A BANDA ESTADUNIDENSE DEVO, EM FOTO DE CERCA DE 1982.
Ser realista é muito melhor do que adotar um otimismo fora da realidade. As "profecias" fabulosas de Francisco Cândido Xavier já são duvidosas em muitos aspectos, por não passarem de devaneios mesclados com utopias religiosas, imagine então se comparados com outras abordagens, mesmo inusitadas?
Pois Chico Xavier perde até mesmo para a banda estadunidense Devo. Surgida em Akron, Ohio, a banda, ícone do som que misturava punk e tecnopop e se tornou um dos artífices do pós-punk - estamos falando de cultura rock, pessoal - é comandada pelos vocalistas e tecladistas Mark Mothersbaugh e Gerald Casale.
A banda - que viu regressarem ao mundo espiritual dois membros-fundadores, o ex-baterista Alan Myers e o guitarrista Bob Casale, irmão de Gerald - surgiu com uma ideia grave que eles trabalharam a princípio de forma humorística: a "teoria da devolução".
Segundo seus integrantes, a "devolução" consistiria no retrocesso da humanidade, em ritmo proporcionalmente inverso ao do avanço da tecnologia e do consumismo. À medida que a tecnologia avança e os bens de consumo se multiplicam, a humanidade passaria a retroceder no aspecto moral, não sendo necessariamente má, mas deixando de ser naturalmente generosa e solidária.
É o que acontece, na sociedade neoliberal e tecnocrática em que vivemos. A tecnologia avança, o consumismo aumenta, e as pessoas deixam de valorizar a amizade e se contentam em serem multidões solitárias reunidas nas mídias sociais, mas incapazes de levar a vida social para além do grupinho do qual está acostumado a se relacionar (e olhe lá).
O Devo afirmava que a "devolução" recuperava os instintos primitivos da sociedade, além de estimular o emburrecimento, a alienação e a estupidez. Por isso, o retrocesso movido pela tecnologia e pelo consumo, criando um "mundo bonito" de conformismo, de aparente felicidade, que a consciência já não consegue mais definir do que se trata.
Isso é muito diferente das fantasias trazidas pelo "velho Chico", o "bom velhinho", falecido há mais de dez anos, mas que continua enfeitando as mídias sociais com suas frases açucaradas. Chico Xavier acreditava que o mundo iria progredir sob o silêncio da prece e o sentimento de fé no coração.
Isso parece muito fácil. Mas a realidade está regredindo de forma catastrófica. Se Chico Xavier "prevê" uma catástrofe a atingir a Europa, os EUA, o Oriente Médio e a Ásia, ele não previu a catástrofe da mediocrização cultural, da corrupção e da violência que assolam o Brasil tão "predestinado" a ser a "vanguarda" da humanidade planetária.
Se os países desenvolvidos vivem a crise do consumismo, e começam a repensar seus valores, sobretudo diante de atos terroristas como os que ocorreram nos EUA, Inglaterra, Espanha e França nos últimos 15 anos, atingindo do World Trade Center à redação do periódico Charlie Hebdo, o Brasil vive a crise de valores resultante do colapso causado pela ditadura militar.
Vivemos um mundo em crise, e não será o Brasil que resolverá esse quadro. Não há reino de amor algum em cogitação, o que existe é um quadro de crises sociais profundas e trágicas, das quais teremos que resolver de forma coerente e sensata, num quadro conflituoso do qual o "silêncio da prece" se torna apenas uma solução inócua, tal qual uma água com açúcar.
O Devo deu uma grande lição de realismo. E o realismo prepara muito mais as almas para a transformação não somente individual, mas grupal, e não somente a transformação do "eu", mas também a do "outro".
Daí que o realismo vivifica muito mais do que otimismos vãos. As "profecias" de Chico Xavier de um "mundo feliz" comandado pelo Brasil são apenas conversas para boi dormir. O "buraco" está mais embaixo, e antes admitíssemos as catástrofes e crises à nossa frente do que ficar sonhando em "reinos de amor e luz" que nada dizem na complexa realidade em que vivemos.
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