sábado, 11 de janeiro de 2014

O Espiritolicismo e os médiuns-estrelas

DIVALDO FRANCO E CHICO XAVIER, PROVAVELMENTE POR VOLTA DE 1957.

No Brasil que tem até mesmo os juristas tomados de estrelismo e obsessão pela fama, como o presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa - cujo filho foi presenteado com um cargo de produtor na Rede Globo - , é compreensível que o "espiritismo" brasileiro também tenha sido famoso pelo estrelismo de seus médiuns.

Daí as figuras do mineiro Chico Xavier e do baiano Divaldo Franco, ambos notórios oradores e escrevinhadores, que transformam suas habilidades mediúnicas - que, na verdade, não eram manifestas em rigorosamente todos os casos atribuídos a tais práticas - num estrelato e numa mitificação de efeitos nem sempre benéficos.

É só comparar como eram os trabalhos dos médiuns consultados pelo professor Rivail, conhecido pela alcunha de Allan Kardec, que, vale lembrar, não era ele próprio um médium. O que ele registrou em livros é resultante de consultas feitas por outros dotados da prática mediúnica.

Esses médiuns eram pessoas discretíssimas, que apenas cumpriam o seu trabalho de transmitir mensagens espirituais. Kardec, bastante criterioso nas suas pesquisas, recorreu a mais de um médium, em locais bem diferentes e distantes entre si, para verificar as possibilidades de mensagens atribuídas a cada espírito indicarem sua identidade.

Nessa época, era impossível afirmar a autenticidade de que um espírito manifesto seja realmente da identidade a ele atribuída. Não havia meios científicos para isso e a mais moderna tecnologia da Comunicação existente na época era a fotografia, ainda incipiente como fenômeno cultural e midiático naqueles tempos entre 1857 e 1869.

E já que falamos em Comunicação, se levarmos em conta a Teoria da Comunicação, nos seus conceitos mais básicos, a comunicação espírita se definiria da seguinte forma:

1) EMISSOR - O espírito de alguém que havia falecido num momento qualquer.

2) CANAL - O médium, que, pelo que o nome indica, é o intermediário, o "instrumento" de comunicação de um espírito do além.

3) RECEPTOR - Qualquer pessoa interessada em receber uma mensagem de um espírito falecido.

Só que, com o "espiritismo à brasileira" da FEB, houve um "ruído" da comunicação. Ruído é todo aquele elemento, não necessariamente um barulho, que desvia o sentido original de um processo comunicativo, rompendo com seu propósito.

Neste caso, o "intermediário" deixou de ser um intermediário para ser ele mesmo o "emissor" das mensagens espiritualistas. Em certos casos, se servindo de espíritos que se reduziram a meros "garotos de recados" de uma moral defendida pelos médiuns-estrelas, mas em outros casos nem a ação de espíritos do além acontece nas "mensagens" registradas em livros, palestras e outros eventos.

Daí que o médium virou emissor, virou o astro principal dos espetáculos "espíritas", muitas vezes lançando como "obras espirituais" livros que não passam de escrevinhações baratas - como o livro Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho - e não raro dotadas de muitos plágios de obras literárias já produzidas aqui na Terra.

Os espíritos do além é que se tornaram "funcionários" desse processo todo, fora aqueles que adotam posturas de verdadeiros chefões, como Emmanuel e Joana de Angelis. Até Bezerra de Menezes foi reduzido a um "moleque de recados" a serviço ora do também médium-estrela baiano, José Medrado, ora do mundialmente conhecido Divaldo Franco.

Ou seja, não se trata mais de um espírito do além que venha a dizer apenas como está se sentindo no plano espiritual, mas de espíritos do além, isso quando a mediunidade, em si, não é fraudulenta, corroborando o moralismo místico e religioso defendido pelos médiuns-estrelas.

Graças a esse processo de estrelismo, que transforma aqueles que têm o dom mediúnico em verdadeiras celebridades, com toda a fama e vaidades que têm qualquer famoso que se deslumbra com o estrelato, o Espiritismo no Brasil fez agravar as deturpações que já eram observadas nas crenças, dogmas e ritos transmitidos, que em si já romperam com as lições originais de Kardec.

Com isso, a figura do médium deixou de ser a do experimentador científico do recebimento de mensagens espirituais para ser um místico religioso que nem sempre controla ou verifica seus trabalhos mediúnicos ou nem sequer exerce a diferença entre mediunidade, imaginação fértil ou delírios psicológicos que dão a falsa impressão de manifestos mediúnicos.

Isso foi muito mal. Os médiuns, em vez de trabalhadores discretos, se tornaram estrelas. Deixaram, na essência, de ser médiuns, no sentido da intermediação das comunicações espirituais, ainda que façam ou sempre tiveram feito esse trabalho. Isso porque a importância do processo comunicativo acaba se centralizando mais nos médiuns-estrelas do que dos espíritos do além que querem dar seu recado.

Daí as mistificações, as mitificações, o fanatismo dos seguidores de Chico Xavier, Divaldo Franco e similares. Daí as eventuais fraudes de oportunistas que usam nomes diversos, como de Raul Seixas, John Lennon, Juscelino Kubitschek, Martin Luther King Jr. e outros, para vender mais livros. Tudo isso transforma a mediunidade num espetáculo, comprometendo seu verdadeiro sentido de permitir a comunicação entre vivos e mortos.

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