quase sempre para pior. Acabamos criando uma "atmosfera" energética no qual quem poderia contribuir para o progresso do país morre mais cedo ou antes de completar sua missão, enquanto pessoas mais retrógradas vivem anos e anos tentando nos provar daquilo que são incapazes de ser.
A lógica "penitenciária" consiste nas forças que destruíram ou deturparam alguma causa ou instituição sejam vistas como as únicas que as podem recuperar. É o mesmo raciocínio que se refere às prisões: só porque aqueles que prenderam alguém são os únicos a lhe restituir a liberdade, muitos acreditam que algozes e empasteladores necessariamente serão os paladinos da causa destruída.
Passamos por uma longa ditadura militar na qual os mesmos responsáveis por sua instauração, como os generais Ernesto Geisel e Golbery do Couto e Silva - este também intelectual militar de direita, professor da Escola Superior de Guerra e militante do IPES, "instituto" que reivindicava o golpe militar contra o então presidente João Goulart - , foram os que promoveram a redemocratização.
No machismo, a supremacia masculina é usada como patrocinadora da emancipação feminina, como se o feminismo, de toda forma, tivesse que florescer às custas de valores machistas. Mulheres independentes acabam se casando com homens poderosos. Em contrapartida, "mulheres-objeto" que seguem estereótipos machistas de sensualidade acabam vivendo sem maridos ou namorados.
A Música Popular Brasileira, jogada à margem do mercado e empastelada por uma geração de ídolos neo-bregas dos anos 90 (Chitãozinho & Xororó, Alexandre Pires, Zezé di Camargo & Luciano, Ivete Sangalo, Leonardo e Daniel), é alvo de uma campanha de recuperação do seu sucesso midiático através da "ajuda" dos mesmos neo-bregas que a liquidaram.
Até a cultura rock, empastelada por jornalistas, músicos e radialistas de mentalidade a mais anti-roqueira possível, tenta agora uma revitalização de mercado e uma recuperação de popularidade nas mãos daqueles que a destruíram.
A princípio, parece verossímil acreditar que a quem destruiu alguma coisa cabe reconstrui-la. Só que, neste caso, a ideia é superestimada e distorcida, e deixamos aos algozes de uma causa a missão de serem seus especialistas, como se qualquer um pudesse ser um Saulo de Tarso que, de um anti-cristo ferrenho, virou um dos ativistas do Cristianismo primitivo.
Isso acaba impedindo que aqueles que realmente entendem ou militam por alguma causa possam realmente representá-la. Os algozes viraram os "reis do pedaço", passaram a se "especializarem" por aquilo que não entendem nem apreciam, e ainda se apoiam na ideia duvidosa de que, se é ruim com eles, pior será sem eles.
Por isso, muitas causas novas acabam minimizando seu potencial transformador ou transgressor. Novidades são apropriadas por pessoas que naturalmente as rejeitam, mas só aceitam ideias novas quando elas possam ser dissolvidas em algo mais ameno e muito menos transformador, um "novo" que não representa ruptura com o "velho".
NO "MOVIMENTO ESPÍRITA" TAMBÉM É ASSIM
A lógica "penitenciária", a ilusão de depender dos algozes para efetuar algum processo libertário, que impede com que pessoas que realmente têm conhecimento de causa abracem o sistema de valores que vivenciam e defendem, também é defendida pelo "movimento espírita" no Brasil.
O "espiritismo" brasileiro passou a ser dominado pelas próprias forças que o tentaram minar. A pressão inicial da Igreja Católica num tempo em que estavam sujeitos à prisão quem fosse instalar um "centro espírita" (não se fala da visão distorcida que confunde "umbanda" com o suposto "kardecismo" da FEB) fez o "espiritismo" se adaptar ao gosto dos católicos.
Com o "espiritismo" brasileiro, o processo evolutivo da doutrina de Allan Kardec, em vez de seguir em frente, declinou tão seriamente que hoje o que se entende como "doutrina de Kardec" no Brasil não passa de uma releitura moderada e parcialmente flexível do Catolicismo medieval.
Este é um típico exemplo do processo que o "novo" sempre sofre no Brasil, com sua essência sendo sacrificada em favor de uma "releitura moderada" que quase nada têm da ideia original, apenas aproveitando sua fachada retórica, sua "embalagem", para colocar praticamente outro conteúdo. É quase sempre assim no nosso país.
O desvio da essência original de Allan Kardec é tal que sua recomendação de rejeitar o menor erro que indique prejuízo aos valores da Doutrina Espírita foi descumprida, já que Chico Xavier cometeu muitos e gravíssimos erros e passa incólume na credibilidade (ou credulidade?) popular, com os "espíritas" brasileiros obsediados em se apegar no carisma do "bom velhinho" e suas frases "dóceis".
Há quem acredite que, no Brasil, se possa recuperar as bases doutrinárias de Allan Kardec mantendo Francisco Cândido Xavier e Divaldo Franco (outro que cometeu erros gravíssimos e constantes) intatos no pedestal, apenas fazendo "mornas críticas" a seus desvios doutrinários mas praticamente mantendo a idolatria obsessivamente apaixonada.
É esse o cacoete que impede que o Brasil atinja um progresso verdadeiro, e que compromete todas as condições de liderar o mundo, como desejava Chico Xavier desde quando lançou os primeiros livros de sua tendenciosa safra "espiritualista" e foi reforçado no sonho que inspirou o documentário Data-Limite Segundo Chico Xavier.
Afinal, se o Brasil se limita a assimilar o novo mantendo bases velhas, como se quisesse apenas espalhar perfume num quarto tomado de mofo tóxico, então não há como esperar uma nação transformadora num país que não rompe com estruturas velhas, sempre adaptando o "novo" ao sabor dos retrógrados, esperando que a "libertação" venha sempre nas mãos dos "carcereiros".
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